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Direitos autorais de execução pública de obras musicais:

o ECAD e o falastrão

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Ouvi, num programa de televisão dirigido pelo falastrão Raul Gil, um artista, por ignorância do assunto e monitorizado pelo apresentador a quem aludo, referir-se desairosamente às atividades desenvolvidas pelo ECAD.

Ouvi, num programa de televisão dirigido pelo falastrão Raul Gil, um artista, por ignorância do assunto e monitorizado pelo apresentador a quem aludo, referir-se desairosamente às atividades desenvolvidas pelo ECAD.

Raul Gil faltou com o dever profissional de bem informar ao seu público ouvinte, dizendo-lhe porque o ECAD enfrenta tantas dificuldades no desempenho de suas funções legalmente previstas na Lei nº 9610/98, que é de arrecadar e distribuir direitos autorais decorrentes da execução pública de obras musicais. Ao contrário de querer enlamear gratuitamente o nome de uma associação que luta contra imensuráveis adversidades, de Norte a Sul do país, para cumprir sua árdua missão, cabia-lhe, se honestamente agisse, esclarecer ao público as razões das dificuldades que o escritório enfrenta. Aí teria que, por honestidade, citar publicamente os nomes dos grandes caloteiros dos direitos autorais. Se isso tivesse ocorrido, estaria prestando um relevante serviço à causa dos compositores brasileiros. Todavia a sua conduta censurável contribuiu para desinformar ainda mais os telespectadores sobre esse trabalho ingente e inglório que realiza o ECAD.

Infelizmente, na selva densa dos grandes usuários, o ECAD é um arbusto que penosamente disputa seu espaço para representar com dignidade os compositores brasileiros e estrangeiros, procurando, pelos meios disponíveis ao seu alcance, receber o que legalmente lhes pertence. Contudo está sozinho nessa peleja, pois falta aos compositores e demais titulares de direito de autor a necessária conscientização de que devem participar também ativamente do processo de arrecadação, exigindo que os usuários cumpram a sua obrigação de pagar os direitos autorais quando contratam os artistas para realização de espetáculos musicais ou quando utilizam em suas atividades econômicas a música através de aparelhos mecânicos.

Se o público tivesse livre acesso à relação de nomes dos inadimplentes, ficaria estarrecido de saber que figuram na cabeça da lista dos devedores de direitos autorais importantes redes nacionais de televisão, entre as quais se inclui aquela onde trabalha Raul Gil. Seguem-nas centenas de emissoras de rádios, operando nos mais distantes rincões do país, muitas pertencentes a legisladores pátrios que solenemente votaram a lei de direitos autorais. Existem na listagem, também, nomes de grandes promotores de eventos, principalmente sediados nos grandes centros urbanos, que estão em atraso com o pagamento das verbas relativas a direitos autorais. Fazem parte desse rol, ainda, por exemplo, grandes hotéis, casas de repasto e de diversão, cinemas, lojas comerciais, etc. Se esses maus pagadores quitassem seus compromissos com o ECAD, melhor dizendo, com os compositores e demais titulares de direito de autor, por certo as contas bancárias destes engordariam sensivelmente.


A acusação de que o ECAD cobra mal dos usuários não procede. Hoje, a associação está informatizada, com um quadro de pessoal regularmente treinado, contando, ainda, para atuar nas cidades interioranas, com a colaboração de uma extensa rede de agentes autônomos. No entanto, alguns daqueles a quem realmente essa associação pertence, ao invés de auxiliarem-na a executar o seu papel com mais eficácia e eficiência, atrapalham quando, por ignorância, denigrem a sua imagem. Muitos outros, completamente desinformados sobre o real alcance da lei de regência dos direitos autorais, reclamam do ECAD, sem nenhuma razão, direitos que não têm.

          ECAD cobra de todos os usuários, segundo as normas do seu Regulamento de Arrecadação, instrumento de trabalho votado pelas associações de compositores e demais titulares de direito de autor, ou, noutras palavras, aprovado com a aquiescência destes. Quando o usuário não paga, o ECAD recorre à justiça para salvaguardar esses direitos autorais, mas a lentidão do sistema processual brasileiro e o abuso dos recursos interpostos pelos devedores que litigam de má-fé protraem a solução dos processos indefinidamente em prejuízo dos lídimos interesses dos compositores e dos demais titulares de direito de autor. O recurso à via judicial, por ser oneroso, não pode ser generalizado, por isso, acertadamente, a fim de impedir evasão de recursos da associação e dos beneficiários dos direitos autorais, os administradores atuais do ECAD se preocupam, hoje, com o problema do custo/benefício dessas cobranças judiciais, evitando o desperdício e a aventura de ajuizar dívidas de pequenos valores cujos responsáveis não possuem situação econômico-financeira que os capacite a assegurar o sucesso de uma demanda judicial.


A crítica que se faz ao sistema de distribuição é injusta. Primeiramente, o ECAD só distribui o que arrecada, porque é inconcebível que proceda de outra forma. Não pode distribuir antecipadamente as dívidas impagas de responsabilidade de milhares de usuários localizados em todos os Estados da Federação, pois não possui reservas de caixa suficientes para o fazer e, mesmo que as tivesse, este seria um ato de administração temerário e por isso merecedor de censura.

O sistema de distribuição pode conter falhas e é até compreensível que as tenha. É eficiente, sem dúvida, na parte relativa a espetáculos musicais, porque o roteiro das músicas executadas, obrigatoriamente entregue pelo promotor de eventos ao ECAD (art. 68, § 6º, da Lei nº 9610/98), favorece a distribuição direta dos valores arrecadados aos seus legítimos donos. Porém a distribuição indireta, que usa o critério de amostragem, não se nivela com a distribuição direta, mas não se pode imputar ao ECAD a culpa por tal fato. Sabemos que são milhares os usuários de músicas espalhados por todas as cidades brasileiras, operando nos pequenos, médios e grandes centros urbanos e explorando diferentes atividades econômicas. Em conseqüência, mensalmente são milhões de execuções musicais realizadas em todo o Brasil. Assim, torna-se humanamente impossível incluir todas essas execuções musicais no benefício da divisão dos valores arrecadados. A solução é considerar uma amostragem mensal de cerca de trezentas mil audições. Esse critério pode ser injusto para com alguns compositores cujas músicas são executadas de preferência na sua região de origem, por não terem ainda conquistado sucesso reconhecido em todo o país, mas é o meio que vem operando no momento e dando resultados. Suponho que a cúpula do ECAD, de cuja capacidade e abnegação sou testemunha, esteja aberta para receber sugestões tendentes ao aperfeiçoamento desse sistema. Sugiro, pois, a Raul Gil visitar a sede do ECAD no Rio de Janeiro para conhecer a filosofia de trabalho que hoje impulsiona essa associação e, conhecendo-a melhor, assumir a hombridade de retratar-se diante de seu público ouvinte, apresentando-lhe sinceras desculpas por ter faltado com o seu dever profissional de bem informar.

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Sobre o autor
Eduardo José Pereira de Matos

acadêmico de Direito da UNIFOR, bancário aposentado, ex-chefe da sucursal do ECAD em Fortaleza (CE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATOS, Eduardo José Pereira. Direitos autorais de execução pública de obras musicais:: o ECAD e o falastrão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 34, 1 ago. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/685. Acesso em: 22 nov. 2024.

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