Terceirização: da atividade meio à forma irrestrita no âmbito do direito do trabalho

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30/01/2020 às 16:11
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IV - DIREITO COMPARADO

Há uma verdadeira miscelânea de entendimentos internacionais quanto ao tratamento legal da terceirização por diferentes nações soberanas. Entre os países que proíbem, se destacam a Suécia (Lei n . 1.877/80), a Espanha (Decreto-Lei de 1952 e Decreto n. 3.677/70) e a Itália (Leis n. 264/49 e 1.369/60). Enquanto França (Lei1972), Alemanha, Dinamarca (Lei n. 114/70), Bélgica, Holanda (Lei n.379/65) permitem a terceirização a partir de regulamento próprio. Outros países sem qualquer legislação permitem a terceirização, como por exemplo, Grã-Bretanha, a Suíça, Irlanda e Luxemburgo. Seleciona-se a seguir um país de cada grupo acima discriminado para analisar como diferentes ordenamentos jurídicos enfrentam o assunto.

4.1. ESPANHA

Na Espanha o ordenamento jurídico – art. 43 do Estatuto dos Trabalhadores - coloca a empresa tomadora de serviço lado a lado com a empresa interveniente prestadora de serviço, atribuindo à ambos a responsabilidade solidária pelas obrigações de natureza salarial contraídas e pelas referente a Seguridade Social, até o ano seguinte ao da terminação do encargo. Assim, o tomador de serviço é obrigado a exigir da empresa interveniente a comprovação dos pagamentos devidos aos trabalhadores, para se liberar de responsabilidades e a intermediação de mão de obra é permitida apenas no trabalho temporário.

4.2. FRANÇA

A legislação francesa que, inclusive, serviu de inspiração para a edição da lei brasileira n. 6.019/74, não veda a intermediação de mão de obra, mas a exploração do trabalho (marchandage), ou seja, veda o abuso, a exploração do trabalhador, mas permite a terceirização lícita não abusiva. A Lei de 1972 e art. L1.251-1 e S. do Código de Trabalho. Na França, a Lei n. 72-1, de janeiro de 1972, que trata do trabalho temporário define como entrepreneur como empreiteiro ou empresário, pessoa física ou jurídica, que coloca à disposição dos tomadores as pessoas assalariadas que são remuneradas para um determinado fim. A jurisprudência consolidou o entendimento que o contrato de marchandage não é proibido, mas sim o seu abuso. Observa-se que a subcontratação tem sido utilizada até mesmo para as atividades-fim da empresa. A jurisprudência considera válida a terceirização desde que o poder de direção seja efetivamente do terceirizado.

4.3. ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

Fundada em 1919 para promover a justiça social, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) é a única agência das Nações Unidas que tem estrutura tripartite, na qual representantes de governos, de organizações de empregadores e de trabalhadores de 187 Estados-membros participam em situação de igualdade das diversas instâncias da Organização. A missão da OIT é promover oportunidades para que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade.

Para a OIT, o trabalho decente é condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável. Vale ressaltar que a Convenção n. 34 de 1933, e Convenção n. 96, de 1949, recomenda a supressão progressiva das agências de colocação de mão de obra com fins lucrativos, bem como, incentivam a criação de serviços públicos gratuitos com essa finalidade que também está inserida na Convenção n. 88 de 1948, e da Convenção n. 96, de 1968. No entanto, a Convenção n. 161 da OIT , aprovada pelo Decreto-Legislativo n. 86, de 14 de dezembro de 1989, e promulgada pelo Decreto n. 127, de 22 de maio de 1991, trata sobre serviços de saúde do trabalho, no art. 7 permite que sejam organizados para uma só ou para várias empresas, e também mostra que as empresas podem terceirizar as atividades de assistência médica.


V - CONCLUSÃO

Ao enfrentar a matéria em debate procurou-se, com cuidado, pesar sobre o fenômeno da terceirização valores que não permitem mais flertar com a ilegalidade, o abuso, e a irresponsabilidade. Ainda que flexível, deve haver nesses casos a responsabilidade solidária entre empresa terceirizada e tomadora. A Lei como está, se cumprida, em breve, as relações de emprego sofrerão um decréscimo agudo enquanto que as relações de trabalho, incluindo a informalidade seguirão, em um curto período, havendo aumento significativo, mas que, em um médio período, o desemprego pode voltar a crescer e de forma estrutural.

As alterações trazidas pela Lei n. 13.429/2017 na Lei n. 6.019/74 aumentaram o espectro da terceirização para alcançar a atividade principal sem restrição. Em seguida à decisão do STF, na ADPF n. 324 e no RE 958252, pela constitucionalidade da terceirização em atividade fim no ambiente privado, a Presidência editou o Decreto n. 9.507/2018 que estendeu a terceirização irrestrita para a Administração Pública, ainda sujeita a exame do STF. Faltou a Lei nova abordar a igualdade salarial entre empregado de empresa terceirizada e da tomadora de serviços, conforme estabelece para o trabalhador temporário, mas que, desde já, posicionou o entendimento em ser extensivo ao trabalhador em regime de terceirização. Por analogia, e por força do princípio da isonomia, deve-se aplicar o art. 461 da CLT, assim como o art. 12 da Lei n. 6.019/74, em consonância com a orientação jurisprudencial 383 da SBDI-1 do TST.


VI - REFERÊNCIAS

1. ALVES GIOVANI. Terceirização e Capitalismo no Brasil um par perfeito. Rev. TST, Brasília. Vol. 80, n. 3 jul./set 2014..

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2. BARROS. Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho, 11ª Edição. Ltr., Março, 2017.

3. BRASIL. Consolidação das leis do trabalho. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em

4. BRASIL. Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1972. Disponível em: .

5. CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. - 16ª Ed. – Rio de Janeiro: Método, 2018.

6. CASSAR, Vólia Bomfim. CLT Organizada. - 3ª Ed. – Rio de Janeiro: Método, 2019.

7. DELGADO, Gabriela Neves; AMORIM, Helder Santos. A ameaça da terceirização sem limites na administração pública e nas estatais. In

8. DELGADO. Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 16 Ed. São Paulo: LTr 2017.

9. DIESE. Terceirização e precarização das condições de trabalho. São Paulo – SP. Março.2017. Disponível em .

10. MARTINS, Sergio Pinto. Terceirização no direito do trabalho / Sergio Pinto Martins. – 15 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

11. MARTINEZ, Luciano, Curso do Direito do Trabalho. 8ª Edição. São Paulo. Saraiva, 2017

12. OIT. Organização Internacional do Trabalho. Convenção 161 da OIT Disponível em < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236240/lang--pt/index.htm>.

13. STF. Arguição De Descumprimento De Preceito Fundamental. ADPF n. 324 DF. Relator: Ministro Roberto Barroso. DJ:30/08/2018 Disponível em .

14. SUSSEKIND, Arnaldo. Convenções da OIT e Outros Tratados. Arnaldo Süssekind, 3ª edição. Ed. LTR, 2007. GLOSSÁRIO ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudo Sócioeconômico. RE – Recurso Extraordinário. OIT – Organização Internacional do Trabalho STF – Supremo Tribunal Federal. SBDI-1 – Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho. TST – Tribunal Superior do Trabalho

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Sobre o autor
Rafael Bicharra Barbosa

Profissional com solida formação e experiência desenvolvida na área jurídica, atuando diretamente no segmento do direito do trabalho e previdenciário

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Mais informações

O presente artigo busca apontar de maneira objetiva as alterações sofridas pelo instituto da terceirização de mão de obra nas relações de trabalho sob contexto da flexibilização das Leis Trabalhistas trazidas, em espécie, pelas Leis 13.429/2017, 13.467/2017 e Decreto 9.507/2018 com o intuito em demonstrar se há ganho em eficiência e melhoria na mão-de-obra com diminuição dos custos para empresa ou se, ao contrário, há a precarização das relações.

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