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O relatório conclusivo de investigação policial pelo delegado e seu valor probatório

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DA TIPIFICAÇÃO PENAL (INFRACIONAL) DA(S) SUPOSTA(S) CONDUTA(S) EM SEDE DE RELATÓRIO CONCLUSIVO (OU DE FINALIZAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL)

A Lei 12.830/2013 restou claro que o ato de indiciamento é ato privativo do Delegado de Polícia de carreira, logo, para o indiciamento é necessário o mínimo de motivação, ainda que de maneira sucinta e apoiado as premissas fáticas do próprio relatório, sem necessário esgotamento, mesmo porque não é essa a ideia e nem a finalidade do relatório.

O Manual de Polícia Judiciária em seu ensinamento aborda como possível a Autoridade Policial inserir opiniões ou impressões pessoais, assim como obras doutrinárias e jurisprudenciais, mesmo porque o indiciamento exige fundamentação e apontamentos. A propósito, confira:

“(...) o relatório, peça técnica com forte conteúdo subjetivo, nada impedindo que nele sejam inseridos opiniões ou impressões pessoais, doutrinárias é até jurisprudenciais, determinando o juízo de valor da autoridade policial e que servem para indicar as razões do seu convencimento sobre o término do inquérito policial” (Manual de Polícia Judiciária. 6ª edição. 2012. p. 59).

Neste pensar, não se pode vedar ao delegado de polícia avaliar os elementos probatórios e informativos angariados com as suas impressões (juízos) e para tipificações dentro da análise dos indícios de autoria, materialidade e circunstâncias, com indiciamento ou não da pessoa investigada.

Com isto num relatório policial conclusivo de investigação, os indícios de autoria e materialidade delitiva e circunstâncias com a tipificação penal deverão ser demonstrados (ou não se for o caso de não indiciamento ou imputação) e havendo, por exemplo provas citadas com exposições ou elementos informativos no corpo do relatório, indiscutivelmente este relatório trará em si uma carga probatória ou informativa, a depender da circunstância.

Em reforço a nossa argumentação do que já foi dito em linhas passadas, calha registrar que não existem palavras inúteis no texto de lei, e quando o legislador ordinário federal fez esta previsão do Delegado de Polícia por “ato fundamentado da análise técnico-jurídico do fato” (art. 2º, § 6º) levou a obrigatoriedade do enfrentamento de forma motivada dos elementos postos colhidos no curso da investigação, reclamando a análise e apontamentos da Autoridade Policial se estariam presentes os indícios de autoria, materialidade delitiva e circunstâncias para fins de indiciamento ou não, dentro do acervo probatório e informativo.

Portanto, qualquer tentativa de alijar este alcance de atuação[7] do Delegado de Polícia deve ser repelida, pois não é dado ao intérprete restringir aquilo que o legislador ordinário conferiu por lei a este agente público no exercício do seu múnus. Aliás, não faz sentido obstruir o delegado de polícia que tem a dominus investigatio para atuar com isenção, imparcialidade e dentro da bidirecionalidade que se presta o inquérito policial na visão contemporânea – que deve ser desgarrada da doutrina clássica e conservadora classista.


DA INSERÇÃO NO CORPO DO RELATÓRIO POLICIAL CONCLUSIVO (OU DE FINALIZAÇÃO) DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL PELO DELEGADO DE POLÍCIA DE PROVAS, VÍDEOS, E ELEMENTOS INFORMATIVOS

Não raras vezes, zelosos delegados de polícias carreiam para o bojo do próprio relatório conclusivo provas e elementos informativos.

Deste modo, na circunstância em que há inserção no corpo do relatório policial conclusivo (ou de finalização) de investigação pelo delegado de polícia de provas, vídeos e elementos informativos, não há dúvidas da força probante e informativa do relatório policial de finalização investigativa da autoridade policial no inquérito policial e autos apuratórios de ato infracional. Neste diapasão, não se pode vedar ao delegado de polícia avaliar os elementos probatórios e informativos angariados com as suas impressões e para tipificações dentro da análise dos indícios de autoria, materialidade e circunstâncias, com indiciamento ou não.


DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em conclusão, temos para nós que é possível prestar valor probatório e informativos ao relatório conclusivo (ou de finalização) de investigação policial pelo delegado de polícia no procedimento policial na persecução penal, mormente na circunstância em que há inserção no corpo do relatório policial conclusivo (ou de finalização) de investigação pelo delegado de polícia de provas, vídeos, e elementos informativos. Nestas situações não há dúvidas da força probante e informativa do relatório policial de finalização investigativa da autoridade policial no inquérito policial e autos apuratórios de ato infracional. Neste diapasão, não se pode vedar ao delegado de polícia avaliar os elementos probatórios e informativos angariados com as suas impressões e para tipificações dentro da análise dos indícios de autoria, materialidade e circunstâncias, com indiciamento ou não.

Por fim, os delegados de polícia e os demais atores da persecução penal devem entender de uma vez que o relatório conclusivo (ou de finalização) de investigação policial é de extrema importância e deve ser tratado com seriedade e com zelo.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ARAÚJO, Fábio Roque; COSTA, Klaus Negri. Processo Penal Didático. Salvador: JusPodivm. 2020.

AVENA, Norberto Cláudio Pêncaro. Processo penal: esquematizado – 7.ª ed. – Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2015.

BRASIL, STF, HC 87662, Rel. Min. Carlos Brito, j. 5/9/2006.

COSTA, Adriano Souza; SILVA, Laudenina Inácio. Prática Policia Sistematizada. Impetus. 2016.

CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. ACADEMIA DE POLÍCIA. Juízos de prognose e diagnose do delegado são essenciais na investigação. Site CONJUR. Publicado em 9 de agosto de 2016. Disponível em:<<http://www.conjur.com.br/2016-ago-09/academia-policia-juizos-prognose-diagnose-sao-essenciais-investigacao.>> Acessado em 24 de outubro de 2016.

CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Investigação e acusação não são regidas pelo in dubio pro societate. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: /www.conjur.com.br/2019-set-25/academia-policia-investigacao-acusacao-nao-sao-regidas-in-dubio-pro-societate. Acesso em 06 de junho de 2021.

GOMES, Amintas Vidal. Manual do Delegado. 9ª ed. Método. 2015.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal: Volume Único. 2ª Edição, revista, ampliada e atualizada. Salvador: Editora Juspodivm, 2014.

JÚNIOR LEITÃO, Joaquim; CARVALHO, Tristão Antônio Borborema de. O nível de cognição do delegado de polícia relativo à profundidade de análise nas deliberações em situações flagranciais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6542, 30 maio 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/90725. Acesso em: 20 jun. 2021.

PACELLI, Eugênio de Oliveira. Curso de Processo Penal. 7ª ed. Belo Horizonte. Del Rey, 2007.

SILVA, Márcio Alberto Gomes. Processo Penal Para Carreiras Policiais. 6ª ed. Salvador: Juspodivm. 2021.

Site: dicio.com.br. Acesso em 17/06/2021.


[1].      Aquelas provas essencialmente realizadas na fase investigatória que materialmente seria impossível à reprodução e repetição durante a fase processual da ação penal.

[2].Art. 7º, inciso XXI, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil:

“[...]

XXI – assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração: a) apresentar razões e quesitos.”

[3] “Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir defensor. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

§ 1º Para os casos previstos no caput deste artigo, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

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§ 2º Esgotado o prazo disposto no § 1º deste artigo com ausência de nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)”

[4] Nesta direção, oportuna faz a citação do delegado de polícia Leonardo Marcondes Machado: “Agora o que deve ficar claro é que existem limites cognitivos entre as fases, ou melhor, que o grau ficou com emissão da instrução preliminar não pode ser do mesmo do processo penal (... ) a investigação parte de um juízo de possibilidade para análise de uma probabilidade delitiva.  O processo por sua vez, se inicia tem um juízo limitado de probabilidade e apenas poder, ao final, redundar em decreto condenatório se restar comprovada a procedência da imputação acusatória em ´um elevado ou elevadíssimo grau de probabilidade´ (ou certeza relativa).  O que também expresso por alguns como “para além da dúvida razoável”. (MACHADO, 2020, p. 22).

Comugando deste posicionamento, o delegado de polícia, Henrique Hoffmann Monteiro de Castro, em precisa análise aborda que: “Do estado de inocência decorrem duas regras básicas:[1] (a) a regra probatória segundo a qual a dúvida na persecução criminal milita em favor do réu (in dubio pro reo), e (b) a regra de tratamento de acordo com a qual a prisão cautelar configura exceção.

Quanto à regra probatória, grande parte dos estudiosos limita sua incidência após a deflagração do processo penal (depois do recebimento da acusação), a fim de que o magistrado faça, no momento da sentença, a valoração da prova.

Contudo, a valoração da prova ocorre também nos momentos anteriores à sentença, a saber, instauração ou não do inquérito policial, indiciamento ou não indiciamento, oferecimento da denúncia ou requerimento de arquivamento, e recebimento ou não da denúncia. E nessas fases costuma-se falar em princípio do in dubio pro societate como suposta variação da regra probatória penal (...) Embora não se tenha alcançado um consenso quanto ao significado preciso dos standards probatórios, podemos falar em prova crível, prova preponderante e prova para além de dúvida razoável, para exprimir respectivamente o juízo de possibilidade, juízo de probabilidade e juízo de certeza necessários nas diferentes fases da persecução criminal (...) (CASTRO, 2019, p. 1).

Em seguida, o delegado Henrique Hoffmann Monteiro de Castro arremata: “O que precisa ficar claro é que, havendo dúvidas sobre a existência de indícios mínimos de materialidade e autoria, não se deve instaurar o inquérito policial. E se for incerta a presença de indícios veementes do crime e de seu autor, o indiciamento e a acusação não devem ser feitas. A dúvida, portanto, continua beneficiando o imputado, por aplicação do in dubio pro reo” (CASTRO, 2019, p. 1) [grifos nossos].

[5] Vale pontuar que, a natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz é polêmica, havendo doutrinadores defensores da classificação como (i) causa pessoal de extinção da punibilidade (ex: Zaffaroni), (ii) causa de exclusão da culpabilidade (ex: Claus Roxin), prevalecendo, porém, na doutrina e jurisprudência pátria a concepção de que são verdadeiras (iii) causas de exclusão da tipicidade.

[6] No sentido de que não cabe ao juiz determinar à autoridade policial o indiciamento formal de investigados: STF, 2ª Turma, HC 115.015/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 27/08/2013; STJ, 5ª Turma, RHC 47.984/SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 04/11/2014.

[7] No prisma de avaliar os elementos probatórios e informativos angariados com as suas impressões (juízos) e para tipificações dentro da análise dos indícios de autoria, materialidade e circunstâncias, com indiciamento ou não da pessoa investigada.

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Sobre os autores
Joaquim Júnior Leitão

Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso. Atualmente lotado no Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO). Graduado pela Centro de Ensino Superior de Jataí-GO (CESUT). Ex-Diretor Adjunto da Academia da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso. Ex-Assessor Institucional da Polícia Civil de Mato Grosso. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colaborador do site jurídico Justiça e Polícia.

Tristão Antônio Borborema de Carvalho

Delegado de Polícia no estado do Paraná desde o ano 2008. Ex-Delegado de Polícia Civil do estado de São Paulo (aprovado em primeiro lugar). Professor concursado de Direito Penal da Academia de Polícia Civil do estado de São Paulo: ACADEPOL. Graduado em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Especialista em Gestão em Segurança Pública pela Escola Superior de Polícia Civil do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JÚNIOR LEITÃO, Joaquim ; CARVALHO, Tristão Antônio Borborema. O relatório conclusivo de investigação policial pelo delegado e seu valor probatório. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6582, 9 jul. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91379. Acesso em: 25 abr. 2024.

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