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A Comissão de Juristas e os primeiros projetos de Supremo Tribunal Federal

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10/01/2020 às 17:10
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Conclusão

Os trabalhos da comissão mostram o ingresso do Direito Constitucional dos Estados Unidos com intensidade na tradição brasileira e também ajudam a mostrar o pensamento dos proprietários rurais que, após os dois presidentes militares, dominariam a política brasileira por décadas. A escolha dos membros da comissão, não matizada por tantas vertentes de pensamento político, ajudou na formação de projetos com soluções diferentes, mas homogêneos em aspectos centrais, como a efetiva elevação da suprema corte ao nível dos demais poderes, a implantação do controle de constitucionalidade, o aparecimento do habeas corpus como matéria constitucional – todas opções que afinal seriam confirmadas pela assembleia.

As disposições transitórias elaboradas no projeto final, sobre a continuidade de juízes da suprema corte imperial, iriam ser modificadas em alguns aspectos, mas se mantiveram na Constituição. Essas normas confirmam que os membros da cúpula do judiciário imperial tinham aquiescência dos proprietários rurais, um dado relevante para afirmar que o Judiciário, de maneira geral, aderiu ao movimento republicano.

Os projetos mostram algo também sobre o papel de Rui Barbosa na introdução do controle de constitucionalidade no Brasil. O papel do constitucionalista seria importante, tanto no pensamento dos juristas brasileiros, quanto na revisão desse projeto da comissão, reforçando a ligação com a tradição constitucional norte-americana, mas todos os projetos previam um controle de constitucionalidade antes de sua intervenção. Alguns rabalhos veem em Rui Barbosa a origem do controle de constitucionalidade, os projetos podem oferecer um aspecto novo nessa compreensão.

A apresentação da Comissão e dos projetos, portanto, ajudam a reconstruir a história do Supremo Tribunal e servem para delimitar melhor o momento vivido. Neles são escritas diversas disposições que seriam importantes na norma, na Primeira República e algumas que seriam incorporadas à suprema corte até os dias atuais.


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Nota

[1] Artigo 6º das Disposições Transitórias da Constituição da República dos Estados Unidos do Brazil: “Art. 6º. Nas primeiras nomeações para a magistratura federal e para a dos Estados serão preferidos os Juízes de Direito e os Desembargadores de mais nota. Os que não forem admitidos na nova organização judiciária, e tiverem mais de trinta anos de exercício, serão aposentados com todos os seus vencimentos. Os que tiverem menos de trinta anos de exercício continuarão a perceber seus ordenados, até que sejam aproveitados ou aposentados com ordenados correspondentes ao tempo de exercício. As despesas com os magistrados aposentados ou postos em disponibilidade serão pagas pelo Governo federal” (BRASIL, 1891).

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Sobre o autor
Wagner Feloniuk

Professor Adjunto de Direito Constitucional no Curso de Relações Internacionais (2019) e Professor Permanente no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Doutorado (2013-2016), mestrado (2012-2013), especialização (2011) e graduação (2006-2010) em Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Pós-doutorado na Mediterranea International Centre for Human Rights Research, Università degli Studi Mediterranea di Reggio Calabria/Itália (2021). Recebeu Láurea Acadêmica na graduação, dois votos de louvor no doutorado, e bolsa de estudos para realização do mestrado, doutorado e estágio pós-doutoral. Coordenador do Projeto de Pesquisa: Observatório do Sistema Judiciário Brasileiro. Pesquisador dos projetos CAPES: A formação de ordens normativas no plano internacional, Núcleo de Estudos em Políticas Públicas e Opinião. Organizador dos Ciclos de Palestras das Relações Internacionais/FURG, Direito/UFRGS, PPGH/FURG e História e Direito/ANPUH, do Congresso Direito e Cultura (2014-2021). Organizou e palestrou em eventos na Argentina, Bolivia, Chile, Colômbia, Espanha, França, Itália, Inglaterra, Uruguai. Editor da Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul e da Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, ex-Editor da Cadernos de Pós-Graduação do Direito/UFRGS e Revista da Faculdade de Direito da UFRGS. Membro da Associação Nacional de História, Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito, Associação Brasileira de Editores Científicos, Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul e do ST História e Direito da ANPUH/RS. Áreas de Pesquisa: Direito Constitucional, História do Direito. Autor dos livros A Constituição de Cádiz: Análise da Constituição Política da Monarquia Espanhola de 1812, A Constituição de Cádiz: Influência no Brasil e série organizada Perspectivas do Discurso Jurídico. Áreas de Pesquisa: Direito Constitucional, História do Direito, Teoria do Estado. Publicações: http://ufrgs.academia.edu/WagnerFeloniuk

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELONIUK, Wagner. A Comissão de Juristas e os primeiros projetos de Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6036, 10 jan. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/71120. Acesso em: 26 abr. 2024.

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