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Delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro

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15/03/2006 às 00:00
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5. DO INTERROGATÓRIO DO RÉU-COLABORADOR COMO MEIO DE PROVA.

5.1.Do réu-colaborador

Primeiramente necessário identificar o que é réu-colaborador.

Réu-colaborador é a pessoa que, identificada como sendo agente ativo em um delito, passa a figurar como pólo passivo da ação punitiva estatal. Segundo Mirabete, "o acusado é a pessoa contra quem se propõe a ação penal, ou seja, o sujeito passivo da pretensão punitiva, parte na relação processual. Só estão legitimadas a serem acusadas as pessoas que podem ser sujeitos passivos de uma pretensão punitiva já que a falta de capacidade penal produz, como conseqüência jurídico-processual, a ausência de legitimação passiva ‘ad causam’ na relação processual." [28]

Assim, colaborador é o réu que corrobora para a investigação criminal, fornecendo informações, indícios, que levem a identificação dos demais co-autores e na proteção do bem jurídico tutelado.

5.2.Dos indícios como meio de prova

Diferentemente do processo civil, busca o processo criminal a descoberta da verdade real dos fatos. Deve o Magistrado, portanto, a todo o momento buscar elementos que formem a sua convicção, não só esperar que as partes formem as provas, como no processo civil.

A convicção do Magistrado forma-se através dos inúmeros indícios constantes nos autos que, apresentados pelas partes, por peritos, ou buscado pelo próprio Juiz, servem para, unidos, formar sua convicção e decorrer a prolação da sentença ou condenatória, ou absolutória.

Neste sentido, Mittermaier ensina que "todas as vezes que um indivíduo aparece como autor de um fato, que é, por força de lei, de conseqüências aflitivas, e que se trata de lhe fazer a aplicação devida, a condenação repousa sobre a certeza dos fatos, sobre a convicção que se gera na consciência do juiz. A soma dos motivos geradores dessa certeza chama-se a prova." [29]

Segundo Julio Fabbrini Mirabette, "meios de prova são as coisas ou ações utilizadas para pesquisar ou demonstrar a verdade: depoimentos, perícias, reconhecimentos, etc. Como no processo penal brasileiro vige o princípio da verdade real, não há limitações dos meios de prova. A busca da verdade material ou real que preside a atividade probatória do juiz exige que os requisitos da prova em sentido objetivo se reduzam ao mínimo, de modo que as partes possam utilizar-se dos meios de prova com ampla liberdade. Visando o processo penal o interesse público ou social de repressão ao crime, qualquer limitação à prova prejudica a obtenção da verdade real e, portanto, a justa aplicação da lei. A investigação deve ser a mais ampla possível, já que tem como objetivo alcançar a verdade do fato, da autoria e das circunstâncias do crime." [30]

É a prova, portanto, a soma de elementos, motivos geradores de certeza, soma de indícios, que levam ao Magistrado a sua certeza.

Desde que lícitos, todos os meios de prova deverão ser buscados pelo juiz que prolatará a sentença. Assim, ensina a professora Ada Pellegrini Grinover, que "(...) a prova é proibida toda vez que caracterizar violação de normas legais ou de princípio do ordenamento de natureza processual ou material. [31]

Servirão os indícios, portanto, como meio utilizados pelas partes para buscar a verdade real.

Os indícios não poderão por si só basear a sentença condenatória. Provas concretas deverão ser fornecidas e os indícios servirão apenas para dar maior credibilidade a sentença.

Sem provas concretas da participação do réu no crime, deverá este ser absolvido, mesmo com a existência de indícios.

5.3 Da confissão

Segundo Fernando Capez, confissão "é a aceitação pelo réu da acusação que lhe é dirigida em um processo penal. É a declaração voluntária, feita por um imputável, a respeito de fato pessoal e próprio, desfavorável e suscetível de renúncia." [32]

Capez ainda explica que pode o réu em seu interrogatório além de confessar, atribuir a prática do crime a terceiro. É a delação. [33]

Mas o que nos interessa, é se o interrogatório do réu-colaborador serve como meio de prova.

É de conhecimento que ninguém é obrigado a produzir provas contra si, e o direito que tem o réu de manter-se calado sem que isso venha a lhe prejudicar é garantido no art. 5º, inciso LXIII da Constituição Federal.

Quando o acusado de um delito passa a colaborar com as investigações, fornecendo material que ajudará a formar o conjunto de indícios e a convicção do juiz, inevitavelmente estará produzindo provas que irão incriminar a si mesmo.

É natural do homem não produzir nada que possa prejudicá-lo. Nesse sentido, com a delação, o acusado estaria confessando a prática delituosa. Somente sua consciência e, a vista do prêmio oferecido pela colaboração com a justiça, convenceria-o produzir provas contra si mesmo.

Pode o interrogatório do acusado produzir provas que venha a incriminá-lo?

Parte da doutrina entende o interrogatório do acusado como sendo um meio de defesa, e não de prova.

Meio de defesa, pois é o interrogatório uma das oportunidades do acusado em demonstrar ao magistrado que não foi o autor do delito e/ou não participou para sua consumação. Baseados no princípio de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo, seria o interrogatório a própria defesa do acusado, na medida em que o juiz responsável formula as perguntas com base nas acusações que pesam sobre o réu.

Porém, se o réu confessa o crime; se além de confessar indica os outros participantes da prática delituosa, apontando o local onde se encontra o objeto do crime, apontando com clareza e convicção todo o modus operandi utilizado, estaria o réu no próprio interrogatório fornecendo matéria que integrará o conjunto probatório e auxiliará na produção de novas provas.

Assim, entende Mirabete que o interrogatório na verdade tem um caráter misto, entre meio de prova e de defesa: "inserida no Capítulo III, do Título VII (Da prova), deve-se considerar que, perante a nossa legislação, o interrogatório do acusado é meio de prova. Mas, como se observa agudamente na doutrina, não se pode ignorar que é ele, também, ato de defesa, pois não há dúvida que o réu pode dele valer-se para se defender da acusação, apresentando álibi, dando a sua versão dos fatos, etc. com fundamento na Constituição Federal de 1988, que consagra o direito do acusado de permanecer calado no interrogatório, e na legislação comparada, Fernando da Costa Tourinho Filho chega a afirmar que o interrogatório não é meio de prova e sim meio de defesa. Entretanto, mesmo quando o acusado se defende no interrogatório, não deixa de apresentar ao julgador elementos que podem ser utilizados na apuração da verdade, seja pelo confronto com provas existentes, seja por circunstâncias e particularidades das próprias informações prestadas. Mesmo o silêncio do acusado, se não pode ser interpretado em prejuízo do réu, pode fornecer ao juiz a convicção íntima para a condenação quando encontra amparo em outros elementos dos autos. Conceitualmente, portanto, o interrogatório, ato privativo do juiz que não sofre interferência das partes, é meio de prova e oportunidade de defesa do acusado. Tem, portanto, esse caráter misto afirmado pela doutrina dominante." [34]

Ainda nesse sentido, Paulo Heber de Morais e João Batista Lopes, afirmam que "o interrogatório, como ato processual, não tem o caráter de prova, mas pode fornecer elementos de prova, os quais, concorrendo com outros, podem influir na convicção do juiz." [35]

Prova é conjunto de motivos formadores da certeza.

Indícios são sinais, fontes que levam a indicação de uma prova.

São elementos que formam uma prova, pois na maioria das vezes, as provas não repousam em evidências materiais. Os indícios auxiliam o juiz na busca da verdade real e a formar na maioria das vezes seu convencimento. É óbvio que evidências materiais auxiliam o magistrado a formar sua convicção mais precisamente, dá-se maior confiança a sentença absolutória ou condenatória. Porém os indícios servem para auxiliar o magistrado em seu convencimento e, por vezes, dar credibilidade a uma prova material.

É tanto mais forte o indício quanto mais íntima sua relação com o fato, não havendo princípios inflexíveis sobre o valor da prova indiciária no processo. [36]

Como busca a verdade real, o Processo Penal não restringe a produção de provas, admitindo ampla investigação.

Não existe no Processo Penal uma valoração de provas. Pode o Magistrado valorar conforme sua intima convicção. Nada impede que a vista de uma prova material e de um indício, o Juiz opte por este último, desde que logicamente fundamentado.

Como se vê da própria Exposição de Motivos do Código Penal, todas as provas são relativas: nenhuma delas terá valor decisivo. Sendo assim, o Juiz deve, para formar sua convicção, examiná-las em conjunto e não isoladamente. [37]

Em seu interrogatório, o réu que colaborar fornecerá indícios. Esses indícios deverão ser posteriormente investigados pela autoridade competente, com fulcro a apurar a veracidade dos fatos alegados pelo réu-colaborador.

Segundo Capez, quando em seu interrogatório o réu além de confessar, aponta terceiros como co-autores, esse depoimento terá "valor de prova testemunhal na parte referente à imputação e admite reperguntas por parte do delatado." [38]

É por lógico que pelo simples fato de ter o réu-colaborador fornecido elementos indiciários, não fará jus a benesse da delação premiada. Partir-se-á para uma nova fase nas investigações. A de apurar a veracidade dos fatos.

Há de se tomar cuidado nesse sentido, pois poderá o acusado valer-se do instituto com o intuito de mudar o rumo das investigações, atrasando o descobrimento da verdade e escondendo os verdadeiros comparsas.

Deverá a investigação ser rápida, mantendo sempre o sigilo para que nada venha a atrapalhar o descobrimento da verdade.

Mesmo sendo considerado como meio de prova, não se valerá o Magistrado apenas do interrogatório do réu-colaborador para prolatar a sentença condenatória.

Como vemos, deverão os indícios por ele indicados serem apurados e, somente se verificado resultarem em verdades, produzindo outras provas que levem ao indiciamento dos demais co-autores poderá valer como prova o interrogatório do réu-colaborador.

Tem força como meio de prova, no mesmo sentido para fazer valer a confissão do acusado. Segundo Mittermaier, "a confissão do acusado, seu comparecimento voluntário, e mesmo o fato de espontaneamente se denunciar não pode satisfazer completamente. É preciso, em todos os casos, que do exame dos motivos que o impeliram a esse passo; que de todo o seu procedimento, e do modo concorde dos detalhes compreendidos na confissão com as demais provas; que da verossimilhança dessa confissão enfim, da probabilidade do crime, resulte para o juiz certeza completa; então, e só então, é que pode a confissão motivar uma condenação". [39]

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A simples delação do réu não poderá conduzir uma sentença condenatória, não poderá, nem ao menos, conduzir a uma ação penal.

Neste sentido, foi muito bem colocado pelo professor Mirabete que "na confissão pode ocorrer também a delação, ou seja, na afirmativa feita pelo acusado, ao ser interrogado em juízo ou na polícia, e pela qual, além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa. Trata-se de prova anômala, admissível, sem qualquer previsão ou regulamento legal. Segundo se entendeu nas ‘Mesas de Processo Penal’ da Faculdade de Direito da USP, coordenadas pela professora Ada Pellegrini Grinover, ‘o interrogatório de co-réu, incriminando outro, tem, com relação a este, natureza de depoimento testemunhal, devendo, por isso, se admitirem reperguntas’ (Súmula 65). Não há dúvida, porém, que a delação é de grande valor probatório, podendo servir de suporte para a condenação, principalmente quando harmoniosa e coerente, encontrando apoio na prova circunstancial. Além disso, a delação do co-réu tem relevância probatória quando não procura ele inocentar-se, máxime quando vem ela corroborada por outros elementos de convicção. Entretanto, só por si é insuficiente para se comprovar a responsabilidade do co-réu, pois, na hipótese de não se permitirem reperguntas no interrogatório, constituiria a condenação ofensa ao princípio constitucional do contraditório, consagrado no art. 5º, LV da Carta Magna, porque acolhe-se como elemento de convicção um dado probante sobre o qual o imputado não teve a mínima oportunidade ou possibilidade de participar." [40]

5.4. Do contraditório

Pelo princípio constitucional do contraditório as partes possuem o direito, por vezes o dever, de apresentar ao juízo sua tese contraposta a parte adversária.

O contraditório busca o equilíbrio entre as partes dentro do processo. Por ele, é garantido o direito da parte em apresentar sua tese de defesa, se contrapondo a acusação.

Segundo Luiz Francisco Torquato Avolio, "o princípio do contraditório, assim, corresponde ao princípio da igualdade das partes, dentro do processo, que terão as mesmas oportunidades de serem ouvidas, apresentar provas, e influir, enfim, no convencimento do juiz. Mas não se trata de uma mera identificação com a igualdade formal. A igualdade, no processo, é entendida modernamente no seu sentido substancial, de ‘par conditio’, ou paridade de armas; ou seja, como princípio de equilíbrio de situações, que se revelam recíprocas entre si, da mesma forma que se colocam, no processo penal, as atividades dos órgãos de acusação e de defesa." [41]

O interrogatório, entendido como momento oportuno para que o juiz entre em contato com o réu, e do próprio réu, em apresentar sua defesa pessoalmente, é baseado no princípio do contraditório.

Ocorre que, como foi visto anteriormente, pode o réu em seu interrogatório fornecer elementos de prova, então o caráter de meio de defesa do interrogatório se modifica, podendo entendê-lo agora como sendo o interrogatório como meio de prova.

Mas e quando o réu no próprio interrogatório, além de confessar a autoria delitiva ele imputa a terceiro a co-autoria, deve ser considerado a delação do co-autor como meio de prova?

A doutrina ainda não pacificou o entendimento quanto a este tópico.

Vê-se que, se entender que a delação realizada pelo réu-colaborador, na medida que as informações prestadas estejam de acordo com os demais indícios existentes nos autos, considerar-se-á como sendo válida. Faz ela prova ao processo.

Porém, poder-se-á entender que a delação não faz prova no processo criminal, pois não está garantido ao delatado o princípio do contraditório, em virtude de que até o momento da delação, em tese, o delatado não figura como pólo passivo da pretensão punitiva, não tendo sido citado e não tendo, portanto, a oportunidade garantida de acompanhar a formulação das provas que lhe pesam.

Assim entendendo, o interrogatório deve ser refeito quando o delatado então figurar como co-autor no processo criminal.

As duas teses são aceitas e a jurisprudência carece de detalhes a cerca de melhor entendimento, mas ao que pese as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, o interrogatório do réu-colaborador deverá bem como com as provas compiladas a partir desse seu depoimento refeitas, com fulcro a melhor garantia dos direitos inerentes ao acusado.

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Sobre o autor
Willian Patric Ferri

bacharel em Direito pelas Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu (UNIFOZ)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRI, Willian Patric. Delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 987, 15 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8104. Acesso em: 5 nov. 2024.

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