Capa da publicação Inovações dos crimes sexuais no enfrentamento à criminalidade (Lei n. 13.718/2018)
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As inovações legislativas aos crimes sexuais no enfrentamento à criminalidade: comentários à Lei n. 13.718/2018

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AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDIDADE SEXUAL

Art. 225. Nos crimes definidos nos capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada.

Parágrafo único. (revogado).

Introdução: Ao longo dos dez últimos anos o legislador vem modificando os crimes contra a Dignidade Sexual, e em relação à ação penal não foi diferente. Recorde-se que o crime de estupro antes do advento da Lei nº. 12.015/2009 era apurado mediante ação penal privada, ou seja, apenas procediam mediante queixa, com as exceções dispostas nos §§ 1º e 2º da antiga redação do art. 225 do CP, na Súmula 608 do STF, que previa a hipótese de ação penal pública incondicionada para os casos em que houvesse o emprego de violência real, bem como nos casos em que houvesse lesão corporal grave ou morte (art. 223). Com o advento da Lei nº. 12.015/2009 os crimes definidos no nos Capítulos I e II, passaram a se proceder mediante ação penal pública condicionada à representação, regra esta, excepcionada pelo parágrafo único do mesmo dispositivo, onde nos casos de vítima menor de 18 anos ou pessoa vulnerável a ação penal será pública incondicionada.

Com o advento da Lei nº. 13.718/2018, o legislador mais uma vez mudou por completo as disposições acerca da ação penal nos crimes inseridos no capítulo I e II do Título VI, desta vez foi categórico em afirmar que “nos crimes definidos nos capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada”.

Dito isto, vejamos os delitos previstos nos capítulos I e II do Título VI e suas respectivas ações penais, antes e após o advento da Lei nº. 13.718/2018:

Título VI – Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual

Antes da Lei nº. 13.718

Após a Lei nº. 13.718

Capítulo I – Dos Crimes Contra a Liberdade Individual

Capítulo I – Dos Crimes Contra a Liberdade Individual

Estupro (art. 213)

Violação Sexual Mediante Fraude (art. 215)

Assédio Sexual (art. 216)

Estupro (art. 213)

Violação Sexual Mediante Fraude (art. 215)

Importunação Sexual (art. 215-A)

Assédio Sexual (art. 216)

Capítulo II – Dos Crimes Sexuais Contra Vulnerável

Capítulo II – Dos Crimes Sexuais Contra Vulnerável

Estupro de vulnerável (217-A)

Corrupção de menores (art. 218)

Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente  (art. 218-A);

Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B)

Estupro de vulnerável (217-A)

Corrupção de menores (art. 218)

Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente  (art. 218-A);

Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B)

Divulgação de cena de estupro e estupro de vulnerável, e de sexo ou pornografia (art. 218-C)

As incongruências bizarras do legislador no revogado art. 225 do Código Penal: o que podia haver de tosco no Código Penal, encontrava-se, em seu inteiro teor, no art. 225 do CP (revogado pela Lei nº. 13.718/2018), vejamos:

Art. 225.  Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único.  Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.       

Em resumo, o legislador deixou claro que nos crimes do Capítulo I, abaixo demonstrados, a ação penal seria pública condicionada à representação, vejamos:

  1. Estupro (art. 213, caput, CP);
  2. Estupro qualificado pela lesão corporal grave (art. 213, §1º, primeira parte, CP);
  3. Estupro qualificado pela morte (art. 213, §2º, CP);
  4. Violação sexual mediante fraude (art. 215, CP);
  5. Assédio Sexual (art. 216-A, CP).

Atente-se que o legislador afirmou também no caput do art. 255, CP, que os crimes previstos no  Capítulo II - Dos crimes sexuais contra Vulnerável -, seriam de ação penal pública condicionada à representação. Portanto, totalmente desnecessária tal menção, vez que o parágrafo único, abaixo analisado, já previa que todos os crimes sexuais contra pessoa menor de 18 anos ou vulnerável seriam de ação penal pública incondicionada.

 No revogado paragrafo único, do art. 225 do CP, o legislador excepcionou a regra do caput, logo se se tratasse de vítima menor de 18 anos ou pessoa vulnerável ação penal seria pública incondicionada. Como temos afirmado ao longo do nosso artigo a falta de tecnicismo do legislador beira o absurdo, o que agrava mais ainda a situação é o fato de os dispositivos antes de entrarem no ordenamento jurídico, deveriam ser debatidos em comissões temáticas, para, enfim, serem levados a sanção.

O equívoco da redação do antigo art. 225, caput do Código Penal: Conforme visto acima, com o advento da Lei nº. 12.015/2009 o legislador asseverou que “nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação”. Acontece, todavia, que o próprio parágrafo único afirma que “procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável”. Ora, o Capítulo II trata justamente dos crimes praticados contra vulnerável. Logo era impossível ter algum delito apurado mediante ação penal pública condicionada à representação. Portanto, errou o legislador na redação do antigo art. 225, caput.

A questão do estupro qualificado pela lesão corporal grave e qualificado pela morte: conforme aduzido acima, o estupro qualificado pela lesão corporal grave e morte, de acordo com a regra estabelecida pelo legislador no revogado caput do art. 255, do Código Penal, seria de ação penal pública condicionada à representação. Diante de tamanha aberração legislativa, o Procurador Geral da República ajuizou ADIN (nº. 4301, ano de 2009), com o objetivo de que fosse concedida a liminar para suspender a vigência do dispositivo, até que o STF julgasse em definitivo a questão, derrubando a parte da cabeça do artigo 225 do Código Penal, e restaurando, para os crimes de estupro com lesão grave ou morte, a regra geral que possibilitasse a ação penal pública incondicionada.

Na doutrina, alguns autores, se posicionavam contra a aplicação da Súmula 608 do STF[9], como era o caso de Guilherme de Souza Nucci, Cleber Masson, Luiz Flávio Gomes etc. entre os argumentos estavam a regra especial expressa no art. 225, caput, CP, bem como por se tratar de norma posterior.  Luiz Flávio Gomes, dissertado sobre o assunto aduzia que: “a ação penal no crime de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave, em síntese, é pública condicionada. Impossível aplicar o art. 101 do CP, por duas razões: 1ª) a norma do art. 225 do CP é especial (perante o art. 101, que é geral); 2ª) a norma do art. 225 é posterior (o que afasta a regra anterior)”[10]. Ainda sobre o assunto, entendendo pela total inaplicabilidade da Súmula 608 do STF, Cleber Masson (2016, p. 1007) disparava: “como foi editada à época em que o estupro era crime de ação penal privada, está súmula perdeu seu fundamento de validade. Sua redação é manifestamente contrária ao art. 225, caput, do CP. Atualmente, a lei impõe expressamente a ação penal pública condicionada à representação”.

Em entendimento contrário, diga-se, pela manutenção da aplicação da Súmula 608 do STF, Rogério Greco e Cezar Roberto Bitencourt. Dissertando sobre o assunto, Bitencourt apontava que: “Estamos convencidos, venia concessa, que essa não é a melhor interpretação, a despeito de representar o entendimento de corrente significativa da doutrina. Na nossa ótica, a previsão contida no art. 225 e seu parágrafo único não é norma especial, mas geral que complementa a outra, igualmente geral, segundo a qual todos os crimes são de ação pública (art. 100), salvo se houver previsão legal expressa em sentido contrário. Pois essa previsão expressa (que condiciona à manifestação da vítima), repetindo, ao contrário do entendimento de parte da doutrina, também é norma geral que completa a anterior”[11].

Por fim, sobre o assunto, tanto o STJ quanto o STF decidiram pela continuidade da aplicação da Súmula 608 do STF, isto é, em casos de violência real a ação penal no crime de estupro permaneceria pública incondicionada. Neste sentido o HC 125360, STF:

HC 125360 / RJ - RIO DE JANEIRO . HABEAS CORPUS. Julgamento:  27/02/2018. Órgão Julgador:  Primeira Turma. Ementa: HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. ALEGADA NECESSIDADE DE OITIVA DE NOVAS TESTEMUNHAS. INDEFERIMENTO JUSTIFICADO. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA. CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. VIOLÊNCIA REAL CARACTERIZADA. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA MESMO APÓS A LEI 12.015/2009. HIGIDEZ DA SÚMULA 608 DO STF. 1. Nos termos do art. 400, § 1º, do Código de Processo Penal, cabe ao Juízo processante indeferir as diligências consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Assentado pelas instâncias antecedentes que as justificativas apresentadas para o indeferimento da solicitada oitiva de novas testemunhas se mostram idôneas, a análise da alegação de cerceamento de defesa, de modo a avaliar a imprescindibilidade das diligências requeridas, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, que é próprio do Juiz da instrução, além de ser providência incompatível com esta via processual. Precedentes. 2. A ação penal nos crimes contra a liberdade sexual praticados mediante violência real, antes ou depois do advento da Lei 12.015/2009, tem natureza pública incondicionada. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, diante da constatação de que os delitos de estupro, em parcela significativa, são cometidos mediante violência, e procurando amparar, mais ainda, a honra das vítimas desses crimes, aderiu à posição de crime de ação pública incondicionada, que veio a ser cristalizada na Súmula 608, em pleno vigor. 3. Para fins de caracterização de violência real em crimes de estupro, é dispensável a ocorrência de lesões corporais (HC 81.848, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, DJ de 28/6/2002, e HC 102.683, Relatora Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, DJe de 7/2/2011). Pormenorizada na sentença condenatória a caracterização da violência real – física e psicológica – a que foi submetida a vítima, é inviável, no instrumento processual eleito, alterar a conclusão firmada acerca dos fatos e provas. 4. Ordem denegada.

O que vem a ser violência real para fins de aplicação da súmula 608 do STF? Em certa feita no julgamento do HC nº. 81848/STF, o Ministro Maurício Correa, de forma primordial asseverou o que seria o conceito de violência real para fins de aplicação da súmula 608 do STF: “Caracteriza-se a violência real não apenas nas situações em que se verificam lesões corporais, mas sempre que é empregada força física contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de agir, segundo a sua vontade. 2. Demonstrado o uso de força física para contrapor-se à resistência da vítima, resta evidenciado o emprego de violência real. Hipótese de ação pública incondicionada. Súmula 608-STF. Atuação legítima do Parquet na condição de dominus litis. (...) não há dúvida de que o autor da agressão empregou violência real, já que esta não se opera apenas quando dela resultam lesões corporais, mesmo que leves, mas também diante da ocorrência de simples coação física consumada, sobretudo se, examinada nas circunstâncias presentes, a vítima fora submetida a vexame e constrangimento públicos. Nas palavras sempre bem-vindas de Júlio Fabbrini Mirabete, "violência é o emprego de força física contra a vítima, causando-lhe ou não lesões corporais". Como ensina Nelson Hungria, "o termo violência é usado no artigo 213 no sentido restrito de emprego de força material. É o meio aplicado sobre a pessoa da vítima para cercear sua liberdade externa ou sua faculdade de agir ou não agir segundo a própria vontade. É a violência que o direito romano chamava de vis corporalis (vis corpori illata, vis absoluta), para distingui-la da exercida mediante intimidação...". (...) Não é a consequência que caracteriza a violência real, mas o emprego de força física para contrapor-se à resistência. (...) Irrelevante, dessa forma, a circunstância de não haverem provas de que do ato resultaram lesões corporais, ao que tudo indica, efetivamente não ocorrentes. A incontroversa coação física consumada, mesmo sem consequências à saúde da ofendida, tipifica violência real, permitindo, assim a, legítima atuação do Parquet como dominus litis, nos termos da Súmula 608 deste Tribunal”. (No mesmo sentido: RHC 117978/SP - SÃO PAULO. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUSRelator(a):  Min. DIAS TOFFOLI. Julgamento:  05/06/2018. Órgão Julgador:  Segunda Turma).

O equívoco do legislador em prever que os crimes são de ação penal pública incondicionada: sabe-se que no silêncio do legislador os delitos são de ação penal pública incondicionada, salvo disposição expressa em contrário. Assim, a título de exemplo, todos os crimes contra o patrimônio são de ação penal pública incondicionada (regra), não precisando o legislador afirmar que o delito de furto, roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro são apurados mediante ação penal pública incondicionada. Quando se pretende excepcionar determinado delito, por técnica legislativa e coerência sistemática, excepciona o dispositivo desejado, como ocorre com os delitos do art. 156 (furto de coisa comum), art. 176 (outras fraudes), art. 179 (fraude à execução). Portanto, no silêncio: ação penal pública incondicionada, não necessitando expressa previsão legal para afirmar que os delitos são de ação penal pública incondicionada[12].

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A questão da vulnerabilidade momentânea e o tipo de ação penal: Imagine a seguinte situação, onde uma vítima não vulnerável, é abordada abruptamente pelas costas, por um estuprador que lhe dá um estrangulamento, vindo desacordar a mesma. Daí então, com a vítima já desacordada, vem a estuprá-la. Indaga-se: nesta situação haveria o crime de estupro, portanto, procedido mediante ação penal pública condicionada ou; haveria o crime de estupro de vulnerável, procedido mediante ação penal pública incondicionada?! Para a sexta turma do STJ haveria o crime de estupro, procedido com ação penal pública condicionada a representação; enquanto para a quinta turma do STJ haveria o crime de estupro de vulnerável, procedido mediante ação penal pública incondicionada. Vejamos abaixo o entendimento esboçado por cada uma das turmas:

“Informativo nº 0553: Período: 11 de fevereiro de 2015. SEXTA TURMA: DIREITO PROCESSUAL PENAL. NATUREZA DA AÇÃO PENAL EM CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. Procede-se mediante ação penal condicionada à representação no crime de estupro praticado contra vítima que, por estar desacordada em razão de ter sido anteriormente agredida, era incapaz de oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos. De fato, segundo o art. 225 do CP, o crime de estupro, em qualquer de suas formas, é, em regra, de ação penal pública condicionada à representação, sendo, apenas em duas hipóteses, de ação penal pública incondicionada, quais sejam, vítima menor de 18 anos ou pessoa vulnerável. A própria doutrina reconhece a existência de certa confusão na previsão contida no art. 225, caput e parágrafo único, do CP, o qual, ao mesmo tempo em que prevê ser a ação penal pública condicionada à representação a regra tanto para os crimes contra a liberdade sexual quanto para os crimes sexuais contra vulnerável, parece dispor que a ação penal do crime de estupro de vulnerável é sempre incondicionada. A interpretação que deve ser dada ao referido dispositivo legal é a de que, em relação à vítima possuidora de incapacidade permanente de oferecer resistência à prática dos atos libidinosos, a ação penal seria sempre incondicionada. Mas, em se tratando de pessoa incapaz de oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos - não sendo considerada pessoa vulnerável -, a ação penal permanece condicionada à representação da vítima, da qual não pode ser retirada a escolha de evitar o strepitus judicii. Com este entendimento, afasta-se a interpretação no sentido de que qualquer crime de estupro de vulnerável seria de ação penal pública incondicionada, preservando-se o sentido da redação do caput do art. 225 do CP. HC 276.510-RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/11/2014, DJe 1º/12/2014”.

“HC 389610 / SP. QUINTA TURMA: Data do julgamento: 08/08/2017. EMENTA: PENAL  E  PROCESSO  PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA  DE JUSTA CAUSA. CRIMES CONTRA DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL.  VÍTIMA  INCAPAZ  DE  OFERECER  RESISTÊNCIA.  DORMIA  NO MOMENTO  DOS FATOS. CRIME DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. ART. 225,  PARÁGRAFO  ÚNICO,  DO  CP.  HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I – A Terceira  Seção  desta  Corte,  seguindo  entendimento  firmado pela Primeira  Turma  do  col.  Pretório  Excelso,  firmou  orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao  recurso  adequado,  situação  que  implica o não conhecimento da impetração,  ressalvados  casos  excepcionais  em  que,  configurada flagrante  ilegalidade  apta  a  gerar  constrangimento ilegal, seja recomendável a concessão da ordem de ofício. II  -  O  trancamento  da  ação  penal constitui medida excepcional, justificada  apenas quando comprovadas, de plano, sem necessidade de análise  aprofundada  de fatos e provas, a atipicidade da conduta, a presença  de  causa  de  extinção  de punibilidade, ou a ausência de indícios  mínimos de autoria ou de prova de materialidade, o que não ocorre na espécie. III  -  Em  casos  de  vulnerabilidade  da  ofendida, a ação penal é pública incondicionada, nos moldes do parágrafo único do art. 225 do Código  Penal.  Constata-se  que  o referido artigo não fez qualquer distinção  entre  a  vulnerabilidade  temporária ou permanente, haja vista  que  a  condição  de  vulnerável  é  aferível  no  momento do cometimento  do  crime,  ocasião  em  que  há  a  prática  dos  atos executórios com vistas à consumação do delito. IV - As reformas trazidas pela Lei nº 12.015/09 demonstram uma maior preocupação  do legislador em proteger os vulneráveis, tanto é que o estupro  cometido em detrimento destes (art. 217-A do CP) possui, no preceito secundário, um quantum muito superior ao tipo penal do art. 213  do  CP.  E  o  parágrafo  único do art. 225 do CP corrobora tal entendimento,  uma vez que atesta um interesse público na persecução penal   quando  o  crime  é  cometido  em  prejuízo  de  uma  vítima vulnerável. (...)”

Questão sobre a tentativa de estupro e superveniência de resultado agravador: Temos complexidade em alguns aprofundamentos, pois é possível que um estupro não se consume por circunstâncias alheias à vontade do agente, consistente como, por exemplo, quando a vítima obtém êxito em sair das garras do seu estuprador e, ao fugir, sofre lesão corporal de natureza grave ou vem a falecer. Qual solução jurídica para o caso de estupro tentado e superveniência de resultado agravador (lesão grave ou morte)?

Comungamos do posicionamento de que o agente responde pelo crime de estupro qualificado pela lesão corporal de natureza grave ou pela morte (art. 213, §§ 1º ou 2º, CP), a depender do  caso concreto: (1) as qualificadoras são exclusivamente preterdolosas, logo, são incompatíveis com a figura do crime tentado;

Estupro e ação penal privada subsidiária da pública (art. 5º, LIX, da Constituição Federal): não se pode olvidar do mandamento Constitucional petrificado no inciso LIX do art. 5º da CF: “ LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal”. No mesmo sentido o teor do §3º do art. 100 do Código Penal: “§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal”.

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Sobre os autores
Joaquim Júnior Leitão

Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso. Atualmente lotado no Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO). Graduado pela Centro de Ensino Superior de Jataí-GO (CESUT). Ex-Diretor Adjunto da Academia da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso. Ex-Assessor Institucional da Polícia Civil de Mato Grosso. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colaborador do site jurídico Justiça e Polícia.

Marcel Gomes de Oliveira

Delegado de Polícia no Estado do Mato Grosso, atualmente lotado na Coordenadoria de Plantão Metropolitano. Formado pelo Centro Universitário Jorge Amado - UNIJORGE. Foi Advogado e consultor jurídico. Especialista em Direito do Estado. Especialista em Metodologia do Ensino Superior. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal e Direito Processual Penal. Foi professor de Criminologia, Ética, Direitos Humanos e Cidadania do Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Estado da Bahia. Atuou também como professor de Direito Penal, Legislação Penal Especial e Medicina Legal das Faculdades 2 de Julho. E, como professor de Direito Penal e Direito Processual Penal do Centro Universitário da Bahia (Estácio de Sá). Atualmente é professor de cursos preparatórios para concursos públicos e professor da Academia de Polícia Judiciária Civil do Estado do Mato Grosso - ACADEPOL/MT.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JÚNIOR LEITÃO, Joaquim ; OLIVEIRA, Marcel Gomes. As inovações legislativas aos crimes sexuais no enfrentamento à criminalidade: comentários à Lei n. 13.718/2018. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5579, 10 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69534. Acesso em: 25 abr. 2024.

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