Observo o artigo 57, parágrafo quarto da CF:
Art. 57. O Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 50, de 2006)
§ 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 50, de 2006).
Por sua vez, na linha da norma paratípica, a norma típica secundária, Regimento Interno do Senado, no artigo 59, assim determina:
“Os membros da Mesa serão eleitos para mandato de dois anos, vedada a reeleição para o período imediatamente subsequente”.
Possibilita-se a recondução para membro da mesa, desde quando seja para outro cargo diverso do que o parlamentar ocupava antes.
Tal recondução era vedada na ordem constitucional pretérita. A Constituição atual permitiu, na sua redação primeira. O Supremo Tribunal Federal decidiu pela impossibilidade de recondução para o mesmo cargo de eleição imediatamente subsequente (RTJ, 119: 964 e 163: 52).
O Supremo Tribunal Federal também entendeu que “a norma do parágrafo quarto do artigo 57 da CF, que, cuidando da eleição das Mesas das Casas Legislativas federais, veda a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente, não é de reprodução obrigatória nas Constituições dos Estados-membros, porque não se constitui num princípio constitucional estabelecido (STF, RTJ, 163: 52).
A Constituição e o regimento do Senado impedem que membros da Mesa Diretora sejam reeleitos na mesma legislatura, ou seja, no período de quatro anos entre duas eleições gerais. Isso é claro, diante dos princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e, ainda, o republicano, um princípio democrático por excelência.
No entanto, divulgou o site Antagonista (7 de fevereiro de 2020) o que segue:
“Para ficar mais dois anos na presidência do Senado, porém, Alcolumbre tirará da manga, no momento que considerar oportuno, um parecer da Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) datado de novembro de 1998, que levanta a possibilidade de reinterpretação do texto constitucional e da norma interna.”
Para tanto, pensam em ressuscitar o parecer 555, que dá interpretação permissiva a tal reeleição, baseando-se, inclusive, em que as funções exercidas na Mesa Diretora — incluindo a de presidente, claro — como de “natureza executiva”, e não de “legislativa”. “É função de direção, supervisão, polícia, administração e execução. Em tudo, e por tudo, se afigura função executiva e administrativa”, diz trecho do parecer. Sendo assim, uma vez que o sistema republicano havia passado a permitir a reeleição de titulares do Poder Executivo um ano antes, em 1997, “não haveria mais razão doutrinária” para impedir a reeleição de presidentes do Senado, ainda que na mesma legislatura.
O ressurgimento da ideia de permitir a reeleição dos atuais presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados atesta o baixo apreço da classe política pela longevidade das normas. Um desvio, de resto, encontradiço até no Supremo Tribunal Federal, cujo vaivém de decisões desvaloriza a missão de resguardar a fortaleza constitucional, como bem acentuou Editorial da Folha, em 24 de agosto do corrente ano.
O Supremo Tribunal Federal tem uma oportunidade para impedir a concretização de tal entendimento.
O PTB representou ao STF para que este consagre o veto à reeleição dos presidentes parlamentares em qualquer situação, não só na legislatura presente.
É claro que, no quadro da política brasileira, poderá haver insondáveis interesses por detrás dessa iniciativa no processo constitucional.
Bem lembrou Rafael Tomas de Oliveira (Republicanismo deve reger eleições municipais para a mesa diretora de câmara municipal in Consultor Jurídico, 23 de janeiro de 2016), que o princípio republicano, destacado logo no caput artigo 1º da Constituição Federal de 1988, possui densidade normativa, devendo vincular os poderes constituídos em todas as esferas de governo (federal, estadual e municipal).
Ainda nessa linha de raciocínio, tem-se que o princípio republicano exige a alternância de poder.
É igualmente elemento normativo do princípio republicano a alternância no poder. As repúblicas modernas, que se organizam por meio do regime democrático, devem possuir, institucionalmente, mecanismos que possibilitem a troca da pessoa ou grupo que, transitoriamente, detém o exercício do poder político (em qualquer dimensão ou esfera de governo), sob pena de criar-se uma espécie de regime dinástico, aristocrático ou oligárquico que coloque a república apenas como símbolo político-jurídico, como ainda disse Rafael Tomas de Oliveira, naquele artigo citado.
E conclui aquele autor:
“É igualmente elemento normativo do princípio republicano a alternância no poder. As repúblicas modernas, que se organizam por meio do regime democrático, devem possuir, institucionalmente, mecanismos que possibilitem a troca da pessoa ou grupo que, transitoriamente, detém o exercício do poder político (em qualquer dimensão ou esfera de governo), sob pena de criar-se uma espécie de regime dinástico, aristocrático ou oligárquico que coloque a república apenas como símbolo político-jurídico.”
Afinal, há deveres de proteção à Constituição, como revelou Canaris(Direitos Fundamentais e Direito Privado. Coimbra: Almedina, 2009).
As casas legislativas da República têm um compromisso republicano de forma que tal pretensão nociva de reeleição fere princípios constitucionais nucleares e deve ser objeto de confrontação dentro das formas que a Jurisdição constitucional permite.