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Da prisão e da prisão preventiva: o papel do julgador

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24/10/2021 às 14:15
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5. A ATUAÇÃO DO JULGADOR NA DECRETAÇÃO DA PREVENTIVA

O juiz assume uma nova posição no processo no Estado Democrático de Direito, e sua legitimidade de atuação não é política, mas, sim, constitucional, sempre baseada na função protetora dos direitos fundamentais de todos e de cada indivíduo, mesmo que isso possa parecer estranho aos que comungam pelo ativismo ou pelo decisionismo judicial.

Dessa forma, o magistrado deve tutelar a pessoa e reparar as injustiças. Portanto, tem o dever constitucional de absolver quando não houver provas plenas e legais. Do mesmo modo, tem o dever de não antecipar decisões sem provas nem mandar encarcerar por conveniências pessoais. A liberdade do julgador deve ser a liberdade nos limites do respeito à lei, sem espaços para às decisões discricionárias ou arbitrárias. Neste sentido, diz Tourinho Filho (2015):

Assim, a prisão preventiva decretada para garantir a ordem pública inviabiliza o controle do instituto por parte do seu destinatário e permanece ao sabor da discricionariedade de seu interprete. No bem da verdade, da forma que o instituo está colocado na legislação brasileira, revela-se como um campo fértil para o cometimento de arbitrariedades, tornando-se uma verdadeira “carta coringa” utilizada pelos por juízes ou Tribunais para justificar prisões arbitrárias, que, infelizmente, buscam por meio do decreto prisional finalidades não contempladas na Lei e nem pela Constituição Federal. (TOURINHO FILHO, 2015, p. 367).

Ou ainda conforme ensinou o Ministro do STF Celso de Mello:

O magistrado, no Brasil, não pode utilizar a prisão preventiva como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, haja vista que o sistema jurídico brasileiro, lastreado nas bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade individual, o qual é incompatível com punição sem processo e inconciliável com condenação sem defesa. Com efeito, a prisão preventiva não ambiciona infringir punição àquele que sofre a sua decretação, mas sim destina-se a atuar em prol da atividade estatal desenvolvida no processo, isto é, dispõe tão só de função cautelar. (MELLO, HC nº 79.857, rel. CELSO DE MELLO, DJ de 04. 05. 2001).

Pode-se concluir, portanto, que a prisão preventiva não pode ser instrumento da ação judicial para servir a essa pobreza cultural que exige a cadeia imediatamente para todo e qualquer acusado. Assim, fundamentos impulsionados pela satisfação do sentimento de justiça ou, até mesmo, na intimidação coletiva não são coerentes e nem idôneos para a decretação do cárcere cautelar, pois operam à aplicação de uma justiça sumária lastreada em argumentos autoritários e repressivos.

No caso específico da decretação da prisão preventiva, o magistrado terá que demonstrar, de acordo com elementos concretos, que cada uma das medidas alternativas menos gravosas que a prisão não se mostra suficiente para eliminar a hipótese de necessidade que exige a imposição de uma medida cautelar. Ao deliberar sobre a necessidade de medida cautelar mais gravosa, no caso da prisão preventiva, o juiz deverá justificar a razão pela qual nenhuma das nove medidas diversas à prisão seria inaplicável ao caso concreto.

Há de ser, contudo, que nem sempre o magistrado quer se dá ao trabalho de demonstrar em profundidade sua opção pela prisão cautelar mais gravosa. Conforme já alertado, as decisões sobre as decretações de prisões geralmente são copiadas e sem a análise aprofundada do cada caso, de modo específico.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os argumentos contrários e favoráveis à decretação da prisão preventiva se voltam mais para o conteúdo das decisões do que mesmo pela sua aplicabilidade.

Indubitavelmente, as previsões contidas em lei, acaso colocadas sob a vigilância da necessidade de utilização, não são passíveis de grandes críticas quanto à forma de sua decretação.

Efetivamente, a prisão preventiva é uma medida de caráter cautelar e visa a proteção da eficácia processual. Sua natureza é excepcional, devendo ser implantada apenas em último caso, quando nenhuma medida menos gravosa lhe convier, por ser uma punição antecipada.

Na verdade, para além de uma punição antecipada, afeiçoa-se mais a uma condenação antecipada. E condenação que possuirá as mesmas consequências prisionais da condenação definitiva, pois os presos preventivos nem sempre são separados dos demais, conforme preconiza a lei.

E uma condenação antecipada sem, na maioria das vezes, motivação suficiente para sua decretação. Ora, nada diz uma decretação por conveniência da instrução criminal ou para garantia da ordem pública. Ademais quando as decisões pela decretação são eivadas de argumentos vazios e fora do contexto do suposto crime praticado.

O que se tem, em verdade, é a banalização da prisão, como se o magistrado fosse além da lei para se voltar apenas para uma justificação intimista ou para atender aos clamores sociais. Tudo como a dizer que decretando a prisão preventiva, ao menos não será passível de críticas.

Tal banalização da prisão deixa de considerar o que é mais importante ao ser humano: sua liberdade. A lei diz que a decretação da preventiva não pode se embasar em suposições abstratas, e sim verter-se a fatos concretos.

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Sim, é isto que a lei diz. Mas não é este o entendimento da maioria dos magistrados, que apenas confirmam a antecipação da condenação sem ao menos – e minimamente – aprofundar-se no caso concreto.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Senado Federal/Brasília, 2016.

BRASILEIRO, Renato de Lima. Nova Prisão Cautelar - doutrina, jurisprudência e prática. Niterói, RJ, 2012.

CRUZ, Rogério Schietti Machado da. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Editora Método, 2011.

DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema das penas. São Paulo: RT, 2010.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal, volume 1 - parte geral. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.

MELLO, Celso de. HC nº 79.857, rel. CELSO DE MELLO, DJ de 04. 05. 2001

MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 7. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

SENNA, Virdal. Sistema Penitenciário Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2008.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7. ed. Bahia: JusPodivm, 2012.

TORNAGHI, Hélio. Curso de processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva. 1989.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

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Sobre o autor
Cícero Dantas de Oliveira

Advogado. Mestrando em Direito. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Eleitoral. Professor Universitário de Direito Penal e Processo Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Cícero Dantas. Da prisão e da prisão preventiva: o papel do julgador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6689, 24 out. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93039. Acesso em: 21 nov. 2024.

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