Capa da publicação Incidência do princípio da congruência nas ações civis públicas
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Princípio da congruência e ação civil pública

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16/09/2019 às 15:16
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6 CONCLUSÃO

A sentença e a decisão de mérito, inclusive nas ações civis públicas, devem ficar adstritas aos limites impostos pelos elementos que identificam a ação. Deste modo, para que não haja atuação “ex officio”, com afronta aos princípios da demanda e do contraditório, tampouco falta de apreciação de determinada pretensão, em desrespeito ao princípio da indeclinabilidade da Jurisdição, a sentença e a decisão de mérito não podem ir além ou ficar aquém das partes que compõem a relação processual, dos pedidos por estas formulados e dos fatos que a estes últimos servem de fundamento.

Quanto ao pedido, a correta aplicação, assim como o próprio entendimento do princípio da congruência, determina, de início, a distinção entre suas acepções mediata e imediata, pois, como regra, há vinculação ao bem da vida que se pretende tutelar (pedido mediato), sendo possível, em contrapartida, sobretudo nas sentenças e decisões que impõem um fazer, não fazer ou dar, a adoção de medida diversa da postulada, sempre com o objetivo de se alcançar a tutela específica e, portanto, efetiva.

Mas, ainda, para que seja o pedido corretamente identificado, e não transborde a atuação judicial aos seus limites, é imprescindível seja ele, salvo exceções legais, certo e determinado. Vale aqui pontuar, entretanto, que nas ações civis públicas, para que se consiga conciliar o dever de prestação jurisdicional efetiva com a contrapartida da proibição à incongruência, é imperiosa uma leitura extensiva do rol de possibilidades legais para formulação de pedidos indeterminados.

Dito isto, é forçoso concluir que somente se poderá verificar a congruência ou incongruência, diante de um pedido devidamente delimitado, e, ainda assim, após se proceder a sua correta interpretação. E para tanto, há de se observar a instrumentalidade necessária entre o objeto imediato e o objeto mediato do pedido, bem como o todo da postulação e o princípio da boa-fé.

A conclusão acerca de quais são os limites da sentença e decisão de mérito na ação civil pública, portanto, deve ter por norte central o fato de que em tais ações busca-se a tutela de interesses coletivos e difusos, cuja natural repercussão social leva à indisponibilidade do direito.

Se os autores coletivos não têm liberdade para a formulação dos pedidos (pois não podem dispor do interesse cuja tutela requerem), é certo que a eles compete proceder à postulação de maneira a alcançar a integral, efetiva e célere satisfação do direito ameaçado ou lesado, com preferência, sempre, à tutela inibitória. É este, em essência, o conteúdo inafastável da pretensão inicial nas ações civis públicas, razão pela qual não será incongruente a sentença ou a decisão de mérito que assim interpretá-la, concedendo a medida pertinente (que melhor tutele o interesse, gerando a menor restrição possível ao demandado), mesmo que não expressa, mas desde que inferível da postulação, pois decorrente do interesse a ser tutelado e dos fatos narrados e discutidos durante o processo.


REFERÊNCIAS

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ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.


Notas

[2] ZAVASCKI  entende que “direitos coletivos são direitos subjetivamente transindividuais (= sem titular individualmente determinado) e materialmente indivisíveis” (2017, p. 39). Para o autor direitos coletivos dividem-se em difusos e coletivos em sentido estrito. En

[3] “Ação coletiva é a medida judicial proposta pelas pessoas arroladas no art. 5º da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347, 1985), por sindicatos, associações de classe, cidadãos e por outros legitimados nas esferas constitucional e legal, com o escopo de tutelar interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos” (SOUZA, 2011, p. 40).

[4] MAZZILLI (2017, p. 78), faz uma diferença entre os conceitos legal e doutrinário. Inicialmente questiona “como denominaremos, pois, uma ação que verse a defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos?” E o próprio autor assim responde: “se ela estiver sendo movida pelo Ministério Público, o mais correto, sob o prisma doutrinário, será chama-la de ação civil pública. Mas se tiver sido proposta por associações civis, o mais correto será denomina-la ação coletiva. Sob o enfoque puramente legal, será ação civil pública qualquer ação movida com base na Lei 7.347/85, para a defesa de interesses transindividuais, ainda que seu autor seja seu uma associação civil, um ente estatal, o Ministério Público, ou qualquer outro colegitimado; será ação coletiva qualquer ação fundada nos arts. 81 e s. do CDC, que verse a defesa de interesses transindividuais. De qualquer forma, porém, nenhuma ação de objeto coletivo poderá ser rejeitada apenas porque o autor chamou de coletiva em vez de civil pública, ou vice-versa”

[5] Este parece ser o entendimento de Arnaldo Rizzardo (2014, p.  38) que conceitua a ação civil pública como “um processo coletivo, dirigido para conseguir a tutela coletiva, de uma só vez, em favor de um determinado grupo, de interesses ou valores comuns de todos os integrantes, e de valores e interesses públicos e que integram o domínio do Poder Público”.

[6] A ressalva decorre do fato de que “interesses individuais poderão ser diretamente tutelados por meio de ação civil pública quando esta for a forma para que, indiretamente, se possa defender um interesse difuso ou coletivo” (SOUZA, 2011, p. 41).

[7] Neste sentido: “podemos conceituar ação civil pública como a ação não penal proposta pelos legitimados de que trata o art. 5º da Lei n. 7.347/85 com o escopo de tutelar interesses difusos ou coletivos” (SOUZA, 2011 p. 37).

[8] Neste sentido dispõe o art. 319 do Código de Processo Civil: “Art. 319. A petição inicial indicará: [..] IV - o pedido com as suas especificações”.

[9] Assim compreendida como o “ato de vir ao juiz pedindo tutela jurisdicional” (DINAMARCO, 2017a, P. 126).

[10] A Jurisdição é “uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar pacificação do conflito que os envolve, com justiça (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2012, p. 155).

[11] Código de Processo Civil: Art. 330, § 1o Considera-se inepta a petição inicial quando: I - lhe faltar pedido ou causa de pedir; II - o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV - contiver pedidos incompatíveis entre si.

[12] Código de Processo Civil: Art. 330.  A petição inicial será indeferida quando: I - for inepta.

[13] Código de Processo Civil: Art. 485.  O juiz não resolverá o mérito quando: I - indeferir a petição inicial.

[14] Como frisa Candido Rangel Dinamarco (2017a, p 131), “a tutela jurisdicional conferida ao demandante refere-se sempre a uma pretensão por ele trazida”.

[15] Parte da doutrina e da jurisprudência adota a divisão em análise de forma diversa. Para esta parcela (que parece minoritária), o pedido imediato seria caracterizado pela própria prestação que se pretende seja a parte adversa compelida e o mediato pelo interesse que, por meio de tal prestação, quer-se resguardar. Neste sentido, Motauri Ciocchetti de Souza, ao analisar a possibilidade excepcional de tutela de interesse individual por meio de ação civil pública, pontua, com nossos grifos: “por vezes a única forma de defesa do interesse metaindividual se dá mediante a defesa imediata de um direito pertencente a determinado indivíduo. Nesse caso, a ação tem como pedido imediato a defesa de um interesse individual e, como pedido mediato, a tutela do interesse difuso ou coletivo” (SOUZA, 2011, p. 41, grifo nosso). Também neste mesmo sentido: “APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Fornecimento de exames e eventual tratamento. Alegação de violação ao princípio da congruência. Inocorrência. O pedido de se receber exames, tratamento e medicamentos é o pedido imediato da inicial; o bem jurídico que se almeja, ou o pedido mediato, é a preservação da saúde a ser obtida por intermédio da disponibilização de todo o tratamento de que necessita. Não está situada além do que foi pedido a determinação à Administração de prestar os procedimentos correspondentes às modalidades pelas quais esse resultado possa ser obtido. Prescrição médica proveniente de profissional regularmente habilitado que não dá margens para presunções de inidoneidade. Prova de hipossuficiência. Imprescindibilidade do provimento jurisdicional efetivamente demonstrada. Sentença de procedência mantida Necessidade, no caso de redução no valor das astreintes e limitação em sua extensão. Recursos voluntário e oficial parcialmente providos” (TJSP;  Apelação 1001610-36.2017.8.26.0407; Relator (a): Bandeira Lins; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro de Osvaldo Cruz - 1ª Vara; Data do Julgamento: 25/04/2018; grifo não original). Cabe pontuar que, por esta última acepção, haveria forte flexibilização do princípio da congruência.

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[16] Empregar-se-á a terminologia costumeiramente utilizada pela doutrina, ou seja, “pedido mediato” e “pedido imediato” para mais fácil compreensão, embora, em verdade, não se esteja diante, propriamente, de dois pedidos, mas um só, havendo fracionamento, apenas, de seu objeto, em objeto mediato e objeto imediato.

[17] Conforme Candido Rangel Dinamarco (2017a, p. 132), “o objeto dessa pretensão que tem por titular passivo o Estado-juiz ou o árbitro é, portanto, o provimento a ser emitido por um destes, e não o bem da vida a que o demandante aspira e já pretendia desde antes de tomar a iniciativa de instaurar o processo”.

[18] Como explica MARINONI (2000, p 131), a necessidade de que o pedido implique na menor restrição possível à esfera de direitos do demandado tem origem no princípio da isonomia, pois se a tutela deve ser a mais adequada à proteção do direito do autor, é medida de igualdade que, em contrapartida, seja também a menos onerosa ao demandado.

[19] Nas palavras de Maria de Fátima Vaqueiro Ramalho Leyses (2007, p. 16), “um interesse é metaindividual quando, além de ultrapassar o círculo individual, corresponde aos anseios de todo um segmento ou categoria social”.

[20] Neste sentido o entendimento de Marinoni (2000, p. 119): “entende-se, a partir daí, que a sentença deve limitar-se ao que foi pedido pelo autor, seja no eu diz respeito ao pedido imediato, seja no que pertine ao pedido mediato”.

[21] Há quem defenda, embora assim não concordemos, que o pedido imediato não serve para delimitar a atuação jurisdicional. Neste sentido: “na verdade, nada obstante a indispensável exigência de que o autor aluda a todos eles na peça inicial, somente o pedido mediato (bem da vida) e a causa remota (fato) interessam na formação dos limites da demanda” (Caldeira, 2006, p. 179)

[22] Apesar de a doutrina excepcionar apenas as ações de obrigação de fazer, não fazer e de entregar coisa, diante do que estabelece o artigo 139, IV, do Código de Processo Civil, pode-se pensar na extensão da exceção em comento, em casos específicos, também às ações condenatórias. Isto porque o referido dispositivo permite que o juiz adote medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias não postuladas pela parte-autora, mas necessárias para “assegurar o cumprimento de ordem judicial”.

[23] “Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento”.

[24] “Art. 497.  Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente”

[25] “Art. 538.  Não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel. [..] § 3o Aplicam-se ao procedimento previsto neste artigo, no que couber, as disposições sobre o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer”.

[26] Em sentido contrário, Vallisney de Souza Oliveira (2004) entende que os artigos 461 do Código de Processo Civil de 1973 (equivalente ao artigo 538 do CPC/15), e 84 do Código de Defesa do Consumidor, constituem exceção ao princípio da congruência aplicável não ao pedido imediato, mas sim ao pedido mediato, pois a pretensão mediata, nas ações de obrigação de fazer, não fazer e entregar, consiste no próprio ato de fazer, não fazer ou de entregar. Ao deferir outra obrigação, o juiz estaria concedendo, na visão do prelecionado autor, bem da vida diverso do requerido.

[27] O Novo Código de Processo Civil corrige erro do Estatuto revogado (CPC/73) que, em seu artigo 286, preceituava que o pedido deveria ser certo ou determinado, não obstante a presença concomitante de ambos os predicados já fosse, mesmo sob a égide daquele diploma, considerada obrigatória, até porque certeza e determinação são conceitos inconfundíveis.

[28] “Somente é determinado o pedido se o autor faz conhecer com segurança o que pede que seja pronunciado pela sentença” (THEODORO, 2016, p. 783).

[29] A respeito, Código de Defesa do Consumidor: “art. 95. Em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados”.

[30] “A peculiaridade das ações coletivas por direitos individuais homogêneos (direitos pertencentes a um número significativo de indivíduos e gerados por uma origem comum – CDC, at. 81, par., III) impõe que as demandas coletivas propostas sejam necessariamente genéricas” (DINAMARCO, 2017a, p. 148).

[31] “A indeterminação ficará restrita à quantidade ou qualidade das coisas ou importâncias. Nunca poderá, portanto, haver indeterminação do gênero da prestação pretendida” (THEODORO, 2016, p. 793).

[32] A respeito: “AÇÃO CIVIL PÚBLICA – telefonia – relações de consumo - Ministério Público – alegação de descumprimento das normas da ANATEL – alegação de má prestação de serviço por: falha de serviço, cobrança indevida, demora exagerada no serviço de atendimento, falta de solução dos problemas – pedido de condenação genérica, nos termos do art. 95 do CDC, com possibilidade de liquidação e execução individual pelos consumidores efetivamente lesados e, ainda pedido de condenação por dano moral difuso – pedidos possíveis – porém, ausência de especificação das condutas reputadas ilícitas – determinação de emenda (art. 317 do CPC) – cumprimento irregular, já que houve apenas reiteração dos termos da inicial – extinção sem resolução do mérito, por inépcia – art. 485, I, do CPC - MP que reitera os termos e aduz que a determinação judicial da emenda para especificar as condutas atenta contra a economia processual – inocorrência – emenda deveria ter sido cumprida, para tornar objetiva a demanda e possibilitar o exercício do contraditório – ademais, o MP sequer indicou quais os parâmetros que entende condizentes como a boa prestação do serviço – assim, não há como amparar - recurso não provido” (TJSP;  Apelação 1080313-63.2016.8.26.0100; Relator (a): Achile Alesina; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 37ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/10/2017; Data de Registro: 23/10/2017, grifos  nossos).

[33] Como aponta José Joaquim Calmon Passos, “a relativa indeterminação é restrita ao aspecto quantitativo do pedido, inaceitável qualquer indeterminação no tocante à substancia do pedido” (PASSOS, José Joaquim Calmon de. Tutela jurisdicional das liberdades. Revista de Processo, São Paulo, v.90).

[34] Excepciona-se neste caso a sentença proferida no juizado especial cível, se genérico o pedido inicial, já que, nos termos do art. 38, parágrafo único, da lei 9.099/95, “Não se admitirá sentença condenatória por quantia ilíquida, ainda que genérico o pedido”. Deste modo, ainda que genérico o pedido, a sentença deverá ser líquida, não padecendo de vício em razão de ser “ultra petita”.

[35] “quando não for possível determinar, de modo definitivo, as conseqüências do ato ou do fato ilícito”

[36] “A referencia ao “conjunto da postulação” ou ao contexto da demanda deve constituir em todos os casos um metro válido e legítimo para a interpretação do pedido” (DINAMARCO, 2017a, p. 329).

[37] A relevância social a que se refere neste ponto decorre, para os interesses coletivos em sentido estrito, do fato de o interesse ser titularizado por uma coletividade de pessoas. Não é a mesma razão que justifica a legitimidade ativa do Ministério Público, pois para este a atuação está limitada à defesa de interesses que importem à sociedade como um todo, de modo que nem sempre estará o “Parquet” legitimado para a propositura de ações civis públicas para a defesa de interesses coletivos. Assim, não haveria interesse social a tornar o Ministério Público legítimo no caso, vg, de um condomínio edilício sofrer com o corte frequente de serviços públicos de fornecimento de energia ou água ou, ainda, no caso de titulares de determinado cargo público que vem sofrendo descontos indevidos em seus vencimentos por conta de contribuição compulsória instituída por lei inconstitucional.

[38] “somente haveremos de falar em indenização quando a função preventiva tenha sido ineficaz e o dano venha a ser considerado tecnicamente irreparável” (SOUZA, 2011, p. 50).

[39] A definição trazida aplica-se ao processo de conhecimento, já que na execução a sentença é meramente terminativa, tendo função unicamente processual, pois, como adverte Humberto Theodoro Junior (2016, p. 1028), nela “o juiz reconhece tão somente que não há mais atos executivos a realizar e, por isso, decreta a extinção do processo, cuja função já se exauriu. O mérito da execução repousa nos próprios atos de satisfação do direito e, como visto, a sentença limita-se a reconhecer a ocorrência do prévio exaurimento do objeto da ação, não sendo ela, portanto, a resposta postulada pelo demandante”.

[40] Como alerta Candido Rangel Dinamarco (2017b, pp 763/764), há proposta doutrinária (que parece francamente minoritária) no sentido de excluir do conceito de sentença os atos judiciais não dotados de liquidez, pois estes não colocariam termo à fase cognitiva, a qual teria continuidade na posterior fase de liquidação.

[41] Em primeiro grau de jurisdição.

[42] Candido Rangel Dinamarco (2017b, p. 775) conceitua os capítulos como “partes em que ideologicamente se decompõem o decisório de uma decisão, sentença ou acórdão, cada uma delas contendo o julgamento de uma pretensão distinta”.

[43] Neste sentido: DINAMARCO, 2017b, p. 775

[44] Neste sentido adverte Humberto THeodoro Junior (2016, p. 1085), ao discorrer sobre a interpretação da sentença: “fruto que é da dinâmica processual, seu teor só será bem compreendido se se buscar, antes de tudo, harmonizá-la com o objeto do processo e com as questões que a seu respeito as partes suscitaram na fase de postulação”.

[45]  Para fins deste trabalho a decisão parcial de mérito será nomeada tão somente como decisão de mérito.

[46] Dispõe o artigo 355 do Código de Processo Civil: Art. 355.  O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras  provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349.

[47] Neste sentido SHIMURA (2006, p. 104): “surgem a idéia e o conceito de tutela específica, consistente no conjunto de remédios e providencias que assegurem o preciso resultado prática que seria atingido pelo adimplemento. Pela tutela específica, o provimento deve, na medida do possível, coincidir com a idéia de efetividade do processo e utilidade de suas decisões. Daí a preferencia da tutela específica sobre qualquer outra, expressão do princípio do exato cumprimento ou do resultado”

[48] “o juiz pode deixar de lado o pedido para conceder a tutela jurisdicional capaz de atender de forma adequada e efetiva o direito material. Os limites da atuação do juiz, na conversão de uma obrigação em outra, são ditados pela própria obrigação originária; ou seja não cabe ao juiz conceder tutela que implique em resultado que não esteja na própria obrigação originária (MARINONI, 2000, p 124).

[49] “a tutela jurisdicional deve proporcionar, na medida do possível, a tutela específica dos direitos, evitando-se, principalmente nos casos de direitos não patrimoniais, a insatisfatória saída pela via da técnica ressarcitória” MARINONI (2000, p. 122)

[50] “a tutela jurisdicional deve ser entendida como aquela apta a tornar efetivo o direito, em casos concretos trazidos ao Judiciário” (LEYSES, 2007, p. 28).

[51] Nas ações coletivas o princípio da efetividade encontra expressa previsão legal no artigo 83 do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela”.

[52] Fala-se aqui em congruência externa, ou seja, na necessidade de que a sentença “seja correlacionada, em regra, com os sujeitos envolvidos no processo (congruência subjetiva) e com os elementos objetivos da demanda” (DIDIER; BRAGA; OLIVEIRA, 2018, p. 413) e não na congruência interna da sentença, concernente aos requisitos para que seja inteligível, ou seja, ao dever de guardar em si clareza, certeza e liquidez.

[53] Há outros fundamentos, que decorrem dos princípios da demanda e do contraditório, tais como a inércia da jurisdição, o princípio da ampla defesa, princípio da igualdade, dever de imparcialidade do juiz e dever de motivação das decisões judiciais: “o pedido surge na relação processual em observância à inércia da jurisdição e à imparcialidade do juiz, indispensável, ademais, ao exercício do contraditório, como condição e limite à atividade jurisdicional num Estado de Direito” (CARACIOLA, 2007, P. 140).

[54] O princípio da congruência “tem assento e fundamento, precipuamente, no princípio dispositivo, na medida em que traduz a liberdade conferida aos indivíduos para exercerem ou não seus Direitos, o que significa, mais precisamente, a possibilidade de deduzir uma pretensão ou não, bem como de delimitá-la em juízo, impondo-se ao magistrado respeitar os limites traçados pelas partes, em observância à autonomia da vontade” (CARACIOLA, 2007, P. 203).

[55] Conforme advertem MARINONI, ARENHART e MITIDIERO (2015, p. 449), a congruência é “a projeção do chamado princípio da demanda”.

[56] “A demanda se traduz, a um só tempo, em condição e limite para o exercício da função jurisdicional” (CARACIOLA, 2007, p. 134).

[57] Será visto mais a frente que, por vezes, basta a análise de uma só causa de pedir, se, ao lado de outras formuladas pela mesma parte, for por si só suficiente para se alcançar o resultado.

[58] A respeito CARACIOLA, 2007

[59] Como explica Vallisney de Souza Oliveira (2004), será “citra petita” a sentença declaratória se o pedido é condenatório, bem como será “ultra petita” a sentença condenatória, se o pedido é meramente declaratório. Em contrapartida, o efeito mandamental, ainda segundo prelecionado autor, é decorrência lógica e necessária do pedido mandamental, não havendo necessidade de o autor postulá-lo expressamente: “a mandamentalidade não se correlaciona necessariamente com o pedido, cabendo ao juiz engendrar, de ofício, tal efeito na sentença que, pela sua natureza, comporta essa eficácia” (OLIVEIRA, V, p. 246). Mesma conclusão se aplica à sentença executiva “lato sensu”, cujo efeito auto executivo, no mesmo sentido, independente de pedido expresso para sua incidência prática.

[60] “Ao objeto do juízo postulado deve corresponder o objeto do juízo proferido, situação que implica, também a identidade relativamente aos demais elementos da ação: partes, causa de pedir e pedidos” (CARACIOLA, 2007, p 45).

[61] Neste sentido: DINAMARCO, 2017b, p. 327

[62] "A regra da congruência (ou correlação) entre pedido e sentença (CPC, 128 e 460) é decorrência do princípio dispositivo. Quando o juiz tiver de decidir independentemente de pedido da parte ou interessado, o que ocorre, por exemplo, com as matérias de ordem pública, não incide a regra da congruência. Isso quer significar que não haverá julgamento extra, infra ou ultra petita quando o juiz ou tribunal pronunciar-se de ofício sobre referidas matérias de ordem pública. Alguns exemplos de matérias de ordem pública: a) substanciais: cláusulas contratuais abusivas (CDC, 1º e 51); cláusulas gerais (CC 2035 par. ún) da função social do contrato (CC 421), da função social da propriedade (CF art. 5º XXIII e 170 III e CC 1228, § 1º), da função social da empresa (CF 170; CC 421 e 981) e da boa-fé objetiva (CC 422); simulação de ato ou negócio jurídico (CC 166, VII e 167); b) processuais: condições da ação e pressupostos processuais (CPC 3º, 267, IV e V; 267, § 3º; 301, X; 30, § 4º); incompetência absoluta (CPC 113, § 2º); impedimento do juiz (CPC 134 e 136); preliminares alegáveis na contestação (CPC 301 e § 4º); pedido implícito de juros legais (CPC 293), juros de mora (CPC 219) e de correção monetária (L 6899/81; TRF- 4ª 53); juízo de admissibilidade dos recursos (CPC 518, § 1º (...)" (NERY; NERY, R., 2007, p.669).

[63] “não obstante a sentença surja em resposta ao pedido formulado pelo autor, não pode o magistrado desconsiderar a resposta do réu na sua prolação, na medida em que ela conforma o pedido” (CARACIOLA, 2007, p. 149).

[64] Neste sentido: “Não há se falar em violação ao princípio da congruência, devendo ser aplicada à espécie a teoria da  substanciação,  segundo  a  qual  apenas  os  fatos   vinculam  o julgador,  que  poderá  atribuir-lhes  a  qualificação  jurídica que entender  adequada  ao  acolhimento  ou  à  rejeição do pedido, como fulcro  nos brocardos iura novit curia e mihi factum dabo tibi ius e no art. 462 do CPC/1973” (STJ, REsp 1442440/AC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, T1 - PRIMEIRA TURMA, DJe 15/02/2018).

[65] “É função do juiz sem se vincular sequer ao direito alegado pelas partes, a correta aplicação das regras” (OLIVEIRA, 2004, p. 235)

[66] “Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

[67] “Art. 493.  Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. Parágrafo único.  Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir”.

[68] Caso não seja a nulidade sanada, caberá ação rescisória.

[69] Os artigos mencionados concernem ao Código de Processo Civil revogado (Lei 5.869, 1973), equivalendo, em boa parte, aos artigos 141  e 492 do Código de Processo Civil em vigor (Lei 13.105, 2015).

[70] A sentença pode ser inexistente (se intrinsecamente inábil a produzir efeitos), ineficaz (se embora não nela não haja vícios está, ao menos momentaneamente, incapacitada de produzir os efeitos programados), ou nula (caso a incapacidade para produção de efeitos decorra de determinação legal e tenha por origem um vício intrínseco ou decorrente de ato processual anterior). Vale observar que a sentença só será nula se houver prejuízo e, ainda que este se faça presente, produzirá efeitos até que seja reconhecida a nulidade (reconhecimento que, em se tratando de nulidade relativa, dependerá de pedido da parte prejudicada).

[71] Há quem defenda ser a nulidade, em todo caso, absoluta (CARACIOLA, 2007).

[72] “se o juiz considerar outros fatos, não cogitados no processo e, ignorando os suscitados, julgar de acordo com  pretensão de uma das partes, sua sentença será “extra petita”’ (OLIVEIRA, p. 255).

[73] Neste sentido é o entendimento de Humberto Theodoro Junior (2016, p. 1083)

[74] O que decorrerá de expressa previsão legal ou do fato de a sentença atingir, inexoravelmente, relação de direito material conexa, como é o caso da sublocação que será extinta em caso de rescisão do contrato principal (locação).

[75] “infra petita” e “citra petita” são vocábulos sinônimos, embora não se ignore haver, como explica Vallisney de Souza Oliveira (2004), quem entenda ser “infra petita” a sentença de parcial procedência (que não padece de vício”) e “citra petita” a sentença viciada por falta de apreciação de parte da demanda.

[76] Há negativa de Jurisdição, o que implica em afronta ao artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal.

[77]  Em relação à falta de apreciação de fundamento fático a conclusão será diversa, como já antes visto.

[78] LEONEL entende, acompanhando boa parte da doutrina, que “a mitigação ao princípio da correlação na tutela coletiva é limitada pelo próprio demandante, em função da indicação na inicial da espécie de medida pretendida: a flexibilidade para a atuação judicial existe, nesse contexto, para o melhor atendimento do direito material, mas jungida à espécie de medida pela qual optou o autor” (2017, p. 396). Embora seja este entendimento corrente, o presente trabalho presta-se, justamente, a repensar tal conclusão, apontando a possibilidade de flexibilização da congruência também no que concerne ao provimento jurisdicional, até porque o autor coletivo não pode, vaçe sempre lembrar, dispor do direito material.

[79]  “A natureza da sentença, na ação civil pública, diante do conjunto dos artigos 11 e 13 da Lei n 7.347/85, é cominatória, ou melhor, voltada para a tutela específica de um interesse transindividual e não para a obtenção de uma condenação pecuniária” (LEYSER, 2007, p. 239).

[80] Sem se olvidar a maior possibilidade, em tais casos, de formulação de pedido genérico (item 3.2.1).

[81] Item 4.1

[82] “A exigência de proteção aos direitos metaindividuais permite, sem qualquer sombra de dúvida, a flexibilização dos limites da atuação jurisdicional” (CALDEIRA, 2006, p. 180).

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Sobre o autor
Thomaz Corrêa Farqui

Juiz de Direito. Mestre em Direito pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARQUI, Thomaz Corrêa. Princípio da congruência e ação civil pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5920, 16 set. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/75617. Acesso em: 18 abr. 2024.

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