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Da aplicação da garantia provisória de emprego à gestante nos contratos a termo

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30/04/2018 às 09:00
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4.DA APLICAÇÃO DA GARANTIA PROVISÓRIA DE EMPREGO À     GESTANTE NOS CONTRATOS A TERMO

Superada a análise das principais características e condições do contrato a termo, bem como da garantia de emprego à gestante, chega-se ao cerne do presente estudo: realmente é compatível e correta a extensão da garantia de emprego sobre os contratos com prazo determinado, prorrogando-o?

A questão é capciosa e suscita muita divergência nos posicionamentos, tanto que recorrente o TST foi instado a se manifestar, o que culminou na edição da Súmula 244 com o objetivo de firmar o entendimento. Assim, inicialmente, o item III da Súmula 244[26] previa que “não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa”.

Nesse sentido, sendo o contrato de experiência modalidade de contrato a termo passou-se a entender que a gestante não faria jus a garantia de emprego quando a dispensa se desse em virtude da extinção normal do contrato por prazo preestabelecido, pois, neste caso não se estaria diante de uma dispensa arbitrária ou sem justa causa, mas tão somente da caducidade do contrato.  Sobre o tema, a eminente Vólia B. Cassar[27], com a maestria que lhe peculiar, assim pontuou:

Em princípio, o termo final dos contratos a termo não é protaído em virtude da aquisição da estabilidade, pois o que a estabilidade impede é a despedida imotivada. O implemento do termo final acarreta na morte natural do contrato, não havendo dispensa, mas sim extinção normal.

Todavia, entendemos que o trabalhador estável, aí incluída a gestante, tem direito a estabilidade durante o contrato, isto é, enquanto não for implementado seu temo final, impossibilitando a despedida imotivada antes deste, quando seria devida a indenização contida no art. 479 da CLT para as dispensas permitidas, sem justa causa. A matéria ainda é controvertida. (grifo nosso)

Lúcido e brilhante é o pensamento da autora ao aduzir que há compatibilidade entre a garantia de emprego da gestante e o contrato a termo apenas no curso deste, uma vez que a extinção natural do contrato (cumprimento do seu termo) não pode ser encarada como despedida arbitrária ou sem justa causa, razão que ensejaria, em tese, a permanência da trabalhadora no emprego. Nesse sentido, se a trabalhadora gestante fosse demitida no curso do contrato a termo poderia reivindicar o retorno ao posto do trabalho ou indenização equivalente aos créditos que faria jus até o fim do contrato, e não até os cinco meses após o parto, pois, segundo a autora, a garantia de emprego não teria o condão de “protair” o contrato a termo.

Posicionamento semelhante é encapado pela célebre Alice M. de Barros[28] que tratando sobre garantia de emprego da gestante nos contratos provisórios assim dispõe:

Rompido o contrato determinado, sem inserção da cláusula do art.481da CLT, a empregada, na nossa opinião, continua não fazendo jus ao salário-maternidade [...] É que milita em favor do empregador, em princípio, por força da própria estrutura do aludido contrato, a certeza de seu término, consequência lógica do acordo de vontades pactuado entre as partes. Excetuando-se, entretanto, a hipótese consagrada no art. 1º, § 4º da Lei nº 9.601, de janeiro de 1998.

[...]

Outra será a situação se o contrato determinado contiver a cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antecipada (art. 481 da CLT) e este direito for exercitado pelo empregador, sem justa causa. Nesta hipótese, o ajuste passará a reger-se pela normas do contrato indeterminado e a empregada gestante fará jus ao salário-maternidade e à estabilidade provisória. (grifo nosso)

A autora tangencia en passant  a questão do salário-maternidade, e aqui merece um esclarecimento, data venia. O salário-maternidade, embora pago diretamente pelo empregador (no caso de segurados empregados, por determinação da Lei 10.710/03), é também um beneficio previdenciário, conforme art. 18, I, “g”,  arts.71 e 71-A, todos da Lei 8.213 (Lei de benefícios previdenciários)[29]. Ocorre, na verdade, que o empregador paga o salário-maternidade à empregada no valor correspondente a sua remuneração e depois é reembolsado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social- INSS, até o limite do teto dos benefícios pagos pela autarquia[30]. Vale frizar que o benefício é garantido a todas as seguradas (empregada-inclusive a doméstica-, avulsa, segurada especial, contribuinte individual ou facultativa), desde que cumprida a carência de 10 meses, exceto para a trabalhadora avulsa e empregada (inclusive doméstica), para as quais não se exige carência.

Outro fato que merece menção é que mesmo as seguradas que se encontram desempregas, mas em gozo do período de graça, fazem jus a tal benefício previdenciário, consoante parágrafo único do art. 97, do Decreto 3.048/99. Dessa forma, pode-se perceber que o fim do contrato de trabalho, per si, não tem o condão de afastar o direito ao benefício, não importando, inclusive, se a despedida se deu por justa causa, desde que a trabalhadora já tenha cumprido carência.

Em continuação a análise do pensamento da autora, é perceptível que a mesma se posiciona no sentido de não ser possível a aplicação da garantia de emprego da gestante nos contratos a termo, tendo em vista a predeterminação do prazo. Ainda, para a autora, a aplicação não de ocorrer nem mesmo no curso no contrato, exceto para os contratos provisórios regidos pela Lei 9.601/98. A exceção dá-se em virtude da expressa previsão acerca da garantia provisória de emprego apenas no curso do contrato, o que é bastante justificável visto que, apesar de ter duração máxima de 2 anos, é modalidade de contratos que pode ser sucessivamente prorrogado sem que isso resulte na sua indeterminação. Dessa forma, embora o contrato seja determinado, sempre promoverá um sentimento de incerteza, visto que constantemente vigorará a esperança nova prorrogação.

Então, conforme visto, enquanto Vólia B. Cassar defende a prevalência da garantia de emprego no curso dos contratos determinados, mas sem o condão de estender o termo do contrato, Alice M. de Barros defende que não cabe a garantia provisória de emprego nem mesmo no curso do contrato determinado, salvo para aquele previsto na Lei 9.601/98. Essa posição de Alice M. de Barros fica ainda mais nítida com a corroboração de trecho de sua análise acerca do contrato de experiência (modalidade de contrato a termo), vejamos:

Se o empregado foi admitido mediante contrato de experiência, pressupõe-se que ele se encontra em regime de prova durante esse período. Além disso, ao firmarem o contrato, as partes antecipadamente, já sabem a data de sua extinção.

Fato superveniente alusivo a gravidez da empregada, acidente de trabalho ou à circunstância de ter o obreiro obtido o registro e sido eleito para o cargo de dirigente sindical, de dirigente da CIPA ou de membro do conselho curador do FGTS, não tem o condão de se sobrepor ao limite do contrato e assegurar a manutenção do emprego a trabalhador considerado sem habilitação durante a vigência do contrato de prova, por ferir os princípios da razoabilidade e da boa-fé.

Logo, se, de um lado, a proteção à garantia de emprego se impõe, de outro, não se pode olvidar a boa-fé do empregador, que ajustou contrato experimental, por prazo certo, e se viu surpreendido por uma fato superveniente a que não deu causa, o qual assegura a continuidade do contrato.

[...] Sustentamos que nos contratos determinados não se obstou a aquisição da licença, pois a empregada já sabia de antemão a data em que o contrato terminaria. (grifo nosso)

Portanto, vê-se que é cristalina a posição da autora no sentindo de incompatibilizar o contrato determinado com garantia provisória de emprego. Já o douto juiz José Cairo Júnior[31], por sua vez, tem um entendimento mesclado, tentando acompanhar as súmulas do TST que tangenciam o tema, e assim dispõe:

Em algumas situações o empregado não adquire a estabilidade no emprego ou, quando adquire, fica limitado a determinado período, como ocorre com o empregado contrato por tempo determinado ou a título de experiência, estabilidade adquirida durante o aviso prévio e extinção da empresa.

Contudo, essas regras não se aplicam quando a estabilidade é adquirida nos casos da gestante e do empregado acidentado, coforme entendimento do TST revelado em suas Súmulas nºs 378 e 244. (grifo nosso)

Como dito, a posição do jurista parece mesclada, o trecho suso suscita a ideia que as garantias provisórias de emprego seriam aplicadas apenas no período do contrato não tendo o condão de estendê-lo, exceto para os casos de garantia de emprego da gestante e do obreiro que sofreu acidente de trabalho, gerando distinção entre os “provisoriamente estáveis”.

Salienta-se que Súmula 378[32] do TST, citada pelo autor, trata da garantia de emprego do obreiro que sofreu acidente de trabalho, estipulando, no item III, que “o empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho”. No mesmo sentido, o item III da Súmula 244[33] do TST, aduz acerca da gestante, declarando, após alteração, que “a gestante tem direito à estabilidade provisória [...] mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado”. Nota-se, portanto, a mudança de entendimento do TST.

Em 2005, o item III da Súmula 244 previa que “não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa”. Assim, sendo o contrato de experiência contrato a termo, entendeu-se que não havia compatibilidade com a garantia de emprego.

 Já em 2012, o item III foi alterado para gizar que será assegurada à gestante garantia provisória de emprego mesmo nos contratos a termo, porém, mais uma vez o TST não elucidou claramente a questão, pois, paira a seguinte dúvida: no caso de contrato a termo, a gestante faria jus a garantia independente do termo do contrato, o qual poderia ser estendido, contrariando o explicitado na Lei 9.601/98? Ou a garantia se limitaria ao período do curso do contrato (como aludido pela Lei)?

            Como dito acima, o jurista Cairo Júnior entende que estabilidade se limita ao curso do contrato determinado, exceto nos casos da gestante e do trabalhador vítima de acidente de trabalho. A distinção e o tratamento privilegiado da gestante parece ser desarrazoado, vez que, como lembrado pela doutrinadora Alice M. de Barros, gravidez não é uma enfermidade, mas tão somente um estado fisiológico transitório, sobre o qual a mulher pode exercer o devido controle tal qual o cipeiro ou dirigente sindical, que pode optar por eleger-se, ou não.

 Ora, com todos os métodos contraceptivos, a mulher pode decidir livremente o momento oportuno e conveniente para procriar, e se, sobre tal direito, o empregador não pode exercer qualquer intervenção (exames, esterilização, investigação da vida pessoal, etc), por via de mão dupla, a emprega também não pode impor um ônus superveniente ao pacto ajustado, ou seja, um ônus não previsto. Assim, parece-nos uma exigência excessiva e contrária à boa-fé, exigir que o empregador postergue o fim do contrato por ato que não deu causa, sem contar que a empregada estava ciente desde o início da prazo contratual. Ademais, como já fora suscitado no capítulo anterior, a previsão da garantia de emprego à gestante não é absoluto, limitando-se a dispensa arbitrária ou sem justa causa, situação que não pode ser confundida com a extinção normal dos contratos a termo.

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Continuando o tema, Cairo Júnior[34] dispõe sobre a “estabilidade provisória” no curso de aviso prévio (modalidade de contrato a termo) e ratifica a visão anteriormente exposta:

Considerando que o aviso prévio concedido pelo empregador delimita o termo final do contrato de trabalho, não haverá possibilidade de o trabalhador adquirir a estabilidade durante o período respectivo, de acordo com o entendimento do TST constante da Súmula nº 371 [...] Entretanto, consolida-se a jurisprudência reconhecendo a possibilidade de aquisição da estabilidade gestante durante o curso de aviso-prévio trabalhado ou indenizado. [...] Pelo mesmo fundamento utilizado para afastar a estabilidade do empregado que se encontra cumprindo o período de pré-aviso, os trabalhadores que celebraram contrato por prazo determinado também não estariam protegidos por este instituto com relação ao período posterior ao termo final. A Lei 9.601/98, art. 4º.,§4º, reforça o direito à estabilidade somente durante o prazo pré-estabelecido pelo contrato por tempo determinado [...].

Assim, mais uma vez o autor tende a expressar uma visão jurisprudencial sem enfrentar exatamente o mérito do tema a razão desse desnivelamento entre trabalhadores em condições símiles de garantia de emprego.

Em linha semelhante segue o entendimento do famoso jurista Maurício G. Delgado, visto que, embora reconheça a especificidade do contrato a termo, suas restrições e impossibilidade de atender a todas as garantias dos contratos indeterminados, como os efeitos da suspensão e provisoriamente do contrato de trabalho, privilegia a condição da gestante e do acidentado, que sofreu acidente de trabalho, como situações autorizadas a protelar o termo do contrato determinado. Tal pensamento pode ser verificado em suas palavras[35]:

[...] nos contratos a prazo, os institutos da interrupção e suspensão contratuais não produzem os mesmos efeitos típicos aos contratos indeterminados. [...] A CLT claramente acolhe semelhante restrição de efeitos da suspensão/ interrupção contratual, ao estabelecer que nos “contratos por prazo determinado, o tempo de afastamento, se assim acordarem as partes interessadas, não será computado na contagem do prazo para a respectiva terminação” (§2º da art at. 472, CLT). Quer a norma dizer, portanto, que inexistindo pactuação favorável efetuada pelas partes, o tempo de afastamento por suspensão ou interrupção será computado no prazo para a respectiva terminação do contrato.

Os mesmos fundamentos inviabilizam, efetivamente, conferir-se incidência às garantias de emprego no âmbito dos contratos a prazo. A prefixação de um termo final ao contrato, em hipóteses legalmente já restringidas, torna incompatível o posterior acoplamento de uma consequência legal típica de contratos de duração [...] (grifo nosso)

E Maurício G. Delgado[36] continua explicando as situações que, no seu entender, podem alargar o contrato a termo:

Pode-se falar a existência de exceção a essa regra geral celetista (art. 472, §2º, da CLT): a derivada dos afastamentos por acidente de trabalho (ou doença profissional, é claro).

De fato, aqui, a causa do afastamento integra a essência sociojurídica de tal situação trabalhista, já que se trata de suspensão provocada por malefício sofrido pelo trabalhador em decorrência do ambiente e processo laborativos, portanto em decorrência de fatores situados fundamentalmente sob ônus e riscos empresariais [...]. Trata-se de isolada exceção (que não abrange sequer afastamento por doenças não ocupacionais ou por serviço militar ou outro). [...]

Uma segunda exceção [...] a garantia da trabalhadora grávida[...] Essa garantia, dotada de força constitucional, ultrapassa o âmbito do interesse estrito da empregada grávida, por ter manifestos fins de saúde e assistência social não somente com respeito a própria mãe trabalhadora como também em face de sua gestação e da criança recém-nascida. Havendo, desse modo, evidente interesse público[...].

Portanto, para o festejado autor, em regra, as restrições impostas aos contratos por prazo determinado não são compatíveis com as garantias provisórias de emprego, salvo nos casos do segurado que ficou em gozo de benefício previdenciário em razão de acidente de trabalho e da gestante.

De fato, o acidente de trabalho é um evento fortuito que não se pode prever ou impedir efetivamente a sua ocorrências, além de se encontrar sobre o risco do empregador, justificando, assim, sua incidência nos contratos a termo. Situação bem distinta é a da gestante, que pode ter efetivo domínio sobre o acontecimento, sobretudo, quando já, desde o início, estava ciente da duração do contrato, ou seja, quando teve a oportunidade de analisar a conveniência de engravidar ou não.

Por outro lado, como já fora dito, gravidez não é moléstia para ser tratada como questão de saúde, ademais, como o próprio autor explicou, a “estabilidade provisória” decorrente de acidente de trabalho não se estende as doenças comuns, mas tão somente as ocupacionais (o que seguramente não seria o caso da grávida). Ainda, no que pertine a questão da assistência social, citada pelo autor, parece-nos um ônus excessivo e arbitrário desejar impô-lo ao empregador, quando é um dever estatal, conforme art. 203 e seguintes da Constituição Federal[37].

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Sobre a autora
Williane Batista Rodrigues

Advogada. Bacharela em Direito pela Universidade do Estado da Bahia- UNEB (agosto/2014) e Pós-graduanda, lato sensu, em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Legale- FALEG/SP, sob a orientação e supervisão do mestre Antero Arantes Martins*

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Williane Batista. Da aplicação da garantia provisória de emprego à gestante nos contratos a termo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5416, 30 abr. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65749. Acesso em: 29 mar. 2024.

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