Considerações finais
Os crimes sexuais, ao serem analisados, sempre provocaram intensos e calorosos debates, chegando-se, inclusive, a contraditórias conclusões, em um misto de indignação e relativização quanto à sua prática.
A legislação penal pertinente ao tema foi se alterando ao longo dos tempos, refletindo sempre os valores considerados em cada época, a exemplo da Lei nº 12.015/2009, que trouxe importante contribuição tutelar a liberdade e a dignidade sexual e não mais os costumes.
Em se tratando de violência sexual, também não se pode deixar de falar em gênero, enquanto resultado de uma construção sociocultural, posto que a mulher é preferencialmente a vítima nessas práticas, evidenciando que ainda está muito presente a ideia de superioridade masculina.
Sendo o crime de difícil elucidação, pelas próprias circunstâncias em que ocorre, a ausência de testemunhas e, até mesmo, pela dificuldade de comprovação mediante exame de corpo de delito, quase sempre não concludente; resta, quase sempre, a palavra da vítima, que é então submetida a toda sorte de dúvidas e questionamentos, sendo desqualificada, uma vez que valorada de forma sempre discriminatória.
Ao se atestar a honestidade e a moralidade da vítima, ao invés de se discutir acerca da prática delituosa em si, a análise do comportamento sexual e social dos envolvidos, seguindo os padrões então fixados diferentemente para homens e mulheres, acabam por legitimar a violência perpetrada, evidenciando que questões de gênero influenciam diretamente na proteção dada à mulher, vítima de estupro, bem como à apuração do fato delituoso.
Resta claro que a vítima é revitimizada, consideradas as variadas formas de violência institucional, na apuração e julgamento de crimes de estupro, principalmente em relação às mulheres, sendo urgente e necessário discutir-se o tema, em busca de uma maior conscientização desses operadores do direito, quanto ao acolhimento dispensado a essa vítima, para que seja ela capaz de perceber que a ocorrência do crime não é sua culpa.
Referências bibliográficas
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Notas
2 CERQUEIRA, Daniel; COELHO, Danilo de Santa Cruz. Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde (versão preliminar). Disponível em: https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/75/estupro-no-brasil-uma-radiografia-segundo-os-dados-da-saude-versao-preliminar. Acesso em: 30 nov. 2021.
3 BOHNENBERGER, Marina; BUENO, Samira. Os registros de violência sexual durante a pandemia de covid 19. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2021/07/7-os-registros-de-violencia-sexual-durante-a-pandemia-de-covid-19.pdf. Acesso em: 30 nov. 2021.
4 ARAÚJO, Ana Paula. Abuso: a cultura do estupro no Brasil. Rio de Janeiro, Globo livros, 2020, p. 22.
5 PIERANGELI, José Pierangeli. Códigos Penais do Brasil: evolução histórica. 2 ed. 2 tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 109-113.
6 Ibidem, p. 261.
7 PIERANGELI, José Pierangeli. Códigos Penais do Brasil: evolução histórica. 2 ed. 2 tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004p. 302-303.
8 Ibidem, 476.
9 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal: parte especial arts. 213 a 361 do Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p.3-4.
10 Ibidem, p.5
11 IBDFAM. Naturalização de violência contra a mulher: especialista analisa a culpabilização da vítima em casos de estupro. Disponível em: https://ibdfam.org.br/noticias/8965/Naturaliza%C3%A7%C3%A3º%20de%20viol%C3%AAncia%20contra%20a%20mulher:%20especialista%20analisa%20a%20culpabiliza%C3%A7%C3%A3º%20da%20v%C3%ADtima%20em%20casos%20de%20estupro. Acesso em: 30 nov. 2021.
12 IBDFAM. Naturalização de violência contra a mulher: especialista analisa a culpabilização da vítima em casos de estupro. Disponível em: https://ibdfam.org.br/noticias/8965/Naturaliza%C3%A7%C3%A3º%20de%20viol%C3%AAncia%20contra%20a%20mulher:%20especialista%20analisa%20a%20culpabiliza%C3%A7%C3%A3º%20da%20v%C3%ADtima%20em%20casos%20de%20estupro. Acesso em: 30 nov. 2021.
13 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.51.
14 OLIVEIRA NETO. Emetério Silva de. Legislação penal e teoria da vitimologia. 2 ed. rev. atual e ampl. Florianópolis: Tirant Lo Blanch, 2018, p. 27.
15 Ibidem, p. 30.
16 PRADO, Alessandra; NUNES, Lara. A vitimização secundária nos casos de estupro: a atualidade da representação da violência de gênero na vida e na obra de Artemisia. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/prisma/article/view/7157/3343. Acesso em: 30 nov. 2021.
17 PASCHOAL, Nohara. O estupro: uma perspectiva vitimológica. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017, p. 241.
18 INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO. Dossiê violência sexual: a culpa nunca é da vítima. Disponível em: https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia-sexual/tipos-de-violencia/estupro/. Acesso em: 30 nov. 2021.