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Os tratados internacionais e os tributos ambientais.

O incentivo da tributação ambiental como método de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

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25/11/2021 às 19:20
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3. A APLICABILIDADE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NO DIREITO BRASILEIRO PARA A EFETIVAÇÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO: A EXTRAFISCALIDADE COMO INSTRUMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O meio ambiente pode ser utilizado pelas empresas com a autorização do Poder Público, desde que cumpram as obrigações fixadas na Constituição e na legislação infraconstitucional. Essa relação jurídica se dá com um vínculo de exploração e proteção, mesmo que pareça contraditório. Enquanto a pessoa jurídica utiliza o bem natural, deve preservá-lo, aplicando os meios possíveis para que não ocorra um dano. Essa obrigação de preservação do bem explorado cria uma responsabilização clara no plano constitucional, já que a atividade econômica precisa satisfazer as necessidades do mercado em geral, ao mesmo tempo que precisa cumprir as exigências para a manutenção da natureza, sem devastá-la. Caso não seja possível cumprir ambos, os princípios fundamentais devem ser obedecidos17.

Não se trata aqui de uma disputa de forças, já que não resta dúvidas que na verdade existe uma simbiose na união da atividade econômica com a preservação ambiental, pois os direitos fundamentais para serem efetivados precisam de recursos, enquanto a existência de vida no planeta precisa do meio ambiente.

No Brasil é adotado o antropocentrismo moderado, uma vez que a Constituição protege os recursos ambientais que são utilizados de maneira direta ou indireta pelo ser humano, apesar de não se limitar apenas a uma espécie, mas aos seres vivos como um todo e reconhecendo a tutela jurisdicional da natureza. Apesar disso, existe uma crise ética no mundo, pois a desordem ecológica passou por gerações e necessitou de instrumentos jurídicos nacionais e internacionais para enfrentar a crescente poluição e degradação dos recursos naturais, com uma ética propriamente ecológica18.

O desafio está na elaboração de metas a serem adotadas pelos países, se adequando as novas diretrizes e elaborando políticas de financiamento para desacelerar a mudança climática19. Além disso, a aplicabilidade dos tratados internacionais pelos Estados-membros se torna quase nula em prol do desenvolvimento, já que diversos países estão buscando melhorias econômicas.

Mesmo que a ONU possua programas para o desenvolvimento de nações mais pobres, existe uma dificuldade prática na colaboração dos envolvidos para que isso ocorra. Os países ricos mantêm sua produtividade em alta e os países pobres tentam prosperar com diversas desigualdades sociais e tendo que cumprir atos obrigacionais decorrente dos tratados. Para Maia e Silva:

Os problemas decorrentes da globalização vão desde questões sobre a regulamentação do mercado de trabalho até alterações ambientais. O consumismo é um dos frutos da globalização e torna refém a sociedade moderna, que é influenciada pelo crescimento econômico e pela abundância de bens e serviços disponíveis20.

A globalização possui o lado positivo do acesso à informação de maneira mais eficiente, enquanto, ao mesmo tempo, aumenta-se os bens de consumo e isso faz com que a sociedade produza mais e, consequentemente, polua mais. Tendo em vista isso, os cientistas visam alinhar os meios de produção de maneira sustentável, aplicando formas de que a economia continue crescente e que não haja tanta devastação do meio ambiente. Como demonstrado anteriormente, os países em desenvolvimento encontram muita dificuldade em realizar essas mudanças, pois os métodos sustentáveis são onerosos e não há como cumprir todas as obrigações de um país, renunciando-se a um direito em prol do outro.

O que se pode propor é que os países desenvolvidos que exportam materiais que não poluam o meio ambiente ou que tenham impacto reduzido, diminuam suas tributações de importação e assim os países em desenvolvimento consigam arcar com os valores propostos na negociação. Além disso, a igualdade de condições econômicas entre os países aumentará o consumo de bens e serviços, principalmente desses produtos, visando a redução da devastação ambiental.

Alinha-se a isso as metas de desenvolvimento sustentável projetado pela ONU, os benefícios fiscais às empresas e aos indivíduos que protegerem e restaurarem o meio ambiente, igualmente com a parceria entre os países na preservação do meio ambiente e no desenvolvimento sustentável.

Saindo do cenário utópico e voltando ao tema constitucional da medida, ressalta-se os ensinamentos de Sarlet, Marinoni e Mitidiero, quanto a obrigacionalidade do Estado, já que “o direito à proteção do meio ambiente, compreendido como um direito em sentido amplo, decodifica-se em um conjunto diversificado e heterogêneo de posições jurídicas, inclusive e particularmente impondo uma série de medidas (tarefas/objetivos) aos poderes públicos”21, portanto é necessário aos governantes estudarem medidas que conciliem a proteção do meio ambiente com o desenvolvimento da sua nação, conciliando com os preceitos internacionais de defesa aos direitos humanos.

Um dos meios pertinentes para realizar tais proteções é através da extrafiscalidade como política pública de implementação de benefícios fiscais para estimular as condutas positivas dos contribuintes, já que os tributos são utilizados para finalidades distintas além da arrecadação, captando recursos necessários para que o Estado aplique as normas constitucionais.

O Poder Legislativo possui papel importante para essa prática, pois é quem aprova os gastos relacionados ao Poder Executivo e pode, por meio de lei, conceder isenções ou diminuir alíquotas nacionais e internacionais, para que estimule as empresas estrangeiras ao cumprimento do papel social que possuem.

Conclui-se que para a aplicabilidade dos tratados internacionais de direitos humanos que versem sobre a proteção ambiental, é necessário o estudo aprofundado de políticas públicas para facilitar o acesso aos meios necessários do desenvolvimento sustentável, desde matéria-prima de outros países, até a colaboração internacional dos países desenvolvidos, buscando por intermédio da extrafiscalidade o elo entre os valores arrecadados por meio dos tributos para que seja utilizado como reparação e que as empresas e os indivíduos recebam benefícios fiscais com o intuito de premiar atitudes de proteção a natureza, em um sistema harmônico de simbiose.


CONCLUSÃO

A interação entre os tratados internacionais e a legislação nacional possui distintos status no ordenamento jurídico brasileiro. Enquanto os tratados de teor econômico são equivalentes a leis ordinárias, os relacionados a direitos humanos podem ser equiparados a norma supralegal e constitucional.

Ressaltando-se que caso haja alguma antinomia entre a norma supralegal e a norma constitucional, a prevalência se dá pela mais benéfica.

A crescente devastação do meio ambiente em prol do desenvolvimento econômico fez com que a comunidade internacional buscasse caminhos para conciliar as duas vertentes com fundamentos na dignidade da pessoa humana, já que é necessário um crescimento na economia de um país para que haja a distribuição de riquezas.

O protocolo de Kyoto e o acordo de Paris tentaram juntar o desenvolvimento sustentável com a negociação entre as nações, para que os países que diminuíssem os danos à atmosfera pudessem negociar os créditos de carbono com os outros Estados internacionais e assim tivessem uma equiparação no ganho econômico anual.

Essa tentativa funcionou em partes, pois vários países se juntaram as convenções, entretanto o que ficou evidenciado é que os países desenvolvidos conseguiram resultados melhores por possuírem condições financeiras para o investimento em tecnologia de produção sustentável que não afetasse tanto o meio ambiente local, o que não foi possível para os países em desenvolvimento.

Em contrapartida, o direito interno tentou, por meio dos tributos, coibir as ações devastadoras das empresas, o que resultou a busca destas por locais mais pobres criando prejuízos em áreas específicas de países que precisassem investir no desenvolvimento econômico, de maneira prioritária.

É sabido que o Estado precisa de recursos financeiros para aplicar os direitos na prática e a maior parte desses valores advém dos tributos. Quanto mais forte a sua economia, mais forte é sua arrecadação, gerando riqueza e, por consequência, distribuição desses recursos. Por mais fantasioso que isso possa parecer, tais países desenvolveram tecnologias próprias para reduzir o impacto ambiental e ao tentarem exportar, encontram barreiras tributárias de alto valor, o que onera o material.

Para que haja uma possibilidade dos países em desenvolvimento adquirirem esses materiais, é fundamental um estudo da extrafiscalidade do tributo com seu valor social, concluindo-se que a melhor maneira de combater o impacto ambiental é com a colaboração das empresas e do indivíduo na proteção, preservação e restauração do meio ambiente.

Apesar de não haver tributos que tenham por finalidade o meio ambiente, é possível direcionar a sua arrecadação para a proteção ambiental, além das sanções civis por meio do princípio da reparação integral do dano. Junta-se isso com os benefícios fiscais decorrentes da legislação infraconstitucional, a liberdade econômica e o meio ambiente ecologicamente equilibrado previstos na Constituição, os tratados internacionais de direitos humanos que versem sobre direito ambiental como ponto de partida para importação de material, instalação de empresas, investimento no desenvolvimento sustentável e reparação do dano por espontaneidade, para que haja a aplicabilidade dos direitos por parte do Estado e crescimento econômico, visando a equidade social e o combate da devastação dos recursos naturais no globo.


REFERÊNCIAS

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Notas

1 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 9.

2 GUERRA, Sidney. Curso de Direito Internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 18.

3 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direitos Humanos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense; MÉTODO, 2020, p. 450.

4 GUERRA, Sidney. Curso de Direito Internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 271.

5 What is Carbon Sequestration and how does it work. CLEAR Center. Disponível em: https://clear.ucdavis.edu/explainers/what-carbon-sequestration. Online. Acesso em 12/06/2021. Online.

6 GUERRA, Sidney. Curso de Direito Internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 273.

7 MEIRELES, Taís. Acordo de Paris completa cinco anos com lições aprendidas. WWF-BRASIL. 2 de dezembro de 2020, Disponível em: https://www.wwf.org.br/?77471/Acordo-de-Paris-completa-cinco-anos-com-licoes-aprendidas. Acesso em 24/06/2021. Online.

8 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 927.

9 BERCOVICI, Gilberto. Responsabilidade ambiental, nexo de causalidade e solidariedade (Parecer). Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 21. Out. /Dez. 2019, p. 308-309.

10 SOUSA, Pedro H. S. de. A Reserva do Possível e a aplicabilidade dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos como políticas públicas no Brasil. Jus Navigandi. Abr. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/89947/a-reserva-do-possivel-e-a-aplicabilidade-dos-tratados-internacionais-de-direitos-humanos-como-politicas-publicas-no-brasil. Acesso em 27/06/2021. Online.

11 MORAIS, Paulo Roberto Benegas de, PENEDO, Antônio Sérgio Torres. Sustentabilidade e empreendedorismo. p. 86. Sustentabilidade: princípios e estratégias. Arlindo Philippi Jr. (org.). Barueri, SP: Manole, 2019.

12 LEITE, José Rubens Morato, FERREIRA, Maria Leonor Paes Cavalcanti. Reparação do Dano Moral Ambiental na perspectiva da jurisprudência mais recente do STJ: Consolidações de um direito pós-moderno. p. 785-786. Direito ambiental e sustentabilidade. Arlindo Philippi Jr, Vladimir Passos de Freitas, Ana Luiza Silva Spínola. (eds). Coleção Ambiental, vol. 18. Barueri, SP: Manole, 2016.

13 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2021, p. 25.

14 BRASIL, Código Tributário Nacional.

15 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Direito tributário ambiental. Rio de Janeiro: Forense, 2020, P. 89.

16 SANTELLO, Fabiana Lopes Pinto. Direito tributário ambiental: recursos hídricos. Barueri, SP: Manole, 2017, p. 45-46.

17 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 303-304.

18 SARLET, Ingo Wolfgand, FENSTERSEIFER, Tiago. Curso de Direito Ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 75.

19 CAVALCANTE, Denise Lucena. Sustentabilidade financeira em prol da sustentabilidade ambiental. In: GRUPENMACHER, Betina et al. Novos horizontes da tributação: um diálogo luso-brasileiro. Coimbra: Almedina, 2012, p. 108.

20 MAIA, Fernando Joaquim Ferreira, SILVA, Rafaela Patrícia Inocêncio da. A extrafiscalidade como instrumento de controle do impacto ambiental gerado pelos resíduos sólidos diante da globalização do mercado. Revista Pensar. Fortaleza, v. 23, n. 3, jul./set. 2018, p. 9.

21 SARLET, Ingo Wolfgang, MARINONI, Luiz Guilherme, MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 314.

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Sobre o autor
Pedro Henrique Silva de Sousa

Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR Especialista em Direito e Processo Constitucional e em Direito Processual Civil pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Ceará - UFC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Pedro Henrique Silva. Os tratados internacionais e os tributos ambientais.: O incentivo da tributação ambiental como método de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6721, 25 nov. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93249. Acesso em: 8 mai. 2024.

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