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Apropriação indébita do ICMS

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15/12/2018 às 15:00
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CONCLUSÃO

A partir da análise da dogmática penal evidencia-se que a única interpretação possível ao tipo penal descrito no artigo 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 é a emanada pelo Superior Tribunal de Justiça no HC n. 399.109-SC. Não há possível interpretação deste tipo penal que permita a diferenciação entre a retenção de valores de ICMS “próprio” cobrado do adquirente, quanto do ICMS decorrente da substituição tributária, na medida em que a sujeição passiva do imposto não é premissa do núcleo típico “valor de tributo cobrado”.

De fato, a finalidade desse dispositivo legal foi proteger a ordem tributária em sua acepção social, como instrumento capaz de garantir a dignidade da pessoa humana, através da prestação de serviços públicos ao cidadão, garantindo a entrega de valores que são cobrados pelo contribuinte de terceiros por meio da tributação indireta.

Para além disso, essa especial proteção visa preservar a ordem econômica, evitando o ilícito planejamento tributário voltado a apropriação do ICMS, e a utilização dessa lesiva conduta como meio de prática de concorrência desleal, em total prejuízo aos princípios da livre iniciativa e da isonomia tributária entre contribuintes.


REFERÊNCIAS

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______. Lei Complementar n. 87 de 13 de setembro de 1996. Dispõe sobre o imposto do Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras providências. (LEI KANDIR). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm>. Acesso em julho/2016.

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Notas

[1] Original publicado no sítio de internet https://jus.com.br/artigos/51018/o-icms-e-o-delito-previsto-no-artigo-2-ii-da-lei-n-8-137-1990, e versão condensada publicada no periódico da Revista do Ministério Público do Estado de Goiás, n. 32 (disponível eletronicamente em http://www.mpgo.mp.br/portal/arquivos/2017/03/23/14_26_07_177_Revista32_final.pdf).

[2] Parametriza-se, aqui, para fins apenas de facilitação e exposição do conteúdo, a expressão “saída de mercadorias”, não obstante o imposto seja amplo e incida sobre a circulação de mercadorias, nela incluída a importação, serviços de telecomunicação, transporte intermunicipal e interestadual, etc.

[3] Art. 36 da Lei n. 10.297/1996, e RICMS/SC, Anexo 5, art. 168, §1º:

§ 1° A DIME com as informações previstas no inciso I do “caput” será encaminhada até o 10° (décimo) dia seguinte ao do encerramento do período de apuração do imposto.

[4] HC n. 399.109-SC, Declaração de voto da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, disponível em https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=75646224&num_registro=201701067980&data=20180831&tipo=4&formato=PDF, p. 2.

[5] Vide matérias publicados por André Eduardo Campos (in https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI286617,21048-STJ+define+que+ICMS+declarado+e+inadimplido+configura+o+crime), Mauricio Stegemann Diete (in http://www.fenafisco.org.br/noticias-fenafisco/item/3276-opiniao-stj-cria-a-extorsao-do-icms-ao-criminalizar-nao-pagamento-do-imposto), Karen Ângela Deodato (in http://www.andradesilva.com.br/stj-recolhimento-icms/), Eduardo Reale, Marcelo Vieira e Rômulo Garzillo (in https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/stj-e-ativismo-judicial/), Pedro Simões e Roberto Junqueira de Souza Ribeiro (in https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/deixar-de-recolher-icms-declarado-nao-e-crime/), Jaime Rodrigues de Almeida Neto (in https://www.jornalcruzeiro.com.br/opiniao/artigos/apropriacao-indebita-tributaria/), Marcelo Knopfelmacher (in https://www.conjur.com.br/2018-set-26/criminalizar-nao-pagamento-tributos-gera-inseguranca-advogado), Ricardo Lodi Ribeiro (in https://www.conjur.com.br/2018-set-25/ricardo-lodi-criminalizando-devo-nao-nego-pago-quando-puder) e Tathiane Piscitelli, David Tangerino e Daniel de Paiva Gomes (in  https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/e-mesmo-crime-destacar-icms-e-nao-pagar-19092018).

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[6] Crimes de atentado, de acordo com a doutrina clássica, são aqueles delitos para os quais a lei preveja pena expressa para ocorrência da tentativa de determinado delito, fugindo da regra geral prevista no artigo 14, parágrafo único, do Código Penal).

[7] HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Lingua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 1920

[8] BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi.. 13ªa. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2015, pp. 526-527.

[9] Cf. http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/taxation/consumption-tax-trends-2014_ctt-2014-en#page17, acesso em 11 de julho de 2016.

[10] Disponível em http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/taxation/consumption-tax-trends-2014_ctt-2014-en#page17, acesso em 11 de julho de 2016.

Tradução do autor:

Os impostos sobre o consumo como o IVA (ICMS), impostos sobre vendas e impostos sobre bens e serviços específicos são frequentemente classificados como impostos indiretos, pois não são incidentes diretamente sobre a pessoa que suporta a carga do imposto. Eles não são impostos sobre o rendimento ou riqueza, mas sim sobre as despesas. Os governos recolhem geralmente o imposto dos produtores e distribuidores da cadeia produtiva, enquanto a carga do imposto é, em princípio, dos consumidores, uma vez que lhes serão repassados os custos nos preços praticados pelos fornecedores.

[11] NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal: parte geral. V.1. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 9 e 3-4.

[12] MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato N.. Manual de Direito Penal: parte geral. 33 ed. rev. atual. São Paulo: Atlas, 2018, p. 3.

[13] Cf. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.  24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 39 – 41.

[14] Cf. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I. 19ª ed. rev. amp. e atual. até 1º de janeiro de 2017. Niterói: Impetus, 2017, p. 2.

[15] EISELE, Andreas. Direito Penal: Teoria do Delito. Salvador: JusPodivm, 2018  p.38.

[16] FRANZONI GIL, Giovanni Andrei. O ICMS e o delito previsto no artigo 2º, II, da Lei n. 8.137/1990. Disponível em https://jus.com.br/artigos/51018/o-icms-e-o-delito-previsto-no-artigo-2-ii-da-lei-n-8-137-1990, último acesso em 24 de outubro de 2018.

[17] EXTRADIÇÃO. PEDIDO DE EXTENSÃO. CRIMES DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL E DE ABUSO DE CONFIANÇA CONTRA A SEGURANÇA SOCIAL. CONCORDÂNCIA PELO DEMANDADO. CONTROLE DA LEGALIDADE PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DUPLA INCRIMINAÇÃO. AUSÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. 1. O Supremo Tribunal Federal admite a apresentação de pedidos de extensão em extradições, condicionando o seu deferimento ao devido processo legal. 2. Concordância expressa do demandado, assistido por defensor, no País Requerente com o pedido de extensão da extradição que tornam desnecessária nova citação e interrogatório relativamente ao pedido de extensão, remanescendo ao Supremo Tribunal Federal o controle da legalidade. 3. Crimes de abuso de confiança fiscal e de abuso de confiança contra a Segurança Social, previstos nos artigos 105, nº 1, e artigo 107, nº 1, da Lei Portuguesa nº 15/2001, que correspondem, respectivamente, aos crimes do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990, e do art. 168-A do Código Penal, da legislação brasileira. 4. Prescrição inocorrente pela legislação portuguesa ou brasileira. 5. Pedido de extensão deferido. (Extensão de Extradição n. 1.139, República Portuguesa, julgado em 18 de dezembro de 2012, Primeira Turma do STF, Relatora Ministra Rosa Weber).

[18] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais . 2ª edição, São Paulo: Malheiros, 2012, p. 90.

[19] cita-se: ARE 1005093/SC, Relator Ministro Alexandre de Moraes, julgado em 12/12/2017; ARE 1062394/SC, Relator Ministro Roberto Barroso, julgado em 07/08/17; e, mais recentemente, em colegiado, o AG.REG. no RE com Agravo n. 1.109.519-SC, da 2ª Turma, Relator o Ministro Celso de Mello, julgado em 29/06/2018.

[20] artigo 12, §4º do Decreto-lei n. 1.598/77.

[21] Ora, se o tributo integra o custo e é cobrado no preço, é receita. Se deixa de ser receita, não integrando o patrimônio da atividade, como no caso dos tributos incidentes sobre o consumo, é justamente pela peculiaridade da detenção, posse transitória para entrega a outrem. Nesse sentido, vale destacar o posicionamento do STF no RE n. 574.706/PR, ao afastar a possibilidade de que o ICMS possa integrar a base de cálculo da COFINS e do PIS.

[22] 29 Opinião publicada no periódico Folha de São Paulo, disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2016/07/1793048-combater-o-devedor-contumaz-e-fundamental-em-tempos-de-crise.shtml, acesso em 25 de outubro de 2018.

[23] STJ, Tema 157 de Repercussão Geral: “Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20 mil a teor do disposto no artigo 20 da Lei 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda”. Este mesmo valor é o vigente em Santa Catarina, para os tributos estaduais, por força do art. 16 da Lei Estadual nº 15.856, de 2012.

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Sobre o autor
Giovanni Andrei Franzoni Gil

Advogado entre 2001 e 2003, Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado de Santa Catarina desde 2003, Coordenador do Centro de Apoio Operacional da Ordem Tributária desde abril de 2015

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GIL, Giovanni Andrei Franzoni. Apropriação indébita do ICMS. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5645, 15 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70822. Acesso em: 26 abr. 2024.

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