Reforma trabalhista e a contribuição sindical

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22/05/2019 às 19:41
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3. NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL E CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 13.467/2017

3.1. POSICIONAMENTOS SOBRE A NATUREZA JURÍDICA E CONTROVÉRSIAS ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 13.467/2017

É de largo conhecimento o fato de que a Lei 13.467/2017, ao realizar diversas alterações nos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho, trouxe consigo muitas incertezas e discussões, especialmente no que toca à extinção da compulsoriedade da contribuição sindical, sendo válido, desse modo, realizar uma breve análise sobre os posicionamentos adotados acerca do assunto.

Cumpre esclarecer, inicialmente, que a questão da constitucionalidade da Lei 13.467/2017 para retirar o caráter compulsório da contribuição sindical está estritamente relacionada com a definição de sua natureza jurídica, isto é, se esta seria tributária ou não.

Pois bem, por muitos anos perdurou a polêmica acerca da natureza jurídica da contribuição sindical, sendo que diversos autores defendiam esta como sendo tributária. Com o advento da Reforma Trabalhista e extinção da compulsoriedade da contribuição sindical, restou configurada evidente controvérsia para os defensores de tal posicionamento, culminando em inúmeras alegações acerca da inconstitucionalidade da Lei 13.467/2017 para realizar tal alteração, vez que, possuindo natureza tributária e devido à sua previsão constitucional, apenas poderia ser o texto legal da contribuição alterado por meio de lei complementar.

Nesse sentido, de grande importância realizar uma análise dos posicionamentos sobre o assunto para que se possa obter uma concepção mais clara do tema em pauta.

Como já mencionado, diversos autores defendem a natureza jurídica tributária da contribuição sindical, vez que esta seria imposta por lei a todos os membros de uma categoria, com destinação de parte das arrecadações aos cofres da União, sendo esta, inclusive, denominada impropriamente “imposto sindical” por certo período.

As obrigações compulsórias decorrem de uma imposição do Estado por meio de previsão Constitucional e instituição por lei, sendo, portanto, tributos. Isto é, com base no artigo 3º do Código Tributário Nacional [1], os tributos seriam toda prestação pecuniária compulsória, e, para que possam ser impostos aos cidadãos, necessitam obrigatoriamente de previsão legal, estando presente, neste caso, o princípio da legalidade, sendo, ademais, a fixação destes extremamente rígida, estando estritamente vinculada à sua definição legal.

Percebe-se que a contribuição sindical está prevista no artigo 8º, inciso IV, da Constituição Federal [2], bem como no artigo 217 do Código Tributário Nacional [3], o qual faz expressa referência à contribuição em questão.

De acordo com Maria Izabel Lorenzetti Lolasso,

“A natureza tributária das obrigações pecuniárias decorre de sua estrutura lógica, independentemente de sua topografia no texto legal e do nomen iuris que lhe é emprestado.

A despeito de o artigo 145 da Constituição enumerar os tributos, impostos, taxas e contribuição de melhoria, na previsão do artigo 149, do mesmo capitulo e seção, as contribuições sociais também tem natureza tributária, e como tributo devem ser tratadas.

Resta afirmar o óbvio. A dicção do artigo 149 abrange as contribuições sindicais, ou seja, aquelas de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas.

Portanto, as contribuições sindicais dependem de instituição em lei complementar federal para serem cobradas, por serem tributos”.

Ora, de acordo com a referida autora, a contribuição sindical, por estar incluída nas contribuições sociais do artigo 149 da Constituição Federal [4], de fato possuiria natureza tributária, necessitando, ademais, de lei complementar para que pudesse ser alterada, porquanto tal artigo estabelece que devem ser observadas as disposições do artigo 146 da Constituição Federal [5], que trata da mencionada necessidade de lei complementar.

No que concerne à compulsoriedade, a autora afirma estar esta justificada pela função dos sindicatos de promoção social, isto é, a necessidade de conferir assistência social, saúde e educação de acordo com as finalidades estabelecidas em seus estatutos, sendo devida, portanto, pelos filiados e não filiados dos sindicatos, porquanto também estariam sendo beneficiados.[6]

Neste mesmo sentido, Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante afirmam que:

“A contribuição sindical destina-se a atender o custeio do sistema sindical (art. 8º, IV, CF; artigos 548, a, 578 e segs., CLT). Considerando a previsão do art. 217, I, e art.3º, ambos do CTN, e, ainda, do art. 149, CF, a natureza jurídica da contribuição sindical é tributária. É devida pelo associado e não associado de entidade sindical. ” [7]

Outro autor que coaduna com o entendimento supramencionado é Eduardo Sabbag, o qual afirma que “a contribuição sindical detém natureza tributária, emana de lei e é devida por todos os trabalhadores, filiados ou não à organização sindical correspondente. ” Ressalte-se que no trecho mencionado ainda estava presente o caráter compulsório da contribuição, porquanto tal discurso foi proferido anteriormente à Reforma Trabalhista.

Pois bem, adotava o referido autor o posicionamento do STF anterior à Lei 13.467/2017, que considerava a contribuição sindical como uma espécie de contribuição parafiscal corporativa ou profissional, sendo, assim, um tributo de competência exclusiva da União, o qual recebia impropriamente a denominação de “imposto sindical”.

Nesse sentido, afirma o autor que, em razão de sua natureza tributária, tal contribuição estaria sujeita às normas gerais de direito tributário, motivo pelo qual possuiria caráter compulsório, sendo imposta, portanto, a todos os integrantes da categoria, filiados ou não aos sindicatos.[8]

Outrossim, Arnaldo Süssekind corrobora tal entendimento ao afirmar que:

“Essa contribuição sindical é, ao nosso ver, um tributo, reunindo os elementos que a configuram como tal (cf. o art. 3º CTN). Trata-se de uma contribuição especial, autorizada peça Carta Magna, que Ives Gandra inclui entre as espécies de tributo. Conforme esclarece o Código Tributário Nacional, é irrelevante, para qualificar a natureza do tributo, “a destinação legal do produto de sua arrecadação” (art. 4º, II)”.[9]

Em remate, Ives Gandra Martins também defende a natureza jurídica tributária da contribuição sindical porquanto o mesmo acredita que a Constituição não deveria ser interpretada por meio de leis infraconstitucionais, mas sim as leis constitucionais deveriam ser interpretadas à luz da Constituição. Isto é, o mesmo, sendo um defensor da divisão quíntupla das espécies tributárias (taxas, impostos, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais), discute a controvérsia acerca da natureza jurídica das contribuições especiais, in casu, a de interesse das categorias, que, por possuírem natureza autônoma e destinação específica, não possuiriam natureza tributária. Entretanto, afirma o autor que tais contribuições possuiriam de fato caráter obrigatório em razão de sua finalidade, isto é, a imposição destas seria necessária para garantir a existência e atuação das referidas categorias econômicas e profissionais na defesa de seus interesses, possuindo, portanto, natureza tributária a contribuição sindical, porquanto estaria realizando a finalidade definida no artigo 8º, IV, da Constituição Federal. Ademais, afirma o autor que tal obrigatoriedade descrita no mencionado artigo aplicar-se-ia não apenas à categoria profissional, mas também à categoria econômica. Assim, entende o autor que ocorrera uma espécie de delegação do poder de inspecionar tais contribuições aos sindicatos, porquanto esta garantiria sua existência e atuação.

Nesse sentido, tal contribuição teria como finalidade suprema a defesa permanente das categorias mencionadas, motivo pelo qual sua obrigatoriedade não ficaria restrita apenas àqueles filiados aos sindicatos, mas atingiria todos os integrantes da categoria que eventualmente auferisse benefício em decorrência da defesa de seus interesses pelo sindicato.

Em suma, na opinião de Ives Gandra, tal contribuição seria a principal garantidora dos movimentos sindicais, razão pela qual defende o autor possuir esta natureza tributária. Nesta esteira, afirma o mesmo que eventual disposição de lei ordinária excepcionando a contribuição de determinados integrantes da categoria causaria grande impacto enfraquecedor das entidades sindicais e as prejudicaria no processo de defesa de seus interesses. Afirma, ademais, que a Consolidação das Leis do Trabalho já previa anteriormente a determinada contribuição sindical e, ao ser recepcionada pela Constituição Federal de 1988, teve seu caráter tributário consagrado, sendo esta devida pelos integrantes das categorias profissionais e econômicas.

Por fim, considera o autor que, partindo da premissa de que a matéria deve ser examinada através da Lei Maior, e não da legislação ordinária, eventual redução da incidência de tal contribuição, feita por lei ordinária, seria iminentemente inconstitucional, no caso de ser realizada interpretação literal do texto constitucional.

Ressalte-se que tais considerações realizadas por Ives Gandra foram proferidas em um artigo jurídico confeccionado anteriormente à vigência da Lei 13.467/2017.[10]

Outrossim, tal seria a natureza tributária da contribuição sindical porquanto possuiria destinação em parte à União, isto é, explica Sércio da Silva Peçanha que, com base no artigo 589 da Consolidação das Leis do Trabalho, parte dos valores arrecadados seria destinada às entidades sindicais, sendo, contudo, parte destinada à Conta Especial Emprego e Salário, pertencente ao governo federal.[11]

Por derradeiro, em face dos posicionamentos supramencionados, tendo como premissa a natureza tributária da contribuição sindical, esta, por ser tributo, não poderia estar condicionada à autorização para que fosse realizada sua cobrança (artigo 146 da Constituição Federal), e, ademais, por ser de competência da União (artigo 149 da Constituição Federal de 1988), quaisquer alterações sobre o assunto deveriam ser realizadas por meio de lei complementar, motivos pelos quais é alegada a inconstitucionalidade da Lei 13.467/2017 para retirar o caráter compulsório da contribuição sindical.

Pois bem, em contrapartida, tem-se que os autores que defendem a constitucionalidade da Lei 13.467/2017 para realizar tais alterações nos dispositivos legais já mencionados adotam posicionamento diverso. Vejamos.

Sergio Pinto Martins defende a constitucionalidade de tais alterações por meio de uma análise literal dos dispositivos legais que preveem a contribuição sindical. A contribuição sindical, como já mencionado, encontra previsão legal nos artigos 545, 578 a 610 da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como nos artigos 8º e 149 da Constituição Federal. O artigo 8º da Constituição Federal faz referência a dois tipos de contribuição, isto é, a contribuição federativa, a ser fixada por pela assembleia geral do sindicato, e uma “prevista em lei”, que seria a contribuição sindical.

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Entende o mencionado autor que, por meio das alterações realizadas e eliminação do caráter compulsório da contribuição sindical, esta não mais possuiria natureza jurídica tributária, porquanto ausente a compulsoriedade exigida no artigo 3º do Código Tributário Nacional.

Em relação à constitucionalidade da Lei 13.467/2017 para retirar tal compulsoriedade, entende o autor que, o artigo 8º da Constituição Federal, ao estabelecer que a contribuição sindical estaria prevista em lei, não estabeleceu nem definiu seus termos no que toca à natureza tributária e caráter compulsório, apenas disciplinando a necessidade de previsão legal.

Nesse sentido, a Consolidação das Leis do Trabalho estaria disciplinando o caráter compulsório da contribuição em pauta, e não a Constituição Federal. Ademais, a Lei 13.467/2017 não está instituindo a contribuição sindical (dispõe o artigo 149 da Constituição Federal que a instituição de tal contribuição seria de competência da União), que já existia anteriormente (Artigo 8º, IV, da Constituição Federal), sendo que também haveria previsão genérica sobre o assunto no artigo 217, inciso I, do Código Tributário Nacional.

Desse modo, seria a matéria em questão de lei ordinária, e não lei complementar, podendo, portanto, ser o caráter compulsório da contribuição sindical alterado pela Lei 13.467/2017, vez que esta seria lei ordinária federal alterando apenas características da mencionada contribuição, sendo, portanto, constitucionais as alterações realizadas.

Inclusive, cita o autor demais hipóteses anteriores nas quais a contribuição sindical já havia sido alterada sem que fosse alegada qualquer espécie de inconstitucionalidade, tais como as realizadas pelo Decreto-lei n. 27 de 14 de novembro de 1966, Decreto-lei n. 229 de 28 de fevereiro de 1967 e pela Lei 11.648 de 31 de março de 2008.

Vale mencionar que após a vigência da mencionada lei foram ajuizadas diversas ações diretas de inconstitucionalidade a fim de reverter as alterações realizadas pela Reforma Trabalhista e, desse modo, recuperar o caráter compulsório da contribuição sindical. Precisamente foram intentadas dezenove ações desta natureza, sendo, por fim, a questão solucionada por julgamento do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5794, a qual reuniu as demais que tratavam do mesmo assunto, restando consolidado, portanto, que de fato a alteração trazida pela aludida Lei 13.467/2017 é constitucional.

3.2. ADI 5794

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794 foi ajuizada em outubro de 2017, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (CONTTMAF).

O objeto da referida demanda consistia na declaração de inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), o qual alterou a redação dos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a fim de extinguir o caráter compulsório da contribuição sindical, condicionando, assim, seu recolhimento à necessidade de expressa autorização pelos trabalhadores.

Vale ressaltar que tramitaram juntamente com a referida demanda outras 18 ADIs que foram ajuizadas visando o mesmo fim, bem como a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 55, a qual, em contrapartida, defendia a validade das alterações trazidas pela referida Reforma, sendo estas apensadas aos autos da ADI 5794, cujo julgamento condicionou o das demais demandas.

O julgamento da ADI 5794 se deu em 29 de julho de 2018, decidindo o Supremo Tribunal Federal, por 6 votos a 3, pela improcedência da referida demanda e consequente declaração de constitucionalidade dos dispositivos legais alterados pela Reforma Trabalhista, sendo tal decisão aplicada às supramencionadas demandas que tramitaram em conjunto.

Votaram pela declaração de inconstitucionalidade dos referidos dispositivos legais o Relator Edson Fachin e os Ministros Dias Toffoli e Rosa Weber, sendo vencidos pelo posicionamento dos Ministros Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes, os quais se manifestaram pela constitucionalidade e validade das alterações trazidas pela Reforma Trabalhista.

O Relator Edson Fachin posicionou-se no sentido de que o sistema sindical brasileiro estaria apoiado em três pilares, isto é, a unicidade sindical, a representação por categoria e o custeio de tal sistema por meio da contribuição sindical, afirmando, portanto, que a mudança em apenas um desses pilares poderia trazer enorme desestabilização ao regime sindical. Nesse sentido, o mesmo afirmou que o fim do caráter compulsório da contribuição sindical traria dificuldades para os sindicatos no que toca à obtenção de uma nova fonte de custeio, tornando, desse modo, dificultosa a manutenção de sua organização e eficiência na defesa dos interesses dos trabalhadores, os quais seriam os prejudicados em último grau. Ademais, pugnou pela inconstitucionalidade das alterações porquanto a contribuição sindical teria natureza tributária, isto por ser instituída pela União e ter parte do valor arrecadado destinado à recita pública. Neste mesmo sentido, acompanharam o voto do relator a Ministra Rosa Weber e o Ministro Dias Toffoli, defendendo este a necessidade de uma reforma gradativa de todo o sistema, garantindo uma substituição de tal fonte de receita.

Em contrapartida, o Ministro Luiz Fux apresentou entendimento diverso, afirmando que a Lei 13.467/2017 não estaria tratando de matéria tributária, e, ademais, não seria necessária lei complementar para tratar de tal assunto, uma vez que a compulsoriedade da contribuição sindical não seria matéria constitucional, mas sim de lei ordinária. O mesmo também atribui ao caráter compulsório a proliferação de sindicatos nas últimas décadas, os quais não estariam de fato buscando a defesa e melhoria de condições das categorias, isso devido à ausência de competitividade. Trata o mesmo, outrossim, da violação causada ao princípio da liberdade sindical pela compulsoriedade da contribuição sindical, vez que o sistema de sindicatos do Brasil, mesmo após o advento da Constituição de 1988, ainda possuiria resquícios do contexto corporativista e intervencionista no qual foi criado, não sendo possível, portanto, a plena concretização da liberdade sindical no Brasil. Por fim, alega ainda a existência de outras fontes de renda pelos sindicatos, tais como as contribuições confederativa e assistencial, bem como outras instituídas pela assembleia geral da categoria. Acompanharam tal entendimento os Ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, tendo este acrescentado argumentos no sentido de que não seria tributária a natureza da contribuição em questão, porquanto não se enquadraria no artigo 149 da Constituição Federal, e, finalmente, pela Ministra Cármen Lúcia, a qual destacou a conveniência de regras de transição no presente caso.

Registre-se, finalmente, que os Ministros Ricardo Lewandowiski e Celso de Mello não participaram do referido julgamento.

Restou concluído, pelo posicionamento da maioria dos Ministros, que as alterações que trouxeram o fim do caráter compulsório da contribuição sindical não seriam inconstitucionais, sendo, portanto, improcedentes as ADIs ajuizadas, e procedente a ADC.

3.3. FORMA DE CUSTEIO DOS SINDICATOS PÓS REFORMA TRABALHISTA

Pois bem, por muitos anos a contribuição sindical foi uma das principais fontes de renda dos sindicatos, sendo que, após a extinção de seu caráter compulsório por meio da Reforma Trabalhista, surgiram diversas discussões acerca da manutenção financeira dos sindicatos a partir de tais mudanças, como se pode observar, inclusive, pelas diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que foram ajuizadas num curto período de tempo a fim de reverter tais alterações.

De fato, tal modelo compulsório de arrecadação seria uma espécie de resquício do sistema corporativista no qual foi desenvolvida a estrutura sindical brasileira, a qual há anos já vinha se mostrando ultrapassada porquanto propiciava uma atuação falha e desvirtuada dos sindicatos, que estariam deixando de cumprir as funções que lhes são delegadas por lei em face do comodismo fornecido por tal fonte de renda, a qual era devida por todos os integrantes das categorias.

Neste contexto, vale realizar uma análise sobre a questão da representação e representatividade dos sindicatos após as alterações trazidas pela reforma trabalhista.

Trata sobre o assunto Aldemiro Rezende Dantas Júnior, em um artigo publicado na Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, no qual o mesmo inicialmente realiza uma breve contextualização histórica do surgimento dos sindicatos e de suas funções, que, atualmente, estariam por demasiado desvirtuadas justamente pelo fato de ser até então a contribuição sindical obrigatória.

Aldemiro Rezende Dantas Júnior define que a representação dos sindicatos seria “o poder de atuar em nome da categoria”, e a representatividade “como a real identificação com os anseios desta mesma categoria”. [12]

Pois bem, de fato assiste razão ao mesmo quanto à Lei 13.467/2017 ter ampliado a representação dos sindicatos na medida que lhes conferiu maior poder de negociação, isto apoiando-se na premissa maior da prevalência do negociado sobre o legislado em determinadas questões.

Nesse sentido, afirma que podem ser citadas como exemplo de tal ampliação as disposições introduzidas pela Reforma no que toca ao artigo 611-A e parágrafo único do artigo 444, ambos da CLT, bem como em relação à possível concessão de eficácia liberatória geral pelos sindicatos no caso de adesão ao Programa de Demissão Voluntária.

Contudo, aduz que a despeito de tais alterações, as quais, num primeiro momento, mostram-se como uma espécie de avanço no âmbito do poder de negociação dos sindicatos, observa-se que a representatividade dos mesmos encontra-se em situação de risco, isto é, a contribuição sindical, sendo considerada a principal fonte de custeio dos sindicatos, ao perder seu caráter compulsório, de certa forma “secou” a fonte de receita dos mesmos, os quais, no período pós-reforma, para que possam retornar ao seu status quo ante, deverão buscar outras fontes de arrecadação.

Nesta esteira, relata que o “risco” em questão seria a possível alegação dos sindicatos sobre insuficiência de verbas a fim de se eximirem de buscar a melhor defesa da categoria, e, desse modo, de nada adiantaria uma ampliação dos casos em que o sindicato possuiria maior poder de negociação se sua representatividade estivesse enfraquecida.

Ora, é possível extrair consequências positivas e negativas das supramencionadas considerações.

Uma das consequências benéficas trazidas pela extinção do caráter compulsório da contribuição sindical seria referente ao fim da desvirtuação das finalidades dos sindicatos que ocorria até então. Define Sérgio Pinto Martins a contribuição sindical como:

“um resquício do corporativismo de Getúlio Vargas. Permite a organização e manutenção de sindicatos sem a menor autenticidade, que não prestam e não tem interesse em prestar serviços aos associados, apenas na manutenção da direção por certas pessoas com o objetivo de obter estabilidade no emprego.”[13]

Entretanto, de acordo com Sércio da Silva Peçanha, com a extinção da compulsoriedade da contribuição sindical haverá grande impacto financeiro nas entidades sindicais e categorias representadas. Afirma o mesmo, in verbis:

“Certamente e na atual conjuntura de dificuldades econômicas, pelo qual passam os brasileiros, um significativo número de membros das categorias, não irá assinar termo autorizativo de desconto (membros das categorias profissionais) ou não irá optar pelo recolhimento (membros das categorias econômicas)”

“O impacto só será menor, para as entidades sindicais, que possuem outras fontes de receita em montante superior ao arrecadado com a contribuição sindical, em especial aquelas representantes das categorias econômicas, que recebem repasses do sistema S”. [14]

Desse modo, entende-se que com a supressão dos valores que até então eram arrecadados por meio da contribuição sindical, as entidades sindicais passarão a depender principalmente, e quase de forma exclusiva, das contribuições dos associados.

Neste ponto, surge grande problemática, porquanto o número de associados no Brasil seria reduzido frente ao montante que anteriormente era arrecadado por meio da contribuição sindical recolhida indiscriminadamente, isto é, cobrada de associados e não associados (que seriam a maior parte dos contribuintes).

Nesta esteira, importante mencionar fragmento da pesquisa realizada em 2016 pelo IPEA, elaborada por André Gambier Campos, baseada no Cadastro Nacional de Entidades Sindicais de 2015 do Ministério do Trabalho e Emprego:

“Atualmente, há 16.491 organizações de representação de interesses econômicos e profissionais no Brasil, reconhecidas pelas autoridades do TEM. Seguindo os níveis da estrutura oficial, de baixo para cima, há 15.892 sindicatos, 549 federações, 43 confederações e 7 centrais sindicais, totalizando 16.491 organizações que representam empregadores (5.251) e trabalhadores (11.240)”

“...a proporção de trabalhadores filiados no país é limitada a 16,2% atualmente, o que corresponde a 17,3 milhões de pessoas”.

Ademais, de acordo com artigo publicado na Folha de São Paulo em 03.05.2017, estima-se que a arrecadação anual da contribuição sindical seria de R$ 2.75 bilhões, sendo R$ 1.97 bilhões destinados aos sindicatos de trabalhadores e R$ 777.4 milhões aos sindicatos patronais.[15]

Em face de tais fatores, observa-se o número exacerbado de entidades sindicais no cenário atual, bem como o valor arrecadado até então por meio da contribuição sindical, e, contrapondo-se tais valores ao número reduzido de associados que existem atualmente, conclui-se que de fato haverá uma redução abrupta na receita dos sindicatos que poderá incidir em consequências negativas no que tange à representatividade mencionada por Aldemiro Rezende Dantas Júnior.

De igual forma, Sércio da Silva Peçanha entende que:

“No momento em que se reforça, legislativamente, os poderes outorgados aos sindicatos até para suprimir e flexibilizar direitos trabalhistas, a fragilização econômica dos sindicatos profissionais retira a paridade de armas, necessária, para a negociação e celebração de instrumentos normativos com os membros e representantes das categorias econômicas, o que poderá ocasionar maior redução ou flexibilização de direitos individuais anteriormente assegurados às categorias profissionais, sejam oriundos de normas autônomas ou heterônomas.”[16]

Como já mencionado no presente trabalho, nos anos anteriores buscou-se a extinção da contribuição sindical compulsória, sendo editadas medidas provisórias e projetos de lei que previam sua extinção progressiva, o que, nos dias atuais, talvez fosse uma opção mais adequada em face do cenário sindical.

Portanto, entende-se que de fato a extinção da compulsoriedade da contribuição sindical era necessária a fim de conferir um avanço na estrutura do sistema sindical brasileiro, verificando-se, no plano teórico, o fortalecimento do direito de liberdade sindical. No entanto, tal extinção realizada, sem um programa de transição, pode trazer eventualmente complicações que, ao final, não sejam tão benéficas aos trabalhadores sindicalizados e não sindicalizados, vez que a representatividade destes possa estar em risco em face de tais alterações.

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Sobre a autora
Helen Rodrigues de Souza

Bacharel em Direito, graduada pela PUC - Campinas, Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Ibmec - SP, com participação em módulo internacional sobre Direitos Humanos e Sociais na Universidade Católica Portuguesa de Lisboa, cursando atualmente Pós-graduação latu sensu em Direito Previdenciário. Atualmente atua como advogada nas áreas Trabalhista, Previdenciária, Cível e de Família. OAB/SP 433.385

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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