Esse texto tem como objetivo ser informativo e ser um alerta, tanto para pessoas físicas como para pessoas jurídicas. E, antes de começarmos propriamente o desenvolvimento do mesmo, a resposta para a pergunta acima é afirmativa. Sim, a Pessoa Jurídica pode ser vítima de dano moral.
Mas, para se compreender essa questão, é necessário ter alguns conhecimentos sobre o tema do dano moral e, só então, essa resposta fará mais sentido. Para isso, faremos um breve estudo sobre o tema do dano moral e depois explicaremos como essa proteção é estendida à pessoa jurídica. Ao final, alertaremos sobre os cuidados que as partes devem ter para se evitar problemas em relação a esse tema.
1. O DANO MORAL
Nas palavras de Mello (2017, p. 592 – 593), antes da Constituição Federal de 1988, o dano moral tinha um caráter complementar ao dano material, ou seja, não se admitia a fixação de valores de indenização por dano moral exclusivamente. Houve também a súmula do 491 do STF que trouxe em 1969 a possibilidade de se indenizar o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado. Isso sinalizava a possibilidade de se ter indenização por dano moral, sem a presença necessária do dano material. Porém, só após a CF/88, com seu art. 5º, incisos V e X é que tivemos a instituição do dano moral independentemente de dano material conexo.
Sabendo que a possibilidade de reparação do dano moral ganha força com a Constituição Federal de 88, precisamos saber o que vem a ser o dano moral. Para responder essa pergunta, Tartuce (2019, n.p) diz que o dano moral é uma lesão aos direitos da personalidade, previstos nos arts. 11 a 21 do Código Civil.
Os direitos da personalidade são os direitos inerentes da pessoa natural ou jurídica, dotados de personalidade jurídica, que têm por objetivo promover a defesa da integridade física, moral e intelectual. Pode-se listar, como exemplo, o direito à vida, à integridade física, à imagem, à honra, aos alimentos e outros (CASSETTARI, 2018, p.i.). Como visto, muitos são esses direitos e todos eles estão tutelados, em caso de violação, pela indenização por danos morais.
Outro ponto que deve ser analisado sobre o dano moral é que, para a sua caracterização, é necessário ter (em regra) o ato que causa o dano; o dano em si; o nexo de causalidade e o dolo ou culpa do agente causador do dano. Deve-se pensar que, se um desses itens citados faltar no caso concreto, não se pode falar na configuração do dano, muito menos no dever de indenizá-lo.
Sobre o dano moral em face de pessoa jurídica, temos:
“A pessoa jurídica, entidade moral criada pela vontade do homem, desempenha inúmeras atividades e funções da pessoa natural. Embora não possa ser atingida na sua honra subjetiva, há agressões morais de cunho objetivo que atingem, sem dúvida, as entidades. No entanto, as repercussões serão sempre financeiras. Adiantando-se um pouco no curso de nossa investigação, é importante mencionar a esta altura que o art. 52 do novel estatuto civil menciona: “aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”. (VENOSA, 2017, p.i.).
1.1 HONRA OBJETIVO E SUBJETIVO
Como dito na citação acima, faz-se obrigatório entender o que seria a honra objetiva e honra subjetiva. Caso uma empresa sofra ataque em relação à sua honra objetiva, nascerá para ela o direito de uma reparação.
Tartuce (2019, p.i) também fala sobre o tema da seguinte forma:
“[...] como é notório, a pessoa jurídica pode sofrer dano moral, por lesão à sua honra objetiva, ao seu nome, à sua imagem diante do meio social. Esse é o entendimento que consta da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, e que também pode ser extraído do art. 52 do Código Civil em vigor, pelo qual se aplica à pessoa jurídica, no que couber, o disposto quanto aos direitos da personalidade. Em verdade, o dano moral da pessoa jurídica atinge a sua honra objetiva, que é a repercussão social da honra, sendo certo que uma empresa tem uma reputação perante a coletividade”.
Mais uma vez, fica claro que a pessoa jurídica tem sim direito à proteção de sua honra objetiva. Pelos textos colacionados acima, pode-se inferir que a honra objetiva é aquilo que os outros pensam da pessoa (seja natural ou jurídica). A doutrina penalista define melhor o tema da honra objetiva e subjetiva, por isso, pegaremos “emprestada” essa definição para melhor esclarecer:
Embora possamos identificá-los (os conceitos de honra subjetiva e objetiva), levando em consideração a relação de precipuidade, ou seja, onde a honra subjetiva, precipuamente, afeta o conceito que o agente faz de si mesmo, e a honra objetiva, também precipuamente, atinge a reputação do agente em seu meio social, não podemos considerá-las de forma estanque, completamente compartimentadas... Dessa forma, somente podemos considerar a distinção entre honra objetiva e honra subjetiva para identificar a classificação da figura típica, bem como para poder apontar, com mais segurança, o momento e consumação da infração penal pretendida pelo agente. (GRECO, Rogério, Direito Penal – Parte Especial, p. 364). (JusBrasil, 2019, online).
Assim, resta claro que, em situações onde se ataque a imagem e o nome que as pessoas tem de determinada empresa, é sim, possível, que se deva arcar com a reparação por danos morais.
2. SITES DE CONSUMIDORES E AS RECLAMAÇÕES:
As interpelações que são feitas em sites específicos de consumidores para reclamar sobre produtos e serviços podem ser realizadas. Não existe proibição nesse sentido. Mas o ponto crucial nesse tema é a razoabilidade. Reclamar de situações que ocorreram e, deixar claro, tudo de forma nítida, mas sem ofensa, é a maneira correta de utilizar esses meios de comunicação.
Basta fazer buscas nesses sites de reclamações de consumidores que serão vistas situações onde o consumidor, consumido por uma ira gigantesca, expõe seu problema e desfere vários xingamentos à empresa, fazendo ameaças de processos judiciais. Aí reside o problema. Quando se faz uma reclamação nesses moldes, o consumidor pode gerar à empresa o direito de buscar reparação por danos morais pela exposição negativa de sua imagem. Porém, se o consumidor demonstra sua indignação, mas da forma correta, sem expor demasiadamente a empresa, até as chances de se resolver o problema sem necessidade de buscar o Poder Judiciário, aumentam.
Como exemplo do que foi dito acima, é o julgado abaixo colacionado:
CIVIL. CONSUMIDOR. PESSOA JURÍDICA. DANO MORAL. HONRA OBJETIVA. VIOLAÇÃO. PUBLICAÇÃO EM REDE SOCIAL E EM SÍTIO DE RECLAMAÇÕES DE CONSUMIDORES. […] O excesso de linguagem em publicações nas redes sociais e sítios de reclamação de consumidores desborda da mera exposição do pensamento para tornar-se ofensa à honra objetiva, inobstante tratar-se de pessoa jurídica, amplamente divulgada na internet, com a intenção confessada de compeli-la a realizar sua vontade, configura dano moral. […] Embora a divulgação de uma reclamação na internet tenha uma abrangência que não se pode precisar o tamanho, as empresas que colocam produtos e serviços no mercado estão naturalmente sujeitas a críticas e reclamações. O que não se admite, e que efetivamente configurou o ilícito, é o excesso na linguagem apto a ofender indevidamente a reputação da pessoa jurídica de maneira significativa. (TJDFT – APELAÇÃO CÍVEL: APC 20140111789662 (DISTRITO FEDERAL, 2015, online).
Assim, com o julgado acima, não resta dúvidas que o consumidor tem o direito de reclamar pela má prestação do serviço ou de defeitos no produto. Porém, é essencial o cuidado na forma e na extensão dessa reclamação, sob pena de ter de arcar com o pagamento de indenização por danos morais à empresa.
O presente texto tem por objetivo informar, tanto o cliente/consumidor quando a empresa. O foco é fazer com que essas relações sejam o mais harmoniosas possível. Nesse ponto, saber dos direitos e obrigações de cada parte é necessário. Tendo em mente esses conceitos, cada um dos lados realizará, da melhor forma possível a sua parte na relação e o fim natural é que os litígios sejam diminuídos.
E a principal recomendação é: sempre que necessário, consulte um advogado para lhe auxiliar. Muitas das vezes, as pessoas acham que estão de posse de seu direito. Entretanto, é importante saber até onde vai o seu direito e a partir de onde você passa a entrar no direito do outro. O advogado é o profissional habilitado para lhe ajudar nessas questões. Portanto, procure o seu advogado de confiança para não exceder em suas manifestações e correr o risco de sofrer sanções decorrentes desse excesso. Importante lembrar que, dependendo do caso concreto, além da indenização por danos, o consumidor pode ter que responder por crimes como a calúnia e a difamação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASSETTARI, Christiano. Elementos de direito Civil – 6ª ed. - São Paulo : Saraiva Educação, 2018.
DISTRITO FEDERAL. TJDFT. APELAÇÃO CÍVEL. APC 20140111789662. Ministro Relator: Hecto Valverde Santanna. DJE: 28/07/2015. Publicado em: 15/07/2015. Disponível em: https://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/213626083/apelacao-civel-apc-20140111789662?ref=serp. Acessado em: 20/08/2019
JUSBRASIL. DIREITO À HONRA NO DIREITO BRASILEIRO VIGENTE. Disponível em: https://duaneds.jusbrasil.com.br/artigos/713488296/honra?ref=serp. Acessado em: 20/08/2019.
MELLO, cleyson de Moraes. Direito Civil: Parte Geral – 3ª Ed. - Rio de Janeiro : Freitas Bastos Editora, 2017.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil – v. 2 – 14 ed. Rio de Janeiro : Forense, 2019. Paginação irregular.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral – 17 ed. - São Paulo : Atlas, 2017. Paginação irregular.