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A formação da fundada suspeita na atividade policial e os desafios da segurança pública no Estado Democrático de Direito

A formação da fundada suspeita na atividade policial e os desafios da segurança pública no Estado Democrático de Direito

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A fundada suspeita motivadora da realização da busca pessoal tem ensejado grandes divergências, pois é difícil encontrar o seu significado.

RESUMO

A fundada suspeita motivadora da realização da busca pessoal tem ensejado grandes divergências entre doutrinadores e juristas, pois seu fundamento é aberto, tornando-se difícil o encontro do seu significado. Esta pesquisa analisa algumas visões de profissionais da área de segurança pública, que atuam diretamente com a aplicação da ferramenta jurídica da busca pessoal em seu cotidiano. Ainda será exposta a visão racial e discriminatória que pode estar entranhada nos fundamentos aparentemente legais da realização da busca pessoal. Faz-se necessário um estudo sobre os estigmas de criminoso nato e que formas de discriminações raciais e sociais podem aflorar no embasamento da busca pessoal. O trabalho ainda enfrenta os desafios que a segurança pública encontra (e que poderá encontrar) para conciliar o dever de manter a ordem pública com o compromisso de observar o Estado Democrático de Direito.

Palavras-chave: fundada suspeita, racismo, polícia, abordagem policial.


INTRODUÇÃO

A busca pessoal vem sendo criticada em diversas áreas da mídia e também pela população em geral, tratada como uma espécie de abuso praticado por agentes públicos. Nestes termos é que se faz necessária uma delimitação do seu fundamento legal, pois nos casos previstos no artigo 244 do CPP (em caso de prisão e no curso de busca domiciliar), as hipóteses são mais precisas e delimitadas, inclusive deixando expressa a autorização de sua realização sem a necessidade do mandado.

No entanto, ainda prevista no mesmo artigo do Código de Processo Penal, está presente a expressão, vaga e subjetiva, "fundada suspeita", que carece de objetividade e precisão, e abre um leque enorme de conflitos existentes sobre o alcance da expressão. Tem-se aqui um terreno fértil para interpretações subjetivas, preconceituosas, racistas, pelo agente autorizado a realizar a busca pessoal. Principalmente quando se constata que os estereótipos que estão dentro de cada um de nós também se fazem presentes no cotidiano policial. Experiências pessoais e profissionais podem estigmatizar determinada aparência como suspeita e, diante da incerteza da definição legal, podem delimitar características de um suspeito. Preconceitos podem, no imaginário social, determinar que o suspeito seja aquele que está mal vestido, com "cara de bandido", também influenciando escolhas, pelos policiais, das pessoas que podem ou devem ser abordadas na rua.

Cogita-se até que ponto a referência legislativa a "fundada suspeita", em termos tão vagos, não estivesse já impregnada pelo costume (ou política) de se atribuir o estigma de suspeito às pessoas de má aparência ou que se encontram em condição social desprivilegiada.

Por ser um tema de grande controvérsia (pela sociedade e por vários críticos do sistema de segurança pública no Brasil, que questionam a fundamentação legal da abordagem policial), faz-se necessária a busca do entendimento doutrinário (e mesmo jurisprudencial) em relação à busca pessoal. Uma delimitação mais palpável, do tema, com maior conhecimento de causa, possibilitará o exercício fundamentado da crítica e a verificação da necessidade de se trazer à tona a intrínseca subjetividade, a parcialidade que cerca do tema da fundada suspeita, a esconder pretensos amparos legais.

Não se pode analisar o termo "fundada suspeita" sem uma investigação acerca do "tipo" de indivíduo que a sociedade, em regra, pretende ver excluído de seu convívio. Principalmente quando se constata que sempre que o sistema penal se volta para os "criminosos do colarinho branco", surgem reações (por vezes com impulso legislativo) no sentido de que, a pretexto de regulamentar uma atividade obscura, se circunscreva a expressão "fundada suspeita" ao universo dos socialmente excluídos. Essas são as linhas gerais da presente monografia.


1.A FORMAÇÃO DA FUNDADA SUSPEITA

1.1.CONCEITUAÇÃO

Identifica-se uma dificuldade inicial em levantar uma definição mais específica sobre a busca pessoal, especialmente sobre a fundada suspeita. Vários autores tratam do tema apenas transcrevendo o texto legal do art. 244 do Código de Processo Penal (CPP): "A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar".

Guilherme de Souza NUCCI procura restringir a subjetividade do agente público incumbido no dever/poder de realizar a busca pessoal quando se encontra diante de uma situação de flagrância de porte ilegal de armas, entorpecentes ou algo parecido:

Fundada Suspeita: é requisito essencial e indispensável para a realização da busca pessoal, consistente na revista do indivíduo. Suspeita é uma desconfiança ou suposição, algo intuitivo e frágil, por natureza, razão pela qual a norma exige fundada suspeita, que é mais concreto e seguro. Assim, quando um policial desconfiar de alguém, não poderá valer-se, unicamente, de sua experiência ou pressentimento, necessitando, ainda, de algo mais palpável, como a denúncia feita por terceiro de que a pessoa porta o instrumento usado para o cometimento do delito, bem como pode ele mesmo visualizar uma saliência sob a blusa do sujeito, dando nítida impressão de se tratar de um revólver. Enfim, torna-se impossível e impróprio enumerar todas as possibilidades autorizadoras de uma busca, mas continua sendo curial destacar que a autoridade encarregada da investigação ou seus agentes podem – e devem – revistar pessoas em busca de armas, instrumentos do crime, objetos necessários à prova do fato delituoso, elementos de convicção, entre outros, agindo escrupulosa e fundamentadamente. [01]

Nota-se que NUCCI frisa a necessidade de que a suspeita seja fruto de fundamentação concreta (pautada em fatos, testemunhas) e não apenas uma mera dedução subjetiva do agente, uma presunção desarrazoada. Assim, embora legitimado, por um interesse público maior, a constranger o cidadão em seus diretos individuais, essa conduta do Estado deve ser escrupulosamente balizada, não podendo causar constrangimento desnecessário, sob pena de ensejar a responsabilização do agente que atuou abusivamente.

Eugênio Pacelli de Oliveira afasta a pretensa inconstitucionalidade (tendo em vista o disposto no artigo 5º, X da Constituição Federal) da disposição processual penal autorizadora da busca pessoal sem autorização judicial

Já a busca pessoal, a nosso aviso, não depende de autorização judicial, ainda que se possa constatar, em certa medida, uma violação à intangibilidade do direito à intimidade e à privacidade, previstos no art. 5º, X, da CF.

Como sustentamos alhures, na abordagem relativa à quebra do sigilo bancário, a exigência de autorização judicial para determinadas restrições de direito não é absoluta, podendo a lei autorizar determinadas atividades e/ou funções realizadas pelo Poder Público, de cuja atuação resulte a redução do âmbito do exercício das citadas garantias individuais. Para isso, será sempre necessário observar a indispensável proporcionalidade da medida, no que se refere ao grau de afetação do direito e à indispensabilidade da atuação estatal.

Sob tais considerações, acreditamos perfeitamente possível a realização de busca pessoal sem autorização judicial, desde que, uma vez prevista em lei, existam e estejam presentes razões de natureza cautelar e, por isso, urgentes. [02]

Eduardo ESPÍNOLA FILHO defende a legitimidade do "tino policial" usado na abordagem de suspeitos. Sustenta que o policial, assim agindo, cumpre com seu dever de manutenção da ordem pública e de coleta de eventuais provas da prática de um delito, discordando das decisões que fundamentam absolvições por pretenso atentado à liberdade pessoal.

A maioria dos julgados já dava apoio a essa atitude, de uma intuitiva oportunidade e que se enquadra nitidamente no cumprimento dos deveres de assegurar a tranqüilidade e o sossego públicos e de prevenir e reprimir as violações da lei penal, aos quais é a polícia obrigada. Mas, de quando em vez, uma decisão desgarrada reputava arbitrária a revista, e, embora a suspeita do policial se confirmasse como muito bem fundada, com a apuração de que o revistado tinha consigo armas, cujo porte é punido, listas de apostas, cuja posse é configurativa da atividade contravencional dos bicheiros, a absolvição era pronunciada, com o mais franco desprezo de um elemento material eloqüentíssimo, como a apreensão do corpo de delito em poder do indiciado, sob o pretexto de que houve desrespeito à sua liberdade pessoal – liberdade pessoal, na verdade, muito mal aplicada, no contínuo, permanente desrespeito (este, sim, manifesto, evidente) das determinações legais. [03]

Os termos jurídicos expostos no texto legal em relação à busca pessoal podem ensejar uma ampla gama de fundamentos a serem usados pelo executor da busca, configurando assim uma norma aberta, permeável a toda a sorte de fundamentações, como realça Adilson MEHMERI, dificultando a caracterização dos abusos por parte do agente que realiza a busca:

A busca, outras vezes pode ocorrer no corpo da pessoa, à procura de armas, objetos ou instrumentos que interessem às apurações. Essa busca inclui utensílios ou outras coisas como valises, malas, bolsas, carteiras etc. a busca pode ser feita, inclusive por meios mecânicos, químicos e radioscópicos, porque é comum o criminoso esconder o objeto em lugares recônditos, ou até engoli-lo, hipótese em que se submeterá a processos químico-farmacêuticos para eliminação, por via intestinal, se for possível reaver o objeto em sua inteireza.Por ser diligência de menor agressividade à pessoa, o legislador cerca-a de menor formalismo, tais como: Existência de suspeição- Enquanto na busca domiciliar exigem-se fundadas razões, aqui o legislador satisfaz-se apenas com Fundada Suspeita. Ora, como a simples suspeição tem caráter subjetivo, dificilmente poderá caracterizar-se abuso de autoridade, a menos que haja escancarado excesso... [04] [sem grifo no original]

Ainda sobre o tema TOURINHO FILHO compara o termo "fundadas razões", usado na busca domiciliar ao termo "fundada suspeita" usado na busca pessoal, sugerindo que o legislador parece ter utilizado um termo mais rigoroso na busca domiciliar por atribuir-lhe mais importância (para a preservação de direitos individuais) do que na hipótese de busca pessoal. Esse maior rigor, na definição da busca domiciliar prender-se-ia ao fato de que, ao contrário da busca domiciliar, a busca pessoal se faz normalmente em público, na presença de terceiros, da sociedade, o que pode representar, em certas circunstâncias, uma defesa contra abusos que a busca domiciliar, em regra, não teria. O abuso de ser molestado em seu próprio domicílio (onde se acredita ter a maior segurança possível frente às ações arbitrárias do Estado e seu agente) teria conotação mais gravosa que no caso da busca pessoal, o que justificaria as divergências no tratamento legal. "A nós parece que o legislador quis emprestar à expressão ‘fundada razão’ o sainete de maior gravidade, maior seriedade, atentando para a circunstância de que a busca domiciliar é medida mais drástica e que excepciona a garantia da infranqueabilidade do domicílio." [05]

Contudo, faz-se necessária a procura de freios e contrapesos para que a falta de parâmetros positivados não fundamentem o abuso de autoridade ou a displicência da autoridade pessoal em bem fundamentar a necessidade da busca pessoal. Há de haver ponderação entre os princípios da privacidade e da liberdade social e a necessidade de garantir segurança a todos os cidadãos. Não se pode olvidar que quem passa por uma busca pessoal humilhante, constrangedora, "fundamentada" numa pretensa "aparência" ou "trejeitos" de "bandido" (o estigma do "elemento suspeito") sofre dano moral de difícil reparação, ainda que pecuniariamente ressarcido pelo Estado.

1.2.LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA

A obscuridade do dispositivo legal (artigo 240, § 2º do CPP) quanto ao que venha se caracterizar por "fundada suspeita" também se repete em outros dois artigos do CPP (os artigos 244 e 304 do CPP), que tratam, respectivamente, da dispensabilidade do mandado em se tratando de busca pessoal e da apresentação do acusado quando da prisão em flagrante. Além desses artigos, identificando a mesma expressão nos seguintes diplomas legais: Código de Processo Penal Militar, arts. 172, 181, 182 e 216, Lei 4.502 de 30/11/1964, art. 100, Decreto-Lei 37 de 18/11/1966, art. 53, Lei 5.869, Código de Processo Civil, de 11/01/1973, art. 1.176, Lei 6.385 de 07/12/1976, art. 9º, Lei 6.404 de 15/12/1976, arts. 105 e 117, Decreto 98.386 de 09/11/1989, art. 13,. Decreto 1.789 de 12/01/1996, art. 29, Lei 10.054 de 07/12/2000, art. 3º, Decreto 4.543 de 26/12/2002, art. 449 e 704 e Decreto 4.544 de 26/12/2002, art. 451. Isso só confirma que a ampla (e insegura) abertura interpretativa ao que se deva entender por "fundada suspeita" não é exclusividade da lei processual penal. Nos demais instrumentos normativos, percebe-se nitidamente a atribuição ao funcionário público da discricionariedade em definir, subjetivamente, quem desperta suspeitas. O Estado confia (e aposta) que o subjetivismo do agente policial não será abusivo, ilegal. Mas como aferir a ultrapassagem do limiar da legalidade, se a própria lei não estabelece parâmetros claros? Entende-se que esses parâmetros estão na Constituição Federal, nos princípios da legalidade, da igualdade, no direito de ir e vir, e em diversos outros que se encontram no art. 5º, que estabelece direitos e garantias fundamentais, cláusulas pétreas. Ademais, o artigo 37, 6º da CF, também prevê a responsabilidade objetiva do Estado a danos praticados por seus agentes. A propósito, o seguinte julgado:

RESPONSABILIDADE CIVIL - INDENIZAÇÃO - CLIENTE DE SUPERMERCADO - SUSPEITA INFUNDADA DE FURTO - ACIONAMENTO DA POLÍCIA - REVISTA PÚBLICA PELOS MILITARES - DANO MORAL CARACTERIZADO. Caracteriza dano moral a revista em público de pessoa cliente de supermercado, sob suspeita infundada de subtração de mercadorias. A imputação de prática de ato ilícito, fundada em suspeita , ofende direito constitucionalmente assegurado, devendo a indenização ser admitida como meio de ressarcimento pela dor sofrida. Não há se falar em reciprocidade de culpas se a matéria sequer foi alegada no correr da instrução processual e, de resto, sem nenhuma pertinência no caso dos autos. Na fixação do valor do dano moral prevalecerá o prudente arbítrio do julgador, e aquele atribuído deve atender às condições tanto de quem paga, como de quem recebe, para a própria viabilidade do cumprimento da obrigação. Decisão: NEGAR PROVIMENTO [06]

Com efeito, se a sociedade civil em geral tivesse o conhecimento de que referida suspeição não pode ser arbitrária (a despeito da obscuridade legal), ensejando reparações, e as possibilidades de acesso à justiça não inviabilizassem na prática as demandas dos que mais necessitam, não faltariam ações judiciais contra o Estado. O Judiciário não tardaria a retratar um choque entre os valores do sistema de segurança pública e as percepções de seus principais alvos. É que muitas são as situações em que membros da população, normalmente de baixa renda, são submetidos à busca pessoal constantemente, sem que de fato estejam em verdadeiro (fundamentado) estado de suspeição, mas apenas porque seus trajes, sua aparência ou até mesmo a cor de sua pele podem ensejar uma suspeição subjetiva do agente público.

A sociedade civil (e parcela do Judiciário), no entanto, tem aceitado com naturalidade, com complacência, o exercício da busca pessoal, como pode se observar no julgado abaixo transcrito

APELACAO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ALEGACAO DE SENTENCA - APOIADA EM PROVA ILICITA POR DERIVACAO. INEXISTENCIA. ABORDAGEM POLICIAL REVESTIDA DAS FORMALIDADES LEGAIS. BUSCA PESSOAL AUTORIZADA EM FUNDADA SUSPEITA. ACAO POLICIAL PREVENTIVA. PREVENCAO EFICIENTE DAQUELA OPORTUNIDADE. APELANTE QUE APOS O FATO E PRESO E ACUSADO DA PRATICA DE HOMICIDIO. PROVIMENTO NEGADO. RESTAM COMPROVADAS A AUTORIA E A MATERIALIDADE DO PORTE ILEGAL DE ARMA QUANDO O AGENTE, ABORDADO POR POLICIAIS MILITARES EM ACAO PREVENTIVA E APOS REVISTA PESSOAL E ENCONTRADO, SEM AUTORIZACAO PARA FAZE-LO, EM PODER DE - ARMA MUNICIADA QUE, APÓS PERICIADA, CONCLUI-SE PELA SUA POTENCIALIDADE LESIVA. INEXISTE ILICITUDE DE PROVA OBTIDA POR MEIO DE BUSCA – PESSOAL QUANDO A ABORDAGEM POLICIAL E REVESTIDA DAS FOR MALIDADES LEGAIS PREVISTA NO ART. 244 DO CPP, ISTO E, QUANDO HOUVER FUNDADA SUSPEITA DE QUE A PESSOA ESTEJA - NA POSSE DE ARMA PROIBIDA. MEDIDA QUE RESULTOU EM VERDADEIRA E EFICIENTE PREVENCAO NAQUELA OPORTUNIDADE POR- QUANTO APOS O FATO O APELANTE FOI PRESO E ACUSADO DA - PRATICA DE HOMICIDIO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. Conclusão: Acorda a Egrégia PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Na conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado: A UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO. [07]

À luz desse Acórdão, a idéia de prevenção legitimaria qualquer suspeita, qualquer abordagem policial. Sempre se poderia justificar que o motivo nobre seria o de se prevenir a ocorrência de um possível crime. Ora, faz-se necessário delimitar o que venha a ser fundada suspeita, em prol da segurança jurídica em relação ao trabalho policial e também para a sociedade. Sendo claros tais limites, poderão ser evitadas situações vexatórias, que colocam inocentes em posição de suspeita. Nesse sentido, um julgado importante do STF bem define o que seria o uso da busca pessoal fundado em mero subjetivismo do agente público, causando constrangimento e revolta desnecessários às pessoas que são submetidas à busca pessoal:

...A "fundada suspeita", prevista no art. 244 do CPP, não pode fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que indiquem a necessidade da revista, em face do constrangimento que causa. Ausência, no caso, de elementos dessa natureza, que não se pode ter por configurados na alegação de que trajava, o paciente, um "blusão" suscetível de esconder uma arma, sob risco de referendo a condutas arbitrárias ofensivas a direitos e garantias individuais e caracterizadoras de abuso de poder. Habeas corpus deferido para determinar-se o arquivamento do Termo. [08]

Pode-se notar a crítica à subjetividade do uso da busca pessoal baseada em vazia suspeita do agente público. No entanto, o uso da busca pessoal na atividade policial vem sendo utilizada, cotidianamente, como forma preventiva de manutenção da ordem pública e de verificação de identidade civil de pessoas suspeitas de estar cometendo ou prestes a cometer algum ilícito. Molduras legais de definição da fundada suspeita são necessárias para determinar o uso da busca pessoal apenas como diligência, como prevenção para atividades ilícitas ou ambos os casos. No entanto, o entendimento que se percebe é que quando se aborda a pessoa, se faz a busca pessoal e se encontra algo ilícito, se concretizou a fundada suspeita. Quando isso não acontece, se comete abuso pois não se caracteriza a fundada suspeita apenas pela aparência de um indivíduo. Nesse quadro, fica difícil a definição de quando esta fundada suspeita é usada corretamente, baseando a culpa do agente na circunstância de ele não adivinhar corretamente quem tem realmente posse de algo ilícito ou não.

1.3.ESTEREÓTIPOS DE CRIMINOSO NATO

Em seu livro O Homem Criminoso, Cesare LOMBROSO [09]aponta diversas características de um criminoso nato, que por sua aparência física está propenso a cometer crimes. Ele relata diversas características de pessoas que tem probabilidade de ser criminosas. Todavia, esta definição de criminoso nato cada pessoa desenvolve por si só. Quando se imagina uma pessoa suspeita, cada um desenha o seu estereótipo, que pode ser diferente ou semelhante para cada pessoa. No trabalho policial, no entanto, cria-se uma cultura de estereotipar determinados indivíduos que, dependendo da região onde estão são taxados de suspeitos, apenas por estar em região de grande circulação de pessoas de alto poder aquisitivo. Um jovem, negro e pobre, por exemplo, se diferencia do ambiente em que está por suas características. Essas idéias preconceituosas e racistas muitas vezes são usadas sem qualquer pudor; A diferença geográfica em relação à pessoa é muito importante na atividade policial. O tratamento dispensado aos pobres que estão na periferia é feito com muito mais violência, diferentemente dos bairros de classe média/alta, em que o policial age com mais cautela pois, sempre pode se deparar com a clássica frase: "você não sabe com quem está falando". Por isso, há diferentes tipos de polícia: a que está preparada para a guerra, ou seja, as que atuam na periferia, como se estivessem o tempo todo preparadas para guerra contra os bandidos mais perigosos e a polícia do centro, que atua com mais atenção ao cidadão e age com mais receio de causar uma imagem ruim de seu trabalho quando atua com pessoas que parecem ser de classe mais elevada. [10]

Dentre os estereótipos de criminoso nato, não se pode colocar mulheres de forma alguma; Apesar de LOMBROSO apontar alguns estereótipos de mulheres criminosas, a abordagem policial feita em mulheres é extremamente rara, pois há uma cultura policial, uma chamada "regra de ouro", de que o policial não pode revistar mulher. Essa regra está em toda a sociedade, na polícia, na periferia, nos grandes centros. Todos concordam que a mulher não deve ser revistada, apesar de existir regra no Código de Processo Penal (artigo 249). Essa regra diz que as mulheres também podem ser revistas, preferencialmente por outras mulheres, em caso de fundada suspeita. Ocorre que, mesmo com a grande guerra contra o tráfico de drogas que paira sobre as favelas, a "regra de ouro" é respeitada, não se sabe se pelo receio de represálias, de serem processados por abuso ou se simplesmente essa regra foi incutida no cotidiano policial e da sociedade e respeitada por todos e ainda mais, efetivamente cobrada, pois em caso de busca pessoal em mulher essa cobrança acontece. [11]

Quando há uma indagação sobre um tipo ideal de criminoso, as pessoas tendem a listar traços em comum. Em pesquisa realizada com grupos sociais diferentes, Silvia RAMOS e Leonarda MUSUMECI demonstram como algumas características podem estar interligadas em diferentes classes sociais, podendo assim chegar próximo do que a população define como elemento suspeito que, com certeza, será abordado pela polícia; Apesar de características semelhantes listadas pelos grupos pesquisados, quando estes exteriorizam em forma de desenho os chamados "freios de camburão", pessoas que fatalmente serão abordadas, os tenham de forma diferente, sua aparência em cada grupo foi de forma totalmente diferente, no entanto, em cada desenho, seja de um negro com roupas caras, seja de um "punk", demonstra características que chamariam a atenção da polícia, mesmo sendo desenhos de pessoas diferentes, porém sua aparência está fora do padrão aceito pela sociedade, ou seja, negro, mal vestido, "punk", "tatuado".

Vale ressaltar que, em todos os grupos focais pesquisados, a maioria das características elencadas se referia à aparência da pessoa e não a sua atitude ou gestos. Portanto, para os grupos focais isso é que conta mais. Ainda que se relacione com atitudes suspeitas o que faz uma viatura abordar certa pessoa é a aparência. [12]

Adolescentes

Zona Oeste

Adolescentes

Zona Sul

Universitários

Multirracial

Universitários

Negros

1º Roupa de marca

Olhos vermelhos

Ser negro

Ser negro

2º Tênis de marca

Atitude (gestos)

Jeito de andar

Adolescente homem

3º Cor da pele

Ar desleixado

Roupa

Cabeça raspada

4º Camisa largona

Brinco e piercing

Corte de cabelo

Cordão de ouro

5º Cordão de ouro

Cabelo grande

Ser homem jovem

Cigarro

6º Cigarro

Sandália aberta

Local de moradia

Boné

7º Boné

Barba ou bigode

Cordão de ouro

Cabelo grande

8º Bermuda caída

Colar pensamento

Boné

Bermuda

9º Modo de falar

Bebendo cerveja

Relógio

Pacote na mão

10º Olhos vermelhos

Fumando cigarro

Tênis

Óculos escuros

Fonte: Ranking das características que formam um tipo suspeito. [13]

Em pesquisa realizada com a população carioca, RAMOS e MUSUMECI demonstram diversas experiências em relação à abordagem policial. Opiniões contraditórias em relação à aceitação das abordagens são detectadas. Ao mesmo tempo em que são mal vistas, causam uma boa impressão na população, os entrevistados dizem que o tratamento do policial em relação a eles na abordagem é de forma educada e gentil, sendo que em outros questionamentos, relatam que foram desrespeitados ou tiveram um tratamento desleixado, isso demonstra que a população analisa diferentemente o atendimento de cada policial em uma abordagem, tendo uns com um bom tratamento e outros desrespeitosos. [14]

São expostas questões raciais que na quantidade de situações não despertam a atenção. No entanto, quando comparadas com o total da sociedade a desproporção de abordagem de pessoas de raça negra em relação às de raça branca é enorme, além de que as abordagens em função da classe social e nível de estudo são muito desproporcionais; Afinal, quem é mais jovem, de classe social inferior e de raça negra, forma uma combinação que leva a abordagem policial, a realização da busca pessoal e conseqüentemente a algum tipo de conflito ou violência entre policiais e abordados. Grande parte da população carioca acredita que a cor da pele é fator importante que leva a abordagem policial. No entanto, as outras opiniões somadas indicam que o mais importante continua sendo a aparência em geral, a forma de se vestir, enquanto a atitude suspeita é também citada com grande proporção, porém fica em minoria em relação à aparência. [15]

São muitas indagações em relação ao tipo de suspeito "perfeito". Não obstante, tais conclusões são pessoais e continuarão a ser, de alguma forma, discriminatórias com algum tipo de pessoa, seja ela por classe social ou cor da pele; Toda classificação de algum tipo de suspeito padrão será discriminatória pois estará taxando determinado sujeito que tenha aparência dentro desta moldura; Concluirá apenas que por uma aparência determinada já se poderá temer que cometerá algum crime; Isso não é diferente da teoria do criminoso nato já lançada por LOMBROSO, pois ao se determinar que alguém, somente por sua aparência física ou forma de se vestir é um criminoso, apenas se está reformulando,de forma semelhante, as idéias do positivismo biológico, quem sabe em prol de um positivismo sociológico. Ainda que se abandone a aparência física da pessoa em prol de uma escolha baseada no tipo de roupa ou certo tipo de cabelo, no lugar em que pretensamente deveria ou não deveria estar, continuamos no reino dos estereótipos. LOMBROSO, afirma que esses estereótipos, que estariam intrínsecos nas inclinações e hábitos de certas pessoas, são transmitidos de geração em geração, ou seja, hereditários; Como animais se defendendo de predadores, afirmando que se deve temer o criminoso nato, como um pássaro de gaiola teme uma ave de rapina, como se vê na passagem de sua histórica obra:

Suponho que existe aí um fenômeno hereditário. A impressão legada por nossos pais e transmitida a nossos filhos, tornou-se uma espécie de conhecimento inconsciente, semelhante ao dos pequenos pássaros nascidos e cridos e nossas casas, que batem com o bico e com a asa nas gaiolas, assustados, quando vêem passar acima deles aves de rapina, que somente seus avós conheceram. Cada dia nos ensina a parte importante do inconsciente nas ações humanas e que papel representam aí o atavismo e a hereditariedade. [16]

LOMBROSO aponta seu pensamento baseando-se em crenças e preconceitos que o ser humano tem. Sustenta que o criminoso tem um olhar característico e que, se for colocado em uma posição de esforço, ele desenvolverá um olhar feroz que é especial ao criminoso nato. Argumenta que o homem pode disfarçar todos os seus trejeitos, à exceção do olhar:

Eu acho o olhar dos assassinos muito análogo ao dos felinos no momento da emboscada e da luta; e explico pela contínua repetição das más ações; por que nas crianças mais delinqüentes nunca observei o olhar feroz. As raras exceções encontradas nos adultos provem de um fenômeno muito curioso, já notado por Vodocq e que chamarei de duplo olhar. Lacenaire, Luciani, Gasparone, por exemplo, para só citar alguns, tinham dois olhares diferentes, um doce e quase feminino e outro feroz e felino, que variavam segundo seu estado de espírito, ora amável ora feroz, o que lhes dava um duplo poder de fascínio, sobretudo com relação à mulher – primeiro atraída pela aparência cortez, em seguida cativada pelo terror e pela energia, como nos muitos casos de cumplicidade inexplicável. [17]

No Brasil, um dos grandes adeptos da teoria de LOMBROSO, FERRI, e do atavismo, foi Raymundo NINA RODRIGUES, maranhense, nascido em 4 de dezembro de 1862. Em sua obra As Raças Humanas e a Responsabilidade Penal no Brasil, reproduz dentro do contexto social brasileiro da época da abolição da escravatura, o pensamento do atavismo, criticando o tratamento dado pela lei penal aos negros, defendendo que deveria ser diferenciado dos demais, os mais desenvolvidos segundo ele:

O desenvolvimento e a cultura mental pemittem seguramente às raças superiores apreciarem e julgarem as phases por que vai passando a consciencia do direito e do dever nas raças inferiores, e lhes pernittem mesmo traçar a marcha que o desenvolvimento dessa consciencia seguiu no seu aperfeiçoamento gradual. Mas esta acquisição, puramente cognosciva, nenhuma influencia pode ter na condu-cta dos povos civilisados. As condições existenciaes da sua sociedade tendo variado, com ellas variou o conceito do direito e do dever. As condições existenciaes das sociedades, em que vivem as raças inferiores, impõem-lhes tambem uma consciencia do direito e do dever, especial, muito diversa e ás vezes mes-mo antagonica daquella que possuem os povos cultos. Mas, a esta circumstancia, que já os imedia de ter a mesma consciencia do direito e do dever, accresce que a sua organisação physiopsychologica não comporta a imposição revolucionaria de uma concepção social, e de todos os sentimentos que lhe são inherentes, a que só puderam chegar os povos cultos evolutivamente, pela accumulação hereditaria gradual do aperfeiçoamento psychico que se operou no decurso de muitas gerações, durante a sua passagem da selvageria ou da barbaria á civilisação. [18]

NINA RODRIGUES era totalmente contrário à igualdade entre as raças frente ao direito penal. A sua concepção de superioridade dos brancos em detrimento dos negros e mestiços era de tal forma a comparar estes a animais em processo de civilização. Essa é a base histórica do pensamento jurídico predominante no Brasil por algum tempo. Mesmo com autores que foram contra esse tipo de pensamento, ainda assim essa base intelectual está presente em muitos pensamentos preconceituosos da atualidade.

Todo esse sistema de controle social está no discurso oficial de que o direito penal serve para proteger os bens jurídicos, prevenir a prática de crimes, está representado por uma igualdade, por uma prevenção geral. No entanto se tem um controle social formado por diversas instituições, que trabalham para manter o mesmo sistema de controle que se repete há muito tempo, controlando as classes desfavorecidas em favor de poderosos, ou seja, a criminalização de fatos praticados pelas classes de proletários, um sistema que visa garantir a manutenção do poder em relação à classe dominada, garantindo a reprodução dessas classes sociais com o apoio de todas essas instituições. [19]

A proteção de bens jurídicos gerais é aparentemente abrangida por todos. Entretanto, é efetivada para as classes subalternas enquanto estas interessam para a produção do capital, quando não são marginalizados e não tem qualquer proteção de bens jurídicos essenciais tornando assim uma violência sem conseqüências penais. Enquanto isso os crimes cometidos pela classe dominadora são abrandados, ou muitas vezes nem são considerados crimes, firmando claramente a diferenciação entre as classes sociais frente ao poder público. Tornam esses crimes negócios muito lucrativos, que mesmo sendo vistos por todos, não se tem qualquer sanção penal e quando tem ainda assim são muito rentáveis. Esses tipos penais que dão uma idéia de proteção geral são criados apenas como discurso para a população ser enganada, de forma que se imagine que algo está sendo feito para amenizar os abusos cometidos pelas classes dominantes. [20]

Com isso, percebe-se uma criminalização de indivíduos estereotipados, pelos agentes de controle social, sendo importante a separação de elementos que cometem violências e fraudes, os tratando de forma rigorosa, com tudo que a lei pode oferecer par afastá-los do restante da sociedade controlada, enquanto os criminosos de classes sociais elevadas, que causam um problema social maior, cujas ações têm grande relevância para a sociedade como um todo, são tratados como simples pessoas sem honra Às vezes nem isso, são até admirados por cometer as maiores ilicitudes, sendo clara a preocupação do sistema em afastar da sociedade os marginalizados e os que realmente causam dano social são vangloriados por sua esperteza. [21]

O discurso real da função do Direito Penal em relação à manutenção da separação social existente está claro, ainda com o intuito de manutenção da exploração de mão-de-obra barata e abundante e mantendo o controle dessa população explorada. Com isso se percebe a trilha que se deve seguir: ou será o caminho da submissão às classes dominantes ou será a prisão, o afastamento do indivíduo, a supressão de sua liberdade e de direitos mínimos, a sexualidade, direitos políticos, culturais, a recreação, em fim, uma forma de privá-lo de tudo, para que se lembre de respeitar os ditames dos dominadores. É um perfeito sistema de controle formado por uma rede de instituições delimitadoras e repetidoras de entendimentos que se deseja incutir na sociedade. E o mais importante: que todos devem consumir bens cada vez mais, mesmo que não se tenha condições de adquiri-los. [22]

Os estereótipos de criminoso vêm do próprio sistema de controle, que visa afastar os que não se enquadram ou não aceitam as formas de dominação existentes, dando exemplo para os que pretendem desrespeitar e ainda mantendo dentro da sociedade apenas os que interessam para a produção de capital, protegendo esses de forma mínima. Para que se mantenham trabalhando, exercendo sua cidadania de forma que consumam e gerem mais capital para os detentores dos meios de produção.


2.ATIVIDADE POLICIAL E A FUNDADA SUSPEITA

2.1.CONFIANÇA NA POLÍCIA

O que se verifica na população brasileira é que não confia no trabalho da Polícia, especialmente na Polícia Militar. Isso se verifica em diversas regiões do país e se confirma com a pesquisa realizada pelo IBOPE no ano de 2008, que constata que a maioria, 56%, desaprova as ações do governo em relação à segurança pública e a grande maioria dos entrevistados, 60%, considera a segurança pública regular ou péssima. Isso mostra a derrota que existe nesse campo. Ainda se acredita que a tendência é piorar cada vez mais. No entanto, a população confia em sua grande parte nas demais instituições que não estabelecem uma relação direta com a população, ou seja, a Polícia Federal (que é aprovada por 70% dos entrevistados), enquanto a Polícia Militar (que tem atuação direta e estabelece um contato mais próximo da população), não é confiável para 51% dos entrevistados. [23]

Ou seja, a confiança na Polícia Militar cai cada vez mais, enquanto a população não acredita na Instituição e não espera melhora para o cenário da segurança pública no país, tendo um resultado temeroso como se vê na mesma pesquisa pois acredita-se que a pena de morte é uma solução para 46% das pessoas entrevistadas ao mesmo tempo em que quase 40% dos entrevistados não confia no poder judiciário. Acredita-se que a pena de morte é uma solução, e quando se fala em prisão perpétua então, a aprovação é gritante, 64% dos cidadãos entrevistados aprovam tal pena. [24]

Verifica-se, portanto, uma forte onda de descrença nas instituições de segurança pública e nas atitudes tomadas pelo governo em relação a ela. Além de tornar desacreditada a instituição policial ainda tem um diferencial: a população está sentindo medo da polícia. Em pesquisa realizada entre a população carioca, RAMOS e MUSUMECI apontam que grande parte da população sente algum medo da polícia:

Em relação ao temor, a freqüência mais alta de respostas é dos que afirmam não ter nenhum medo da polícia, mas numa proporção quase idêntica à soma dos que dizem ter muito (14,5%) ou médio (27,4%) medo. Como a pergunta – vale insistir – se referia à polícia em geral e como é possível que muitos tenham respondido "nenhum" informados pela máxima "quem não deve não teme", torna-se ainda mais expressivo o fato de a maioria da população carioca (58,8%) admitir que sente algum medo da polícia (pouco, médio ou muito). [25]

Como forma de avaliação do trabalho da polícia as pesquisas mostram extrema reprovação pela população, que se diz insatisfeita e até mesmo com medo dos profissionais de segurança pública. Como se deve mudar essa realidade? Não basta apenas uma mudança salarial, não basta uma mudança comportamental. A alteração da forma de tratamento dispensado à população é uma necessidade urgente. Nada mais justo com os responsáveis pelo pagamento de impostos que sustentam toda a estrutura da grande máquina estatal seria o trato cordial e respeitoso, o que normalmente não acontece, pois o cidadão é visto como "inimigo" em muitos casos. Em pesquisa realizada no ano de 2007 no Estado do Rio de Janeiro pelo Instituto de Segurança Pública, fica evidente o descontentamento da população pelo tratamento dispensado para com eles por policiais militares, desde a apresentação pessoal do policial, forma de se vestir e se expressar , reprovada em sua maioria, até a esmagadora insatisfação com referência a distribuição do efetivo policial nos bairros:

11

Fonte: Pesquisa de Condições de Vida e Vitimização/ISP (2007)

O que se vê é uma reprovação geral de todas as formas possíveis. O que então se verifica é a necessidade de mudar esse quadro de desconfiança, como se vê no trabalho de Tânia Maria PINC:

Neste sentido, confiar na instituição polícia requer que os cidadãos conheçam a função que ela desempenha, em outras palavras: para o que a polícia serve; a fim de que ele possa demandar seus serviços de acordo com o objetivo pelo qual ela foi criada; bem como, que todos os policiais conheçam a missão institucional, a fim de que possam atender o cidadão nas suas necessidades específicas. [26]

Por isso, se faz necessário um conhecimento do cidadão pela polícia e vice e versa, contando assim com uma quebra de tabus. Lembre-se, por exemplo, das chamadas recebidas através do telefone de emergência 190, que vão desde uma mulher prestes a dar a luz, até mesmo a um desentendimento entre pessoas. De certa forma essas ocorrências não são criminais, mas geram um grande volume de trabalho para a polícia que necessariamente desloca uma viatura para atender cada uma delas, muitas vezes deixando de atender uma ocorrência realmente criminal. Sendo assim, os policiais desempenham funções atípicas a sua atribuição, que seria de enfermeiro, conselheiro amoroso, psicólogo, agindo diferentemente da especialidade para o qual foi treinado e deveria atuar, ou seja, diante da ocorrência de um crime. [27]

Portanto, ou o cidadão confia em demasiado na polícia, que liga para a emergência em qualquer situação, ou ele não tem outra opção gratuita e que atenda 24 horas por dia de outro serviço público oferecido pelo Estado, que tenha um atendente sempre pronto a escutá-lo. Ou então ele não conhece o trabalho da instituição e por isso não sabe quais as suas atribuições legais, qual a verdadeira função da polícia, e se não conhece não confia, pois confiança se gera com o conhecimento por parte do usuário em saber qual atribuição de cada ente e o que ele deve e pode fazer em cada situação. [28]

Há de se falar também na desconfiança que a polícia tem da população, de que trata o presente trabalho. Se há uma desconfiança na polícia, também há uma desconfiança da polícia em relação ao cidadão, como comenta PINC:

Há ainda que se analisar a ação policial proativa exemplificada anteriormente com a abordagem policial. Neste caso a iniciativa da ação é do policial, mas ela ocorre na razão da desconfiança do agente contra a pessoa abordada, pois o policial, quando em patrulhamento, suspeita de alguém, ou seja, desconfia que essa pessoa possa representar alguma ameaça para a segurança dos outros em razão de sua atitude e interfere no direito individual de ir e vir, a fim de investigar o fundamento dessa suspeita. Por mais que tentem, as instituições não conseguiram traduzir em seu conjunto de normas um significado de atitude suspeita que possa ser universalizado, pois trata de comportamento humano. Entretanto o procedimento da abordagem policial é legal, ou seja, está previsto na legislação e, além disso, no estado de São Paulo, foi desenvolvido pela polícia militar um Procedimento Operacional Padrão – POP, que orienta e padroniza as ações do policial militar nas abordagens, a fim de evitar excessos e conseqüentemente, abuso de poder. [29]

Essa situação só poderia mesmo mudar com o conhecimento que a população poderia ter do trabalho policial, quais as suas prerrogativas e atribuições. Isso se dá por meio de leis mais claras e acessíveis ao público e que explicitem as atribuições de cada ente com a devida especificidade e que atinja todas as classes sociais. Que não sejam legisladas apenas para a elite dominante. Que não tenham cunho transitório, ou seja, se fixem por período de tempo coerente ao ponto de alcançarem o conhecimento do cidadão e que façam parte de sua cultura. Ainda tendo como objetivos a estabilidade da ordem social, dando enfoque ao controle que as autoridades têm da ordem social e a população tem que acreditar nesse controle. [30]

Com referência à abordagem policial, se ressalta a legalidade do ato, pois advém da manutenção da ordem social, mas esse exercício de direito realizado pelo policial não é nem um pouco agradável ao cidadão, e isso se torna uma forma de opressão e demonstração de força do Estado impondo seu poder coercitivo para com seu administrado. Contudo, a opinião de quem passa por uma abordagem ou de quem observa o ato ser efetuado, é influenciada diretamente, enquanto a mídia tem a função de exercer a influência indireta na opinião de quem não passou por nenhuma das experiências apontadas. Essas experiências ruins são contagiantes e geram uma desconfiança geral no trabalho da polícia, desconfiança essa que dificilmente se consegue quebrar. Ainda se atribui a experiência com a polícia como ruim pois foi ela quem participou dos piores momentos da vida de um cidadão, como o dano, a violência o desrespeito, mesmo que a instituição não tenha causado tal mal ao indivíduo, ela quem esteve presente em todos eles, causando uma ligação direta a pontos negativos vividos por uma pessoa. [31]

A instituição está o tempo todo enfrentando dilemas, ou tem uma relação melhor com a população, não cerceando direitos, e tratando o cidadão com mais liberdade ou mantém a ordem social e relativiza os direitos individuais das pessoas para a manutenção dessa ordem social, como ressalta PINC:

Ainda no que se refere à abordagem policial, em que pese estar amparada pela legislação e objetivar manter a estabilidade da ordem social, variáveis estas que representam a estrutura de oportunidade para aplicação de políticas que constroem a cultura de confiança, paradoxalmente, à medida que esta ação é implementada pelos policiais é provável que tenha um efeito negativo na confiança, em razão de gerar no cidadão uma referência negativa da instituição, pois não agrada a ninguém ter direitos individuais cerceados, mesmo que seja momentaneamente. No entanto, se esta ação deixa de ser implementada, a ordem social pode correr riscos. [32]

Portanto, se faz necessária a manutenção da abordagem policial. Contudo, a manutenção da ordem social deve ser atualizada. Mesmo tendo legislação que garante tal procedimento, essa deve ser atualizada para o Estado Democrático de Direito, tornando assim cidadão como sujeito de direitos que ele é, o centro das atenções. Ele deve ter seus direitos e garantias respeitados, seguindo o ritmo de uma leitura constitucional das leis que garantem a abordagem. Essa renovação deve ser respeitada por todos os membros da corporação, o que muitas vezes não se consegue, como explana muito bem PINC. Os que atuam nas linhas de frente recebem a mensagem correta, mas não a interpretam e descartam como se fossem algo inoportuno e impróprio para a realidade:

Isto posto, a hipótese que proponho, no que diz respeito à abordagem policial, é a de que os policiais militares conhecem a legislação e os procedimentos, mas não os reconhecem, pois a dinâmica de mudanças da estrutura organizacional ocorre num ritmo em que a mudança da cultura organizacional não consegue acompanhar. Em outras palavras, existe um problema na difusão das reformulações, é como os membros de um corpo que não conseguem decifrar a mensagem do cérebro e respondem de alguma forma, que não a esperada. [33]

Portanto, a falta de aceitação dos que atuam diretamente com a população faz com que a confiança na instituição diminua. Com isso se verifica que algumas atitudes devem ser tomadas, como a transparência da instituição, demonstrando suas ações com respaldo as que devem ser preservadas pelo sigilo, com a aplicação das políticas públicas de respeito aos cidadãos e aos direitos humanos respeitadas por todos os membros da corporação. Principalmente por quem está atuando diretamente com a população, um elevado sentimento de controle da ordem social da população em relação às autoridades envolvidas com a segurança pública, uma efetiva ação preventiva, que ocorre antes do crime. Como as atividades de polícia comunitária, que atua no contato direto da população com o policial estreitando a distância entre eles e ainda um controle externo da atividade policial possibilitando assim uma responsabilização dos que ainda teimarem em remar contra a correnteza do respeito aos cidadãos e das garantias fundamentais e a aplicação dos direitos humanos. [34]

2.2.PRECONCEITO

Mesmo tendo um alto índice de membros negros, sejam eles oficiais ou praças, as polícias militares, normalmente, contrariando as opiniões populares, se dizem não racistas. O acesso e a ascensão nas carreiras militares, tornam-se um atrativo para os negros e mestiços pois, como são firmadas em hierarquia e disciplina torna a vida profissional menos preconceituosa do que a vida civil, trabalhando em uma empresa qualquer por exemplo. No entanto, a grande participação de negros nos quadros das corporações não muda a visão racista que se tem no momento da escolha de um suspeito. [35]

Em entrevistas com os mais experientes de uma corporação policial militar se nota a esquiva de certos assuntos sobre raça e preconceito. Todavia, muitos assumem de certa forma a parcela de preconceito em um primeiro momento para a escolha de um abordado, em que a cor da pele é motivo sim de suspeição. Essa negativa contraria a maioria das pesquisas em que se verifica que a maioria dos escolhidos como suspeitos serão os negros. A PMRJ se orgulha de ter sido comandada três vezes por coronéis negros, muito embora a sua visão preconceituosa não tenha mudado. Em entrevista realizada com policiais militares do Rio de Janeiro, RAMOS e MUSUMECI obtiveram muitas respostas evasivas, mas que tinham um cunho racista na motivação da escolha do elemento suspeito a ser submetido à abordagem policial No cotidiano policial as respostas tendem a ser iguais, que a atitude é que configura a suspeição e não a cor da pele, mas quando se pergunta de quais atitudes se está falando, as respostas recaem sobre alguma característica física que fatalmente será relacionada à cor da pele . [36]

Uma hipótese em que não se fale em racismo dentro da própria policia é a de que o policial não tem cor, tem farda, frase esta formulada em um grupo focal no estudo de RAMOS e MUSUMECI na cidade do Rio de Janeiro, o que se resumiria em uma guerra que acontece predominante entre os policiais e os civis, entre policiais e bandidos, por isso de um lado todos são iguais, todos tem farda, de outro, todos são inimigos. O que resultaria no policial militar negro se sentir diferente dos civis negros, ele não usará de empatia para com o abordado em uma situação de suspeição pois ele, o policial, naquele momento não é negro e sim um PM, o que afasta a possibilidade de tratamento diferenciado dispensado a um negro em uma abordagem policial, sendo o PM negro ou branco, por esse pensamento de igualdade de farda dentro da caserna. Por isso, um jovem negro não ficará menos receoso de ser abordado por um policial negro pois terá o mesmo tratamento. Se o jovem negro não tem uma farda, então ele é parte inimiga e não será considerado como igual pelo policial no memento da abordagem. [37]

Em uma situação de suspeição não são todos os abordados que são submetidos à busca pessoal. O que levaria a esse critério discricionário seria a fundada suspeita no momento da abordagem, no entanto foram aqui expostos vários motivos em que se pode chegar a essa fundada suspeita. Entretanto, o que se percebe no cotidiano seria uma distorção entre os critérios de um cidadão ser considerado suspeito e sua real suspeição fundada em fatos concretos. Como se vê em pesquisa realizada por RAMOS e MUSUMECI, nota-se uma tendência em submeter mais os negros e os pardos à busca pessoal do que os brancos, pois os negros estão em quantidade inferior no total da sociedade e representam uma quantidade expressiva no total de abordados submetidos à busca pessoal:

Fonte: RAMOS; MUSUMECI, Elemento Suspeito..., p. 114

O que se percebe com o gráfico apresentado por RAMOS e MUSUMECI é que em proporção relativamente superior, 55%, os negros são revistados quando abordados, diferentemente dos brancos que em proporção muito inferior, 32,6%, são revistados no momento da abordagem. Logicamente pode-se notar que a população branca por estar em situação mais favorável e como a maioria das abordagens são realizadas em blitzes, ou seja, quando os veículos são abordados aleatoriamente, e pelo motivo da população negra ainda se encontrar em sua maioria nas classes menos favorecida, que não se deslocam de carro, os negros são minoria na população, não sendo motivo fundamentado a sua sobre-representação no gráfico dos revistados pela polícia. [38]

Segundo Paul AMAR, o termo filtragem racial significa a seleção feita pela polícia no momento da abordagem, usando o critério da cor da pele:

Para fins do presente capítulo, o filtramento racial será descrito em relação a maneira como hoje é utilizado na esfera pública nos Estados Unidos: assim, "filtramento racial" refere-se a praticas de racismo institucional no setor de polícia e segurança que provieram da histórica tolerância americana em relação à impunidade e a "discricionariedade" policiais em questões relacionadas ao controle das hierarquias raciais; consiste em práticas racialmente tendenciosas de identificação de suspeitos usadas em específico no contexto dos motoristas que são parados nas rodovias. [39]

No presente contexto, apesar de disfarçado, há uma filtragem racial nas instituições policiais. Com isso nota-se um racismo institucional que AMAR salienta bem, em várias instituições, e são mascaradas por pareceres técnicos e científicos que respaldam a discriminação racial:

Ao contrário do racismo estatal formalmente codificado, o racismo institucional gera hierarquias através de práticas profissionais tecnocientíficas ou rotineiras "neutras" dentro de instituições públicas ou privadas (tais como a mídia, shoppings ou firmas de segurança privadas) que controlam espaços públicos, serviços ou imagens.

Há racismo institucional quando uma organização ou estrutura social cria um fato social racial hierárquico – um estigma visível, identidades incorporadas e geografias sociais – mas desloca as implicações raciais deste processo. Em vez de reconhecer raça e racismo, referem-se ao reino das práticas profissionais cotidianas, "técnicas", que só estão ligadas à raça por "coincidência". Por exemplo: a publicidade pode vender produtos cominando imagens positivas de brancos de classe média e imagens aviltantes, sexualizadas ou criminalizadas de negros. No entanto, a mídia alega que esta prática não passa de uma feliz coincidência do funcionamento técnico da economia do marketing, não do racismo. Outro exemplo: um governo municipal pode não fornecer transporte público a bairros cuja população é de maioria negra. Mas essa prefeitura afirmará que se trata de um problema fiscal ou de infra-estrutura, não de uma forma racial de privação de direitos civis. Ou um sistema escolar pode educar apenas alunos brancos, alegando ser este o resultado técnico das notas que obtiveram em um exame de seleção. Não enfrentam o fato de que o sistema educacional subsidia sistematicamente o desempenho dos alunos brancos, ao passo que o sistema não oferece estrutura adequada e degrada alunos negros a vida toda. As desculpas tecnocratas do racismo institucional permitem que essas organizações continuem a esquivar-se de assumir a responsabilidade pelo racismo e a bloquear a toada de consciência do papel que cumprem na perpetuação e intensificação do racismo. Entre as formas mais preocupantes de preconceito institucional talvez estejam as formas globais e locais de racismo que foram redesdobradas no contexto das "guerras urbanas contra o crime", recentemente articuladas às "guerras de segurança" transnacionais e com elas reidentificadas [40]

AMAR ressalta a importância que se tem de trabalhar com o racismo institucional para amenizar a separação existente nessas instituições e assim trazer à tona o tema para que se discuta em seus cursos de formação e instrução, trabalhando de forma direta esses temas que são normalmente evitados.

Segundo BARROS, a abordagem policial é extremamente preconceituosa. Ele comenta a pesquisa que realizou na região metropolitana de Recife/PE, entre policiais experientes e iniciantes, oficiais e praças da Policia Militar de Pernambuco e trouxe a baila o capcioso assunto de racismo em uma instituição policial militar, como ele é trabalhado e quais as suas faces, quando os suspeitos são escolhidos e se a cor influi ou não no momento de escolher as pessoas que serão abordadas. Se as atitudes é que são suspeitas ou a aparência da pessoa, como se vê no gráfico a cor da pele é de grande influência no momento da decisão da abordagem. [41]

Fonte: BARROS, Geová da Silva. Racismo institucional: a cor da pele como principal fator de suspeição. Dissertação (Mestrado em Ciência Política). Recife, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, 2006. p. 112.

Como se vê no gráfico, o negro é o elemento suspeito padrão dos policiais pesquisados. Isso demonstra filtragem racial que existe na abordagem policial, mesmo que ela seja de forma velada, se busca sempre maquiar o racismo com diversos subterfúgios como ressalta BARROS:

O racismo sofre adaptações, muda de estratégia, conforme as circunstâncias, dando a entender que está ultrapassado e moribundo. Entretanto, continua tão vivo quanto antes e muito mais perigoso, pois essa aparente invisibilidade permite que se instalem e produzam seus efeitos sem serem percebidos. Esse racismo mimético, que se confunde com o meio, assumindo discursos politicamente corretos, que caminha ombro a ombro com suas vítimas, deve ser erradicado das práticas institucionais. [42]

Com a pesquisa, se verifica que os policias dão a entender outro tipo de suspeição, a de que quem está nas favelas e o modo de se vestir, essa é mais uma forma de disfarçar o racismo institucional presente na instituição castrense. A abordagem é a forma mais simples de atuação policial. Por isso deve ser pautada pelos direitos humanos, pois a sociedade em geral exige uma forma mais democrática e respeitosa da atividade policial, com isso o estudo sobre o racismo na aplicação dessa prática se torna tão importante. [43]

O que se percebe é uma falta de aceitação do racismo incutido nas instituições que atuam diretamente com a população, a repulsa em aceitar que ele existe e a recusa de trabalhá-lo internamente; Não podem ser justificativa para que as conseqüências causadas pelo racismo sejam afastadas de sua motivação inicial, como ressalta BARROS:

Nesse sentido, apoiar-se na falta de intencionalidade de uma prática racista como justificativa para desqualificá-la como tal não é mais pertinente, pois o racismo deve ser considerado em virtude das conseqüências negativas da ação. Assim, mesmo que os atores de uma instituição não sejam racistas ou que não tenham intenções de cometer práticas racistas, a conseqüência das ações é o que contará na caracterização. [44]

Mesmo para os membros de uma instituição, que não se considerem racistas, repetir uma prática usual da instituição, que tenham conseqüências racistas, de nada adiantará os princípios desses membros se suas ações perpetuem resultados de cunho preconceituoso. Estarão repetindo gestos e comportamentos de gerações passadas que preconizavam a segregação racial.

BARROS, em pesquisa realizada no Estado de Pernambuco, faz aflorar o grande preconceito existente na instituição policial militar daquele estado. Verifica que nos momentos de escolha dos suspeitos o negro sempre é priorizado, seja pelo policial no inicio de carreira ou pelos mais experientes. No entanto, verifica-se, na pesquisa, que o policial, quando é colocado de forma externa, ou seja, quando ele é colocado como espectador, na maioria das vezes identifica o comportamento racista dos outros policiais, mas quando é colocado como parte da equipe, tende a maquiar a filtragem racial que existe na corporação, demonstrando assim que esse comportamento não é aceitável mas que normalmente acontece. [45]

Na atividade policial, mesmo sem querer o agente explicita o racismo que está em seu interior. Em entrevistas realizadas por BARROS, essas opiniões afloram de forma natural, explicitamente menosprezando um indivíduo de cor da pele negra, o colocando como uma pessoa inferior ao de cor da pele branca. Frases como "ele é pretinho, mas tem uma alma de branco" são claramente racistas. Têm como fundamento um elogio ao companheiro de farda negro, dizendo que ele não é tão ruim assim, que apesar de negro é uma boa pessoa. Essas opiniões, de dentro da polícia, não há de se esperar um comportamento diferente nas ruas, em um contato direto com a população. [46]

Considerando o racismo institucional no organismo policial, se preconiza a esquiva dos agentes em assumir tal preconceito. Prefere-se o preconceito social ao invés do racial, porém as opiniões se contradizem quando os agentes falam dos demais policiais. Quando se fala na instituição em geral, se admite um racismo institucional, se admite que os policiais priorizem o negro ao branco na hora da abordagem e, o que é mais importante, admite-se certa normalidade nisso, se escudando do racismo institucional, alegando que a própria sociedade é racista e com isso a instituição apenas repete o que a população em geral faz. Contudo, uma sociedade pautada pelos direitos humanos, que preconiza o Estado Democrático de Direito, não pode permitir que uma instituição que faça parte de seu aparato, tenha como base alegações de tal estirpe. [47]

BARROS conclui que o preconceito racial se encontra nos policiais mais antigos e também nos novos em uma proporção muito parecida, isso significa que as práticas apresentadas continuarão se repetindo. Não se verifica uma melhora no tratamento do tema pelas instituições. A proposta apresentada é a seguinte:

Elaborar cartilha sobre o racismo institucional. Essa cartilha iniciará uma ampla discussão sobre a temática, o que facilitará o trabalho de conscientização dos operadores do sistema. É essencial lembrar que ainda existem gestores que desconhecem a própria definição de racismo institucional.

Constituir comissão multidisciplinar para formatar padrões de identificação do suspeito policial. Esses padrões serão estabelecidos a partir dos olhares das múltiplas ciências que lidam com a criminalidade. Dessa forma, os policiais terão um padrão de identificação do suspeito mais profissional. Em conseqüência, reduzir-se-á a reprodução do "padrão" do senso comum.

Tornar "racismo institucional" conteúdo programático nas disciplinas de Ética e Cidadania e Direitos Humanos nos cursos de formação das instituições policiais. Com efeito, aumentar-se-ão os momentos de discussão sobre a temática, o que permitirá reforçar o cuidado em trabalhar de forma profissional. [48]

Com tal proposta, BARROS aponta algumas formas de se discutir mais no âmbito policial militar o tema racial, tentando evitar que se perpetuem as práticas que ocorrem simplesmente por repetir os atos que outros agentes fazem sem se questionar sobre tal assunto. Somente com a conscientização de suas ações, se conseguirá uma polícia cidadã, que respeita os direitos humanos e promove uma igualdade entre todos os cidadãos, para assim conseguir chegar a uma liberdade. [49]

2.3.TEM UM ELEMENTO SUSPEITO EM FRENTE A MINHA CASA

A população constrói um tipo ideal de pessoa suspeita e com isso também contribui para a formação do suspeito para o policial, como se depara com um tipo de suspeito que ele, o cidadão, entende como tal, em frente a sua casa. Por exemplo, fatalmente o cidadão procurará a emergência, descrevendo o sujeito estranho que ronda sua casa e exigirá dos agentes públicos que seja tomada alguma atitude, que de uma forma ou de outra, será a abordagem policial com possível busca pessoal. Esse tipo de comportamento é encontrado em diversas regiões do país, pois é indicado por experientes agentes de segurança pública, profissionais que dão dicas para se viver nos dias atuais como se pode averiguar na página da internet da Polícia do Senado:

Com o crescimento desordenado das populações nas grandes cidades nos últimos anos, especialmente nas capitais e nos principais municípios do interior, a segurança pública tornou-se um dos setores mais exigidos pela sociedade, tendo em vista que, como era de se esperar, os índices de criminalidade também aumentaram na mesma proporção. É claro que, muitas vezes, o crime pode ser evitado com pequenas precauções. Afinal, como diz o antigo ditado, "a ocasião faz o ladrão". Vale salientar, que o melhor parceiro das forças de segurança é você, cidadão. Somente com a colaboração da sociedade, podemos fazer um trabalho efetivo e assim aumentar a segurança e a tranqüilidade em nosso Estado. Nas RuasPrevina-se contra a ação dos marginais não ostentando objetos de valor como relógios, pulseiras, colares e outras jóias de valor. Evite passar em ruas ou praças mal iluminadas. Se sentir que está sendo seguido, entre em algum estabelecimento comercial ou atravesse a rua. Não saia com grandes quantias de dinheiro ou cartões de crédito se não houver necessidade. Não abra a carteira ou a bolsa na frente de estranhos. Separe pequenas quantias de dinheiro para pagar passagem, café, cigarros etc. Ao sair sozinho, procure sempre ficar no centro da calçada e na direção contrária ao trânsito. Fica mais fácil perceber a aproximação de um veículo suspeito. Não deixe de comunicar a presença de elementos suspeitos nas proximidades de sua casa. Ao retornar, notando algum sinal estranho (porta aberta, luzes acesas, etc.), não entre em casa, chame a polícia... [50] [sem grifo no original]

Nas dicas de segurança fica explícita a estereotipagem de indivíduos, um atavismo generalizado que se espalha pela população que taxa tais tipos de sujeitos como sendo predeterminados a cometerem crimes Não há um trabalho com a sociedade, com educação social, preconceitos e racismo. Não se verifica no ensino fundamental e médio qualquer tipo de estudo em relação ao preconceito racial com os jovens.

Do latim atavu, quarto avô, atavi, antepassados.

Reaparecimento de determinado indivíduo, de tendências peculiares a ascendentes remotos. Pode, também, ser definido como a tendência de um homem ou animal apresentar características inerentes ao seu tipo primitivo, progressivamente alterado. O famoso médico criminologista Cesare Lombroso (1836-1909) publicou, em 1875, uma obra intitulada O homem delinqüente, na qual professou a original opinião de que o crie não resulta, exclusivamente, do livre-arbítrio, mas de várias causas, principalmente a biologia, representada pelo atavismo ou regressão ao homem primitivo. [51]

RAMOS e MUSUMECI, ao questionarem a população carioca sobre os preconceitos existentes na Polícia Militar daquele Estado, se depararam com a resposta de que a polícia nada mais é do que um espelho da sociedade:

Acha que a polícia é mais, menos, ou igualmente racista que o resto da sociedade?

A maioria (59,9%) acha que policia e sociedade são igualmente racistas, vindo em seguida os que acham que a primeira é mais racista que a segunda (29,7%). Não há variações significativas por gênero ou raça em nenhuma das respostas a essa pergunta. Os mais velhos (50 a 65 anos) e os de alta escolaridade (mais de 12 anos de estudo) ficam acima da média na avaliação de que a polícia e a sociedade são igualmente racistas: respectivamente, 66 e 65%. Quanto à renda, as maiores distâncias da média, para a resposta "igualmente", estão nos dois extremos: mais de zero a um salário mínimo (65,9%) e mais de cinco salários mínimos (63,8%). A distribuição racial, dentro de cada resposta ("mais", "menos" ou "igualmente") é muito próxima da distribuição racial da população como um todo. [52]

A própria sociedade estabelece parâmetros de suspeição de indivíduos, mas a polícia deve ter parâmetros técnicos para especificar tal tipo de suspeição, diferenciando-se do senso comum. Se faz necessária uma melhor formação acadêmica, um trabalho direto dos aspectos raciais e de estereótipos criados pela sociedade em geral. Que estes aspectos preconceituosos sejam minimizados do cotidiano policial. Com isso, se busca o afastamento de "tinos policiais", de esperteza, de adivinhação de quem é ou não é bandido, apenas por suas características físicas, ou seus trajes, taxando o pobre como bandido, o negro, o mal vestido. Essa visão de filtragem racial deve ser banida, senão ao menos reduzida a ponto de não taxar a polícia como a protetora dos ricos brancos em detrimento dos pobres negros e mal vestidos. RAMOS e MUSUMECI apontam algumas sugestões de parâmetros que podem ser utilizados para definir a fundada suspeita nas atividades policiais:

Adiando um pouco a questão específica do racismo, as sugestões abaixo vão no sentido de institucionalizar na PM a noção de fundada suspeita e de estabelecer parâmetros nítidos para a abordagem de transeuntes. Seria fundamental que:

Em documentos escritos, e em cursos de formação e de reciclagem, fossem definidos clara e detalhadamente os critérios norteadores da fundada suspeita e as justificativas técnicas para a abordagem e revista corporal de transeuntes, levando em conta diferentes situações-tipo enfrentadas no trabalho cotidiano dos policiais;

Fossem estudadas formas adequadas de monitoramento e controle das abordagens e revistas corporais efetuadas em modalidades ordinárias de policiamento ostensivo, capazes de identificar e corrigir a incidência de estereótipos e preconceitos nos critérios de suspeição;

Se estabelecesse como uma das metas do treinamento policial banir o recurso à revista corporal como mecanismo de humilhação, subjugação ou intimidação;

Tal como nos caso das blitzes em veículos, fossem instituídos mecanismos de avaliação de resultados e análise de custo-benefício das abordagens de pessoas nas ruas, em transporte coletivo e em outras situações. [53]

Se faz necessária uma melhor formação policial no sentido de escolha do cidadão que será submetido à busca pessoal, com critérios técnicos que não sejam maquiagem para estereótipos de criminosos predefinidos.

Ainda se faz importante salientar que o comportamento do cidadão perante a abordagem policial é de suma importância, com o conhecimento de seus direitos e deveres. Torna muito mais fácil o serviço da polícia e ainda poderá ser exigido um melhor atendimento desta para com a sociedade, pois sabendo os mecanismos de cobrança que o cidadão pode recorrer quando tem seus direitos violados, a atividade policial, paulatinamente, tomará uma qualidade maior.

Nesse contexto se ressalta a importância de trabalhos educativos para com a sociedade, divulgando normas relacionadas à abordagem policial, destacando cada tipo de comportamento que deverá ser tomado pelos atores que participarão da abordagem. Ressalte-se, aqui, o trabalho da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, com sua campanha de conscientização, A polícia me parou. E agora?, criada em apoio às Ouvidorias de Polícia e Policiamento Comunitário em parceria com a União Européia. A publicação ensina os direitos e deveres do cidadão no momento da abordagem policial. Vejamos algumas de suas orientações:

O QUE FAZER QUANDO FOR ABORDADO PELA POLÍCIA

A polícia pode abordar as pessoas e revistá-las sempre que presenciar alguma atitude suspeita. Se você for parado pela polícia, alguns comportamentos podem ajudar a impedir que a situação se transforme em conflito:

Fique calmo e não corra; Deixe suas mãos visíveis e não faça nenhum movimento brusco; Não discuta com o policial nem toque nele. Não faça ameaças ou use palavras ofensivas. Não é crime andar sem documentos, mas recusar-se a se identificar é contravenção penal. Se estiver sem documento, forneça ao policial dados que auxiliem a sua identificação.

SE FOR ABORDADO, VOCÊ TEM DIREITO

De saber a identificação do policial; De ser revistado apenas por policiais do mesmo sexo que você; De acompanhar a revista de seu carro e pedir que uma pessoa que não seja policial a testemunhe; De ser preso apenas por ordem do juiz ou em flagrante; Em caso de prisão: de não falar nada além de sua identificação, e de avisar sua família e seu advogado;

De não ser algemado se não estiver sendo violento ou tentando fugir da abordagem. Se algum policial desrespeitar os seus direitos, tente se lembrar e anotar o nome, a identificação e a aparência dele, o número da viatura em que ele estava e o nome das testemunhas que presenciaram os fatos. [54]

Trabalhos como este são se suma importância para a atividade policial, pois com o cidadão sabendo o seu comportamento ideal no momento da abordagem, propiciará ao policial uma maior segurança em seu trabalho e ainda, o mais importante, prevenirá o embate que tende a ocorrer com o comportamento, considerado pelo policial, desrespeitoso do cidadão quando é submetido à abordagem, com questionamentos inoportunos que tornam uma simples abordagem policial uma grande ocorrência. Com encaminhamento à delegacia de polícia por desacato, desobediência e até mesmo resistência à prisão. Cabe ainda crítica ao trabalho que poderia ser ainda melhor, pois quanto mais informação a população adquirir em relação ao trabalho policial, mais fácil se tornará essa convivência cidadão / policial. Ao mesmo tempo que entra em choque por falta de conhecimento de alguns assuntos pela população, é ocasionado o problema também pela falta de sensatez de alguns policiais que tratam o cidadão como um ser sem direitos, sem mesmo explicar o motivo pelo qual foi abordado.


3.O PROBLEMA É SÓ DA POLÍCIA?

3.1.COMO MUDAR ESSA DIVISÃO SOCIAL

O presente trabalho não pretende tratar de forma ampla as desigualdades sociais presentes neste país. No entanto, é interessante ao tema tratar de tais alegações, pois se entende que sejam, também, motivadoras de fatores criminosos provocados por má distribuição de renda. Como salienta Paulo Roberto da Silva PASSOS, "Pobreza e desigualdade social têm sido há muito tempo consideradas a causa fundamental dos males da sociedade e economistas e sociólogos têm procurado demonstrar como os fatores que estão na base do desvio social tiveram a sua própria origem nas forças econômicas e na desigualdade social." [55]

PASSOS aponta a pobreza como uma forma de indução ao cometimento de crimes, com a má distribuição de renda e com a falta de medidas necessárias pelo poder público, a falta de condições para a aquisição de bens é motivo bastante para a iniciação na carreira criminal:

Entre as abordagens que cabem ao âmbito das ciências sociais, está aquela estritamente econômica, segundo a qual o comportamento criminal está ligado à pobreza e ao nível de vida inferior ao standard. Diversos autores reconhecem que os fatores econômicos são extremamente importantes na vida social e que muitas sociedades modernas são construídas em torno de uma ideologia essencialmente econômica e acreditam, portanto, que a explicação do comportamento criminal devesse ser investigada na falência da sociedade em suprir todos os membros de bens adequados. Está implícito que se a "pobreza" fosse eliminada, poderia se iniciar um longo período desprovido de todo o desvio, inclusive a própria criminalidade. [56]

Há um nível de proteção da classe dominante para com a ânsia do individuo menos favorecido de obter seus bens. Com isso, se um rico passa em uma área menos favorecida com seu carro novo, já se espera que o pobre tenha a vontade de tomar para si, de forma violenta ou não, aquele bem. Para tanto, o legislativo já prevê tal situação e tipifica como crime um provável comportamento que um dia pode advir daquele descontentamento do indivíduo sem bens materiais para com o burguês que desfila com seu carro novo, protegendo-o assim de indivíduos marginais a sociedade. [57]

Por isso se percebe que a diferença social é crucial para o cometimento de crimes contra o patrimônio, PASSOS diz que "Assim, poderíamos dizer, sem medo de errar, e abandonando por ora os demais fatores criminógenos internos ou externos, que a diferença social desproporcional, um dos caracteres básicos do capitalismo selvagem, é a principal responsável pelo crime contra o patrimônio, que hora cuidamos." [58]

No entanto, PASSOS ressalta que a pobreza em si não se constitui num fator de predeterminação ao cometimento de crimes. Apenas pode influir, mas não necessariamente taxará o pobre como criminoso. A má distribuição de renda ajuda no aumento do cometimento de crimes, sendo que a grande maioria de crimes está ligada aos crimes contra o patrimônio. A erradicação da pobreza por meios hábeis reduzirá proporcionalmente o cometimento de crimes relacionados com tal fato, pois todos terão ao menos as mesmas condições de adquirir bens. [59]

Apesar de que, mesmo em regimes socialistas puros, a ganância do homem sempre aparecerá, mas não será de forma tão forte como no capitalismo. A proporção do cometimento de crimes contra o patrimônio em sociedades mais igualitárias seria menor. Entretanto, se tem cometimento de crimes violentos contra o patrimônio no Brasil. PASSOS entende que a violência está ligada ao baixo nível de educação que os indivíduos que cometem crimes contra o patrimônio têm. Essa proporção de violência estaria ligada com a cultura do país. Por isso "... a violência advém do baixo nível intelectual do marginal brasileiro." [60] Pois se o criminoso brasileiro tivesse um nível de conhecimento maior, tivesse tudo de mais atualizado em termos de tecnologia e artimanhas do mundo criminoso que rodeia os criminosos de "colarinho branco", provavelmente não usariam de violência em seus crimes, pois não gostariam de arriscar suas vidas em um assalto violento, com a possibilidade de ser morto pela polícia. [61]

Portanto, também em tais casos, que põe em perigo iminente a sociedade; que cria a síndrome do roubo ou seqüestro; que faz com que o indivíduo, no afã de proteger-se, veja-se compelido a viver em uma verdadeira prisão, com grades, assegurando-lhe uma pseuda [sic] vida tranqüila, à volta da casa, o Estado ocupa também papel preponderante, quer ao não sanar o desnível social, quer ao não educar a contento, como já dissemos, fazendo com que o dito "cada sociedade tem os crimes que merece" seja uma realidade. [62]

Por certo que o criminoso brasileiro age com violência por seu nível intelectual reduzido. Para tanto se faz necessária a empreitada de mecanismos de melhor acesso educação, distribuição de renda, condições sociais mais elevadas. Contudo, o Brasil apresenta um nível de distribuição de renda entre os piores do mundo. Apesar de ter melhorado muito nos últimos anos, ainda se espera uma melhor posição das autoridades e dos detentores do poder para que haja uma mudança neste contexto social.

Segundo o índice GINI, que mede o grau de distribuição da renda da economia de um país, que vai de zero, uma distribuição perfeita, até 1 (um), que seria uma total desigualdade, o Brasil está longe de muitos países com o potencial econômico muito menor. Na America Latina, por exemplo, o Brasil perde em distribuição de renda para países como a Colômbia e Paraguai que tem uma capacidade econômica relativamente inferior, como se percebe nos dados apresentados a seguir. O Brasil, em relação aos países da Europa, está extremamente com sua renda concentrada em poucas mãos dominantes. Nota-se pela escala apresentada pelo IPEA entre os anos de 2003 a 2007, que realmente houve uma melhora expressiva na distribuição de renda do país, mas isso está muito aquém de uma verdadeira mudança que possa ser sentida pela população brasileira.

País

2003

2004

2005

2006

2007

BR-Brasil

0,5809

0,5698

0,5670

0,5603

0,5533

Fonte: IPEA

O país vem melhorado muito, mas em relação aos países desenvolvidos ainda está longe de uma boa colocação na listagem mundial de concentração de renda como na tabela comparativa abaixo:

Argentina

ARG

52.2

Bolívia

BOL

44.7

Brasil

BRA

58.5

Chile

CHL

57.1

Colômbia

COL

57.6

Equador

ECU

43.7

Guiana

GUY

43.2

Paraguai

PRY

56.8

Peru

PER

49.8

Suriname

SUR

-

Uruguai

URY

44.6

Venezuela

VEN

49.1

França

FRA

32.7

Reino Unido

GBR

36.0

Estados Unidos

USA

40.8

Fonte:Instituto Política y Democracia, Índice de GINI 1984-2002

No Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008, do Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento, da listagem de 177 países o Brasil está na posição de numero 70º. Está num patamar elevado em comparação com outros países, mesmo alguns que apresentam melhor índice de distribuição de renda que o Brasil. Entretanto, há de se salientar que esse índice de desenvolvimento humano prioriza outras bases para ser calculado, como expectativa de vida, educação, que de alguns anos para cá vem melhorando. Esses dados apresentados, quando comparados a realidade, permitem o questionamento quanto à verdadeira melhoria. Ainda se olhado apenas pelo critério de distribuição de renda nota-se que este ainda não melhorou, puxando os demais itens para baixo. Segundo especialistas, esses dados acabam por não demonstrar a verdadeira realidade de vida no país, fato que já foi detectado pela ONU, que promete correção para 2010. [63]

Verifica-se que a sociedade com maior poder aquisitivo, ao mesmo tempo em que reclama da falta de segurança, se tranca em seus condomínios e cobra das autoridades competentes que armem melhor as forças policiais, que sejam construídos mais e maiores presídios e que estes sejam de segurança máxima, para que se possa garantir que os criminosos não fujam e não tomem os bens da classe mais favorecida. Sobre esse assunto pode-se ressaltar o trabalho de Cristina ZACKSESKI, que apresenta a corrida para melhor estruturar o Estado em medidas repressivas, quando deveria ser ampliada e aprimorada as medidas preventivas:

No momento em que as pessoas se sentem inseguras, manifestam sua insegurança reclamando da oferta pública, na maioria das vezes relacionada ao modo de "resolução" dos conflitos típico do Direito Penal — mais recursos para a polícia, mais vagas nas penitenciárias, mais repressão, legislações severas e, obviamente, menos tolerância. Outras vezes elas reivindicam um espaço privado para suprir as falhas da resposta pública, com o recurso a empresas privadas de segurança ou com a instalação de toda uma parafernália tecnológica. [64]

Portanto, se está presenciando uma atividade privada da segurança pública, onde quem detém o poder econômico pode adquirir a segurança e mais uma vez as classes menos favorecidas ficariam aquém de obter esses serviços decentemente pelo Estado. Para uma mudança nesse contexto a sociedade tem que deixar de cobrar as medidas repressivas, pois se verifica que essas não são capazes de reduzir a criminalidade. Adotando uma posição mais ativa, se organizando em grupos e atuando de forma preventiva, com educação e projetos sociais capazes de diminuir a incidência de processos criminosos que atinjam cada vez mais os mais jovens.

No Brasil, quando surpreendentemente são aventadas estratégias de segurança que não sejam tipicamente repressivas, imediatamente vemos diversas tentativas de desqualificá-las em sua capacidade de contribuírem para a segurança a partir da imposição do rótulo "políticas sociais", como se qualquer medida não repressiva ou não jurídico-formal fosse incapaz de contribuir para a composição de um quadro de alívio do sentimento de insegurança e dela própria. É a concepção conservadora de segurança que está sendo exposta nestes momentos. [65]

Se a mentalidade não for alterada, será uma luta sem fim, pois a segurança pública será privatizada, e os meios estatais que são disponibilizados sempre serão insuficientes para travar a guerra contra o crime, pois a efetivação de medidas sociais como secundárias transformam o tratamento dado a segurança pública apenas medidas paliativas, se mais armas para o combate a violência, que no final trazem resultados ainda piores. [66]

Voltando ao tema de desigualdades sociais, pois o tratamento dado aos meios de combate a violência normalmente, como já explanado, tendem a contra-atacar com mais violência. De longe se fala em redução de desigualdades sociais. E quando se comenta o tema é tratado como mais uma medida social que não passa de retórica. Mesmo com a Constituição Federal de 1988, que é chamada de Constituição Cidadã, pois prevê muitos direitos sociais que, na verdade, eram tratados como normas programáticas e ainda são em muitos casos. Impossibilitam a melhora da situação de desigualdade que teima em permanecer neste país, como lembra Aimbere Francisco TORRES:

Com efeito, a característica social do positivismo jurídico que se procurou exteriorizar com o advento da Constituição de 1.988 e posteriormente com o Código Civil de 2.002, alardeada aos quatro cantos deste país, em momento algum contribuiu para extirpar as profundas desigualdades entre a elite e a imensa maioria da população pobre deste país, que continuam mesmo com a vigência dos regramentos acima mencionados, excluída da participação política e desprovida de direitos básicos. [67]

Por isso se faz necessária a aplicação de normas que determinem a melhoria na condição de vida da população, com mais saúde, educação, emprego com salário justo e sem exploração demasiada, para que com isso se consiga concretizar um parâmetro de qualidade de vida para todos.

Assim como para Eugenio Raúl ZAFFARONI, não é à toa que os direitos humanos sempre são criticados no âmbito penal, pois com o abuso que ocorre perante aos tratamentos diferenciados que existem entre os pobres e os ricos, toda vez que se utiliza dos direitos humanos para amenizar o tratamento desigual do Estado para com o menos favorecido, se indigna a população pois se diz que há excessiva proteção para com os bandidos:

Enquanto os direitos humanos assinalam um programa realizador de igualdade de direitos de longo alcance, os sistemas penais são instrumentos de consagração ou cristalização da desigualdade de direitos em todas as sociedades. Não é por acaso que os dispositivos dos instrumentos de direitos humanos referentes aos sistemas penais sempre sejam limitadores, demarcadores de fronteiras mais ou menos estritas do seu exercício de poder: fica claro que os direitos humanos se defrontam ali com fatos que desejam limitar ou conter. [68]

Sendo assim, a visão que se tem dos direitos humanos frente ao direito penal gera conflitos com a população que influenciada pela mídia tende a rebater as idéias de proteção ao cidadão menos favorecido frente aos abusos do Estado, taxando tal proteção como apoio a bandidos. Estes são crucificados por toda a sociedade, que não entende que em outro momento qualquer pessoa, normalmente sem poder aquisitivo, pode ser tratada de forma atentatória aos seus direitos fundamentais.

3.2.CRIANDO UMA NECESSIDADE DO QUE NÃO POSSO TER

No mundo globalizado em que vivemos há uma busca incessante pela venda de produtos, comparada a uma corrida armamentista, onde se criam produtos novos a todo instante e com isso, há uma disputa entre o mundo do marketing e da publicidade e propaganda para criar novas necessidades, diferentes das necessidades básicas que todo ser humano tem.

PASSOS, indica alguns fatores que podem induzir ao cometimento de crimes um deles seria a labilidade que se demonstra da seguinte forma:

A labilidade é vulnerada pela denominada sociedade do bem-estar, que coloca a meta da felicidade "na satisfação imediata do prazer do momento". Os desejos artificiais estimulados pela propaganda; o íntimo da vida da sociedade de consumo sempre com novas ondas; o envelhecer rápido das novidades dando margem à instabilidade e futilidade; o pensar pouco e ler pouco, etc., tudo isso leva ao agir irrefletido, inconseqüente, desprovido de lastro da experiência moral, gerando comportamentos criminosos. [69]

O jovem se torna parte desse consumismo, quando não detém um produto que está na moda, um celular, uma tênis, ele se sente fora do contexto do seu grupo causando profunda agonia no seu intimo, fazendo com que, um vídeo-game, um roupa de marca, o torne uma pessoa mais social, que tenha muitos amigos, esse deseja exacerbado pelo consumo de bens faz com que sejam iniciados diversos problemas desde o momento em que esses jovens não detenham condições financeiras de adquirir os objetos tão desejados, Marta CONTE trata diretamente sobre o tema:

A análise que decorre de debates atuais indica que com o triunfo do neoliberalismo um novo modo de civilização se impôs, cujo slogan se traduz em SER FELIZ PELO CONSUMO! ou "gozar a qualquer custo". O modo de civilização anterior a este da modernidade era marcado pela poupança, sobriedade, valores como virtude e solidariedade, pela ordem e o recalcamento. Cabe lembrar que, há poucas décadas, falar em gozo individual era tabu; hoje, é um imperativo. [70]

Na atual conjectura se verifica o consumo exacerbado de bens, e para efetivar esse consumo são utilizadas diversas maneiras. O que vale é a satisfação atual. Não se pensa no futuro. O agora e o atual são o que importa e nada mais. Por isso os jovens, nessa ânsia de consumo, acabam por cometer qualquer tipo de injusto, desde que sejam satisfeitos os seus desejos de consumo, para que se mantenham no prazer do momento, o celular com câmera, a moda da vez. Por isso se cria uma necessidade no indivíduo, de se efetivar uma compra de tal produto, que este lhe dará todas as suas expectativas e lhe dará uma nova identidade, como salienta CONTE:

O núcleo da personalidade, nesse contexto, estava tanto no interior sentimental quanto nos objetos comprados e exibidos. O indivíduo projetava suas peculiaridades emocionais nas mercadorias e, em seguida, adquiria-as como se fizessem parte de seu caráter permanente e interior. E, assim, o "comprismo" burguês desnudou o modo de produção material das crenças emocionais. Portanto, é possível dizer que o consumismo surge como meio de construção de identidades; tanto mais poder os objetos adquirem quanto mais o interior subjetivo está esvaziado e exteriorizado. [71]

Formam-se personalidades a partir do objeto adquirido, mas quem não pode adquirir os tão sonhados objetos, como poderá formar essa identidade que é cobrada por todo o circulo de amizades que o indivíduo se encontra? Há ainda as instituições, escola, família, as que se ocupam da educação de jovens, criam um pessimismo para com o futuro no mercado de trabalho e isso causa uma angustia sobre as perspectivas futuras, como esclarece CONTE:

Tomo como exemplo o descrédito no futuro e a idéia de "sem saída", partilhada por diferentes instâncias que se ocupam dos jovens em nosso país e impedem as apostas, criando um curto-circuito. A juventude sem perspectiva de inserção social no mercado de trabalho e em outras formas culturais de testemunhos compartilhados se vê à deriva e impulsionada a atos de delinqüência e consumo de drogas, como apelos a uma alteridade que se presentifique e ofereça ancoragem, bordas, referências. [72]

Essa perspectiva futura conturbada, aliada ao anseio de consumo exacerbado, causa uma mistura explosiva para o comportamento dos jovens, que não sabem de que forma satisfazer seus desejos e nem mesmos acreditam que terão boas chances de se realizarem profissional e pessoalmente.

Essa instabilidade emocional do sujeito, causada pelos baixos valores morais, torna o sujeito aberto a todo o tipo de liberalidade, pois somente assim ele estará pronto para o mercado de consumo. Coloca-o como um campo aberto a todo tipo de informação recebida. Contudo, essa informação é baseada na criação de anseios para um consumo sem controle. É usada uma comunicação sem medidas, transmitindo uma mensagem geral, sem distinção de quem pode ou não pode comprar. Apenas que se compre ou será uma pessoa sem qualquer realização pessoal e social:

Até porque os valores morais não têm valor mercadológico e, além disto, constituem uma possibilidade de resistência ao consumo e à propaganda publicitária. Não são surpreendentes a transposição da relação com o desejo para as inúmeras formas de compulsão e a escalada da violência comum, pontuada por momentos de hiperviolência. Isto se fundamenta no fato de que a lógica neoliberal produz sujeitos que funcionam precisamente segundo a lei do mais forte ou a do "empoderamento" pelos objetos. [73]

Com essa onda de violência exacerbada, cria-se um modismo sobre esse aspecto, uma forma de recusa dos valores morais e éticos que antes eram respeitados e impostos pela sociedade. Contemporaneamente são deixados de lado e são colocados os valores mercadológicos, os objetos de desejo são os alvos que compensam qualquer meio para se atingir, CONTE trata esse aspecto como uma das causas da violência:

Na medida em que a garantia simbólica das trocas entre os homens tende a desaparecer, é a própria condição humana que muda, e o valor da vida fica em questão; um se relaciona com o outro enquanto objeto. Esta objetalização e utilitarismo passam a fazer parte do cotidiano de todo cidadão, produzindo relações de desrespeito e violências de toda ordem. Criam-se, assim, as condições para o elogio da delinqüência e a recusa de escolhas éticas que obriguem a tomada de uma posição responsável frente aos próprios atos. [74]

Agora a sociedade dominante parece que quer se livrar desse tipo de problema, mas suas soluções para a violência exacerbada, e a falta de segurança, normalmente não se prende a soluções pacíficas, de melhor distribuição de renda e melhores condições sociais. Como ressalta CONTE:

A sociedade neoliberal quer banir de seu horizonte os efeitos que ela própria engendra, a saber, as conseqüências das desigualdades sociais, do consumismo, dos excessos, das violências e de conflitos sociais, produzindo movimentos de reformas que não oferecem inscrição social às conseqüências do sistema sociopolítico, mantendo enormes segmentos da população à margem dos direitos fundamentais e do acesso a bens e serviços. [75]

Mas uma vez se nota a falta de interesse da classe dominante em reformas de cunho social. Apenas se enseja a exclusão, que se deixe o menos favorecido cada vez mais longe da sociedade que tem poder de compra, para que as violências geradas por quem não pode adquirir bens sejam deixadas em outro patamar. Ou seja, o problema é da polícia e não da sociedade que não distribui sua renda.

CONTE obtém de um apenado da cidade de São Leopoldo/RS, uma síntese dessa sociedade de consumo e traz em seu trabalho uma resposta obtida em um grupo de discussão sobre o tema, sendo que seu contexto se encaixa perfeitamente ao viés da segurança pública:

Isso aí é só embalagem, mas é que a gente se compara, o fulano tem e eu não tenho, principalmente no meio de adolescentes, né. Nessa idade a gente deixa se levar pelos bens materiais. O meu amigo tem, o pai dela dá, e eu não tenho o meu pai pra me dar, então quem vai ter que fazer por mim sou eu mesmo, e a maneira mais rápida que eu tenho é cometendo algum delito (Apenado do regime semi aberto que participou do Grupo de Discussão). [76]

O depoimento do condenado traduz a síntese do presente tema, pois a falta de recursos pode levar um jovem a cometer crimes para poder satisfazê-los. Nesse contexto CONTE trata o tema como um problema generalizado que pode levar mesmo o jovem de alto poder aquisitivo ao mundo do crime. Não porque ele não tenha condições de adquirir os bens desejados, mas pela perda de valores morais e éticos essenciais à convivência em sociedade, que vêm sendo menosprezados pela mídia publicitária, com o intuito de levar a população às compras a qualquer custo.

3.3.EU QUERO ME PROTEGER "DELES"

Buscando entender a diferença de tratamento dispensado entre as diferentes castas sociais, um levantamento histórico há de ser feito, com base no estudo da Criminologia Radical exposto por Juarez Cirino dos SANTOS, frente às divergências ideológicas e políticas perante as sociedades contemporâneas deste lado do hemisfério, desde a Revolução Francesa, desde a busca da dominação das classes capitalistas, das lutas de classes sociais. [77]

Como demonstra o trabalho de SANTOS, há uma busca para se definir um perfil de criminoso, enquanto na verdade se verifica que causas afetas a criminalidade estão diretamente ligadas ao controle social dos indivíduos excluídos. Há um direcionamento para as definições legais de crime e da aplicação das diversas instituições de controle social, como a polícia, a prisão e a justiça, focadas diretamente sobre os pobres e os indivíduos marginalizados pelo capitalismo. O que se pode ver nas sociedades capitalistas, como nos Estados Unidos, é que a grande maioria da população carcerária é composta por negros, mexicanos e porto-riquenhos, que representam 20% no total da sociedade e 50% na população carcerária, a taxa de negros nas prisões e mais alta do que nas universidades americanas. Quando se fala em classes de trabalhadores, nas prisões norte americanas estão concentrados em sua maioria, 87,4%, operários artífices, operadores etc., sendo que estes representam cerca de 59% dos trabalhadores daquele país. Isso se dá por reforçar um sistema de proteção ao capitalismo, que exclui do circulo do poder de compra os marginalizados os levando ao crime contra o patrimônio que representa a maioria dos delitos cometidos que levam às prisões nos EUA, isso configura uma busca que excluídos sociais fazem de suprir as dificuldades de adquiri bens. [78]

O que se verifica entre os crimes cometidos pelas classes menos favorecidas, que são extremamente explorados pela mídia, tem grande atividade repressiva da polícia e do poder judiciário, mas provocam normalmente, o menor dano a sociedade como um todo. Há também os crimes que estão no âmbito das fábricas, como pequenos furtos e apropriações indébitas, mas esses não são divulgados por clara intervenção na força produtiva. Assim como os crimes cometidos por profissionais liberais, mesmo sendo crimes danosos a sociedade como um todo, raramente aparecem na mídia. Por ultimo os crimes de "colarinho branco", esses sim extremamente danosos a sociedade, causam problemas gravíssimos aos cofres públicos, muitas vezes causando risco grave à vida e a saúde da população em geral. Esses crimes sim estão totalmente excluídos das estatísticas, demonstrando claramente a separação da classe carcerária em castas sociais, priorizando os detentores do capital em detrimento dos menos favorecidos, como expressa SANTOS por uma visão marxista. [79]

O que se forma é uma rede de controle social onde o indivíduo fica submetido ao sistema capitalista, mesmo nas prisões, com o "sursis", livramento condicional, as penas alternativas, o que se faz valer é o controle que se dá sobre a sua vida, configurando assim apenas algumas opções ao homem. Ou se torna uma maquina do capitalismo, se sujeita ao sistema de produção, à monotonia, e aceita a sua condição, ou ainda pode tentar a sua ascensão social da forma mais difícil possível. Como também pode furtar a propriedade alheia que não tem condição de adquirir , podendo se tornar criminoso e pagar por isso, ou ainda fazer a revolução de forma política, agindo de forma a mudar a situação se infiltrando no sistema político para mudar a exploração social. No entanto se resume ao criminoso mais cruel que se tem pela mídia em geral, o mais lembrado, o mais rechaçado, o criminoso comum, enquanto o criminoso de "colarinho branco" se mantém anônimo e protegido, escondido atrás da grande exploração da indústria do crime provocada pela divulgação da mídia sobre os pequenos crimes, ou mesmo sendo grandes, que não chegam nem perto da destruição, do prejuízo que causa um crime de colarinho branco. [80]

As instituições, como forma de controle social, são marcadas pela lavagem cerebral que realizam, ressalta SANTOS, assim como a imprensa e o Parlamento, entre outros, enquanto a polícia e a prisão são garantias de uma ordem social injusta. A escola, a fábrica e a prisão são instituições similares que promovem a robotização do indivíduo que é colocado na sociedade em formato de linha de produção e qualquer um que saia desses moldes é colocado na prisão para que volte a se ajustar e aceitar a sua condição social sem causar conflito. O crime é definido pela lei e a lei é definida pelos detentores do capital que a utilizam para fomentar o controle social dos marginalizados. Com isso se define o comportamento das classes trabalhadoras e marginalizadas como crime, pois esses comportamentos vão de encontro aos interesses das classes dominantes e a lei que foi criada por elas, principalmente o que se pode definir como crime, é forma de manifestação contrária à submissão imposta à classe dominada. É uma forma de protesto contra o Estado que legitima a criminalidade exercida pelas classes sociais elevadas. [81]

SANTOS ao comentar sobre a prisão, assevera que, o controle social de classes tem nela a sua principal instituição, e como principal agente a polícia, sendo as duas caracterizadas pela ineficiência no controle do crime, tendo como principal objetivo, mesmo oculto, a ameaça às classes sociais exploradas economicamente. Esses objetivos são marcados pela falsa imagem de ressocialização passada como função das prisões que nada mais são do que grandes castigos impostos aos presos além de isolamento e aplicação de drogas para controle de forma mais eficaz. Essas idéias são base para a esquerda idealista que visa à abolição do controle social burguês com o fim das prisões, da polícia, da escola, dos meios de comunicação de massa, da família nuclear, etc. . Têm à disposição todas as instituições citadas como meios de repressão e de ferramentas para o capital. Tratam de aniquilar essas instituições e substituí-las por instituições proletárias. Promovem a união dos grupos sociais subalternos para a realização dessa meta. [82]

Já a visão do reformismo, exposta por SANTOS, sobre as instituições, que prega a dissolução do capitalismo no socialismo, que por isso se torna um Estado intervencionista, para assim provocar as mudanças necessárias no sistema, e assim também modificar as instituições de forma interna e não apenas aniquilá-las, trata o crime como algo natural e com as reformas propostas tende a diminuir. O reformismo trata como dupla origem do comportamento criminoso, sendo uma a partir de deformações biológicas e a outra pelo ambiente social em que vive, na verdade se retorna a teorias antes criticadas, como o positivismo, sendo de pouca influencia para a Criminologia Radical, funcionando apenas como modelo de reformulação do discurso de controle social existente. Essas duas teorias, a radical e a esquerda idealista, não trazem a explicação da criminalização das classes subjugadas. [83]

A Criminologia Radical é marcada pela critica ao sistema prisional, como lembra SANTOS, pois este é usado como alicerce de manutenção da hegemonia capitalista, assim como o conceito de crime utilizado pelo sistema, que isola determinadas condutas típicas das classes subalternas e as tipifica como crime, rotulando esses comportamentos como desrespeitosos aos direitos humanos, ao mesmo tempo em que banalizam as grandes práticas de crimes cometidos por classes superiores como o imperialismo, a exploração econômica, entre outras. Tendo como proposta da Criminologia Radical e abolição da desigualdade social como forma de mudança, transformando-a no modelo socialista. Assim como a crítica aos sistemas penais e de despenalização, sendo estas tidas como humanitárias, mas no entanto, não passam de formas de controle do poder estatal determinada pelo excesso de presos sendo regulada pelo sistema de produção capitalista. [83]

Juarez Cirino dos SANTOS ressalta o objetivo da Criminologia Radical que se faz necessário nesse contexto: "O projeto científico da Criminologia Radical tem por objetivo a produção de uma teoria materialista do Direito e do Estado nas sociedades capitalistas, em que a produção crescentemente social requer uma regulação crescentemente jurídica das relações sociais, procurando identificar as forças sociais subjacentes às formas legais e mecanismos institucionais de controle da sociedade." [84]

Com isso se firma a posição dos criminólogos radicais em que são contra qualquer tipo de exploração social, exploração de classes, racismo, entre outras formas de desigualdades presentes e sustentadas pelo capitalismo exacerbado, como é asseverado por SANTOS, a Criminologia Radical promove a sociedade sem classes e socialização dos meios de produção. O crime é baseado no capitalismo, na divisão social em classes, e com isso a separação é feita por capital/trabalho assalariado, fundamentado pelo Estado que tipificam como criminosas as condutas contrárias ao capital e a perpetuação da separação social em classes. Com isso o crime está ligado diretamente ao estudo social do autor, em que classe ele se encontra, e não relacionado com a sua personalidade ou estereótipo de criminoso, se ele está inserido ou não no campo social, nos meios de produção de alguma forma, ou se está excluído. Isso explica como o capitalismo, ao mesmo tempo em que impõe ao trabalhador que seja submetido ao trabalho diário, por um salário ínfimo, onde ele aceita ou será marginalizado, também, com a mesma carga de opressão, oferece ao marginalizado, desempregado, da mesma forma de aceitação ou não da submissão ao trabalho assalariado, a opção de entrada para o crime com o risco de ser criminalizado ou de se manter oprimido e submetido aos mandos e desmandos do detentor do capital. Com isso a força de trabalho incluída nos meios de produção, conhece uma disparidade social existente que é a relação esforço/recompensa. Por outro lado a força de trabalho excluída dos meios de produção, marginalizada, fora do contexto de consumo, tem grandes motivos para usar de meios ilegítimos para conseguir sobreviver em um mundo consumista. Assim, o sistema de controle social atua fortemente para reprimir essa classe marginalizada que não aceita sua condição social de marginalização, com a retórica de proteção ao cidadão "honesto". [85]

SANTOS lembra que o Estado atua com rigor na transgressão de normas preestabelecidas para essa força de trabalho excedente. No entanto a sua real intenção é a de controle social do marginalizado que se opõe ao sistema de produção capitalista e se recusa a ficar como força de trabalho reserva e ainda disciplina a força de trabalho atuante com o viés de mostrar que o caminho do desvio não compensa e sim a manutenção da vida servil ao detentor do capital. Essa ciranda mantém problemas específicos do capitalismo moderno, o desemprego, a miséria e o crime, sendo este último, para o Estado o grande causador do problema é o criminoso, que no entanto é taxado pelas prisões, sem um potencial meio de ser reinserido no mercado de trabalho, sem dar meios de ter cidadania, é reprimido nas cadeias como forma de domínio e repressão às classes trabalhadoras ativas formando uma imagem de medo e contenção a qualquer tipo de revolta de classes. [86]

Todo esse contexto marxista defendido por Juarez Cirino dos SANTOS em algumas décadas atrás, traz ao tema uma relevante controvérsia, se o pensamento marxista era radial ao extremo, ou se apenas demonstrava uma verdadeira forma de proteção dos detentores de bens que tem interesse de se livrar das pessoas menos favorecidas, realmente querem se livrar de tais elementos que causam um perigo para seus filhos, seus bens, querem se livrar "deles", ou seja, quem está fora da classe consumidora, quem não tem se quer condições de comer, só causará problemas para a sociedade dominante. Portanto a forma mais fácil de se livrar "deles", é com o uso da força, do aparato policial, e com o uso da prisão pra extirpar da sociedade tal presença insolente que insiste em perpetuar, o pobre.

Portanto, não será por isso inconscientemente que o policial prefere as classes menos favorecidas para se abordar? Por isso que se dá ênfase ao pobre e as minorias excluídas em momentos de suspeição, seja por suas roupas ou por sua cor da pele, seja pelo número elevado das mesmas classes de pessoas que já se encontram nas prisões, pois esse tipo de pensamento é de longa data e acaba por se repetir insistentemente causando uma ciranda sem previsão de mudança, pois o excluído sai da prisão sem condições de se estabelecer, quando está nas ruas é a preferência nas abordagens e conseqüentemente retorna para a prisão, nesse pensamento separatista, lugar de onde ele nunca deveria ter saído.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A fundada suspeita analisada no momento é tema aberto que se pauta na experiência pessoal do agente público, mesmo que se busque a delimitação de seu entendimento, se terá o enfrentamento com as experiências pessoas do indivíduo, apenas com qualquer mudança legislativa ou doutrinária será difícil obter o resultado esperado. Com análise da jurisprudência adotada para o tema, foi verificada a prevalência de fatos concretos para ensejar uma busca pessoal. No entanto os casos que são levados ao judiciário são ínfimos se comparados aos acontecidos diariamente. Portanto, sem uma mudança geral na visão do preconceito se tornará difícil a mudança de visão que a população tem da polícia como instituição que deveria proteger os direitos dos cidadãos.

Nota-se que não houve muita mudança nos estereótipos de criminosos que a população e conseqüentemente a polícia tem hoje em dia e nos primórdios da colonização brasileira. Os negros são tratados como inferiores e como tendenciosos ao crime, assim como em muitas décadas atrás. Não houve uma evolução no pensamento brasileiro de preconceitos e raças. Mesmo com todo o tratamento dado nesse sentido pelo governo, longe se está de uma total igualdade entre raças no país. Têm se desenvolvido programas de inclusão social de negros e pobres, que ainda são mal vistos pela sociedade. Tratados como assistencialistas, são rebatidos por grande parte da classe "pensante". Falta ser efetuada, além desses programas, uma reeducação desde a infância, para amenizar a situação do preconceito racial.

Essa perpetuação de estereótipo criminoso se mantém, mesmo depois de grandes exemplos percebidos na mídia, que os grandes crimes, que tem maior volume de dinheiro envolvido, são cometidos por classes extremamente elevadas, normalmente empresários e políticos de raça branca e de famílias ricas, que nunca se quer passaram por alguma necessidade na vida. Mesmo assim a população, mesmo de classe baixa, a sociedade em geral, repete os mesmos estigmas de criminosos aos mais humildes, que se submetem à uma vida de miséria, que não tem dinheiro para comprar roupas aceitas pela sociedade e com isso acabam por se manter em uma linha de exclusão social.

As Polícias Militares estão cada vez mais desacreditadas, por haver um embate direto com a população. Resta para os milicianos apenas o que há de ruim nesse confronto. Todo o problema da criminalidade é colocado como única e exclusivamente problema de polícia. Frente à falta de investimentos reais em formação profissional adequada a realidade do policial, com baixos salários comparados a outros profissionais e outros servidores públicos de mesma escolaridade, obrigando o policial a se manter em vários empregos, denominados "bicos" (que são ilegais administrativamente mas se tornam parte do sustento do militar estadual), este se torna um ser fora do convívio social, pois seu tempo escasso é dispensado aos trabalhos extras para manter as contas da família em dia.

Apesar desses péssimos motivos que o miliciano tem para tratar mal o cidadão, não se pode permitir que o cidadão seja prejudicado, pois o tratamento dado ao contribuinte é o mesmo que será dado ao policial quando ele está em seu momento de folga ou a sua família quando necessitar dos serviços de segurança do Estado. Mas essa visão é distorcida e se vê o cidadão como um inimigo que se for mantido controlado será respeitado mas se ousar ir contra a autoridade será exterminado.

Portanto, para se renovar a confiança na polícia não se pode acreditar que seja uma tarefa fácil, pois há diversos motivos que tendem a diminuir cada vez mais aprovação da opinião pública para com a instituição, sendo eles, falta de investimento em pessoal, falta de viaturas ou viaturas inadequadas, falta de equipamentos, ou também a sua inadequada aplicação no cotidiano, além de tudo isso o policial quando atende a população está normalmente cansado, ou porque trabalhou em outro turno no seu "bico" ou porque está atendendo a dezenas de ocorrências durante o dia e com sua escala de serviço apertada ainda teve sua folga cancelada para trabalhar em uma escala extra de futebol no final de semana em que seu filho fará aniversário. Problemas que existem em todas as profissões e que sempre existirão: hora-extra, baixos salários, desrespeito dos superiores, desrespeito dos colegas de classe, falta de equipamentos necessários. No entanto há de se observar que o funcionário no caso em tela, é um policial, que está armado, e que suas ações, se forem mal efetuadas acarretarão em perdas de vidas e grandes ônus para o Estado e a população. Por isso, esse é um problema de todos e não apenas de governantes ou dos próprios policiais, pois nunca se sabe onde acontecerá um crime e se a atuação será dentro do esperado ou desastrosa, podendo atingir qualquer pessoa que passa pela rua.

A sociedade em geral se sabe que é preconceituosa, trata com diferença os negros e os pobres, ou qualquer outra parcela que seja minoria, ou que não tenha poder aquisitivo para ser tratado como deveria. A polícia nada mais é do que uma parcela da sociedade que é treinada e colocada nas ruas para atender aos problemas de quem necessita, no entanto, como a polícia é parcela dessa mesma sociedade, ela traz consigo os mesmos problemas de discriminação e preconceitos existentes. Trata com diferença gritante as minorias, especialmente os negros. Normalmente dá preferência para a suspeição. Mesmo que negado esse preconceito formalmente, nos dados apresentados no presente trabalho e na opinião pública, fica clara essa suspeição preferencial dos negros jovens, sendo que os próprios negros se sentem suspeitos, pois por serem sempre abordados pela polícia, sabem que são alvos preferenciais no momento da revista pessoal.

Mas essa parcela da sociedade que é tirada para atender a população em seus problemas que necessitam da atuação do Estado, não pode ser carregada de preconceitos. Essa parcela deve ser diferente, deve promover a igualdade social e os direitos humanos. Não pode se igualar ao pensamento comum e sim se pautar pela legalidade. Para isso os cursos de treinamento devem levar o policial a um patamar elevado de conhecimento intelectual, para que se livre de preconceitos gerais, mesmo que para isso se mude o nível de escolaridade exigido para ingresso na corporação. Entretanto deve-se reajustar o salário a um patamar aceitável para atrair pessoas com nível intelectual cada vez mais elevado. Para que o ingressante saiba o seu lugar no ordenamento e tenha suas opiniões pautadas pela doutrina e jurisprudência. Que sejam pessoas capazes de promover a igualdade de tratamento para com o cidadão, tratando como seu cliente, ou seja, que busque agradar o cidadão, tratar como gostaria de ser tratado.

Para tanto, se trata de um problema exclusivo da polícia, de sua formação profissional de seus defeitos. No entanto, se esquece na maioria das vezes, de tratar de alguns temas quando se fala em segurança pública, como por exemplo a distribuição de renda, problema de longa data neste país que está longe de ser resolvido, passa pelas políticas sociais implantadas pelo governo que são muito criticadas em sua maioria. Quando se trata de distribuição de renda, a colocação do problema é apontada como um problema dos políticos, mas normalmente não se vê a população com maior poder aquisitivo contente com o pagamento de impostos e de contribuições sociais que serão revertidas em melhores serviços. Ou seja, ninguém quer dividir a sua renda e sim a dos outros, mas com isso se perpetua o problema da divisão da renda, que se concentra em poucas mãos enquanto a grande parcela da população vive na miséria. Em oposição a essa melhor distribuição de renda esta também a má gerência das verbas públicas, estampadas a todo momento na mídia a corrupção existente na aplicação do dinheiro público, causando uma insatisfação do contribuinte em pagar seus impostos e com isso receber um serviço de péssima qualidade em todas as áreas.

Além disso está a sociedade de consumo que exige, especialmente do jovem, que se mantenha sempre atualizado com os produtos, objetos de consumo cada vez mais caros, que tornam, para o jovem, a vida insustentável sem eles, para isso o jovem usa de todos os meios para obter o produto da moda a "onda da vez", nem que para tanto chegue a um ponto de cometer crimes para conseguir, até mesmo porque esse pode ser o único modo de conseguir um produto de alto custo, pois o emprego escasso e a abundância de profissionais no mercado, tornam os salários cada vez mais baixos impossibilitando a pessoa comum de adquirir a maioria dos bens de consumo que são desejados pelos jovens.

Com todos esses problemas e motivações que levam a criminalidade, se nota que a sociedade tende a fugir do problema, transferi-lo para outros, como os políticos, policiais. No entanto, a segurança pública é um problema de todos. Não basta querer a pena de morte, ou a prisão perpétua; que as prisões sejam de segurança máxima, ou como se ouve dos mais idosos, que "o ideal seria que os soltassem no mar". O problema é de toda a sociedade, se prender em grades e muros com segurança na porta. Isso faz com que apenas os ricos tenham segurança, mas não poderão viver o tempo todo dentro de seus condomínios. O capitalismo criou um problema que agora não pode controlar. Suas ações até aqui foram inválidas, seus sistemas legais tem se mostrado insuficientes. Nos resta ver até quando esse sistema vai agüentar sem ruir totalmente.

Por isso, revela-se de extrema importância a delimitação de parâmetros para a fundada suspeita em meio à atividade policial. Seja na formação dos agentes policiais que ingressam, seja na reciclagem dos que já atuam, seja na avaliação crítica das práticas policiais. De modo que o aparato policial não seja usado apenas como forma de afastar o pobre do rico, e sim para defender a sociedade de verdadeiros criminosos. Sejam eles ricos ou pobres, bem ou mal vestidos. Que a aparência divergente das expectativas criadas pelos padrões sociais (muitas vezes em razão da diversidade de oportunidades sociais) não seja utilizada como forma de estabelecer um criminoso "nato", cujas vestes (ou cor da pele) indicariam estar prestes a cometer uma atrocidade.


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Notas

  1. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 6 ed. São Paulo: RT, 2007. p. 502.
  2. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 371.
  3. ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. v. 3. Campinas: Bookseller, 2000. p. 266.
  4. MEHMERI, Adilson, Manual Universitário de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 138;139.
  5. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 3. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 385.
  6. BRASIL, MINAS GERAIS. Tribunal de Alçada. Indeferimento de Apelação Cível. Apelação Cível n. 2.0000.00.320284-8/000. Supermercado Shimoda Ltda e Domingos Fabiano da Silva e Outros. Relator: Juiz: Gouvêa Rios. 28 nov. 2000. Disponível em: <http://www.tjmg.gov.br/juridico/jt_/inteiro_teor.jsp?tipoTribunal=2&comrCodigo=0000&ano=0&txt_processo=320284&complemento=000&sequencial=&pg=0&resultPagina=10&palavrasConsulta=>Acesso em: 23 out. 2008.
  7. BRASIL, ESPIRITO SANTO. Tribunal de Justiça. Indeferimento de Apelação Criminal. Apelação Criminal n. 035979002876. Relator: Desembargador: Osly Da Silva Ferreira. 22 abr. 1998. Disponível em: <http://www.tj.es.gov.br/> Acesso em: 30 out. 2008.
  8. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Deferimento de pedido de Habeas Corpus. HC nº 81.305-4/GO, Marcelo Carmo Godinho e Turma Julgadora Criminal dos Juizados Especiais da Comarca de Goiânia. Relator: Min. Ilmar Galvão. 22 fev. 2002. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=35&dataPublicacaoDj=22/02/2002&numProcesso=81305&siglaClasse=HC&codRecurso=0&tipoJulgamento=M&codCapitulo=5&numMateria=4&codMateria=2> Acesso em: 30 out. 2008.
  9. LOMBROSO, Cesare. O Homem Criminoso. Rio de Janeiro: Rio, 1983.
  10. RAMOS, Silvia; MUSUMECI, Leonarda. Elemento Suspeito: abordagem policial e discriminação na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 31-37.
  11. Ibid., p. 41;42.
  12. Ibid., p. 85-96.
  13. Ibid., p. 89.
  14. Ibid., p. 120.
  15. Ibid., p. 103-168.
  16. LOMBROSO, op. cit., p. 182.
  17. Ibid., p. 183.
  18. NINA RODRIGUES, Raimundo. As Raças Humanas e a Responsabilidade Penal no Brasil. Rio de Janeiro: Guanabara, s/d, p. 84;85.
  19. SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: parte geral. Curitiba: ICPC; Lumen Juris, 2006. p. 4-8.
  20. Id.
  21. Ibid., p. 8-14.
  22. Id.
  23. IBOPE. Pesquisa de opinião pública – JOB012/2008. Brasil, 2008. Disponível em: <http://www.ibope.com.br/opiniao_publica/downloads/opp_confiancainstituicoes_maio05.ppt> Acesso em: 05 mar. 2009.
  24. Id.
  25. RAMOS; MUSUMECI, op. cit., p. 146.
  26. PINC, Tânia Maria. Confiança na Polícia: Um Desafio na Implementação de Políticas Públicas. São Paulo, 2006. 20 f. Trabalho de pós-graduação (apresentado no IV Simpósio dos pós-graduandos em Ciência Política) – Curso de pós-graduação em Ciência Política, Universidade de São Paulo. p. 6.
  27. Ibid., p. 6;7.
  28. Ibid., p. 7;8.
  29. Ibid., p. 8.
  30. Ibid., p. 8;9.
  31. Ibid., p. 9;10.
  32. Ibid., p. 10.
  33. Ibid., p. 11.
  34. Ibid., p. 14-17.
  35. RAMOS; MUSUMECI, op. cit., p. 44-47.
  36. Id.
  37. Ibid., p. 47-50.
  38. Ibid., p. 112-114.
  39. AMAR, Paul. Táticas e termos da luta contra o racismo institucional nos setores de polícia e de segurança. In: RAMOS, S.; MUSUMECI, L. Elemento Suspeito: abordagem policial e discriminação na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, p. 229-281. p. 236-237.
  40. Ibid., p. 234;235.
  41. BARROS, Geová da Silva. Filtragem Racial: a cor na seleção do suspeito. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 2, n. 3, p. 134-155, jul/ago. 2008. p.135;136.
  42. Ibid., p. 135.
  43. Ibid., p. 136.
  44. Ibid., p. 137.
  45. Ibid., p. 140;141.
  46. Ibid., p. 144;145.
  47. Ibid., p. 145-149.
  48. Ibid., p. 151.
  49. Ibid., p. 150-152.
  50. SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA SOCIAL – CE. Dicas de segurança. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/sf/senado/spol/asp/DP_DicasDeSeguranca. asp> Acesso em: 21 abr. 2009.
  51. ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva. 7 ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1995. 7 ed. p.196.
  52. RAMOS; MUSUMECI, op. cit. p. 167.
  53. Ibid., p. 213;214.
  54. SECRETARIA ESPECIAL DOS DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. A polícia me parou. E agora?. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/sedh/ popc/publicacoes/f_a_policia_me_parou.pdf> Acesso em: 25 abr. 2009.
  55. PASSOS, Paulo Roberto da Silva.Elementos de Criminologia e Política Criminal. Bauru: Edipro, 1994. p. 49.
  56. Id.
  57. Ibid., p. 59.
  58. Ibid., p. 60.
  59. Id.
  60. Id.
  61. Ibid., p. 61.
  62. Id.
  63. PARAGUASSÚ, Lisandra; FORMENTI, Lígia. IDH muda, mas País mantém posição. O Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20081219/ not_imp296295,0.php> Acesso em: 26 abr. 2009.
  64. ZACKSESKI, Cristina. Sistema penal, política criminal e outras políticas. Boletim IBCCRIM, v. 14, n. 172, p. 6-7, mar. 2007.
  65. Id.
  66. Id.
  67. TORRES, Aimbere Francisco. Sistema penal e exclusão social: questões de classe sócio-econômica. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos: Divisão Jurídica, Bauru, SP, v. 41, n. 48, p. 195-206, jul./dez. 2007. Disponível em: <http://www.ite.edu.br/>. Acesso em: 13 jun. 2008. p. 199.
  68. ZAFFARONI,Eugenio Raul. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. 5. ed. Rio de Janeiro: 2001. p. 149.
  69. PASSOS, op. cit. p. 51.
  70. CONTE, Marta. Consumismo, violências e uso de drogas: os riscos do neoliberalismo. Filosofia Unisinos, São Leopoldo, RS, v. 7, n. 3. p. 281-286, set/dez. 2006. Disponível em: <http: //www.unisinos.br/publicacoes_cientificas/images/stories/pdfs_filosofia/vol7n3/com01_conte.pdf> Acesso em: 26 abr. 2009. p. 282.
  71. Id.
  72. Ibid., p. 283.
  73. Ibid., p. 284.
  74. Id.
  75. Id.
  76. Id.
  77. SANTOS, Juarez Cirino dos. A Criminologia Radical. 2. ed. Curitiba: ICPC; Lumen Juris, 2006. p. 1.
  78. Ibid., p. 11;12.
  79. Ibid., p. 13;14.
  80. Ibid., p. 16;17.
  81. Ibid., p. 20-30
  82. Id.
  83. Ibid., p. 31.
  84. Ibid., p. 35-38.
  85. Ibid., p. 38.
  86. Ibid., p. 39-41.
  87. Id.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Daniel Nazareno de. A formação da fundada suspeita na atividade policial e os desafios da segurança pública no Estado Democrático de Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2826, 28 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18772. Acesso em: 26 abr. 2024.