Sob o sistema preconizado pelo novo Código de Processo Civil, as ações indenizatórias deverão ter valor determinado, correspondente ao quantum pretendido pelo demandante. O que parece uma novidade simples, é, na realidade, uma grande mudança na praxe forense, que requererá atenção dos advogados – sobretudo considerando o imenso quantitativo de demandas fundadas em danos extrapatrimoniais em trâmite nos tribunais brasileiros.
É que também as ações de indenização por dano exclusivamente moral deverão submeter-se à regra de determinação do valor da causa, impondo o fim do já usual pedido de condenação “em valor fixado ao arbítrio do juízo” (artifício utilizado pelos causídicos com vistas, na maioria das vezes, a evitar o pagamento de custas processuais exorbitantes). A questão é: e nos casos de condenação em valor inferior ao pleiteado, haveria sucumbência recíproca e todos os ônus (notadamente honorários advocatícios) dela decorrentes? Em outras palavras: ainda tem aplicação a Súmula 326 do STJ, segundo a qual "na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca"?
Interpretando-se literalmente o dispositivo legal, a conclusão parece clara: se a ação tem valor determinado e a condenação se dá em importe inferior ao pleiteado, autor e réu são, simultaneamente, vencedores e vencidos. É a exata definição de sucumbência recíproca. Partindo-se dessa premissa, restaria afastado o enunciado sumular, de forma que ambas as partes seriam condenadas ao pagamento de honorários advocatícios proporcionais ao proveito econômico – ou seja, o que o requerente ganhou e o que o requerido “deixou de perder” – obtido.
A jurisprudência da Corte Superior, no entanto, tem seguido – a meu ver, corretamente – outra direção, defendendo veementemente a aplicação da Súmula 326 nos casos de condenação em importe inferior ao requerido. Isso porque a quantificação dos danos morais é um dos temas mais tortuosos do Direito contemporâneo, sendo inviável – senão impossível – estabelecer valores pré-determinados às indenizações.
Os tribunais apresentam, inclusive entre as próprias câmaras, divergências no arbitramento dos valores das indenizações – realidade que vivencio diariamente, enquanto Procurador do Município, em diversas demandas fundadas na responsabilidade civil do ente público –, sendo impossível ao autor (ou melhor, ao seu advogado), em um exercício de abstração, estabelecer um quantum apto a ser acatado na integralidade. Justamente por essa razão, são inúmeros os julgados que defendem, ainda sob a égide do novo CPC, a manutenção da aplicabilidade da súmula. A posição é amplamente majoritária.
Considerando a tendência da Corte Superior de continuar aplicando o teor da Súmula 326 aos casos levados a seu crivo, impende tecer uma consideração. O art. 927 do novo diploma processual estabelece eficácia vinculante a determinados precedentes, dispondo que “os juízes e os tribunais observarão”, dentre várias hipóteses, “os enunciados do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional”.
A novidade dá aos enunciados sumulares contornos de especial relevância, ao passo que a parte lesada com eventual sucumbência decorrente do não acolhimento integral do valor pleiteado a título de danos morais poderá impugnar a decisão com fundamento na súmula. Cabe aqui apenas uma ressalva: o art. 988 do código processual não autoriza, nesse caso específico, o manejo de reclamação constitucional. Dessa forma, o demandante deverá valer-se de outras espécies recursais (apelação ou recurso especial, este com fundamento no art. 105, III, c, da Constituição Federal).