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Análise crítica sobre a nova Emenda Constitucional n. 105/2019

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28/02/2020 às 11:55
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3. A necessidade de regulamentação

As vantagens dos Governos Estaduais ou os Municípios poderem receber tais valores de forma mais célere e menos burocrática, e utilizá-los de forma mais discricionária, não significa dizer que isto, de fato, será melhor nem que trará mais benefícios à população, porquanto, na verdade, poderá desfavorecer, e muito, AS FORMAS DE CONTROLE e, portanto, o combate à corrupção.

Isso porque tais mudanças que desobrigam formalidades facilitam a possível malversação e desvio destas verbas públicas pelos entes beneficiados. Diminuem o controle e a vigilância sobre a execução e aplicação destes valores, da forma como se fazia antes da EC N.º 105/2019. Inclusive, retirou da competência federal a fiscalização de tais valores, que já detinha de sistemas, plataformas de acesso e fiscalização, de ferramentas e meios de controle disponíveis para acompanhamento do uso de tais recursos, repassando, agora, tal responsabilidade para as Cortes de Contas e órgãos de controle Estaduais e municipais. Estes, por sua vez, para darem conta desta nova atribuição precisam, rapidamente, adaptar-se, e regulamentar as suas formas de controle e atuação sobre tais recursos, a fim de que se tornem aptos à fiscalização, sem prejuízos para sociedade.

O que se percebe, portanto, é que a nova modalidade de TRANSFERÊNCIA ESPECIAL, criada com a Emenda Constitucional n.º 105/2019, vem desacompanhada de regras que estabeleçam, por exemplo, como passará a ser, a partir de então, a fiscalização e monitoramento das mesmas pelos órgãos de controle.

E, ainda, sem esclarecer dúvidas como:

a) quando, onde e como o Governador ou prefeitos deverão informar e prestar contas de tais repasses à Corte de Contas do Estado?;

b) quais valores estão recebendo de forma direta, mensalmente, através destas TRANSFERÊNCIAS ESPECIAL, diretamente nas suas contas do FPE e FPM, respectivamente?;

c) bem como, sobre em quê e onde irão aplicá-las e, também, onde deverão e de que forma deverão comprovar e prestar contas do que realmente utilizou de tais verbas e em que prazo?

d) como deverá ser avaliado se entes beneficiários cumpriram com os percentuais de uso e limites de gastos pré estabelecidos na emenda?

Essas dúvidas, assim como outras, portanto, devem ser, o quanto antes, esclarecidas e orientadas pelas Cortes de Contas e demais fiscalizadores, sob pena de permitirem que essas novas transferências entrem nas contas dos Estados e municípios, incorporando-se e misturando-se aos recursos do FPE ou FPM, sem qualquer controle ou possibilidade de fiscalização sobre seus gastos e aplicação, muito menos posterior e a destempo.


Conclusão

Ao analisar-se, portanto, as mudanças advindas com a promulgação da nova emenda EC N.º 105/2019, o que podemos concluir é que há uma necessidade, urgente e imprescindível de regulamentação sobre a mesma. Caso contrário, bilhões serão repassados da União, de forma direta, aos demais entes federados, sem maior controle, em pleno ano eleitoral, o que facilita a malversação de recursos públicos e contribui com o desequilíbrio eleitoral.

Corre-se o risco, também, de tal artifício vir a ser repetido nas demais esferas, já que, assim como os parlamentares federais criaram essa possibilidade, os Deputados Estaduais, dentro de seus Estados, ou Vereadores no âmbito municipal, poderão fazê-los se assim propuserem e aprovarem, com fulcro no princípio da simetria. E isso só aumentará o percentual e o valor de recursos públicos transferidos de forma descontrolada.


Referências:

-Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm > Acesso em 20 jan. 2020. ___.

-Decreto nº 6.170 de 25 de julho de 2007. Dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, e dá outras providências. Disponível em .Acesso em 20 jan. 2020. ___.

-Lei Complementar 101 de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em . Acesso em 20 jan. 2020. ___.

-Lei 4.320 de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e contrôle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4320.htm >. -Acesso em 20 jan. 2020. ___.

-. Portal de Convênios. Desenvolvido pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Disponível em < http://portal.convenios.gov.br/ >.Acesso em 20 jan. 2020. ___.

- Portaria Interministerial nº 507 de 24 de novembro de 2011. Estabelece normas para execução do disposto no Decreto no 6.170, de 25 de julho de 2007, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, revoga a Portaria Interministerial nº 127/MP/MF/CGU, de 29 de maio de 2008 e dá outras providências. Disponível em . Acesso em 20 jan. 2020. ___.

- Resolução nº 01 de 2006 do Congresso Nacional. Dispõe sobre a Comissão Mista Permanente a que se refere o § 1º do art. 166 da Constituição, bem como a tramitação das matérias a que se refere o mesmo artigo. Disponível em < Acesso em 20 jan. 2020. ___.

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- Sistema de cadastro de propostas Fundo a Fundo. Fundo Nacional de Saúde. Desenvolvido pelo Ministério da Saúde. Disponível em < http://www.fns2.saude.gov.br/fafweb/ >. Acesso em 20 jan. 2020. ___.


Notas

1 https://www2.camara.leg.br/legin/fed/rescon/2006/resolucao-1-22-dezembro-2006-548706-normaatualizada-pl.html

2 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc86.htm

3 https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8031764&ts=1573589709339&disposition=inline

4 https://www.i9treinamentos.com/parlamentares-devem-indicar-emendas-ate-4-de-fevereiro/

5 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/11245086/artigo-25-lc-n-101-de-04-de-maio-de-2000

6 https://www.siop.planejamento.gov.br/siop/

7 https://siconv.com.br/acesso-livre/

8 http://plataformamaisbrasil.gov.br/acesso-livre

9 http://www.portaltransparencia.gov.br/emendas/consulta?ordenarPor=autor&direcao=asc

10 https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/leis-orcamentarias/loa

11 https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/04/pec-da-eficiencia.shtml

12 http://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr/pec-que-preve-transferencia-direta-de-recursos-de-emendas-parlamentares-para-estados-df-e-municipios-fragiliza-o-combate-a-corrupcao

13 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc105.htm

14 https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/12/12/promulgada-emenda-que-permite-transferencia-direta-de-recursos-por-palamentares

15 https://www.cnm.org.br/cms/images/stories/comunicacao_novo/links/30042019_Parecer_AGU.pdf

16 https://www.cnm.org.br/cms/images/stories/comunicacao_novo/links/30042019_Parecer_AGU.pdf

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Sobre a autora
Débora Coelho Costa

Assessora da Procuradoria de Contas do MPC do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão (TCE-MA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Débora Coelho. Análise crítica sobre a nova Emenda Constitucional n. 105/2019. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6085, 28 fev. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/79664. Acesso em: 25 abr. 2024.

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