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Delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro

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15/03/2006 às 00:00
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6. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO PRÊMIO

A delação premiada em todos os crimes em que é prevista, possui determinados requisitos.

Não basta, portanto, que o acusado após acordo com o Ministério Público, fornecendo informações sobre o crime faça jus a minoritante.

Poderá o acusado utilizar do benefício com o simples intento de ludibriar os órgãos investigativos, indicando como elementos que participaram da atividade criminosa pessoas que na verdade não praticaram nenhum crime, com o simples propósito de vingança ou de mudar o curso das investigações, garantindo a impunidade de seus verdadeiros comparsas.

Para fazer direito ao benefício, as informações colhidas deverão ser investigadas e estar concatenadas com os demais indícios da ação penal. Se for o único indicio da ação penal, não terá força de prova.

Portanto, necessariamente ao crime de extorsão mediante seqüestro, o réu que tiver como propósito colaborar com a justiça, deverá identificar os demais co-autores ou partícipes da ação criminosa.

Neste requisito, dúvidas aparecem quando o réu-colaborador não identifica todos os co-autores ou partícipes. Deverá ser concedido o beneficio?

Não há previsão legal que auxilie na resposta.

Crê-se que havendo o desmantelamento da quadrilha ou bando, que seus integrantes fiquem impossibilitados de reunir-se para a prática de delitos, já se faz satisfeita a exigência legal.

Ainda o inciso III, do art. 13 da Lei 9.807, de 13 de julho de 1999 (Lei de Proteção as Vítimas e Testemunhas), prescreve que para angariar o benefício, o colaborador deverá auxiliar na recuperação total ou parcial do produto do crime.

Assim, nos crimes contra o patrimônio, se o réu indicar onde encontra-se o objeto do crime, e se suas informações levem ao seu efetivo resgate, mesmo parcialmente, já fará por merecer a benesse.

Por óbvio que tal requisito não se refere ao crime objeto deste trabalho.

A condição específica para a delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro é a libertação do seqüestrado.

O parágrafo 4º, do art. 159 do Código Penal, prescreve que "se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços".

Portanto, a delação premiada neste crime apresenta dois requisitos. O primeiro é que o crime tenha sido praticado em concurso de agentes. Como já visto anteriormente, o concurso de agentes fora inserido pela Lei nº 9.269/96. Não há necessidade que o delito tenha sido cometido por um bando ou quadrilha. Basta que o réu-colaborador tenha se reunido com no mínimo outra pessoa para já caracterizar o concurso, qual seja este um dos requisitos para a concessão do prêmio.

Com a redação anterior do parágrafo, se o delito fosse cometido por duas ou três pessoas, não caracterizava o disposto no artigo 288 do Código Penal, pois este dispositivo tipifica quadrilha ou bando como a associação de mais de três pessoas.

Assim, o concurso de agentes se dá pela simples união de duas ou mais pessoas com o fim de praticar crimes.

A última parte do parágrafo 4º diz respeito a "facilitação da libertação do seqüestrado".

Para a concessão do benefício, primordial que a colaboração do réu leve a eficaz libertação do agente passivo do delito, ou seja, a vítima do seqüestro deverá ser encontrada com sua integridade física preservada.

Neste sentido, Simone Moraes dos Santos, escreve que "a delação deve ser eficaz, isto é, deve proporcionar a libertação do seqüestrado. Se a libertação não ocorrer por qualquer motivo, o benefício não poderá ser aplicado, mas o juiz poderá considerar o fato como uma atenuante genérica". [42]

Por lógico que a integridade física preservada não quer dizer que a vítima deverá ser resgata sem nenhum arranhão. Porém, não se pode admitir que a vítima tenha sofrido lesões de grande monta. A prática de tortura durante o cativeiro também inibirá a concessão do benefício.

Como a extorsão mediante seqüestro caracteriza-se por ser um crime complexo, onde o bem jurídico tutelado além do patrimônio é a própria vida do agente passivo.

O Magistrado quando da análise do caso concreto deverá analisar a importância das informações cedidas pelo réu-colaborador para aplicação do benefício que, como já visto, poderá ser de 1/3 a 2/3. Ressaltando que, para fazer direito a benesse, deverá o réu fornecer informações que levem a libertação com vida do seqüestrado.

No seqüestro busca-se sempre, e porque não dizer, a todo custo, o resgate da vítima com vida.

E é este o motivo – a vida – o bem jurídico mais importante, que vislumbrou proteger o legislador quando inseriu a delação premiada no direito brasileiro.

Enfim, estando em concurso de agentes e tendo suas informações efetivamente auxiliado na libertação da vítima, o prêmio se faz direito subjetivo do réu-colaborador e não mais faculdade do juiz, que não poderá escusar-se a aplicar a medida mesmo se o crime teve grande repercussão social.


7. DA DELAÇÃO PREMIADA NOS DEMAIS DISPOSITIVOS LEGAIS.

A delação premiada não vem somente disciplinada no Código Penal, quando trata do crime de extorsão mediante seqüestro.

Aparece muitas vezes em diversos delitos, cada qual com características pertinentes.

7.1 Da delação premiada na Lei de Crimes Hediondos.

Encontra-se também prevista na Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990.

"art. 8º - Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços."

O caput do artigo 8º, aumenta a pena do crime de quadrilha ou bando, tipificado no artigo 288 do Código Penal, sendo que em seu parágrafo, dispõe sobre a delação premiada.

Para ser eficaz, e a delação fazer jus ao prêmio, deverá haver o desmantelamento de quadrilha ou bando, sendo que a benesse poderá ser concedida com a diminuição da pena de 1/3 a 2/3.

7.2 Da delação premiada na Lei do Crime Organizado.

A Lei nº 9.304, de 03 de maio de 1995, conhecida como "Lei do Crime Organizado" dispõe em seu artigo 6º:

"art. 6º - nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria."

Além de não conceituar o que seria organização criminosa, a Lei do Crime Organizado não trás nenhuma inovação nas conseqüências da delação premiada. Como nos demais delitos já vistos, o art. 6º traz apenas a redução da pena (1/3 a 2/3), sem perdão judicial.

7.3 Da delação premiada na Lei de Lavagem de Capitais.

Diariamente vemos na mídia o cometimento dessa modalidade crime. Com a lavagem de capitais, o agente procura tornar legal dinheiro proveniente de atividades ilícitas.

Devido a enorme incidência do delito e o impacto que causa a economia, a Lei 9.613, de 03 de março de 1998 inovou, trazendo em seu bojo a possibilidade da fixação do regime aberto na pena, bem como a possibilidade do perdão judicial.

"art. 1º. Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

(...)

§5º. A pena será reduzida de um a dois terços e começara a ser cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direito, se o autor, co-autor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimento que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

7.4 Da delação premiada na Lei de Proteção às Vítimas e Testemunhas.

A delação prevista na Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, não é específica a nenhum crime. Poderá, portanto, o acusado de qualquer crime, desde que primário e depois do Magistrado analisar sua personalidade, a repercussão social do fato criminoso e sua gravidade, conceder desde a simples redução da pena, até o perdão judicial.

"Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:

I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;

II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

III – a recuperação total ou parcial do produto do crime.

Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso."

Continua o art. 14 do mesmo diploma legal:

"Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá a pena reduzida de um a dois terços".

Vale salientar que, para concessão do perdão, deverá o réu-colaborador ser primário. No caso de ser reincidente, poderá ter a pena reduzida se da mesma forma preencher os requisitos expostos nos artigos acima.

7.5 Da delação premiada na Lei de Tóxicos

A Lei nº 10.409, de 11 de janeiro de 2002, disciplina sobre o trafico ilícito de entorpecentes. Nos parágrafos 2º e 3º do art. 32, disciplina a delação premiada:

"Art. 32 (vetado)

§1º (vetado)

§2º O sobrestamento do processo ou a redução da pena podem ainda decorrer de acordo entre o Ministério Público e o indiciado que, espontaneamente, revelar a existência de organização criminosa, permitindo a prisão de um ou mais dos seus integrantes, ou a apreensão do produto, da substância ou da droga ilícita, ou que, de qualquer modo, justificado no acordo, contribuir para os interesses da Justiça.

§3º Se o oferecimento da denúncia tiver sido anterior à revelação, eficaz, dos demais integrantes da quadrilha, grupo, organização ou bando, ou da localização do produto, substância ou droga ilícita, o juiz, por proposta do representante do Ministério Público, ao proferir a sentença, poderá deixar de aplicar a pena, ou reduzi-la, de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), justificando a sua decisão."

Segundo Thales Tácito Pontes Luz de Pádua Cerqueira, "com o advento da nova Lei de Tóxicos (Lei nº 10.409/02, artigo 32, §2º), é permitida uma espécie de transação penal ‘sui generis’ entre Ministério Público e o traficante delator: trata-se de acordo de ‘sobrestamento do processo’, que somente pode ocorrer se a delação eficaz for antes do oferecimento da denúncia. Este ‘sobrestamento do processo’, apesar da falta de técnica, pois o correto seria ‘sobrestamento do inquérito policial’, uma vez que ‘processo’ para o legislador é no sentido lato (engloba o inquérito), corresponde a pedido de arquivamento do inquérito policial, excepcionando o principio da obrigatoriedade da ação penal pública, bem como o acordo para redução da pena. Para isso o indiciado deve espontaneamente revelar a existência de organização criminosa, permitindo a prisão de um ou mais dos seus integrantes, ou a apreensão do produto, da substância ou da droga ilícita, ou que, de qualquer modo, justificado no acordo, contribuir para os interesses da Justiça. Todavia, se o oferecimento da denúncia tiver sido anterior à revelação eficaz dos demais integrantes da quadrilha, grupo, organização ou bando, ou da localização do produto, substância ou droga ilícita, enfim, se a delação eficaz ocorrer depois de oferecida a denúncia, o juiz, por proposta do representante do Ministério Público, ao proferir a sentença, poderá deixar de aplicar a pena (perdão judicial), ou reduzi-la de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), justificando sua decisão". [43]

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8. CONCLUSÃO

Através da Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90), o legislador brasileiro começou a traçar um novo desenvolvimento para a colheita de provas no processo criminal: a delação premiada.

O Estado, portanto, admite a deficiência de seus órgãos para uma investigação precisa e busca ajuda ao co-autor do delito, para o qual garante descontos na pena e até o perdão judicial como prêmio pela colaboração.

Nota-se que apesar dos esforços legislativos em adotar políticas criminais, não se resolve o problema do crime no Brasil. Ao contrário, vemos a cada dia a criminalidade aumentar em passos largos.

Não é com medidas legislativas de caráter político/penal que o crime irá diminuir no país. O problema do crime é social, político. Somente com medidas eficazes de caráter social que poderá ocorrer a diminuição da criminalidade crescente.

E não é o tamanho da pena que inibe o indivíduo a praticar um delito, mas sim a certeza da punição, pois por mais branda que seja a reprimenda, mas se for consciente da aplicação da pena, o indivíduo é compilado a não praticar o crime.

A delação premiada surge como meio para suprir essa deficiência social do Estado, o qual mais uma vez aplica medidas legislativas na tentativa de diminuir a criminalidade.

Apesar das vantagens processuais que notoriamente a delação apresenta, pois ninguém melhor do que o próprio réu para saber qual o modus operandi da quadrilha ou bando, seus integrantes e demais elementos que levem a verdade real dos fatos, parte da doutrina entende o instituto como anti-ético.

Estaria o Estado incentivando a sociedade a delatar, ato este recriminável do mais culto indivíduo até o mais vil dos criminosos.

No que concerne a delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro, vemos que se o Estado não pôde evitar o delito, a medida apresenta-se eficaz para seu combate posterior.

Na extorsão mediante seqüestro o bem maior a ser protegido é a vida. Qualquer medida que vise a garantia da vida deve ser tomada nestas circunstâncias.

Se é garantido ao indivíduo a legítima defesa, mesmo tendo que, por exemplo, tirar a vida de outra pessoa para garantir a sua, nada mais coerente o Estado utilizar-se do instituto da delação premiada para proteger a vida da vítima de seqüestro.

Na medida em que o bem maior protegido no caso do crime de extorsão mediante seqüestro é a própria vida da vítima, estaremos a vista de um delito que, ao que pese, deverá ter todas as medidas buscadas para o seu término.

Na maioria dos inúmeros casos em todo o país, somente o réu que participou do seqüestro pode afirmar onde a vítima se encontra, se está viva ou não e como fazer para resgatá-la.

Não se vê coerência nas afirmações de que não poderá se valer do instituto, pois estaremos enfrentando um problema ético. Não se vislumbra ética quando o bem protegido é a vida. Ainda mais nas circunstâncias apresentadas por parte da doutrina que entende a delação premiada como instituto que insita a sociedade a trair.

A delação premiada só veio a acrescer e auxiliar os meios de investigação na apuração e, no tocante ao delito de extorsão mediante seqüestro, o resgate da vítima com vida e com sua integridade física preservada.

Por conseguinte, poderá ainda ser preservado o patrimônio da vítima, que estaria sendo resgatada sem o pagamento do exigido pelos criminosos e, no caso de já ter sido pago o resgate, a devolução do valor ou de parte deste, ensejaria a valoração para maior da benesse.

Dúvidas surgem apenas quanto ao interrogatório do réu-colaborador.

Poderá valer sim como fonte de prova, na medida que os indícios apresentados pelo réu confirmem provas já elencadas ou produzam novas provas que auxiliarão no desfecho rápido e eficiente do delito.

Porém, tais provas não poderão valer para a prolação de sentença condenatória dos demais co-autores, se não lhes for garantido o direito constitucional do contraditório.

Dever-se-á, portanto, chamar os co-autores ao processo, e produzir todas as provas novamente, com o intuito de garantir a igualdade das partes e proteger o princípio do contraditório, a vista de que não poderá defender-se, em tese, o réu que não tinha conhecimento das acusações que a si estavam sendo imputadas. Mas vale ressaltar que a doutrina não é pacífica nesse sentido.

Na valoração do interrogatório, o Magistrado deverá analisar todos os termos do que fora delatado pelo réu-colaborador para a concessão da benesse.

Se configurado a consumação do delito em concurso de agentes e se as informações prestadas foram eficazes na libertação da vítima, no tocante ao crime de extorsão mediante seqüestro, o réu-colaborador já faz direito ao benefício, o qual deverá ser concedido.

Mesmo com a comoção social que eventualmente o seqüestro ocasiona, o que poderia fazer com que o Juiz condene o réu sem conceder-lhe a delação premiada, trata-se de direito subjetivo do réu e deverá ser dado o prêmio.

Deverá o Magistrado, portanto, verificar a importância das declarações para o desfecho do delito na dosimetria da pena. O prêmio poderá ter como desconto até 2/3 da pena, sendo que em alguns crimes poderá, inclusive, haver o perdão judicial.

Para o delito em tela, onde – frisa-se – o bem protegido, dentre outros, é a vida da vítima, aparece a delação premiada como excelente meio para a obtenção de provas que visem o resgate.

Mas, para ter eficácia, deverão ser tomadas medidas para a proteção do réu-colaborador, o qual fica a mercê da vingança dos demais co-autores do delito.

O instituto está posto. A Lei de Proteção às Vítimas e as Testemunhas está vigente. Basta aplicá-los.

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Sobre o autor
Willian Patric Ferri

bacharel em Direito pelas Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu (UNIFOZ)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRI, Willian Patric. Delação premiada no crime de extorsão mediante seqüestro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 987, 15 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8104. Acesso em: 5 nov. 2024.

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