O tema sustentabilidade, apesar da sua importância ramificada junto à Administração Pública, ainda é bastante carente de atenção pelos gestores públicos.
Com origem no latim, a palavra sustentabilidade refere-se a apoiar, conservar e está normalmente relacionada com uma mentalidade, atitude ou estratégia voltada, principalmente, aos aspectos sociais, econômicos e ambientais.
Segundo conceito do ilustre professor Jair Santana:
Sustentabilidade é uma ideia sempre incompleta, sistêmica, envolvente e transcendente, que perpassa por aspectos ambientais, ecológicos, sociais, econômicos, religiosos, tecnológicos, políticos, culturais, entre outros tantos, que são, em realidade, dimensões que integram e formam a própria condição humana[1].
Trazendo, então, o enfoque para a Administração Pública, mesmo tendo sido incorporado à Lei nº 8.666/93 no ano de 2010, por força da Lei nº 12.349, é possível observar que ainda não se obteve avanços consideráveis. No ano passado, por exemplo, o Tribunal de Contas da União materializou no Acórdão 1.057/2017 o “não” avanço da implementação de ações de sustentabilidade pela Administração Pública Federal.
Para se chegar àquela conclusão, foram levados em consideração alguns índices, como:
- a elaboração, implementação e monitoramento do Plano de Gestão de Logística Sustentável (PLS);
- a racionalização no uso de energia elétrica e de água;
- o atendimento a requisitos de acessibilidade;
- a certificação de prédios públicos;
- a racionalização no uso de papel e implementação de processo eletrônico;
- a gestão de resíduos e coleta seletiva;
- as contratações públicas sustentáveis;
- a mobilidade e gases do efeito estufa; e
- a conscientização, capacitação e adesão a programas de sustentabilidade.
No entanto, cabe ressaltar que não somente o gestor público tem o dever de entender e buscar implementar as ações de sustentabilidade. Toda engrenagem pública tem papel fundamental para o desenvolvimento das contratações e aquisições sustentáveis. O próprio pregoeiro pode vir a contribuir adotando medidas perfeitamente acessíveis. Para tanto, este deve ter conhecimento sobre a existência do Decreto Federal nº 7.746/2012, decreto este que foi alterado no mês de outubro, pelo Decreto Federal nº 9.178/2017.
O Decreto nº 7.746/2012 regulamenta o artigo 3º da Lei Geral de Licitações e Contratos, estabelecendo os critérios e as práticas para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável nas contratações realizadas pela administração pública federal direta, autárquica e fundacional e pelas empresas estatais dependentes, além de instituir a Comissão Interministerial de Sustentabilidade da Administração Pública Federal direta, autárquica e Fundacional (CISAP), vinculada à Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, cuja natureza é consultiva e de caráter permanente, tendo por finalidade propor a implementação dos critérios, práticas e ações de logística sustentável junto à Administração Federal.
Neste ponto, é importante abrir um adendo, posto que, embora as alterações trazidas pelo Decreto nº 9.178/2017 fossem imediatas, a inclusão do parágrafo único no artigo 2º, o qual terá sua vigência iniciada no mês de abril de 2018, determinou que a adoção de critérios e práticas de sustentabilidade deverá ser justificada nos autos, assim como deverá preservar o caráter competitivo do certame.
E já que estamos falando de critérios e práticas de sustentabilidade, outra alteração importante ocorreu no artigo 4º do mesmo decreto, com a inclusão de mais uma prática, onde passamos a buscar:
- o baixo impacto sobre recursos naturais como flora, fauna, ar, solo e água;
- a preferência para materiais, tecnologias e matérias-primas de origem local;
- a maior eficiência na utilização de recursos naturais como água e energia;
- a maior geração de empregos, preferencialmente com mão de obra local;
- a maior vida útil e menor custo de manutenção do bem e da obra;
- o uso de inovações que reduzam a pressão sobre recursos naturais;
- a origem sustentável dos recursos naturais utilizados nos bens, nos serviços e nas obras; e
- a utilização de produtos florestais madeireiros e não madeireiros originários de manejo florestal sustentável ou de reflorestamento.
No entanto pode ser gerada uma dúvida. Será que a competência de inclusão dos critérios e práticas de sustentabilidade seria mesmo do Pregoeiro?
Como abordado noutra oportunidade, a Administração Pública é um conjunto de engrenagens interdependentes e, quando uma área é omissa em determinada ação, e sendo esta passível de correção tempestiva por outra, a mesma não apenas poderá como deverá adotar as cautelas pertinentes.
Ocorre que, muitas vezes, nos deparamos com servidores despreocupados, que procuram sempre se esquivar da responsabilidade sob a alegação de que as orientações já deveriam vir da área anterior, prevista no fluxo gerencial, sendo neste caso, a área demandante, responsável pela confecção do Termo de Referência ou do Projeto Básico, ou posteriormente por meio de parecer jurídico, o qual competiria apontar aquela ausência. É uma observação bastante pertinente, já que, em muitos órgãos da Administração Pública, o Pregoeiro acumula a responsabilidade pela confecção do Edital.
Compete ressaltar que a não observância de práticas voltadas ao desenvolvimento nacional sustentável pode tornar a licitação nula. Desta forma, o agente público deve atentar a quem pode ser responsabilizado neste sentido, posto o preconizado pelo artigo 3º do Decreto nº 7.746/2012.
Sob sua égide, os critérios e as práticas de sustentabilidade devem ser publicada como:
- especificação técnica do objeto,
- obrigação da contratada ou
- requisito previsto em lei especial, em estrita observância ao disposto no inciso IV do caput do artigo 30 da Lei de Licitações e Contratos.
Na realidade, o fato é que a prática sustentável ainda está muito distante de se tornar uma realidade e, muitas vezes, esbarra na falta de conhecimento ou de recursos, no entanto, sendo o agente comprometido com a Administração Pública, independente do seu posicionamento no fluxo licitatório, este fará o apontamento e, dentro das suas possibilidades, promoverá o saneamento de falhas que possam acarretar não só em prejuízos à contratação segura, mas também em nulidade do certame, decorrente da não preocupação com a licitação sustentável.
Em suma, mesmo que possa ser entendida por alguns como uma responsabilidade indireta ou mesmo remota, o papel do pregoeiro tem fundamental importância para o incremento de diretrizes sustentáveis agregadas às suas responsabilidades, visando atender ao desenvolvimento nacional sustentável, a exemplo das implicações que poderiam ocorrer se este resolvesse afastar as exigências e obrigações trazidas pela Lei Complementar nº 123/06 e alterações posteriores. Então, não deixem de atentar para a sustentabilidade em suas aquisições ou contratações.
Nota
[1] Santana, Jair Eduardo. Judiciário e Sustentabilidade. Jornal o Estado de Minas, 14/07/2009, Caderno Direito & Justiça.