O feminicídio dois anos após a promulgação da lei

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3. Considerações finais

Grandes são os desafios para que seja eficaz a aplicação das Leis 11.340/06 – Lei Maria da Penha e 13.104/15 – Lei do Feminicídio.

Ao escrever o artigo sobre o tema feminicídio, foi possível adentrar no mundo das violências de todos os tipos, desde as mais brandas, até as mais graves, cometidas contra as mulheres.

Quando identificamos a origem do problema sob a perspectiva de onde advém a questão de gênero, é notório que tal questão aprofunda-se em tempos remotos de nossa história. Sendo esse um fato tão antigo, criou-se a cultura ao longo dos anos de banalizar o assunto. Durante décadas a mulher foi tratada no seio familiar como “coisa” ou “objeto” e, no pior cenário encontrado, nossa lei sempre a inferiorizou pelo simples fato de ser mulher.

Quando outros países já se encontravam muitos anos à frente do Brasil nas questões que envolvem a defesa da mulher, aqui a discussão se fortaleceu somente após a repercussão de casos de notoriedade nacional, entre eles o mais importante que envolveu a senhora Maria da Penha Maia Fernandes, vítima emblemática da violência doméstica, cuja luta originou a lei que leva seu nome. A lei veio trazer novas diretrizes com institutos e medidas protetivas importante às mulheres no âmbito doméstico (laços de convivência) e no âmbito familiar (laços de parentesco).

Com a criação da lei que qualificou o crime cometido contra a mulher por questão de gênero como feminicídio, avançou-se mais um passo na luta pela defesa de todas as mulheres, embora seu entendimento seja ainda subjetivo.

Um passo importante na conclusão do presente artigo foi sem dúvida a pesquisa realizada em campo. Ao visitarmos delegacias gerais e de defesa das mulheres em diversas cidades, pudemos constatar em primeiro plano o grande número de ocorrências oriundas de violência doméstica ainda diariamente. Embora tenhamos encontrado dificuldade em obter os números dos registros. Apenas a delegacia de defesa da mulher da cidade de Itapetininga nos apontou um número aproximado de ocorrências de forma genérica. Mas dados estatísticos que trouxemos a voga demonstra claramente essa triste constatação.

Em segundo plano tornou-se conhecido por nós a dificuldade encontrada na aplicação da lei, fato que foi nitidamente percebido ao nos depararmos com delegados que lamentam que o crime cometido contra a mulher ainda é difícil de ser combatido, seja pelo lapso temporal que a lei determina para que se aplique as medidas protetivas, pela assistência por parte do Estado ou município concedida às vítimas, ou ainda pela dificuldade da própria vítima em cortar os laços que a une ao agressor. Este último fato ficou demonstrado com clareza pelas psicólogas ás quais dirigimos nosso questionário a respeito da identificação da vítima.

A realidade que permeia hoje nossas delegacias ainda é a de falta de efetivo preparo dos agentes que no dia a dia de suas tarefas lidam com a problemática da violência doméstica. O primeiro ponto que observamos seria a necessidade de criação de um método que identificasse já no primeiro atendimento a ocorrência do crime de feminícidio, ou ainda a possibilidade de que ele venha a ocorrer. Ocorrendo essa identificação, ficaria mais fácil a exigência das medidas protetivas que propõe a lei, uma vez que não faltariam argumentos necessários. Aqui cumpre ressaltar que recentemente foi negado ao delegado a possibilidade de concessão de medidas protetivas de urgência a mulheres na iminência de sofrerem agressões, ainda que em caráter provisório. O delegado substituto da delegacia de defesa da mulher da cidade de Itapetininga apontou o lapso temporal de 24 a 48 horas entre o pedido e a concessão da medida protetiva pelo judiciário como crucial para a proteção da mulher, visto que muitos crimes ocorrem quando a mulher já fez a denuncia da agressão sofrida e, não encontrou eficiência na aplicabilidade da lei. Esse fato se torna ainda mais danoso quando a agressão ocorre aos finais de semana ou feriados, períodos que se encontram fechadas as delegacias de defesa da mulher e as denuncias são recebidas nas delegacias comuns. Nesse sentido se julga necessário a existência de um plantão policial para a mulher.

Outro fato importante seria a existência em todas as cidades de uma casa de acolhimento à vítima impedida de retornar ao seu lar na iminência de sofrer nova agressão, coisa que efetivamente não se cumpre nos municípios de nosso país. Algumas cidades possuem esse acolhimento, sobretudo as maiores como Sorocaba e Itapetininga. Em Tatuí não obtivemos essa informação e nas cidades menores elas não existem, o que implica em um importante fator de risco para todas as mulheres.

De igual importância seria o atendimento psicológico oferecido à vítima. Hoje, como informado, é dever dela buscar esse atendimento, que é oferecido na rede pública de saúde. Como é notório a todos, o acesso a esse atendimento nem sempre ocorre de maneira fácil e eficiente, por diversas vezes é um processo moroso, defeito do nosso sistema de saúde. Além disso, as vítimas nem sempre procuram por esse atendimento por não julgar necessário ou até mesmo por não encontrar forças para buscá-lo. Seria fundamental a existência de um encaminhamento direto por parte das delegacias de defesa da mulher a esse atendimento, bem como encontrar nesse atendimento, profissionais preparados para lidar com os casos de violência doméstica.

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Em nossa busca por informações nos deparamos com o fato de nenhuma delegacia possuir dados estáticos relativos os número de ocorrências do crime de feminícidio ou dos outros crimes previstos na lei Maria da Penha. Ao buscar essas informações no site da Secretaria de Segurança Pública o encontramos desatualizados. As informações estatísticas são dados relevantes no processo de evitar a ocorrência desses crimes. Ao analisar esses dados podemos observar onde sua ocorrência é maior, de que forma e maneira ele ocorre e a partir daí, criar métodos de apoio e proteção às mulheres.

Enfim, é perceptível que ainda existe um longo caminho para que seja eficaz a aplicação das leis que protegem o bem mais precioso de uma mulher, ou seja, a vida e sua dignidade. As diretrizes apontadas pela ONU dão ênfase ao dever do poder público de proteger e garantir a vida de todas as mulheres ao afirmar que o feminicídio é um crime evitável e que o Estado tem a responsabilidade de formular medidas de responsabilização, proteção e prevenção.

Assim, o ponto que salta aos nossos olhos é a falta de treinamento de todos os agentes nas propostas trazidas pelas leis. O preparo dos profissionais que trabalham nas delegacias é um ponto primordial na aplicabilidade da lei. O Estado deveria promover treinamento diferenciado a esse profissional baseado naquilo que é proposto pela lei. A necessidade de criação de lei específica para combater a violência doméstica evidenciou o quão grande é o número desses crimes. Se foi necessária a criação dessa lei, é imprescindível que exista treinamento que torne eficaz a sua aplicabilidade.

Tendo um efetivo devidamente preparado, as delegacias de defesa da mulher devem oferecer um plantão policial aos finais de semana e feriados, o que disponibilizaria um atendimento diferenciado às mulheres nesse período, fato que não ocorre nas delegacias comuns. O enquadramento na lei, a detecção do crime de forma objetiva ofereceria imediatamente a vítima a ajuda necessária naquele momento.

Por fim, o Estado deveria colocar à disposição de todas as delegacias, ferramentas eficientes para o registro dessas ocorrências. A sugestão seria a existência de um aplicativo que compilasse as informações necessárias para todas as delegacias, e que essas mesmas informações, fossem periodicamente enviadas á Secretaria de Segurança Pública Estadual, que os remeteria á União, criando assim números absolutos e efetivos desses crimes. Essa ferramenta faria com que fossem detectadas as carências que possuem hoje nossos municípios e a polícia de maneira geral, na aplicabilidade da lei e na prevenção da ocorrência de crimes relacionados à mulher.

Ao apresentar esse artigo á toda comunidade, esperamos suscitar nos municípios, nos estados e nos mais variados meios de convivência social, discussões acaloradas e, sobretudo, contribuições significativas que possam tornar eficaz a aplicação de nossas leis.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

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GOMES, LUIS FLÁVIO. Feminicídio: entenda as questões controvertidas da Lei 13.104/2015, 2014, em: <www.jusbrasil.com.br/artigos>

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PORTAL RAÍZES. Texto da especialista em Sexologia, Psicologia Clínica de adultos e Psicoterapia, Camila Rodríguez Fernández. Disponível em: <http://www.portalraizes.com/10-dicas-para-reconhecer-um-possivel-agressor-de-mulheres/.> Acessado em 07 de outubro de 2017.

PRADO, Débora e SANEMATSU, Marisa; Invisibilidade Mata: Fundação Rosa Luxemburgo, São Paulo: Instituto Patrícia Galvão, 2017.

SANTOS, Bárbara Ferreira. Os números da violência contra mulheres no Brasil. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/brasil/os-numeros-da-violencia-contra-mulheres-no-brasil/.> Acessado em 07 de outubro de 2017.

TELES, Maria A. de Almeida. MELO, Mônica. O que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense, 2002.

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Sobre os autores
Cesar Augustus Mazzoni

Advogado e parecerista (2002), pós graduado em direito empresarial (2013) e direito administrativo (2018). Professor no Curso de Direito da FAESB - Faculdade Santa Barbara de Tatuí. Professor no Curso de Direito da Faculdade de Cerquilho - FAC. Especializado em Direito Aeronáutico, Administrativo, Contratos e Empresarial.

Emanuel Santos Françani

Graduação em Faculdade de Direito pela Fundação Karnig Bazarian (2004). - Pós-Graduação &quot;Lato Sensu&quot; em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus (2014). Formação Profissional: - Ex- Investigador de Polícia - Polícia Civil de São Paulo (período de novembro/1997 a maio/2007). - Atualmente é Delegado de Polícia - Polícia Civil de São Paulo (desde maio/2007). - Professor na Faculdade de Ensino Superior Santa Barbara (FAESB) - Tatuí/SP

Vanúzia Almeida Rodrigues

graduação em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas - USP, graduação em Economia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Mestrado em Sociologia pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas - USP (2006) e Doutorado em Ciências Humanas pelo Programa de Pós-Graduação de História Social da FFLCH - USP (2017). Atua como professora de ensino superior da Rede Privada. A experiência profissional mais longa foi na Universidade Nove de Julho, onde atuou no ensino presencial e EAD, ministrando diversas disciplinas, entre as quais: Sociologia, C. Sociais, Ciência Política, Antropologia, Ética Profissional e Empresarial, Governança Corporativa e Empreendedorismo Social e Ambiental, Ética e Cidadania e Responsabilidade Social e Ambiental para os cursos de Administração, Direito, Economia, Ciências Contábeis, Recursos Humanos. Atualmente ministra aulas na Faculdade de Ensino Superior Santa Bárbara - FAESB.

LUÍS FERNANDO DE OLIVEIRA

aluno do 3º semestre da faculdade de direito da FAESB de Tatuí/SP.

MARIA CHRISTINA TRIELLI AVILA

aluna do 3º semestre da Faculdade de Direito da FAESB de Tatuí/SP.

TALITA SARTORI

então aluna do 2º semestre da Faculdade de Direito da FAESB de Tatuí/SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo científico desenvolvido pelos alunos do 2º semestre do curso de direito da Faculdade de Ensino Superior Santa Barbara de Tatuí - FAESB.

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