Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/21972
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O direito fundamental do nascituro em receber alimentos à luz da Lei nº 11.804/08

O direito fundamental do nascituro em receber alimentos à luz da Lei nº 11.804/08

Publicado em . Elaborado em .

Mesmo com o advento da Lei nº 11.804, que trata dos alimentos gravídicos e apesar do relevante caráter jurídico e social, o direito do nascituro de receber alimentos é um assunto pouco explorado pela doutrina atual.

RESUMO

O conceito de nascituro e seus direitos há muito são alvos de debates por parte dos doutrinadores e estudiosos. Um dos motivos de tamanha discussão acadêmica é divergência quanto ao momento em que o nascituro adquire personalidade jurídica. Em 2008 foi promulgada a Lei 11.804 que visa à regulamentação do direito do ser humano em gestação em receber alimentos, por meio de sua genitora. Nesta oportunidade, objetivou-se demonstrar que o direito do nascituro a alimentos está intrinsecamente ligado ao da vida. Para tanto, a nova  lei foi analisada em conformidade com os demais dispositivos legais já existentes. Os aspectos processuais aplicados à referida lei, também, tiveram destaque no presente estudo. Como fonte de pesquisa, foram utilizadas obras e artigos de vários estudiosos do assunto, bem como, os mais recentes entendimentos jurisprudenciais.

PALAVRAS-CHAVE: Nascituro. Proteção à vida. Alimentos gravídicos (Lei 11.804/2008). Prestação Alimentícia.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. NASCITURO. 1.1. CONCEITO. 1.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA. 1.3. INÍCIO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E TEORIAS. 1.3.1. Teoria Natalista. 1.3.2. Teoria da Personalidade Condicional. 1.3.3.Teoria Concepcionista. 1.4. PROTEÇÃO E DIREITOS JÁ ASSEGURADOS AO NASCITURO NO BRASIL. 2. ALIMENTOS. 2.1. CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA. 2.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA. 2.3. ESPÉCIES. 2.4. CARACTERÍSTICAS DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. 2.5. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO A ALIMENTOS. 2.6. REQUISITOS. 3. ALIMENTOS GRAVÍDICOS. 3.1. CONCEITO. 3.2. POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS. 3.3. EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. 3.4. PROJETOS DE LEIS. 3.5. DA NATUREZA JURÍDICA DOS ALIMENTOS AO NASCITURO. 3.6. ASPECTOS PROCESSUAIS DA LEI 11.804/2008. 3.6.1. Capacidade e Legitimidade. 3.6.2. Do quantum dos alimentos em favor do nascituro. 3.6.3. Da conversão, revisão e extinção dos alimentos ao nascituro. 3.7. RESPONSABILIDADE CIVIL DA PARTE AUTORA DA AÇÃO DE ALIMETNOS GRAVÍDICOS. 3.7.1. Responsabilidade Objetiva e Responsabilidade Subjetiva. 3.7.2. Dos Danos Indenizáveis. 3.8. APLICAÇÃO DA LEI NOS JUÍZOS. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.


INTRODUÇÃO

O direito do nascituro de receber alimentos, apesar de seu relevante caráter jurídico e social, é um assunto pouco explorado pela doutrina atual. Mesmo com advento da Lei 11.804/2008 a doutrina que aborda essa temática ainda é escassa.

Antes de adentrar no tema em discussão, é salutar a definição de nascituro e de alimentos, uma vez que muitas das regras gerais a eles atribuídas, podem ser aplicadas ao instituto dos alimentos gravídicos.

O primeiro capítulo, portanto, trata do conceito de nascituro e da evolução histórica dos direitos a ele assegurados, além de um dos pontos mais importantes desse estudo, qual seja, o início da personalidade jurídica da pessoa humana. É, pois, por meio da averiguação do início da personalidade jurídica que define-se a possibilidade  do nascituro pedir em nome próprio os alimentos. Nesse capítulo inicial, foram apreciadas, também, as previsões legais e constitucionais sobre a proteção jurídica ao nascituro no Brasil.

Em seguida, discorrer-se-à sobre os alimentos, com a conceituação e a origem da palavra alimento, bem como seu significado para alguns doutrinadores e especialistas nesse tema, e, ademais, sobre a sua previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro. Também serão abordados os aspectos históricos desde o Direito Romano até o Código Civil atual.

Os alimentos podem ser classificados de diversas formas, dependendo da situação que for analisada. Tais classificações serão descritas neste trabalho, juntamente com seus principais requisitos e características.

Finalmente, no último capítulo será analisado o direito de alimentos ao nascituro à luz da Lei 11.804/2008. O conceito dos alimentos gravídicos será apresentado, bem como os posicionamentos doutrinários a favor e contra esse tipo de prestação alimentar. A evolução jurisprudencial também tem destaque, porque conforme será observado, as decisões dos Tribunais já vinham entendendo a possibilidade da gestante requerer alimentos em favor do feto que carrega.

Um outro ponto que merece atenção especial é o disposto no artigo 6.º da Lei 11.804/2008. Artigo o qual apresenta-nos as ideia de pagamento alimentício com base em indícios de paternidade do suposto pai e de convencimento do juiz. Em um primeiro momento, a ideia de paternidade baseada apenas e indícios pode parecer perigosa, mas conforme se verá existem mecanismos de defesa e proteção àquele que foi apontado como genitor e restou comprovado após o nascimento que não o era.

Destaque merecido será concedido aos aspectos processuais da Lei 11.804/2008, principalmente, aos relativos à legitimidade, ao termo inicial, ao quantum, à conversão, à revisão e à extinção da prestação alimentícia nas ações de alimentos gravídicos.

A responsabilidade civil daquele que pleiteou os alimentos ao seu favor, também é merecedora de debate, haja vista que a nova lei não tratou do assunto. Por isso, será dedicado tópico específico para a responsabilidade civil da parte autora do pedido de alimentos.

Por fim, na feitura deste trabalho, como meio de embasamento e sustentação foram pesquisadas as mais recentes jurisprudências a respeito do tema. Conforme se verá, a nova lei foi omissa em alguns pontos, o que torna imprescindível a análise das decisões dos Tribunais brasileiros. Além disso, não se pode olvidar, que por meio dessas, pode ser percebida a influência direta dos preceitos constitucionais e o efetivo emprego das normas legislativas, em especial da Lei 11.804/2008.


1. NASCITURO

1.1. CONCEITO

O Código Civil brasileiro (Lei 10.406/2002), em seu artigo 2.º, estabelece que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

O texto legal, todavia, não define o que é nascituro. Nem lhe competiria fazê-lo. No universo jurídico a conceituação desse termo incumbe à doutrina e à jurisprudência e não se trata de tarefa fácil, uma vez que requer conhecimentos de diversas áreas do saber humano. Para se chegar a uma definição satisfatória, é indispensável o auxílio das ciências biológicas; não raro, contudo, as discussões a respeito do tema são permeadas por outras perspectivas, em geral, de cunho filosófico e religioso.

Sob o prisma da doutrina clássica, nascituro é o ente já gerado ou concebido, com existência no ventre materno, dotado de vida intrauterina[1]. Ao teor dessa linha de entendimento, portanto, nascituro é o ser resultante da concepção, entendida como a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, desde que já fixado nas paredes internas do útero (endométrio) por meio do processo denominado nidação, que marca o início da gravidez.

A professora Maria Helena Diniz vai mais além. Como elaboradora da proposta legislativa que inspira o Projeto de Lei 6.960/2002, de autoria do Deputado Ricardo Fiuza, demonstra claramente o posicionamento de que nascituro tem um conceito diferente de embrião, mas ambos devem ter seus direitos garantidos, como pode ser observado no Projeto de Lei 6.960/2002, que visa a modificar, dentre outras, a redação do artigo 2.º do Código Civil, atribuindo-lhe a seguinte: “A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos humanos do embrião e do nascituro”.

A professora Silmara J. A. Chinelato e Almeida[2], no entanto, defende que se deve considerar nascituro, no atual estágio do Direito Civil, tanto o que há de nascer - o zigoto já fixado no útero - quanto o embrião pré-implantatório. Ademais, critica ferrenhamente as pretensas alterações do texto do artigo 2.º do Código Civil, “por entender que o conceito de nascituro - ser concebido e ainda não nascido — é amplo, não importando o locus da concepção”.

Vale lembrar, ainda, que tramita no Congresso Nacional, além do Projeto de Lei supracitado, o Projeto de Lei 90/1999, de autoria do Senador Lúcio Alcântara, que pretende regulamentar a reprodução humana assistida e, para tanto, em seu artigo 9.º, prevê que “não se aplicam aos embriões originados in vitro, antes de sua introdução no aparelho reprodutor da mulher receptora, os direitos assegurados ao nascituro na forma da lei”.

Diante do choque de disposições entre os dois Projetos de Lei mencionados, oportuna é a preocupação dos autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, que se mostram adeptos à proteção do embrião concebido in vitro, como pode se observar do texto abaixo:

Ora, uma rápida leitura dos dois textos legais leva-nos à conclusão de haver desarmonia entre ambos. De tal forma, impõe-se ao legislador corrigir a antinomia, antes que os mencionados projetos se convertam em lei, causando conflitos de normas no tempo a serem dirimidos pelo intérprete. A respeito do tema, somos favoráveis à ampla proteção do embrião concebido in vitro, uma vez que não retamos justo haver diferença de tratamento em face do nascituro pelo simples fato de este ter-se desenvolvido intra-uterinamente[3].

Há de se ressaltar que, segundo a maioria da doutrina, para a existência do nascituro é necessário que o óvulo fecundado tanto por fecundação natural ou in vitro (realizada em laboratório) esteja implantado no útero materno. O óvulo fecundado fora do ventre materno denominado de embrião pré-implantatório só irá ser considerado nascituro a partir da sua efetiva implantação e fixação no útero materno[4].

1.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Desde a mais remota antiguidade os gregos admitiam a capacidade jurídica do nascituro e foram preceptores nos estudos e no desenvolvimento da Embriologia. Neste sentido, é digna de nota a ilustração apresentada pelo jurista Plutarco através da história do rei Polydecte, citada pela professora Silmara J. A. Chinelato e Almeida:

Polydecte morreu cedo, sem filhos, e todos acreditavam que Licurgo seria o Rei. E o foi, mas apenas enquanto se ignorou a gravidez da Rainha, sua cunhada. Desde que ela foi conhecida, porém, Licurgo declarou que, se a Rainha tivesse um filho, seria a ele que a coroa pertenceria. Desde esse momento, ele administrou o reino apenas na qualidade de autor[5].

Continua a explicar a professora que as divergências na Grécia surgiam na permissão da prática do aborto. Nas cidades de Tebas e Mileto havia forte repressão ao aborto, diferentemente do que ocorria na cidade de Atenas que, até a época de Lysias, não conhecia nenhuma lei que cominava ao aborto com pena pública, sendo a impunidade, muito provavelmente, originada do temor ao aumento da população e, consequentemente, à potencial situação de fome e miséria.

O filósofo Platão defendia as práticas abortivas como controle demográfico, preocupava-se com a pureza da raça - defendia o aborto eugênico -, e com a idade dos genitores, atribuindo à mulher a idade de quarenta anos e ao homem a idade de cinquenta e cinco anos para a procriação. Já Aristóteles admitia o aborto por interesses demográficos e eugênicos, contudo, incriminava o aborto se o feto já estivesse dotado de alma, fato que, decorreria aos quarenta dias se homem, e três meses se mulher, momento em que o feto já teria os primeiros lineamentos humanos[6].

William Artur Pussi descreve que no aspecto medicinal, acredita-se que tenha sido escrito no ano de 1.416 a.C. um tratado em sânscrito sobre a embriologia Hindu - chamado de Garbha Upanishad - no qual, segundo tais escritos, o embrião passaria a existir a partir da conjugação do sangue com o sêmen. Bem interessante e evoluída a descrição dos meses de gestação trazida pelo tratado, conforme se observa abaixo:

Durante o período favorável à concepção, após o contato sexual, ele torna-se um Kahala (embrião de um dia), porque após sete noites seria uma vesícula e após quinze dias seria uma massa esférica e após um mês já seria uma massa firme.

Ainda, seguindo a evolução natural, passados dois meses, a cabeça já estaria formada, e no terceiro mês, já apareceriam as regiões dos membros. Entretanto, o ponto mais interessante estaria no fato de que, segundo tais escritos, o nascituro durante o sétimo mês se tornaria dotado de vida[7].

Já no Direito Romano há uma aparente contradição dos textos, ora era reconhecida a personalidade ao nascituro, ora se estabelecia uma personalidade condicional. Outros textos consideravam que a criança não viável era desnuda de personalidade e, em outros, negava-se a personalidade aos monstrum ou crianças nascidas sem forma humana[8].

Mesmo com tantas divergências entre o reconhecimento ou não da personalidade jurídica do nascituro Sérgio Semião Abdalla afirma que:

[…] não há dúvidas que prevaleceu, entre os juristas romanos, o conceito de que o feto é apenas parte das vísceras da mulher e não podia, portanto, ser considerado homem. O feto que ainda não foi dado à luz não se diz que seja um homem (“partus nondum editus homo nos recte fuisse dicitur”)[9].

E conclui que, em decorrência da orientação que prevaleceu no Direito Romano, a maioria dos doutrinadores brasileiros modernos adota a teoria natalista, a qual atribui personalidade completa aos que preencherem duas condições: a natural (nascimento perfeito) e a civil (por meio da qual se adquiria direitos)[10].

Assim, à época Romana, com o nascimento perfeito estar-se-ia apta a produção de efeitos jurídicos, diante da reunião de outras subcondições: estar o feto completamente separado do ventre materno, nascer vivo, ter forma humana e ser viável. Nesta época não havia diferença se o nascimento decorria de parto normal, ou por meio de intervenção cirúrgica, até porque, os romanos consideravam o parto artificial como o verdadeiro parto[11].

Analisando-se as referidas subcondições, tem-se que não bastava o nascimento com vida, necessário era que o nascido possuísse forma humana. Se o recém-nascido não possuísse forma humana não era considerado pessoa, e sim monstrum - ser disforme -, que apresentava no todo ou em parte uma deformação[12].

A condição de viabilidade é debatida pelos autores. Aqueles que aceitam essa condição afirmam que, em decorrência da interpretação dos textos antigos, somente seria pessoa quem nascesse vivo e com condições de permanecer vivo.

Ademais, a questão temporal também era saliente neste período histórico, a tal ponto que a legitimidade do filho era aferida de acordo com o momento em que houve sua concepção. Se gerado durante as justas núpcias seriam legítimos, mesmo se nascidos após a dissolução do matrimônio. Contudo, seriam ilegítimos se nascidos durante o matrimônio, mas tivessem sido concebidos antes das justas núpcias[13].

Ainda no tocante à viabilidade e ao lapso temporal, o Direito Romano fixou o menor e o maior prazo possível para ser completada a gestação saudável de um filho. Estabeleceu-se que o feto poderia nascer perfeito se completo o tempo mínimo de cento e oitenta e dois dias de concepção, ou o período máximo de dez meses. Tempos depois, o Direito Romano adotou certas modificações em favor dos filhos, considerando legítimos os nascidos de gestação com duração inferior a cento e oitenta dias se ocorresse o matrimônio entre os pais, momento que indicava o reconhecimento do filho por parte do marido[14].

Há de se ressaltar que o ordenamento jurídico de Roma, tal como o da cidade grega de  Atenas, não incriminava o aborto. A fundamentação desta atipicidade consistia na crença, vigente, de que o feto não era um ser autônomo e sim parte da mulher ou de suas vísceras.

Colaciona-se, a fim de ilustrar os direitos favoráveis ao nascituro, a doutrina de William Artur Pussi, na qual há menção dos seguintes trechos da legislação romana:

a) D. 1.5.18 (de statu hom.). de Adriano em que foi estatuído como sendo cidadão romano o que foi concebido em justas núpcias, mesmo que na época do nascimento sua mãe já se achasse desterrada;

b) D. 1.9.7.1 e 2 (de senatoribus), pelo qual se considerava filho de senador aquele que foi concebido quando o pai era senador, embora, quando do nascimento, tivesse o pai perdido essa dignidade;

c) D.1.5.12 (de statu hom.) e D.38.16.3.11 (de suis) dispunha que a legitimidade do filho em regra era fixada pela concepção durante as justas núpcias;

d) D.5.16 (de stat. hom.) dispunha que ao que estava no ventre era atribuída a herança legítima, e o título de ventre in possessionem mittendo et curatore eius estabelecido no D. 37.9, estabelecia a bonorum possessio ventris nomine em virtude do qual um curador era especialmente nomeado e exercia a posse em nome do ventre de maneira que poderia praticar todos os atos e tomar todas as medidas cabíveis a fim de conservar os bens do nascituro e providenciar que fossem providenciadas à mãe todas as medidas necessárias a seu sustento e também garantir, assim, o desenvolvimento do nascituro.

Também o bonorum possessio ventris nomine permitia a nomeação de um curador quando o nascituro era chamado à sucessão de um estranho, e a mãe não possuía posse suficiente para lhe garantir o sustento;

e) D.11.8.2 estabelecia especial proteção ao nascituro quando permitia que fosse aberto o ventre da mulher que havia morrido grávida, a fim de tentar salvar o nascituro, e o D.48.19.3 pelo qual se vedava a execução da mulher grávida condenada a morte, adiando-se a execução para depois do parto[15].

Em suma, é de se concluir que no Direito Romano havia, de fato, disposições que garantiam direitos ao nascituro. Destaca-se dos demais, pela pertinência temática, o bonorum possessios ventris nomine, haja vista o seu objetivo de garantir medidas necessárias ao sustento e ao desenvolvimento do nascituro, no transcurso da gravidez da sua genitora. O que configura claramente o reconhecimento pela legislação romana do direito do nascituro a alimentos e ao desenvolvimento saudável intrauterino.

Seguindo o transcurso do tempo, outro período histórico relevante foi o período medieval, com destaque para a figura da Igreja, e para a cronologia histórica da área jurídica o chamado Direito Intermédio. A doutrina canônica nessa época exercia papel fundamental, pois de forma indireta controlava toda a política e, até mesmo, o pensamento do povo a sua volta.

Os pensadores cristãos da época, como Santo Agostinho, entendiam ser imprescindível a distinção entre os fetos formados e os informes. Apenas os fetos formados receberiam a alma e assim iniciariam a vida eterna. O feto recebia a alma quando começasse, dentro do ventre materno, a apresentar movimentos característicos de uma vida própria. A partir do momento em que o feto recebia alma ele não poderia mais ser abortado. Se o abortamento fosse praticado seria considerado homicídio.

Com o advento do Código Francês, também conhecido como Código Napoleônico (1804), deu-se a individualização do Direito Civil. Contudo, como à época o interesse era de expansão econômica (Revolução Industrial), tal codificação tinha como paradigmas o patrimonialismo e o individualismo.

No Brasil, a primeira Constituição foi promulgada em 1924 e teve vigência até 1981, dois anos após a Proclamação da República. No período compreendido entre a Constituição Monárquica e a Constituição Republicana, no ano de 1962, o então contratado para redigir o Projeto do Código Civil, Teixeira de Freitas, terminou de elaborar o conhecido “Esboço do Código Civil”, o qual foi repudiado pelo Brasil, mas abarcado pelo ordenamento jurídico da Argentina (hoje um dos mais evoluídos mundialmente).

Mais adiante, em 1899, Clóvis Beviláqua redige o Projeto de Código Civil, com base nos paradigmas dos Códigos Europeus (patrimonialismo e individualismo) e esse Projeto entra em vigor no ano de 1916, tendo vigência até a promulgação da Lei 10.406 de 2002, atual Código Civil pátrio. O Código Civil de 1916 foi bem aceito pela sociedade, uma vez que fora concebido para uma sociedade agrária, tradicionalista e conservadora, a qual mantinha um perfil essencialmente patrimonialista.

Fazendo-se uma análise comparativa entre o Código de Civil de 1916 e o de 2002, contudo, nos limites do tema deste estudo, tem-se que os paradigmas foram significativamente alterados, passando-se de uma preocupação individualista e patrimonialista para um rol de valores que visam a proteger a dignidade da pessoa humana em suas mais diversas esferas, enfatizando-se os direitos da personalidade - que atualmente possuem até capítulo próprio dentro do Código Civil. Deixa-se de lado o “ter” para consagrar o “ser”.

O artigo 4.º, hoje, artigo 2.º, que é a disposição mais relevante para a discussão do tema nascituro teve sua redação alterada, substituindo-se a expressão “homem” por “pessoa”, em consonância com o artigo 1º,  inciso III, da Constituição da República.

São enumerados como pontos obscuros da redação do artigo 2.º do atual Código Civil, em primeiro lugar, o uso das expressões “nascimento” e “concepção”, pois  não foi aditada uma posição concreta quanto à personalidade do nascituro; em segundo lugar, a eventual abrangência do embrião, haja vista que a fecundação in vitro já era uma realidade à época[16].

As outras proteções e direitos conquistados ao longo do tempo pelo nascituro serão explanados. Mais adiante, nos tópicos pertinentes.

1.3. INÍCIO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E TEORIAS

A personalidade jurídica é um valor jurídico reconhecido aos indivíduos, dando-lhes a oportunidade de titularizarem uma relação jurídica. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[17] conceituam personalidade jurídica como sendo a “aptidão de adquirir direitos e contrair obrigações, é o atributo necessário para ser sujeito de direito, assim, adquirida a personalidade, o ente passa a atuar, na qualidade de sujeito de direito, praticando atos e negócios jurídicos dos mais diferentes matizes”.

Várias são as controvérsias a respeito do momento inicial da personalidade jurídica do nascituro. Os doutrinadores ao longo dos anos levantaram inúmeras teorias para explicar o início da personalidade jurídica.

O próprio Código Civil aplica duas teorias, concomitantemente, no seu artigo 2.º, sendo a primeira parte baseada na teoria natalista, e a segunda baseada na teoria concepcionista. Atualmente, contudo, em face do reconhecimento de inúmeros direitos ao nascituro, há uma modificação da prevalência das teorias, da natalista para a concepcionista.

1.3.1. Teoria Natalista

É a teoria adotada pelo Código Civil brasileiro e defendida por doutrinadores como Eduardo Espíndola, Vicente Raó e Silvio Rodrigues[18].

Esta teoria defende que a personalidade jurídica só se inicia com o nascimento com vida, antes desse momento o nascituro não é considerado pessoa e tem apenas a mera expectativa de direito.

Silvio Rodrigues[19] acrescenta que a lei não concede ao nascituro personalidade, a qual só  adquire-se ao nascer com vida, “mas, como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico desde logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus”.

Segundo o entendimento de Vicente Ráo, a mera expectativa de direito se aperfeiçoa com o nascimento, conforme se extrai do trecho a seguir:

Não importa reconhecimento nem atribuição de personalidade, mas equivale, apenas, a uma situação de expectativa, de pendência, situação que só com o nascimento se aperfeiçoa, ou então, indica a situação ou fato em virtude do qual certas ações podem ser propostas ou ao qual se reportam, retroativamente, os efeitos de determinados atos futuros[20].

O significado da expressão nascimento com vida, ou da chamada vida extrauterina é antigo; bastando, para sua caracterização, que tenha havido a pulsação dos órgãos ou a leve respiração. No auxílio da averiguação do funcionamento do aparelho cardio-respiratório está o exame de docimasia hidrostática de Galeno, mediante o qual se afere se houve a entrade de oxigênio no pulmão. Este procedimento verifica a diferença de peso do pulmão que respirou do que não respirou, mergulhando-o em solução aquosa.

Sérgio Semião Abdalla indica além do exame de docimasia hidrostática de Galeno outros tipos de verificação de entrada de ar nos pulmões e consequente comprovação de um breve momento de vida após o parto:

[…] na eventual impossibilidade da utilização desse método principal de investigação (se por acaso o pulmão do neonato já vier impregnado de líquido), outras técnicas são aplicáveis, como a docimasia pulmonar histológica (verificação dos alvéolos pulmonares, pois, se houve respiração, apresentarão dilatação uniforme e, caso contrário, as paredes alveolares estarão coladas), docimasia óptica de Icard (exame microscópico de fragmento de pulmão, esmagado em uma lâmina, quando, ao observar pequenas bolhas de ar na película esmagada deduz-se a respiração), docimasia química de Icard (passagem rápida de fragmento do pulmão em álcool absoluto, a seguir, mergulhado em solução alcoólica de potássio cáustico a 30%, que dissolve o estroma pulmonar, liberando bolhas de ar, no pulmão que respirou, docimasia radiográfica de Bordas (exame radiográfico dos pulmões, que se mostrarão opacos - se não respiraram - ou transparentes - se receberam oxigênio), docimasia epimicroscópica pneumo-arquitetônica (exame da superfície externa dos pulmões) e as docimasias respiratórias indiretas (verificação de outros órgãos, como estômago, intestinos, fígado e ouvidos - trompas de Eustáquio - conjuntamente com os pulmões, para tentar constatar se houve ar circulando no corpo do nascituro)[21].

1.3.2. Teoria da Personalidade Condicional

A teoria da Personalidade Condicional, também chamada de concepcionista imprópria, é defendida por diversos doutrinadores, dentre eles, Miguel Maria Serpa Lopes, Gastão Grossé Saraiva e Clóvis Beviláqua[22].

De acordo com essa teoria entende-se que o feto, desde sua concepção, pode adquirir direitos, os quais serão irrevogáveis a partir do nascimento com vida. O nascituro, neste entender, é pessoa condicional. A aquisição da personalidade acha-se sob a dependência de uma condição suspensiva, qual seja, o nascimento com vida[23].

No direito argentino, o nascimento atua como condição resolutória, pois o feto é considerado um ser real, capaz de adquirir direitos. Para o ordenamento jurídico brasileiro, no entanto, o nascimento seria condição suspensiva.

Destarte, a condição consiste em um acontecimento futuro e incerto que subordina a eficácia jurídica. Em se tratando de nascituro, a condição é o nascimento com vida. A condição suspensiva paralisa o início da eficácia jurídica do negócio até o momento do nascimento do feto com vida.

Por conseguinte, é com o nascimento com vida que se implementam os direitos adquiridos como nascituro, integrando definitivamente o patrimônio do recém-nascido. Caso, poucos momentos depois do seu nascimento, o recém-nascido vier a falecer, mas houver comprovação de um minuto sequer de vida, ter-se-ão garantidos todos os direitos inerentes à época de nascituro e ainda aos direitos de recém-nascido. Se não nascer com vida, nada adquirirá.

Gastão Grossé Saraiva[24], ao defender a teoria da personalidade condicional, conclui que duas premissas básicas devem ser seguidas: a primeira é a de que a personalidade jurídica do homem começa desde a concepção; e a segunda é que os direitos do nascituro estão sujeitos a uma condição suspensiva (nascimento com vida).

É importante ressaltar que os mesmos procedimentos de averiguação do nascimento com vida, referidos ao final do tópico da teoria natalista, são também meios utilizados por esta teoria e pelas demais.

1.3.3.Teoria Concepcionista.

Fundamentada na segunda parte do artigo 2.º do Código Civil brasileiro, possui grandes doutrinadores como defensores, entre eles Teixeira de Freitas, R. Limongi França e Silmara J. A. Chinelato e Almeida[25].

Para esta teoria, o nascituro é pessoa desde sua concepção, ou seja, possui personalidade jurídica desde a nidação, ocasião em que se inicia a viabilidade da vida intrauterina. O nascimento com vida não é condição para conquistar-se a personalidade jurídica.

Estaria resguardado ao nascituro tanto os seus direitos patrimoniais quanto os personalíssimos e não apenas meras expectativas de direitos. Assegura-se, aos nascidos com vida, os direitos patrimoniais concretos como receber uma doação ou herança, seja ela legítima ou testamentária.

Maria Helena Diniz diferencia a personalidade entre material e formal:

[…] poder-se-ia até mesmo afirmar, que na vida intra-uterina, tem o nascituro, e, na vida extra-uterina, tem o embrião personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos da personalidade, visto ter a pessoa carga genética diferenciada desde a concepção, seja ela in vivo ou in vitro, passando a ter personalidade jurídica material, alcançado os direitos patrimoniais e obrigacionais, que permaneciam em estado potencial, somente com o nascimento com vida. O nascimento com vida diz respeito à capacidade de exercício de alguns direitos patrimoniais[26].

Nessa senda, só com o nascimento com vida adquirir-se-á personalidade jurídica material, inatingível para os natimortos, os quais terão possuído apenas personalidade jurídica formal. A personalidade formal visa a proteger juridicamente os direitos da personalidade, tais como a imagem, o nome, a sepultura e o registro em livro próprio.

Silmara J. A. Chinelato e Almeida[27] com fortes argumentos embasa a teoria concepcionista, afirmando que “não há meia personalidade ou personalidade parcial. Mede-se ou quantifica-se a capacidade, não a personalidade. Por isso se afirma que a capacidade é a medida da personalidade. Esta é integral ou não existe”. Conforme demonstra, a capacidade limitada do nascituro não lhe tira a personalidade.

Acrescenta, ademais, em contraposição à teoria da personalidade condicional, “que apenas certos efeitos de certos direitos dependem do nascimento com vida”, e nesses casos o nascimento com vida é mero elemento do negócio jurídico.

E, por fim, explicita três premissas que norteiam a personalidade e, consequentemente, a teoria concepcionista. Sendo a primeira a de que a personalidade começa com a concepção; a segunda a de que os direitos do nascituro não são taxativos, sendo-lhe reconhecidos todos os que com suas características de pessoa por nascer forem compatíveis; e a terceira a de que os direitos patrimoniais (doação e herança) ficam condicionados resolutivamente ao nascimento com vida.

1.4. PROTEÇÃO E DIREITOS JÁ ASSEGURADOS AO NASCITURO NO BRASIL

A lei não consegue prever em sua plenitude todos os eventuais acontecimentos e de antemão normatizá-los; cabe aos juízes e doutrinadores construírem bases para a concreção jurídica, ajustando o positivismo jurídico à evolução natural das relações sociais.

Miguel Reale[28], ao tratar do princípio da eticidade assevera: “o que importa numa codificação é o seu espírito; é um conjunto de ideias fundamentais em torno das quais as normas se entrelaçam, se ordenam e se sistematizam”.

Nesse contexto, os doutrinadores e os Tribunais Superiores brasileiros possuem papel ímpar para o adequado balizamento dos direitos atribuídos ao nascituro, além dos já possuídos e previstos em lei. Acórdãos hodiernos demonstram o fortalecimento desse novo posicionamento, com a visível tendência da prevalência da adoção da Teoria Concepcionista.

No Brasil há uma variedade de dispositivos legais que protegem o nascituro, todavia, estão assistematicamente espalhados dentro do ordenamento jurídico nacional. Nesta oportunidade, serão elencadas as normas protetivas primordiais, e, a partir delas desenvolvida a interpretação e análise à luz do conceito de nascituro trazido pelo Código Civil.

O Código Civil de 1916, muito influenciado pelo Código Civil Francês e pelo Código Alemão, tinha como paradigmas o patrimonialismo e o individualismo. Naquela época a Constituição Federal era uma mera carta política, que, por sua vez, mantinha neutralidade e indiferença ao Direito Civil. Sendo assim, o Direito Público estava hermeneuticamente separado do Direito Civil. Sobre este período do ordenamento jurídico Gustavo Tepedino refere que:

De fato, cuidava-se da garantia legal mais elevada quanto à disciplina das relações patrimoniais, resguardando-as contra a ingerência do Poder Público ou de particulares que dificultassem a circulação de riquezas. O direito público, por sua vez, não interferiria na esfera privada, assumindo o Código Civil um papel  monopolizador das relações privadas[29].

Com o advento da Constituição da República no ano de 1988, nesse cenário legislativo muda. A Carta magna traz uma tábua axiológica que consagra a dignidade da pessoa humana, a solidariedade social e a erradicação da pobreza, a liberdade e a igualdade, acontecimento que faz com que o Direito Civil abandone o viés do Código Civil de 1916 e adquira contornos delimitados e garantidos pela própria Constituição.

A esse movimento migratório de temas, antes só tratados na esfera civil para a Constituição dá-se o nome de Constitucionalização do Direito Civil ou Direito Civil Constitucional. Em outras palavras, os paradigmas do Código Civil de 1916 - patrimonialismo e individualismo - caem por terra com a inescondível preocupação do legislador com a pessoa humana. A propósito, vem o Código Civil de 2002 substituir os antigos paradigmas, apoiando-se na eticidade, operabilidade e socialidade, todos com fulcro nos valores do garantismo constitucional.

A Constituição da República assegura, no artigo 5.°, caput, dentre outros direitos, o direito à vida, que é considerado o mais fundamental de todos os direitos, já que constitui um pré-requisito à existência e ao exercício de todos os demais. Assim, ao se falar em vida, quer-se protegê-la de forma plena, inclusive a vida uterina.

Ademais, a Carta Magna assegura, em seu artigo 201, inciso II, proteção especial às gestantes, e mais adiante, no artigo 227, trata dos deveres familiares, da sociedade e do Estado ao estabelecer diversos direitos à criança e ao adolescente.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, Pacto São José da Costa Rica, que entrou em vigor internacional na data de 18/07/1978 e em vigor para o Brasil na data de 25/09/1992, por meio do decreto n. 678, traz no seu artigo 4.º que “toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito dever ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”.

Ocorre a discussão Constitucional a respeito do status desta convenção de direitos humanos, se teria status constitucional ou infraconstitucional. A respeito da matéria, Alexandre de Moraes defende que:

As normas previstas nos atos, tratados, convenções ou pactos internacionais devidamente aprovadas pelo Poder Legislativo e promulgadas pelo Presidente da República, inclusive quando preveem normas sobre direitos fundamentais, ingressam no ordenamento jurídico como atos normativos infraconstitucionais, salvo na hipótese do §3º, do art. 5º, pelo qual a EC nº45/04 estabeleceu que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que foram aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais[30].

Deste fato, o Superior Tribunal Federal atribuindo aos tratados de direitos humanos que não foram aprovados segundo os critérios de emenda constitucional o status supralegal, o qual valora o tratado em posição superior à lei e inferior à Constituição, modificando a tradicional pirâmide normativa de Hans Kelsen.

Aplicando-se, com status supralegal, o disposto na Convenção Americana de Direitos Humanos, vê-se que a teoria adotada no Brasil é a concepcionista, haja vista a preconizada proteção desde o momento da concepção. Conforme já explicitado anteriormente, a celeuma a respeito de qual teoria da personalidade jurídica seria aplicada no Brasil ainda não restou pacificada pela doutrina e jurisprudência.

No Código Civil, além do artigo 2.º, há outros dispositivos que dizem respeito aos direitos e garantias do nascituro, sendo um deles o direito à sucessão - legítima ou testamentária. Conforme o artigo 1.798, “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão” e, mais adiante, ao tratar da sucessão testamentária, no artigo 1.799, inciso I, também faz referência ao nascituro de forma indireta “os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão”.

O nascituro também pode, de acordo com o artigo 542 do Código Civil, receber doação, todavia, para que seja considerada válida tal operação, é imprescindível a manifestação do aceite daquele que tem o dever de cuidar de seus interesses.

Em nosso ordenamento jurídico, ainda há a proteção legal conferida ao nascituro trazida nos artigos 877 e 878 do Código de Processo Civil. Nesses artigos garante-se ao representante do nascituro o direito de prova do estado de gravidez, com a intenção de requerer a imissão na posse dos direitos que assistam ao nascituro. Humberto Theodoro Júnior[31] lembra-nos que o objetivo último desta medida de caráter transitório, denominada posse em nome do nascituro, é “dar proteção a direitos de quem não pode exercê-los por si”.

Em outra senda, o ordenamento penal brasileiro, ao enquadrar o aborto dentre os crimes contra a vida, protege a vida do ser humano em formação, atribuindo-lhe a qualidade de pessoa. Para Silmara J. A. Chinelato e Almeida[32] “qualquer que seja a posição da doutrina a respeito da natureza jurídica do nascituro, se é pessoa, spes personae, spes hominis, é mister observar que o código penal brasileiro subsume o aborto no título I da Parte Especial, que cuida dos crimes contra a pessoa”.

É por ter essa qualidade de pessoa, que o Direito Penal conceitua aborto como a interrupção da gravidez por meio do extermínio do produto da concepção. No aborto, ocorre a destruição da vida intrauterina, esteja ela em qualquer estágio de desenvolvimento. Fernando Capez explica que:

A lei não faz distinção entre óvulo fecundado (3 primeiras semanas de gestação), embrião (3 primeiros meses) ou feto (a partir de 3 meses), pois em qualquer fase da gravidez estará configurado o delito de aborto, quer dizer, entre a concepção e o início do parto, pois após o início do parto poderemos estar diante do delito de infanticídio ou homicídio[33].

O ordenamento penal brasileiro traz no artigo 128 do Código Penal dois casos que excluem a ilicitude de aborto, quais sejam, aborto necessário - quando não houver outro meio de salvar a vida da gestante, que representa uma modalidade especial de estado de necessidade -, e o aborto sentimental ou humanitário - quando a gravidez resultar de estupro, se precedido o aborto do consentimento da gestante ou representante legal -, que representa uma forma especial de exercício regular de direito.

O Estatuto da Criança e Adolescente, instituído pela Lei 8.069/1990, ao tratar dos direitos fundamentais à vida e à saúde, inclui o nascituro em suas normas protetivas. O artigo 7.º do referido estatuto, dispõe que “a criança e o adolescente têm direito à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”.

Como forma de garantir o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, o próprio estatuto, em seus artigos, fornece diretrizes a serem cumpridas para o melhor atendimento da gestante, dentre elas o atendimento com prioridade, consultas pré e perinatal, apoio alimentar e parto com o médico responsável pelo acompanhamento pré-natal.

A medicina também, a fim de proteger a vida do nascituro, desenvolveu novas técnicas intrauterinas, intervenções cirúrgicas, transfusão de sangue, avanços nas drogas que asseguram a estabilidade do feto, dentre outras.

O direito de filiação é assegurado pelo Estatuto da Criança e Adolescente no seu artigo 26, parágrafo único, que dispõe: “o reconhecimento pode proceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes”. Nesse diapasão, tanto o pai quanto mãe poderão pleitear, em nome do nascituro, o reconhecimento de paternidade e maternidade e, ainda, todos os direitos inerentes a tal reconhecimento.

Tanto o Código Civil quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente possuem artigos que regulamentam a adoção de crianças e adolescentes, no entanto, não fazem menção a possibilidade de adoção do nascituro. O que deu margem ao surgimento de duas correntes doutrinárias.

A primeira corrente afirma não existir a possibilidade desse tipo de adoção, pois não há alusão no ordenamento jurídico da eventual adoção do nascituro. Afirmam, ademais, que a ninguém deveria ser facultado a possibilidade de realizar a adoção de quem ainda não nasceu, uma vez que não se sabe se haverá o nascimento com vida. E essa incerteza “contraria o princípio de segurança e estabilidade que deve presidir as relações que deixam marca no estado das pessoas”[34].

A segunda corrente combate os argumentos contrários à adoção com base em uma afirmação de cunho sociológico-sanitarista, no sentido de que a adoção é um direito inerente ao próprio ser, assemelhando-se aos direitos que o nascituro tem reconhecidos antes mesmo do nascimento.

Hodiernamente, tem-se discutido a possibilidade de habeas corpus em nome do nascituro, nos casos em que a gestante encontra-se reclusa em estabelecimento penal. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo no ano de 2007 concedeu a ordem 100070002991, conforme ementa a seguir colacionada:

EMENTA: HABEAS CORPUS - AÇÃO PROPOSTA PELA GENITORA DO NASCITURO FUNDAMENTANDO-SE NO DIREITO CONFERIDO A  ELE DE NASCER  DIGNAMENTE - ATENDIMENTO PRÉ E PÓS -NATAL - NASCIMENTO EM LOCAL ADEQUADO COM A DEVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA. ORDEM CONCEDIDA.

À luz do artigo 2º do Código Civil, temos que a  personalidade civil do homem começa do nascimento com vida. Entretanto, expressamente dispõe o artigo que desde a concepção, os direitos do nascituro são postos a salvo.

Dessa forma, resta claro que, havendo qualquer dano ou  ameaça de dano ao seu bem-estar físico ou psíquico, ao nascituro cabe proteção.

No presente caso justa se faz a concessão da ordem para  garantir o direito do paciente ao nascimento com vida e  em condições dignas e saudáveis, com observância no princípio da dignidade da pessoa humana.

ORDEM CONCEDIDA para garantir um tratamento pré e pós-natal eficiente e imediato, bem como um parto digno à gestante, em local adequado e salubre.[35]

O entendimento do Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a teoria de que o nascituro é um ser individualizado, com carga genética diferente de seus genitores, mesmo que ligado e dependente à saúde de sua mãe, devendo, portanto, ser protegido de quaisquer abalos que lhe possam acontecer.

Uma vez no cárcere, a gestante está exposta a diversos tipos de violência física e psíquica, que pode, por consequência, acarretar algum tipo de anormalidade ao nascituro durante seu ciclo de formação. E por ter em vista essa proteção, caberia ao nascituro o direito de impetrar habeas corpus em seu nome, a fim de resguardar-se de eventuais abalos que o cárcere de sua genitora possa transmitir-lhe.

Outro direito que vem sendo pacificado pela doutrina é a possibilidade de indenização por danos morais causados ao nascituro. Esse entendimento já foi admitido, inclusive, pelo Superior Tribunal de Justiça, no RESP 399028/SP, do ano de 2002:

DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. MORTE. ATROPELAMENTO. COMPOSIÇÃO FÉRREA. AÇÃO AJUIZADA 23 ANOS APÓS O EVENTO.  PRESCRIÇÃO INEXISTENTE. INFLUÊNCIA NA QUANTIFICAÇÃO DO QUANTUM. PRECEDENTES DA TURMA. NASCITURO. DIREITO AOS DANOS MORAIS. DOUTRINA. ATENUAÇÃO. FIXAÇÃO NESTA INSTÂNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

I - Nos termos da orientação da Turma, o direito à indenização por dano moral não desaparece com o decurso de tempo (desde que não transcorrido o lapso prescricional), mas é fato a ser considerado na fixação do quantum. II - O nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstância de não tê-lo conhecido em vida tem influência na fixação do quantum. III -  Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado desde logo, inclusive nesta instância, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando inconvenientes e retardamento da solução jurisdicional[36].

Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça reiterou a decisão anterior, conforme pode se observar no RESP 931556/RS:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. MORTE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. FILHO NASCITURO. FIXAÇÃ DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. DIES A QUO. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DA FIXAÇÃO PELO JUIZ. JUROS DE MORA. DATA DO EVENTO DANOSO. PROCESSO CIVIL. JUNTADA DE DOCUMENTO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE, DESDE QUE NÃO CONFIGURADA A MÁ-FÉ DA PARTE E OPORTUNIZADO O CONTRADITÓRIO. ANULAÇÃO DO PROCESSO. INEXISTÊNCIA DE DANO. DESNECESSIDADE.

- Impossível admitir-se a redução do valor fixado a título de compensação por danos morais em relação ao nascituro, em comparação com outros filhos do de cujus, já nascidos na ocasião do evento morte, porquanto o fundamento da compensação é a existência de um sofrimento impossível de ser quantificado com precisão. - Embora sejam muitos os fatores a considerar para a fixação da satisfação compensatória por danos morais, é principalmente com base na gravidade da lesão que o juiz fixa o valor da reparação. - É devida correção monetária sobre o valor da indenização por dano moral fixado a partir da data do arbitramento. Precedentes. - Os juros moratórios, em se tratando de acidente de trabalho, estão sujeitos ao regime da responsabilidade extracontratual, aplicando-se, portanto, a Súmula nº 54 da Corte, contabilizando-os a partir da data do evento danoso. Precedentes - É possível a apresentação de provas documentais na apelação, desde que não fique configurada a má-fé da parte e seja observado o contraditório. Precedentes. - A sistemática do processo civil é regida pelo princípio da instrumentalidade das formas, devendo ser reputados válidos os atos que cumpram a sua finalidade essencial, sem que acarretem prejuízos aos litigantes.

Recurso especial dos autores parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. Recurso especial da ré não conhecido[37].

Analisando-se a evolução histórica do nascituro, observa-se o amadurecimento a respeito do tema, com nítida efetivação de seus direitos mesmo antes do nascimento, reflexo da preponderância da teoria concepcionista ou também chamada de concepcionista pura.

A promulgação de leis e o proferimento de decisões que entendem ser o nascituro detentor de direitos só fazem fortalecer o entendimento de que a atual codificação não esgotou a matéria, não se podendo afastar a proteção de outros direitos, principalmente os direitos fundamentais, trazidos pela Constituição Federal entre seus artigos 1.º a 5.º.


2. ALIMENTOS

O instituto dos alimentos possui amparo na Carta Magna, da qual decorrem outras formas legislativas que preveem e regulam os alimentos, entre elas a Lei 5.478/1968 - Lei de Alimentos -, Lei 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente -, Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso -, e o robusto Código Civil.

Os alimentos estão regulados no Código Civil, no Livro IV - Do Direito de Família -, Subtítulo III - Dos Alimentos -, artigos 1.694 a 1.710. Isso não quer dizer que não há outras leis e artigos dispersos dentro do ordenamento jurídico e até mesmo dentro do Código Civil que fazem referência direta ou indiretamente ao instituto dos alimentos.

Silvio Rodrigues[38] acrescenta que na tentativa do Estado de aliviar-se, ou na inviabilidade de cumprir este encargo assistencial “o transfere, por determinação legal, aos parentes, cônjuge ou companheiro do necessitado, cada vez que eles possam atender a tal incumbência”.

A abrangência do termo alimentos no âmbito do Poder Judiciário é diferente das outras ciências, haja vista que para o Direito abrange não só as propriedades alimentares, mas sim, todas as necessidades básicas para a sobrevivência com dignidade. Moradia, vestuário, saúde, educação e lazer são formas englobadas no conceito de alimentos.

Tem interesse direto, sobretudo, o Estado no cumprimento das normas que impõem a obrigação alimentar, tendo em vista que o descumprimento do seu comando aumenta o número de pessoas desprotegidas e carentes, que devem por ele, Estado, serem protegidas e amparadas. Motivo pelo qual as normas que disciplinam o instituto de alimentos serem consideradas normas de ordem pública, inderrogáveis por convenção entre os particulares e impostas por meio de repressiva sanção, como por exemplo no caso de infração do alimentante a aplicação da pena de prisão civil por alimentos[39].

Maria Helena Diniz[40] ressalva que não se pode confundir o dever de prestar alimentos com os deveres familiares, pois possuem pressupostos diferentes para a sua prestação. Enquanto os deveres familiares - sustento, assistência, socorro - entre marido e mulher, pais e filhos menores são unilaterais e não possuem caráter de reciprocidade, devendo ser prestados incondicionalmente, em outra senda, o dever de prestar alimentos pauta-se na reciprocidade, dependendo das possibilidades do devedor, e só se faz exigível se o eventual credor estiver necessitado.

2.1. CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

O Código Civil, no subtítulo específico de alimentos, não conceituou alimentos, restando à doutrina fazê-lo. Nos manuais há uma diversidade de conceitos, cuja essência pode ser sintetizada na noção de que constituem uma prestação periódica a quem necessite, por não ter condições de prover a própria subsistência.

Orlando Gomes[41] de forma sucinta conceitua alimentos como “prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-la por si”.

O conceito trazido por Yussef Said Cahali acrescenta:

A palavra “alimentos” no seu significado vulgar: tudo aquilo que é necessário à conservação do ser humano com vida; [...] em linguagem técnica, bastaria acrescentar a esse conceito, a ideia de obrigação que é imposta a alguém, em função de uma causa jurídica prevista em lei, de prestá-los a quem deles necessite[42].

Um ponto relevante, que merece reiteração, é o sentido amplo em que é usado o termo alimentos, para a linguagem jurídica. Neste diapasão, Carlos Roberto Gonçalves[43] ensina que “a aludida expressão tem, no campo do direito, uma acepção técnica de larga abrangência, compreendendo não só o indispensável ao sustento, como também o necessário para a manutenção da condição social e moral do alimentando”.

Maria Helena Diniz[44] assevera que compreende alimentos o que é imprescindível à vida da pessoa humana como alimentação, vestuário, habitação, tratamento médico, transporte, diversões, e no caso de alimentados menores de idade, engloba-se as verbas para educação e instrução.

No ano de 2002, o legislador expressamente incluiu no artigo 1.694 do Código Civil as necessidades com a educação, além daquelas destinadas a preservar a subsistência de modo compatível com a condição social do alimentando.

O dever de prestação alimentar funda-se no princípio da preservação da dignidade humana, estabelecida pela Constituição da República em artigo 1.º, inciso III, bem como no princípio da solidariedade social e familiar, previsto, também, na Constituição Federal, em seu artigo 3.º. Diante de tais fundamentos, pode-se afirmar que o dever de alimentos é um dever personalíssimo, devido pelo alimentante, em razão de um vínculo conjugal, convivencial ou familiar com o alimentando.

Registre-se, por fim, que tradicionalmente a doutrina brasileira leciona que a obrigação legal de alimentos não tem cunho indenizatório e sim assistencial, pois funda-se nos já mencionados princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.

No tocante à natureza jurídica do direito à prestação de alimentos, há divergência doutrinária, pois, alguns atribuem natureza de direito pessoal extrapatrimonial, outros, de direito patrimonial, e ainda, de direito de conteúdo patrimonial e finalidade pessoal.

Aqueles que sustentam a natureza jurídica de direito pessoal extrapatrimonial afirmam que o interesse do alimentando não tem cunho propriamente econômico, já que a prestação recebida não tem finalidade de aumentar o patrimônio e nem servir de garantia contra credores, por parte de quem a recebe.

De forma contrária aos que defendem a natureza jurídica de direito extrapatimonial estão os que defendem que a natureza jurídica é patrimonial. A atribuição do direito patrimonial se dá com base na qualidade econômica da própria prestação da obrigação, pois, ao consistir-se no pagamento periódico de quantia em dinheiro ou de medicamentos, escola, roupas, assemelha-se a uma relação patrimonial de crédito-débito; de um lado um credor exigindo o pagamento de prestações  econômicas periódicas e do outro um devedor, que se não honrar com o pagamento poderá vir a sofrer diversas sanções[45].

Os autores que defendem a natureza jurídica mista, por sua vez, mesclam as duas posições anteriores. Ao passo que, mesmo sendo o direito a alimentos personalíssimo, a obrigação alimentar não deixa de ter representação material. Sob este aspecto Yussef Said Cahali aduz:

Em verdade, a afirmativa de que um direito relativo como este tem um caráter patrimonial ou um caráter pessoal, qualquer que seja o fundamento para justificar a opção, não equivale ao seu confinamento no contexto de uma determinada categoria, pois faltariam outros requisitos para a sua exata sistematização[46].

2.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

No Direito Romano, a obrigação alimentícia fundada nas relações de família não foi mencionada nos primeiros momentos legislativos. Essa omissão seria reflexo da estrutura da família romana, que existiu durante todo o período arcaico e republicano vivido por aquele povo. O vínculo que subsistia era o do pátrio poder, o pater familias concentrava em suas mãos todos os direitos, sem, contudo, qualquer vinculação de obrigação com seus descendentes. Nesta oportunidade, todos em volta do pater familias não podiam exercitar contra ele nenhuma pretensão de caráter patrimonial, como a derivada de alimentos[47].

O momento histórico do reconhecimento da obrigação alimentar no seio familiar não é preciso. Contudo, os historiadores acreditam que, com o amadurecimento do conceito de família, o vínculo sanguíneo adquiriu maior importância, acarretando a inserção do dever moral de socorro nas relações familiares romanas. O dever moral de socorro é uma forma de obrigação alimentar, a qual seria prestada em favor dos cônjuges, ascendentes, descendentes, irmãos e irmãs[48].

No tocante ao Direito Canônico, este foi um dos expansionistas da obrigação alimentar, alargando-a da esfera familiar para a extrafamiliar. O vínculo de sangue que antes era o principal pilar da obrigação alimentar foi alterando-se, e começou a abranger as relações “quase religiosas” - clericato, monastério, patronato. O vínculo espiritual começara a ser questionado[49].

Analisando-se a história evolutiva do tema alimentos, observa-se que cada sistema jurídico, por meio das suas tradições e costumes e em razão dos princípios adotados pela cultura de cada local, tutelou de forma diversa a obrigação de prestação alimentícia.

No Brasil, antes do Código Civil de 1916, vigiam as Ordenações Filipinas, que à época era o instrumento que mais expressivamente abordava o tema da obrigação alimentar. Naquela época, o direito alienígena aplicado no Brasil colônia possuía lacunas e era precário, diante da aceleração das mudanças nas relações econômico-sociais mundiais então experimentadas.

As Ordenações Filipinas, segundo Yussef Said Cahali[50], traziam alguns dispositivos legais no Liv. 1, Tít. LXXXVIII, 15, que proviam a respeito da proteção orfanológica, Liv. 1, Tít. LXXXVIII, 11 e Liv. 4, Tít. XCIX, 1º que tratam da assistência devida aos filhos ilegítimos.

Acrescenta ademais, que o documento representado pelo Assento de 09.04.1772, proclamou ser dever de cada um alimentar e sustentar a si mesmo, salvo exceções a certos casos de descendentes, transversais, irmãos legítimos e ilegítimos, primos e outros consanguíneos legítimos. Esse assento recebeu força de lei por meio do Alvará de 29.08.1976, que hoje é documento histórico e cultural.

Com a promulgação da Lei 3.071 de primeiro de janeiro de 1916, conhecida como Código Civil de 1916, tentou-se proteger a família e seus demais aspectos, dentre os quais a obrigação da prestação alimentar. Consequentemente, foram surgindo leis extravagantes que visavam a aprimorar a regulamentação sobre o direito a alimentos.

Cronologicamente, pode-se citar a Lei de Proteção à Família (Decreto-Lei 3.200, de 19/04/1941); o Estatuto dos Funcionários Públicos Militares (Decreto-Lei 9.698, de 02/09/1946); as disposições sobre o reconhecimento de filhos ilegítimos (Lei 883, de 21/10/1949), as disposições sobre a tentativa de acordo nas causas que versam sobre desquite litigioso e alimentos (Lei 968, de 10/12/1949), a Lei de Alimentos (Lei 5.478, de 25/07/1968), o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis (Lei 8.112, de 11/12/1990), as disposições sobre a investigação de paternidade de filhos havidos fora do casamento (Lei 8.560, de 29/12/1992), as disposições sobre o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão (Lei 8.971, de 29/12/1994), as disposições que regulam o §3º do artigo 226 da Constituição Federal (Lei 9.278, de 10/05/1996), o Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002) e, mais recentemente, as disposições sobre o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido (Lei 11.804, de 05/11/2008).

Com certeza das diversas legislações acima relacionadas, foram divisores de águas a Lei de Alimentos e o Código Civil, haja vista a abrangência da matéria por eles tratada, regulamentando e aperfeiçoando os direitos e deveres alimentares.

2.3. ESPÉCIES

Os alimentos são divididos em várias espécies e a doutrina classifica-os seguindo  diversos critérios, dentre os quais, quanto à natureza, quanto à causa jurídica, quanto à finalidade e quanto ao momento em que são reclamados.

Quanto à natureza, são divididos em naturais ou civis.

Os naturais ou necessários são aqueles indispensáveis à satisfação das necessidades primárias da vida, ou seja, necessários para a sobrevivência. E os civis ou côngruos são aqueles destinados a manter a condição social, o status da família na sociedade.

Orlando Gomes ensina que a expressão alimentos designa medidas diversas:

Ora significa o que é estritamente necessário à vida de uma pessoa, compreendendo, tão-somente, a alimentação, a cura, o vestuário e a habitação, ora abrange outras necessidades, compreendidas as intelectuais e morais, variando conforme a posição social da pessoa necessitada. Na primeira dimensão, os alimentos limitam-se ao necessarium vitae; na segunda, compreendem necessarium personae[51].

Quanto à causa jurídica, são divididos em legais ou legítimos, voluntários e indenizatórios.

Os legais ou legítimos são aqueles devidos em virtude de uma disposição legal. Em nosso ordenamento jurídico, são, em sua maioria, decorrentes de um vínculo sanguíneo - ex iure sanguinis -, ou em decorrência do matrimônio. São os únicos que permitem o uso da prisão civil àqueles que descumprirem o dever de prestação alimentar[52].

Os voluntários são aqueles emanados de uma vontade inter vivos, por exemplo, os alimentos assumidos contratualmente por quem não tinha obrigação de pagá-los, e de uma vontade causa mortis, decorrentes de testamento.

Em suas considerações sobre os alimentos voluntários Carlos Roberto Gonçalves[53] acrescenta que “os primeiros pertencem ao direito das obrigações e são também chamados de obrigacionais; os que derivam de declaração de vontade causa mortis pertencem ao direito das sucessões e são também chamados de testamentários”.

Os alimentos indenizatórios ou ressarcitórios pertencem ao direito das obrigações, com previsão legal nos artigos 948, inciso II e 950 do Código Civil,  e constituem forma de indenização do dano ex-delito, por resultarem da prática de um ato ilícito. Neste caso, é necessária a fixação dos alimentos a partir de uma sentença condenatória, geralmente estabelendo-os em prestações periódicas.

Quanto à finalidade, os alimentos podem ser classificados como definitivos ou regulares, provisórios e provisionais.

Os alimentos definitivos ou regulares são aqueles prestados em parcelas periódicas, de caráter permanente, estabelecidos pelo juiz na sentença ou mediante acordo entre as partes homologado em juízo, passíveis de revisão a qualquer tempo.

Os alimentos provisórios são aqueles fixados liminarmente no despacho inicial da ação de alimentos, são previstos e regulados pela Lei 5.478/68 - Lei de Alimentos -, mais especificadamente no seu artigo 4.º. É uma modalidade de antecipação dos efeitos da tutela, submetida a requisitos específicos, dentre eles, a necessidade de prova pré-constituída, seja ela prova de parentesco, companheirismo, ou casamento. O artigo 4.º da referida lei tem caráter mandamental, ou seja, uma vez comprovado o vínculo acima referido, o juiz poderá fixar os alimentos, independentemente de pedido da parte, ou seja, poderá fazê-lo de ofício.

Os alimentos provisionais ou ad litem estão previstos no artigo 852 do Código de Processo Civil e são determinados em medida cautelar, preparatória ou incidental, destinam-se à mantença do alimentando durante a tramitação do processo principal. O artigo 807 do Código de Processo Civil dispõe que os alimentos provisionais mantêm eficácia até o julgamento da lide principal, mas podem a qualquer tempo serem revogados ou modificados.

Quanto ao momento em que são reclamados, os alimentos podem ser divididos em pretéritos, atuais e futuros.

Os alimentos serão pretéritos quando o pedido de alimentos retroagir à data anterior a da propositura da ação, já os atuais são aqueles postulados a partir do ajuizamento da ação e os  futuros são aqueles devidos em decorrência de sentença, ou acordo entre as partes homologado em juízo.

Essa classificação é de suma importância na determinação do termo a quo, momento em que os alimentos tornam-se exigíveis. No caso dos alimentos pretéritos referentes ao lapso temporal anterior ao da propositura da ação não serão devidos, pois, entende-se que o alimentando sobreviveu todo o período passado sem o auxílio da prestação alimentar, não restando comprovada a necessidade dos alimentos, mesmo que tenha sobrevivido com sérias dificuldades e miséria.

Os alimentos pretéritos, comenta Carlos Roberto Gonçalves[54], não podem ser confundidos com prestações pretéritas, que são as oriundas da fixação do dever de alimentos em sentença ou em acordo, são, portanto, prestações vencidas e não ainda não cobradas. O recebimento deste crédito deve ser pleiteado por meio da ação de execução por quantia certa, nos moldes do artigo 732 do Código de Processo Civil.

No tocante à possibilidade de prisão civil por dívida alimentar, os Tribunais entendem que só poderão ser executadas pelo rito do artigo 733 do Código Processo Civil os alimentos atuais, entendimento pacificado pelo STJ, na súmula de número 309 “o débito alimentar que autoriza prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo”.

2.4. CARACTERÍSTICAS DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR

São características essenciais da obrigação de prestar alimentos a transmissibilidade, a divisibilidade, a condicionalidade, a reciprocidade e a mutabilidade.

A obrigação alimentar é transmissível. Possui previsão a partir do Código Civil de 2002, haja vista, que o de 1916 dispunha expressamente no artigo 402 “a obrigação de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do devedor”. O antigo Código Civil, contudo, resguardava o direito ao recebimento das prestações em atraso, as quais na herança faziam parte da classe das dívidas, deixando de lado o seu caráter alimentar.

Hodiernamente, o artigo 1.700 do Código Civil consagra a transmissão aos herdeiros da obrigação de prestar alimentos. Assim, o credor dos alimentos poderá exigir dos herdeiros do devedor falecido o cumprimento da obrigação alimentar nos limites da força da herança. Entendimento este reforçado pelo Enunciado de número 343 da IV Jornada de Direito Civil que adiciona à aplicação do artigo 1.792 do Código Civil o seguinte “a transmissibilidade da obrigação alimentar é limitada às forças da herança”.

O dever de prestar alimentos entre parentes consaguíneos encontra forte resistência doutrinária sob a alegação de que, uma vez transmitido tal encargo, ocorreria um desequilíbrio na divisão da herança. Por isso, como forma de minorar o desequilíbrio sustentam que o encargo alimentar deve perdurar até o momento da partilha dos bens e, ainda, deverá ocorrer a devida compensação dos bens recebidos pelo alimentado-herdeiro. A jurisprudência é contrária a esse entendimento. Na maioria dos julgados as parcelas recebidas a título de alimentos não devem ser compensadas do quinhão hereditário do alimentado-herdeiro[55].

A obrigação alimentar é divisível. Se o devedor único do dever alimentar não puder suportar o encargo, os parentes de grau imediato poderão ser chamados para assumir a obrigação, nos termos do artigo 1.698 do Código Civil.

Se existir mais de um devedor, os alimentos serão proporcionais, ou seja, cada devedor suportará o valor segundo suas possibilidades, não podendo ser, portanto, obrigado a quitar a dívida toda. Nesse caso, segundo Lafayette[56] “a dívida alimentária é distribuída não em partes aritmeticamente iguais, mas em quotas proporcionais aos haveres de cada um dos coobrigados, constituindo cada quota uma dívida distinta”.

A obrigação alimentar é condicionada. Essa característica está subordinada a sua condição resolutiva, qual seja, somente perdurará o encargo alimentar enquanto subsistirem os pressupostos objetivos, compostos pelo binômio necessidade-possibilidade. Pode-se dizer que tal entendimento tem como base o teor do artigo 1.694, §1.º combinado com o artigo 1.699, ambos do Código Civil.

A obrigação alimentar é recíproca. Essa característica, por sua vez, tem berço no dever de solidariedade. O artigo 1.696 do Código Civil preceitua que “o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos graus, uns em falta dos outros”. Logo, o direito de exigir alimentos corresponde ao direito de prestá-los, no entanto, esse direito permanece em estado de dormência até que sejam requeridos pelos alimentados em casos de necessidade para provimento da sua mantença.

A obrigação alimentar é mutável. Conforme o sobredito artigo 1.699 do Código Civil, há a possibilidade de revisão, de redução, de majoração ou até de exoneração da obrigação alimentar, conforme a variação dos pressupostos objetivos, condicionantes da prestação. Em virtude desses elementos variáveis e à luz da cláusula rebus sic stantibus, o ordenamento jurídico permite a alteração da prestação por meio da ação revisional de alimentos ou por meio da ação de exoneração.

2.5. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO A ALIMENTOS

O direito a alimentos é personalíssimo, não podendo ser transferido a outrem, por negócio jurídico ou fato jurídico. Os alimentos visam ao auxílio de quem deles necessita para sobreviver e são fixados de acordo com as características do credor e do devedor, por isso são intransferíveis. Como decorrência do seu caráter personalíssimo, os alimentos não podem ser objeto de cessão, nem ser sujeitos à compensação, independentemente da natureza da dívida cobrada.

O direito a alimentos é incessível. A incedibilidade tem por fonte o caráter já mencionado, qual seja, o personalíssimo. Desta feita, uma vez que a prestação é inseparável da pessoa, não pode ser objeto de cessão de crédito, pois tal conduta vai de encontro com a sua natureza – artigo 286 do Código Civil. No tocante às prestações vencidas, por serem consideradas crédito comum, nada impede a sua cessão a outrem.

As prestações alimentares são impenhoráveis. Nenhum credor do alimentado terá direito a fazer incidir penhora sobre o montante das prestações devidas pelo alimentante. Essa regra decorre do fato de o crédito alimentar ter a finalidade de assegurar a subsistência da pessoa alimentada, assim, se houvesse a possibilidade de penhora do crédito alimentar estar-se-ia privando o alimentante daquilo que é estritamente necessário a sua sobrevivência.

As prestações alimentares são incompensáveis, isso porque a sua natureza é a de assistência ao alimentando naquilo que for estritamente necessário a sua mantença. Portanto, se o devedor da pensão alimentícia torna-se credor do alimentando, não há de se falar em compensação, principalmente quando houver diferença entre a causa das dívidas, conforme o entendimento do artigo 373, inciso II do Código Civil.

A jurisprudência, no entanto, permite a compensação em alguns casos, como bem ilustra Washington Monteiro de Barros:

Assim, por exemplo, se o devedor paga a escola do filho, em vez de depositar o valor correspondente na conta bancária da mãe do menor, o alegado crédito pela falta de depósito bancário ficará sujeito à compensação, já que a causa do referido pagamento de escola é a mesma obrigação de alimentos do pai para com sua prole. No entanto, se o pai resolve oferecer um presente ao filho, o que vai além de sua obrigação alimentar, não poderá abater o valor respectivo do depósito bancário a ser realizado na conta da mãe do menor; nesse caso não haverá compensação, em razão da diversidade de causas[57].

O direito a alimentos é imprescritível. Destarte, mesmo se não exercido por um longo período de tempo, ainda que já existentes os pressupostos a sua reclamação, o direito aos alimentos não será passível de prescrição. Ocorre a prescrição, no prazo de dois anos, do direito de cobrar as prestações mensais já fixadas em sentença ou pactuadas em acordos, a partir da data em que vencerem.

Por sua vez, adverte Carlos Roberto Gonçalves[58] que em se “tratando, porém, de execução de alimentos proposta por alimentando absolutamente incapaz, não há falar em prescrição das prestações mensais, em virtude do disposto nos arts. 197, II e 198, I, do Código Civil de 2002”.

O direito a alimentos é intransacionável. A regra aplicada é a constante no artigo 841 do Código Civil “só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação”. Em decorrência de tal característica, o direito a alimentos não pode ser objeto de juízo arbitral ou de compromisso.

A jurisprudência considera como intransacionável o direito de pedir alimentos e transacionável o quantum das prestações, vencidas ou vincendas. Consequentemente, a transação celebrada nos autos de ação de alimentos e a homologação do acordo extrajudicial constituem um título executivo judicial[59].

As prestações alimentares são atuais. Isso quer dizer, conforme já explanado, que os alimentos visam à satisfação das necessidades atuais ou futuras, de modo que as passadas não podem ser objeto de propositura de ação de alimentos. Washington Monteiro de Barros[60] bem explica que os alimentos possuem “finalidade prática, a subsistência da pessoa alimentada. Se esta, bem ou mal, logrou sobreviver sem recorrer ao auxílio do alimentante, não pode pretender, desde que se resolveu a impetrá-lo, se lhe concedam alimentos relativos ao passado, já definitivamente transposto”.

Por fim, o direito a alimentos é irrenunciável. O Código Civil, no artigo 1.707, prescreve que é facultado ao credor exercer seu direito ao recebimento da pensão, assim, conclui-se que a irrenunciabilidade atinge apenas o exercício de direito, não o direito. Nessa trilha, a não postulação em juízo do direito alimentar tem interpretação de mera falta de exercício e não de renúncia ao gozo.

2.6. REQUISITOS

O artigo 1.695 do Código Civil enuncia que “são devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, a própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”, bem assim preceitua em seu artigo 1.694, §1.°, que “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”.

Desses dispositivos legais são extraídos os requisitos objetivos, dentre os quais, a existência de vínculo de parentesco, a necessidade do reclamante, a possibilidade da pessoa obrigada e a proporcionalidade.

A existência de laços familiares constitui o fato principal, do qual a lei faz derivar a obrigação. Nem todas as pessoas ligadas pelos laços familiares estão obrigadas a prestar alimentos. O ordenamento jurídico prevê que os ascendentes, descendentes, irmãos, cônjuges e os colaterais de até segundo grau estão sujeitos a essa obrigação assistencial alimentar.

No tocante à necessidade do reclamante, este poderá reclamá-los se não possuir recursos próprios ou se estiver impossibilitado de obtê-los, por motivos de doença, idade avançada, ou outro motivo relevante. Aferir a causa pela qual o reclamante foi reduzido a esta condição de necessitado é prescindível, uma vez que terá  direito à pensão alimentícia, mesmo se culpado pela situação que o tornou necessitado. Nesses casos, todavia, os alimentos pagos deverão ser apenas aqueles indispensáveis para a sua subsistência. Como já visto, serão devidos os chamados alimentos naturais ou necessários – necessarium vitae.

Orlando Gomes[61] assinala que “o estado de miserabilidade da pessoa que necessita de alimentos é um pressuposto de exigibilidade da obrigação enquanto o vínculo de família apresenta-se como pressuposto de configuração”.

A possibilidade da pessoa obrigada a prestar os alimentos também é requisito imprescindível, pois, não se pode condenar ao pagamento da pensão alimentícia aquele que possui o estritamente necessário para sua própria subsistência. A legislação visa ao não perecimento do alimentado, contudo prevê também que não haja sacrifício impossível de ser suportado por parte do alimentante.

É válido constar que, caso o alimentante fique desempregado, é de entendimento pacífico que o dever de prestar alimentos não se extingue, pois a obrigação alimentar ainda estará baseada em uma sentença homologatória ou condenatória que continua líquida e certa, permanecendo assim até que seja revista por uma ação própria para tal finalidade.

O requisito da proporcionalidade é determinado no artigo 1.694, §1.º, do Código Civil: “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”, do qual se pode retirar o consagrado binômio necessidade e possibilidade.

Lembra-nos Yussef Said Cahali[62] que a regra da proporção é maleável e circunstancial e, geralmente, é resolvida por meio de um juízo de fato ou valorativo, a fim de se chegar a um valor razoável sem excessivo sacrifício da parte alimentante nem perecimento da parte alimentada. Nesse contexto, o juiz deverá “conduzir-se de maneira cautelosa, usando adequadamente as regras de experiência”.

Por sua significação social e assistencial, o quantum da pensão não é imodificável, assim, havendo mudança em uma das esferas da relação alimentar, poderá a prestação ser revista ou até mesmo extinta, a depender do caso concreto.


3. ALIMENTOS GRAVÍDICOS

3.1. CONCEITO

Alimentos gravídicos são prestações necessárias para o custeio das despesas oriundas da gestação, que se estendem da concepção (fixação do óvulo fecundado no útero ) até o parto, momento o qual os alimentos perdem o caráter de gravídicos e são convertido em penão alimentícia.

Várias são as críticas ao uso do termo gravídicos. Maria Berenice Dias[63] assinala “a expressão é feia, mas o seu significado é dos mais salutares”, já José Carlos Teixeira Giorgis também comenta o uso desse termo da seguinte forma:

A palavra não é sonora, ameaça seriedade, circunspecção. O dicionário socorre e revela que gravídico é termo relativo ou próprio da gravidez. Assim se explica o pomposo título da lei recém promulgada: alimentos gravídicos são as prestações necessárias para suportar as despesas da prenhez[64].

A lei 11.804/2008, no entanto, explicita no seu artigo 1.º o propósito de disciplinar “o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido”. Esqueceu-se, contudo, o legislador que os alimentos visam, sobretudo, a assegurar a preservação da vida do nascituro. Os alimentos não são para a mulher gestante tão-somente, pois, se assim fosse, a mulher gestante poderia aplicar o valor percebido no que entendesse ser melhor para si e não para o nascituro.

Maria Berenice Dias[65], no seu artigo “Alimentos para a vida” proclama que “enfim está garantido o direito à vida mesmo antes do nascimento”, salientado-se que os alimentos visam à efetiva proteção da vida, nesse mesmo diapasão é o ensinamento de Caio Mário da Silva Pereira transcrito abaixo:

Se a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção, é de se considerar que o seu principal direito consiste no direito à própria vida e estar seria comprometida se à mãe necessitada fossem recusados os recursos primários à sobrevivência do ente em formação em seu ventre[66].

Assim, deve-se entender como alimentos gravídicos os valores que a mulher gestante recebe em nome do nascituro, a fim de se garantir uma gravidez saudável. A própria lei 11.804/2008, no seu artigo 2.º, elenca, em um rol exemplificativo, o que deve ser abrangido pela pensão alimentícia, enunciando “as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis”.

Podemos ainda definir os alimentos gravídicos usando os conceitos já trazidos ao longo do trabalho, quais sejam, alimentos e nascituro. Ao falar de nascituro foi trazido o conceito clássico de ente já gerado ou concebido, com existência no ventre materno, com vida intrauterina[67], e os alimentos foram conceituados como uma prestação periódica a quem necessite, por não ter meios de prover a própria subsistência.

3.2. POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS

Os doutrinadores, em geral, apresentaram explicação singela acerca do tema, alguns com posicionamento favorável e outros com posicionamento contrário à prestação de alimentos ao nascituro.

Com a promulgação da Lei 11.804/2008 alguns autores reviram seus posicionamentos diante da previsão expressa de alimentos ao nascituro.

Yussef Said Cahali[68], na terceira edição de seu livro entitulado “Dos Alimentos”, não reconhecia o direito a alimentos ao nascituro. Afirmava que “não obstante o espírito de humanidade que se encontra na base desse entendimento, parece-nos que o mesmo não se compadece com os princípios adotados pelo Código Civil, no art. 4º”.

É importante ressaltar que Yussef Said Cahali no supracitado trecho se referia ao Código Civil de 1916. Carlos Roberto Gonçalves, por sua vez, sintetiza com maestria os ensinamentos de Cahali da seguinte forma:

Como a personalidade civil começa do nascimento com vida (CC, art. 2. º ) e, portanto, a eventualidade do exercício de seus direitos apresenta-se condicionada a esse evento, entende Yussef Cahali que o nascituro não pode ser titular atual da pretensão alimentícia. Sustenta o mencionado autor que somente se reconhece ao nascituro “direito a alimentos, no sentido das coisas necessárias à sua manutenção e sobrevivência, de modo indireto, compondo os valores respectivos a pensão deferida à esposa”. Sob esse prisma, o nascituro fruto de relações extramatrimoniais não podeira ser beneficiado quando a mãe não tivesse direito a alimentos[69].

Mesmo com a promulgação da Lei 11.804/2008, Yussef Said Cahali, na sexta edição do livro acima mencionado, continua a entender que o nascituro não é o titular da pretensão aos alimentos, explicação para tal pensamento é a seguinte:

Aqui, às expressas (a lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante), a titular da pretensão é a mulher, com direito próprio para exigir a coparticipação do autor de sua gravidez nas despesas que se lhe fizerem necessárias no transcorrer da gestação, exclusivamente em função do estado gravídico. O nascituro, em inteira consonância com o disposto no art. 2.º do CC/2002, somente terá direito a pensão alimentícia, por conversão dos alimentos gravídicos, quando nascer com vida (art. 6., parágrafo único, da Lei 11.804/2008).

Em outros termos, a Lei 11.804/2008 procura proporcionar à mulher grávida um autêntico auxílio-maternidade, sob a denominação lato sensu de alimentos, representado por uma contribuição proporcional a ser imposta ao suposto pai. Sob forma de participação nas despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive  as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo médico, além de outras que o juiz considere pertinentes[70].

Doutrinadoras como Maria Helena Diniz e Silmara J. A. Chinelato e Almeida defendem desde antes da promulgação da Lei 11.804/2008 a possibilidade da prestação alimentícia em favor do nascituro, até mesmo por serem defensoras da personalidade jurídica concepcionista. Carlos Roberto Gonçalves sustenta serem devidos os alimentos ao nascituro e ainda faz uma reflexão a respeito da teoria da personalidade do nascituro e concluiu da seguinte forma:

A constatação de que a proteção de certos direitos do nascituro encontra, na legislação atual, pronto atendimento, antes do nascimento, leva-nos a admitir a aquisição da personalidade desde a concepção apenas para a titularidade de direitos da personalidade, sem cunho patrimonial, a exemplo do direito à vida ou a uma gestação saudável, uma vez que os direitos patrimoniais estariam sujeitos ao nascimento com vida, ou seja, sob condição suspensiva[71].

Maria Berenice Dias[72], que também tem posicionamento favorável à prestação alimentícia em favor do nascituro, comenta as leis promulgadas em 2008 na área de família, e ao se referir à lei de alimentos gravídicos pondera que “a obrigação alimentar, desde a concepção, estava mais do que implícita no ordenamento jurídico, mas nada como a lei para vencer a injustificável resistência de alguns juízes em deferir direitos não claramente expressos”.

Este posicionamento doutrinário a favor da concessão de alimentos ao nascituro como forma de proteção à vida é defendido há anos por Roberto Thomas Arruda, em sua obra datada do ano de 1982:

O nascituro é sujeito de direito e, entre estes, o de alimentos, primordialmente, no sentido de possibilitar o desenvolvimento do embrião, até que assuma juridicamente sua categoria de pessoa. Materialmente, contudo, embora seja o nascituro o titular ativo da relação obrigacional, os alimentos serão prestados à mãe, para uma sadia e confortável gravidez, ensejando o perfeito desenvolvimento do feto e as despesas de assistência médicas, decorrentes do parto[73].

A doutrina que sustenta a teoria concepcionista, portanto, defende de igual maneira o direito de alimentos ao nascituro. Mesmo que os alimentos em prol do nascituro sejam prestados a sua genitora, sendo esta uma forma de proteção àquele que está para nascer, o que faz com que a letra do artigo 2.º do Código Civil tenha seu ideal atingido, qual seja, por a salvo os direitos do nascituro desde sua concepção.

3.3. EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL

As constantes divergências doutrinárias a respeito da possibilidade ou não dos alimentos ao nascituro produziram reflexos nos tribunais de todo o país. A Lei 11.804/2008 veio tentar unificar as decisões dos tribunais e aquietar as divergências dos doutrinadores da matéria.

Há cerca de uma década, a maioria dos acórdãos negava o direito de alimentos ao nascituro, todavia, decisões que precederam a publicação da Lei 11.804/2008 demonstraram, claramente, a evolução do posicionamento dos tribunais superiores ao conceder alimentos em prol do ser humano em gestação.

De fato, a gravidez acarreta uma série de despesas necessárias para possibilitar um desenvolvimento intrauterino sadio do nascituro. Não é razoável, portanto, à luz do princípio da solidariedade, que apenas um dos genitores tivesse a responsabilidade de arcar com todas esses gastos inerentes à gestação.

No cenário familiar brasileiro não são raros os casos em que o eventual genitor recusa-se a reconhecer a paternidade sem que seja realizado o exame laboratorial de paternidade, para tanto apoia-se no artigo 2.º da Lei 5,478/1968.

Nestes casos, tendo em vista a demora do exame de paternidade, que consiste na coleta do líquido amniótico da placenta da gestante, procedimento de altíssimo custo e que coloca em risco a vida do feto, outros elementos de convicção começaram a ser utilizados pelo Poder Judiciário para aferir a existência do vínculo de paternidade.

Diante disso e por serem os alimentos indispensáveis à sobrevivência, a jurisprudência evoluiu gradativamente e passou a entender que mesmo sem a comprovação da paternidade laboratorial, mas havendo indícios de paternidade - relacionamento sexual entre a mãe e o possível pai, testemunhas, cartas, fotografias, depoimentos pessoal das partes - os alimentos poderiam ser concedidos em caráter provisório.

Sobre o tema, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vinha proferindo decisões, ao longo dos anos, da seguinte forma:

EMENTA: Investigação de paternidade. Alimentos provisórios em favor do nascituro. Possibilidade. Adequação do quantum. 1. Não pairando dúvida acerca do envolvimento sexual entretido pela gestante com o investigado, nem sobre exclusividade desse relacionamento, e havendo necessidade da gestante, justifica-se a concessão de alimentos em favor do nascituro. 2. Sendo o investigado casado e estando também sua esposa grávida, a pensão alimentícia deve ser fixada tendo em vista as necessidades do alimentando, mas dentro da capacidade econômica do alimentante, isto é, focalizando tanto os seus ganhos como também os encargos que possui. Recurso provido em parte[74].

AGRAVO INTERNO. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. Incontroversa a união estável e a paternidade do filho que a alimentanda espera, deve o agravante contribuir para o desenvolvimento do nascituro, mormente considerando que a ex-companheira não pode desempenhar com a mesma intensidade o ofício de cabeleireira, em face da dificuldade de ficar o tempo todo em pé, já que está na metade do sexto mês de gravidez. Possibilidade do alimentante em pagar o valor fixado, de um salário mínimo, demonstrado pelos documentos juntados, que apontam possuir ele patrimônio não condizente com a renda mensal que alega ter, de R$ 700,00[75].

Esse posicionamento, que ao longo dos anos foi sendo solidificado pelos Tribunais, encontra reflexo no artigo 6.º da Lei 11.804/2008, o qual dispõe que uma vez convencido da existência de indícios de paternidade o juiz, poderá fixar alimentos que perdurarão até o nascimento da criança.

Recentemente,  foi dada à Lei 12.004/2009 que versa sobre a presunção de paternidade a seguinte redação no seu salutar artigo 2º-A:

Art. 2º-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos.

Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético - DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.

Assim, preocupa-se essa lei em explicitar quais meios legais serão admitidos com a finalidade de provar a verdade dos fatos, no caso, a paternidade. Reforça, portanto, a Lei 12.004/2009 o entendimento trazido pela Lei de Alimentos Gravídicos, qual seja, quando da impossibilidade do exame de DNA, outros podem ser os meios probatórios de paternidade.

Magna é a importância da aplicação de outros meios probatórios ao se falar em alimentos gravídicos porque, conforme já abordado, o exame de DNA no nascituro pode vir a acarretar graves riscos gestacionais. Por isso, quando sopesados os direitos à vida e à saúde do nascituro com a necessidade de uma prova absoluta de paternidade, os dois primeiros direitos se sobressaem e permitem o emprego de um rol probatório amplo, formado por testemunhas, fotografias, cartas, correspondências eletrônicas, sem a imprescindibilidade do exame de carga genética no nascituro.

Em julgado recente, datado de 16/09/2009, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu haver no caso analisado fortes indícios de paternidade, haja vista o depoimento testemunhal colhido em audiência de justificativa, conforme se observa abaixo:

ALIMENTOS GRAVÍDICOS. Concessão – Necessidade - Oitiva das partes em audiência de justificação confirmando o relacionamento amoroso - Idade gestacional compatível com o início do namoro - Fortes indícios de paternidade - Redução dos alimentos – Descabimento - Observância do binômio necessidade e possibilidade - Incidência do percentual sobre férias, 13° salário, horas extras e verbas rescisórias - Impossibilidade - Rendimentos que possuem caráter indenizatório ou de prêmio ao esforço empreendido pelo trabalhador - Decisão parcialmente reformada - Recurso provido em parte[76].

Destarte, verifica-se que a jurisprudência anterior à promulgação da lei de alimentos gravídicos já vinha caminhando para a sedimentação da possibilidade de alimentos ao nascituro, visando ao desenvolvimento intrauterino saudável. Por derradeiro, tem-se que a nova lei apenas trouxe um parâmetro legal para justificar o entendimento que estava sendo consolidado pelos Tribunais.

3.4. PROJETOS DE LEIS

Antes mesmo da Lei 11.804/2008 ser promulgada, quando ainda era o Projeto de Lei 7.376/2006, de autoria do Deputado Federal Rodolpho Tourinho, foi realizada uma campanha idealizada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que propunha a revisão e veto de alguns artigos do projeto contrários à Constituição da República e aos interesses da gestante e do nascituro.

A vice-presidente do IBDFAM à época Maria Berenice Dias apontou incongruências nos artigos 3.º, 5.º, 8.º, 9.º e 10.º, os quais foram vetados pelo presidente da república, com o acréscimo do artigo 4.º do referido projeto.

Nesta feita, o projeto inicial, que continha 12 artigos, foi aprovado e promulgado com apenas a metade dos dispositivos originais. Foram vetados os artigos que dispunham do deslocamento da gestante (competência judicial no domicílio do suposto pai), especificação de provas (petição inicial necessariamente instruída com o laudo médico atestando gravidez e viabilidade), necessidade de audiência de justificação, exame de DNA (realização de exame pertinente), alimentos pagos a partir da citação do suposto pai e responsabilização, por meio de indenização, se a paternidade for negativa.

Determinantes e acertados foram os vetos presidenciais, haja vista que se esses artigos não tivessem sido suprimidos, a lei acabaria por prejudicar aqueles a quem se pretendia proteger. A grande pergunta que paira é se havia mesmo a necessidade da promulgação de uma lei assegurando a obrigação alimentar em favor do nascituro, já que os Tribunais já caminhavam para a concessão dessa prestação alimentícia?

A Constituição da República é jovem. Conforme vai amadurecendo e criando raízes, aumenta o seu lastro. O Estado, consequentemente, fortalece-se na mesma medida, proporcionando segurança nas diversas áreas de atuação, dentre as quais, a jurídica. Para esse fortalecimento estatal é imprescindível o crescimento simultâneo dos três poderes da União -  Legislativo, Executivo e Judiciário.

Como outrora já abordado, no ordenamento jurídico brasileiro várias são as leis que permitem e respaldam a segurança dos direitos do nascituro, em especial de alimentos. A própria Constituição da República, em seu artigo 1.º, inciso III, assegura a dignidade da pessoa humana, impedindo, nesta oportunidade, a violação à integridade física e à saúde de todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país, incluindo o nascituro mesmo ainda em formação.

Além disso, em seu artigo 227, a Carta Magna reitera o dever da família, da sociedade e do Estado de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, dentre outros. No âmbito constitucional, o legislador não limitou a idade mínima para se considerar uma pessoa como criança, podendo-se, então, concluir a possibilidade da inclusão do nascituro.

Não bastasse toda a proteção constitucional aos bens da vida, o Código Civil protege no seu artigo 2.º, os direitos do nascituro desde a sua concepção, e dentre os direitos mais manifestos está o direito a alimentos, por meio do qual se efetiva uma garantia de vida e desenvolvimento intrauterino saudável.

No Brasil, as fontes do Direito são divididas em estatais (legislação, tratados internacionais e jurisprudência) e não-estatais (costume jurídico e doutrina). Nota-se, portanto, que são cinco espécies de dois gêneros, no entanto, há um desprestígio das que não são normas jurídicas emanadas pelo Estado.

Por tais razões, mesmo a jurisprudência inclinando-se à prestação alimentícia em favor do nascituro, com decisões reiteradas nesse sentido, veio o legislador positivar esse direito. Fato esse que demonstra o quando o quão positivista é o Estado.

Aliás, está em trâmite desde 2007 o Projeto de Lei 478, de autoria de Luís Bassuma e Miguel Martini, que dispõe sobre o chamado Estatuto do Nascituro, no qual estão apensados o Projeto de Lei 489/2007, o Projeto de Lei 1.763/2007 e o Projeto de Lei 3748/2009. O projeto visa a privilegiar o nascituro, concedendo-lhe direitos de um cidadão, equiparando o nascituro à criança.

Miguel Martini, em entrevista sobre o estatuto, fala acerca da necessidade de criação do Estatuto do Nascituro:

Nós precisamos dar ao nascituro os mesmos direitos e garantias que um cidadão brasileiro tem. Para nós a cláusula pétrea do artigo 5º da Constituição que fala do direito à vida não permitiria que houvesse discussão em relação ao aborto, mas está tramitando um projeto abortista na Câmara. O Estatuto não fala somente contra o aborto, mas fala além do que o artigo 5º prevê: que a pessoa que está no ventre materno é um cidadão, uma cidadã. Ele reforça, especifica e detalha ainda mais o direito à vida garantido na Constituição[77].

3.5. DA NATUREZA JURÍDICA DOS ALIMENTOS AO NASCITURO.

 É imprescindível para a correta compreensão dos institutos jurídicos o conhecimento da sua natureza jurídica. De Palácio e Silva[78] define natureza como sendo “a essência, a substância ou a compleição das coisas”, por meio do qual se revelam os requisitos e atributos essenciais que devem vir com a própria coisa.

A natureza jurídica dos alimentos está ligada à origem, ao dever dos pais em sustentar os filhos derivado do poder familiar. Ao aplicar por analogia estas considerações ao nascituro, tem-se que ele é considerado o filho que está para nascer, tornando os pais responsáveis civilmente pelo seu sustento que durante o período gestacional é definido principalmente pelo desenvolvimento saudável intrauterino.

Vale ressaltar, que mesmo no que diz respeito aos alimentos em geral, a doutrina é divergente, conforme já abordado no capitulo antecedente. As correntes doutrinárias aludidas anteriormente, são três, quais sejam, uma corrente é defensora da natureza jurídica de direito pessoal extrapatrimonial, uma segunda, de direito patrimonial e uma terceira de conteúdo patrimonial com finalidade pessoal.

Um outro posicionamento que chama atenção é o do advogado de família Douglas Phillipis Freitas[79], o qual defende que a natureza jurídica dos alimentos gravídicos é sui generis, composto por elementos de pensão alimentícia e de responsabilidade civil.

E vai mais adiante, ao discorrer sobre o início do dever de prestar os alimentos ao nascituro, sustenta que os alimentos ao nascituro possuem como termo inicial a concepção, momento anterior até mesmo ao ajuizamento ação. Para o referido autor, os alimentos gravídicos uma vez concedidos devem ser prestados de forma retroativa, por exemplo, se forem concedidos na 22.ª semana de gestação o alimentante deverá ser condenado a prestar os alimentos desde a 1.ª semana gestacional.

Por manter posicionamentos fortes e contrários aos da maioria doutrinária, resguarda-se da seguinte forma:

É claro que tal posicionamento será contraposto pelos processualistas, porém, no escopo da nova norma que apregoa integral proteção à mãe e ao menor estas regras devem ser relativizadas, pois, por analogia (e por híbrida origem alimentícia e indenizatória), pode-se aplicar, por exemplo, a regra do posicionamento ou mesmo da indenização da responsabilidade civil onde o marco inicial é a do sinistro, ou seja, do fato gerador da responsabilidade civil[80].

Em um sentido mais tradicional, preleciona Carlos Roberto Gonçalves[81] que prepondera o entendimento de que os alimentos, em geral, têm natureza mista, composta de conteúdo patrimonial e finalidade pessoal.

Em verdade, parece mais razoável dentre as correntes doutrinárias existentes, a  natureza mista, pois, se analisada criticamente, o conteúdo patrimonial o objetivo precípuo dos alimentos ao nascituro é assegurar a sua vida, consequentemente o seu desenvolvimento saudável dentro do útero materno, motivo pelo qual as prestações periódicas de alimentos devem ser consideradas de caráter patrimonial, haja vista que protegem um mínimo necessário patrimonial para o alcance da finalidade a que se destina.

No tocante à finalidade pessoal, esta caracteriza-se por serem os alimentos gravídicos, mesmo com posicionamentos doutrinários contrários, devidos ao nascituro e não a mãe gestante. O valor percebido como alimentos gravídicos deve ser destinado em sua integralidade ao bem estar do nascituro.

3.6. ASPECTOS PROCESSUAIS DA LEI 11.804/2008.

3.6.1. Capacidade e Legitimidade

É direito constitucional garantido a todos a provocação da atividade jurisdicional. Na legislação processual civil, toda pessoa maior e capaz possui capacidade ad causam, no entanto, os incapazes têm a necessidade de representação e assistência para integrar suas capacidades.

A capacidade de agir e a capacidade processual são pressupostos processuais, a primeira, é a capacidade de ser parte, assumir direitos e obrigações na ordem civil, e a segunda, é a capacidade de estar em juízo, defendendo os direitos e obrigações[82].

Fredie Didier Junior ao falar na capacidade de ser parte (capacidade de agir) leciona que:

Dela são dotados todos aqueles que tenham personalidade material-ou seja, aqueles que podem ser sujeitos de uma relação jurídica material, como as pessoas naturais e as jurídicas- como também o nascituro, o condomínio, o nodum conceptus, a sociedade de fato [...][83].

No concernente à capacidade processual o mesmo doutrinador assim escreve:

A capacidade processual é a aptidão para praticar atos da processuais independentemente de assistência e representação (pais, tutor, curador, etc.), pessoalmente, ou por pessoas indicadas pela lei, tais como o síndico, administrador de condomínio, inventariante etc[84].

Dessa forma, diante dos ensinamentos supracitados, o nascituro possui capacidade de ser agir e capacidade de processual. Com a observação que para a última, o nascituro deve estar devidamente representado, uma vez que pode ser comparado ao menor impúbere (aquele que possui idade inferior a 16 anos), o qual para figurar no polo ativo de uma ação deve ser representado por aquele que lhe é responsável ou por um curador nomeado.

A legitimidade, por sua vez, é uma das  condições da ação, ao lado do interesse processual e da possibilidade jurídica do pedido. Como regra geral, pode-se dizer que parte legítima ativa é aquela que afirma ser titular de um determinado direito, e para resguardar tal direito necessita do amparo jurisdicional, já a parte legítima passiva é aquele a quem caiba ao cumprimento e observância do de dever relacionado ao direito da do legitimado ativo. Seguindo tal entendimento, assim se pronuncia Luiz Rodrigues Wambier:

Autor e réu devem ser partes legítimas. Isso quer dizer que, quanto ao primeiro, deve haver ligação entre ele e o objeto do direito afirmado em juízo. O autor, para que detenha legitimidade, em princípio deve ser o titular da situação jurídica afirmada (art. 6º do CPC). Quanto ao réu, é preciso que exista relação de rejeição diante da pretensão do autor[85].

Aplicando este linear aos alimentos devidos ao nascituro e ao encontro do posicionamento doutrinário majoritário, tem-se que a ação de alimentos gravídicos tem por objetivo a condenação do eventual genitor do nascituro em pagar alimentos, os quais assegurarão à vida daquele que está por vir.

Assim, pode-se afirmar que o nascituro, por meio da ação de alimentos gravídicos,  demanda sobre o que lhe é de direito. O direito à vida é resguardado sobretudo pelas prestações alimentares. É obvio, que não é o nascituro que irá gerenciar a quantia recebida como obrigação alimentícia, será sua representante. Fato este que não descaracteriza a destinação dos alimentos gravídicos, qual seja, o nascituro.

Posicionamento minoritário é o de Yussef Said Cahali[86], o qual ao defender que os alimentos gravídicos possuem caráter  de auxílio-maternidade, entende que a parte legítima para propor a ação seria a própria gestante, e expõe:

Até o parto, a gestante reclama o auxílio-maternidade do futuro pai, agindo em nome próprio, em função do sue estado gravídico. Somente depois de dar a luz ao filho, passa a mesma a agir como representante do menor na execução ou revisão da pensão alimentícia que passa a ser devida a este.

Os Tribunais já se manifestaram em suas jurisprudências quanto à legitimidade do nascituro em ser parte legítima para propor as mais diversas ações, conforme pode-se observar dos acórdãos colacionados:

Investigação de paternidade – Ação proposta em nome de nascituro pela mãe gestante – Legitimidade ‘ad causam’ – Extinção do processo afastada. Representando o nascituro pode a mãe propor a ação investigatória, e o nascimento com vida investe o infante na titularidade da pretensão de direito material, até então apenas uma expectativa de direito[87].

MENOR – Ação proposta por nascituro buscando o atendimento pré-natal à sua genitora, que se encontra presa – Decisão do juiz a quo que determinou a emenda da inicial por entender que o nascituro, por não possuir personalidade jurídica, não tem legitimidade ativa ad causam – Não conhecimento do agravo no tocante ao pleito que visa a concessão da antecipação da tutela ainda não apreciada em primeira instância – Nascituro que pode ser parte, desde que representado pelos genitores ou por quem determina a lei civil – Provimento do agravo apenas para reconhecer a possibilidade do nascituro vir a juízo, sem adentrar no mérito de sua legitimidade para a causa presente e, tampouco, a competência da Justiça da Infância e da Juventude – Necessidade de anulação do despacho que determinou a emenda da inicial – Agravo conhecido em parte e, na parte conhecida, provido, nos termos do acórdão[88].

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça[89] veiculou uma notícia com o seguinte título “mãe ganha direito de pedir em nome próprio alimentos em favor de filhos”. Em um primeiro momento, causa estranheza tal título, no entanto, ao ler e refletir a respeito do escrito, tem-se a afirmação de que o nascituro e os filhos são parte legítima para propor ação de alimentos, entretanto, se a ação de alimentos for ajuizada em nome daquele que deveria ser o representante processual, o processo não será anulado por ilegitimidade da parte ativa.

Não aleatoriamente, o Tribunal vem assim se posicionando. A má-técnica processual não pode ser motivo de anulação de uma ação que visa ao sustento da família de forma digna, ou, se aplicado aos alimentos gravídicos, ao desenvolvimento intrauterino saudável do nascituro. Por isso, na notícia transmitida pelo Superior Tribunal de Justiça, a Terceira Turma entende que:

É realmente dos filhos a legitimidade ativa para propor ação de alimentos, devendo os pais representá-los ou assisti-los conforme a idade. Contudo, a formulação do pedido em nome da mãe não anula o processo, apesar da má-técnica processual, pois está claro que o valor se destina à manutenção da família. “O pedido está claramente formulado em favor dos filhos”, assinalou a relatora do processo, ministra Nancy Andrighi. “E esse entendimento traz como suporte o interesse público familiar que está na obrigação de prestar alimentos”[90].

Pelo acima exposto, pode-se concluir que o nascituro tem capacidade de agir e capacidade processual, e ainda legitimidade ativa para propor a ação de alimentos gravídicos, se devidamente representado processualmente. Se, no entanto, por má-técnica processual a ação for ajuizada figurando o polo ativo a genitora, esta não deverá ser declarada nula, se for caracterizado que o pedido formulado é dirigido em favor do nascituro.

Para dar prosseguimento ao início da ação de alimentos é necessário que se saiba quem é o genitor do alimentante, ou consoante o entendimento do artigo 6.º exista ao menos indícios de paternidade, para que seja fixada a prestação alimentar.

Antes da Lei 11.804/2008 a ação de alimentos em favor do nascituro era um emaranhado de disposições que por analogia ou extensão aplicavam-se ao caso concreto. A legitimidade passiva era definida quando não se conhecia o pai por meio de uma ação de investigação de paternidade cumulada com ação de alimentos. Havia-se, portanto, uma combinação dessas duas demandas, que seguiam o procedimento comum ordinário.

Ocorre, no entanto, que com a nova lei, no seu artigo 6.º, diversas vezes já mencionado no decorrer do trabalho, o polo passivo pode ser definido por meio de indícios de paternidade, ou seja, não se tem certeza absoluta de quem é o genitor, apenas uma presunção de paternidade. O juiz, por conseguinte, ao definir que existem indícios de paternidade, está ratificando o eventual genitor como legitimado no polo passivo.

3.6.2. Do quantum dos alimentos em favor do nascituro

Os alimentos gravídicos devem seguir a fixação do quantum das prestações alimentícias gerais, ou seja, deve ser obedecido o binômio possibilidade e necessidade. A Lei 11.804/2008 traz um rol exemplificativo das despesas mínimas que devem ser abarcadas pela proteção da obrigação alimentar no seu artigo 2.º que dispõe:

Art. 2º: Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes. 

A partir de uma leitura com esmero, percebe-se a intenção de enfatizar o fato de que a gravidez pode vir a acarretar gastos adicionais, que não devem ser arcados unicamente pela gestante. A lei deixou ao encargo do médico definir o que há de ser considerado necessário para a mantença de uma gestação saudável, já deixando exemplificado algumas formas de despesas excepcionais, quais sejam, alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis.

Não se pode olvidar, contudo, que o magistrado pode acrescer as necessidades que o médico não julgou relevantes, ponderando-as e fixando um valor satisfatório, consideradas, por óbvio, a cota-parte do genitor e a cota-parte da genitora.

Com efeito, adverte Carlos Roberto Gonçalves[91] que o juiz fixa os alimentos de acordo com seu convencimento, não estando adstrito ao quantum fixado na petição inicial. Em conformidade com esse raciocínio, não há falar em julgamento ultra petita quando a fixação dos alimentos, pela sentença, for além dos limites de quantia pedidos na peça exordial.

O autor Douglas Phillips Freitas, ao discorrer sobre a fixação do quantum como um todo, é comedido e aduz:

Embora os critérios norteadores para a fixação do quantum sejam diferentes dos alimentos previstos no art. 1.694 e seguintes do Código Civil de 2002, quando determinados, o raciocínio é o mesmo, ou seja, é levado em consideração todas as despesas relativas à gravidez (necessidade) e o poder de contribuição do pai e da mãe (disponibilidade), resultando na fixação proporcional dos rendimentos de ambos, já que a contribuição não é somente de um ou de outro[92].

E, chega ao extremo ao dizer-se temerário com a destinação dada à pensão alimentícia  pois, segundo ele, os exames de pré-natal, internação e parto da gestante, em princípio, são custeados pelo Sistema Único de Saúde[93].

Esquece o supracitado autor que o direito constitucional à saúde (artigo 196 da Constituição da República) tem aplicação precária no cenário brasileiro. O atendimento e os exames realizados em ambulatórios e postos de saúdes são agendados para datas longínquas, o que não tornam raros os casos em que a gestante entra em trabalho de parto sem ao menos ter feito um exame de pré-natal. A  falta de uma equipe de profissionais da saúde para a realização do parto, ou mesmo a falta de leito para o momento posterior ao parto são deficiências da área da saúde que saltam aos olhos da população.

Falar em amparo gestacional pelo Sistema Único de Saúde é vendar os olhos à realidade social vivida no país, na qual a previsão de direitos fundamentais como vida e saúde não constitui certeza de efetiva existência. Assim, a lei de alimentos gravídicos vem socorrer as gestantes que não possuem por si só meios de garantir uma gravidez saudável, sem solicitar o auxílio financeiro do eventual genitor.

3.6.3. Da conversão, revisão e extinção dos alimentos ao nascituro

O parágrafo único do artigo 6.º da Lei 11.804/09 dispõe que “após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão”.

Pela análise de tal dispositivo tem-se que a conversão dos alimentos gravídicos em pensão alimentícia dá-se pela única exigência de nascimento com vida. Essa conversão é automática, sendo, pois, os alimentos pagos sem interrupção quando da ocorrência do nascimento do feto, procedimento esse que assegura ao recém-nascido a mesma proteção alimentar conferida ao nascituro.

Vale ressaltar que quando os alimentos são fixados em favor do nascituro, o juiz fundamenta-os nos indícios de paternidade, o que não acarreta o reconhecimento do filho. O reconhecimento dar-se-á apenas no momento do nascimento do feto, quando o eventual genitor poderá contestar a ação de alimentos com fulcro na negativa de paternidade do recém-nascido que deverá ser provada por exame laboratorial. Sobre o tema Maria Berenice Dias defende que:

A transformação dos alimentos em favor do filho ocorre independentemente do reconhecimento de paternidade. Caso o genitor não conteste a ação e não proceda ao registro do filho, a procedência da ação deve ensejar a expedição do mandado de registro, sendo dispensável a instauração do procedimento de averiguação de paternidade para o estabelecimento do vínculo parental[94].

Caso não fosse assim, o recém-nascido teria de entrar novamente com uma ação de paternidade cumulada com alimentos, a qual possuiria uma fase probatória extensa a fim de impedir resquícios de dúvida a respeito da paternidade.

O mesmo parágrafo do artigo 6.º da lei de alimentos gravídicos prevê a possibilidade de revisão dos alimentos devidos. O termo revisão, segundo De Palácio e Silva[95], é o “exame ou o estudo de alguma coisa para expurgar dela o que não estiver de acordo ou em harmonia com o Direito ou a verdade”.

A revisão pode ser requerida por qualquer das partes se houver a modificação dos requisitos norteadores da concessão e fixação dos alimentos. A genitora como representante do nascituro e o suposto pai podem pedir a revisão dos valores pagos como pensão, almejando tanto a sua majoração como redução, com fulcro no artigo 1.699 do Código Civil.

A sentença proferida na ação de alimentos não faz coisa julgada material, motivo pelo qual a qualquer momento pode ser revista. Assim, os alimentos podem ser revistos a maior ou a menor do quantum anteriormente fixado. Essa imaterialidade da coisa julgada nas ações de alimentos deve ser aplicada também aos alimentos gravídicos, pois ambas visam à garantia de um valor mínimo para a sobrevivência do nascituro ou do recém-nascido.

A revisão do quantum dos alimentos, no entanto, diferente da conversão que é automática, deve ser requerida em juízo. Para tanto, devem ser trazidos aos autos meios que comprovem a modificação da capacidade econômica do alimentante ou da necessidade do alimentado.

Quando o feto nasce, as despesas antes abrangidas pela pensão alimentícia se modificam, o que gera, novamente, a possibilidade da revisão do quantum dos alimentos. Nesse caso, entretanto, os alimentos gravídicos já terão sido convertidos em pensão alimentícia; assim, não se haverá de falar em revisão dos alimentos gravídicos e sim revisão dos alimentos.

Para melhor compreensão do momento da extinção da obrigação dos alimentos ao nascituro é necessário relembrar o momento de concessão dos alimentos gravídicos. O dever de prestar alimentos tem gênese no início da gestação e perdura até o seu fim. Por consequência, extingue-se a obrigação prestacional de alimentos quando há a interrupção da gravidez, como, por exemplo, no caso do aborto espontâneo.

Outra forma de extinção da obrigação alimentar em favor do nascituro é por meio da ação negativa de paternidade ajuizada após o nascimento do feto e julgada procedente. Caso seja comprovada que a paternidade não é do obrigado da pensão gravídica, será extinta a obrigação da pensão alimentícia.

3.7. RESPONSABILIDADE CIVIL DA PARTE AUTORA DA AÇÃO DE ALIMETNOS GRAVÍDICOS

3.7.1. Responsabilidade Objetiva e Responsabilidade Subjetiva

O artigo 10 do Projeto de Lei 7.376/2006 tinha a seguinte redação “em caso de resultado negativo do exame pericial de paternidade, o autor responderá, objetivamente, pelos danos materiais e morais causados ao réu”.

Com acerto, houve o veto presidencial desse artigo. O dispositivo legal vetado impunha à mulher que equivocadamente apontasse um homem como pai do seu filho o dever de indenizar, independentemente da existência de culpa. Com efeito, atribuir responsabilidade objetiva à autora de demandas que versam sobre alimentos gravídicos constituiria óbice ao direito fundamental de livre exercício da ação.

Para melhor compreensão das razões do veto presidencial ao artigo acima referido, é importante diferenciar a responsabilidade objetiva da subjetiva. Para tanto, valiosos são os ensinamentos de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, abaixo transcritos:

Hipóteses há em que não é necessário sequer ser caracterizada a culpa. Nesses casos, estaremos diante do que se convencionou chamar de “responsabilidade civil objetiva”. Segundo tal espécie de responsabilidade, o dolo ou a culpa na conduta do agente causador do dano é irrelevante juridicamente, haja vista que somente será necessária a existência do elo causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável para que surja o dever de indenizar. As teorias objetivistas da responsabilidade civil procuram encará-la como mera questão de reparação de danos, fundada no risco da atividade exercida pelo agente[96].

Tem-se, portanto, que a responsabilidade objetiva funda-se no risco da atividade exercida pelo agente. No que diz respeito à ação de alimentos gravídicos, a genitora não pode ser condenada a reparar objetivamente o dano causado àquele que foi apontado como pai. Isto porque, a legitimidade da parte passiva na obrigação alimentar foi apreciada por um juízo de valor realizado pelo magistrado. O alimentante foi assim obrigado (pagar alimentos), haja vista um rol probatório que indicava fortes indícios de paternidade.

Para não haver a criação de uma norma jurídica injusta, portanto, defende-se a aplicação da regra geral da responsabilidade subjetiva, norteada pelo artigo 186 do Código Civil, o qual prevê que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

No artigo acima referido, a culpa é apresentada em seu sentido amplo, abrangendo tanto o dolo quanto a culpa. A professora Maria Helena Diniz, explica esses conceitos da seguinte forma:

A culpa em sentido amplo, como a violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever. Portanto, não se reclama que o ato danoso tenha sido, realmente, querido pelo agente, pois ele não deixará de ser responsável pelo fato de não ter-se apercebido do seu ato nem medido as suas consequências[97].

Já, o ato ilícito é definido como aquele ato contrário ao Direito, e tem como elementos a culpabilidade, o dano e o nexo causal. O artigo 927 do Código Civil dispõe como consequência jurídica do ato ilícito a obrigação de reparação do dano causado a outrem.

Sob esse aspecto, só haverá a possibilidade de indenização se o ato ilícito causar dano. Sílvio de Salvo Venosa[98] leciona que “sem dano ou sem interesse violado, patrimonial ou moral, não se corporifica a indenização. A materialização do dano ocorre com a definição do efetivo prejuízo suportado pela vítima”.

Assim, para a aplicação da responsabilidade civil subjetiva nos casos em que a representante do nascituro pleiteou alimentos gravídicos em face de quem não era o genitor, a demonstração de prejuízo da parte que foi condenada ao pagamento da pensão alimentícia é dispensável, nos termos do artigo 334 do Código de Processo Civil. O fato, portanto, que merece prova inequívoca, nas ações de responsabilidade, é a paternidade, se provado que o alimentante gravídico não era o genitor o prejuízo já terá sido configurado.

Em vista disso, a análise do dolo e da culpa (sentido estrito) é imprescindível para a caracterização do dever de indenizar da parte alimentada. A conduta dolosa, conforme os ensinamentos expostos anteriormente, é aquela em que o agente pratica atos com objetivo ou assumindo o risco de causar prejuízos a outrem. É o caso, por exemplo, de uma gestante saber quem é o pai, mas ajuizar a ação de alimentos gravídicos em desfavor de outra pessoa, por este possuir melhores condições financeiras.

Por outro norte, a conduta culposa (sentido estrito) possui como elementos a conduta voluntária com resultado involuntário, previsão ou previsibilidade e a falta de cuidado, cautela, diligência ou atenção. Dentre os elementos apontados, merece especial destaque o elemento constituído pela falta de cautela, o qual é exteriorizado por meio da imprudência, da negligência e da imperícia.

Por óbvio, a forma de exteriorização da conduta culposa nos processos de prestação alimentícia gravídica, é a imprudência. A imprudência é conceituada por Sergio Cavalieri Filho[99] como sendo a “falta de cautela ou cuidado por conduta comissiva, positiva, por ação”. Desse modo, a falta de cautela da parte autora na ação de alimentos gravídicos ocorre, por exemplo, quando a gestante alega ser o pai do filho que carrega, o seu namorado, mas manteve relações sexuais com outro.

3.7.2. Dos Danos Indenizáveis

Como defendido no tópico anterior, o meio de reparação do prejuízo causado pela demanda contra parte ilegítima, portanto, deve-se dar pela ação de indenização embasada na responsabilidade subjetiva da parte autora.

A esse respeito, ensina Fátima Maria Costa Soares de Lima:

Se a autora agir com dolo ou culpa por promover ação indevida, imputando a um homem as obrigações de pai no caso de ele não ser o pai, esta responderá pela indenização cabível, conforme prevê permanece a aplicação da regra geral da responsabilidade subjetiva constante do art. 186 do Código Civil, cabendo àquele que for demandado o livre exercício do direito de ação a teor do disposto no art. 186 do Código Civil, com a finalidade da reparação de danos morais e materiais[100].

A reparação do dano causado pelo ajuizamento de ação de alimentos contra pessoa que não é o genitor do nascituro visa a recompor materialmente algo que foi perdido ou sofrido, podendo ser pleiteada na forma de indenização, tanto material quanto ou moral.

A indenização material decorre do dano patrimonial que atingiu os bens integrantes do patrimônio da vítima. Este dano é subdividido em lucro cessante e dano emergente. O lucro cessante pode ser conceituado como a perda de um ganho esperável ou frustração da expectativa de um lucro, já o dano emergente, também chamado de dano positivo, é a efetiva diminuição do patrimônio da vítima. A mensuração do dano emergente é por vezes menos dificultosa do que a mensuração do lucro cessante.

Na reparação do dano causado pela prestação dos alimentos gravídicos por quem na realidade não tinha este dever, a princípio, parece prosperar apenas o emprego do dano emergente, o qual deverá ser considerado da seguinte forma, os valores prestados na forma de pensão alimentícia ao nascituro deverão ser calculados, atualizados e ressarcidos.

Muito embora, vigore no ordenamento jurídico o princípio de irrepetibilidade dos alimentos prestados, uma vez caracterizada a má-fé ou a culpa (sentido amplo) da parte autora da ação de alimentos gravídicos, defende-se a possibilidade da devolução dos alimentos. Tem-se, portanto, que os princípios da boa-fé e do vedação de enriquecimento ilícito devem sobrepujar o princípio da irrepetibilidade alimentar.

Resta, nesta oportunidade, examinar a restituição dos alimentos nos casos em que a culpa (sentido amplo) da parte autora da ação alimentar gravídica não é comprovada. Para tanto, salutares são os ensinamentos do professor Arnoldo Wald, a seguir transcritos:

[…] admite a restituição dos alimentos quando quem os prestou não os devia, mas somente quando fizer prova de que cabia a terceiro a obrigação alimentar, pois o alimentando utilizando-se dos alimentos não teve nenhum enriquecimento ilícito. A norma adotada pelo nosso direito é destarte a seguinte: quem forneceu os alimentos pensando erradamente que os devia, pode exigir a restituição do valor dos mesmos do terceiro que devia fornecê-los[101].

Note-se que o autor acima referido defende que os casos nos quais não há evidente enriquecimento ilícito, ou má-fé da parte alimentada, a ação de restituição de alimentos deve ser ajuizada em face do terceiro que desde o início deveria ter sido condenado a prestá-los. Esse entendimento, merece prosperar, pois assegura a proteção da gestante e do nascituro que agiram de boa-fé e ainda o ressarcimento dos valores prestados pelo alimentante não genitor.

Outro ponto que merece destaque é o dano moral. Por ser motivo de discussão doutrinária e acadêmica, as únicas certezas trazidas são as de que o dano moral é indenizável e pode ser cumulado com o dano material. Definir um conceito de dano moral, ou até mesmo prová-lo, entretanto, é matéria árdua. O professor Sergio Cavalieri Filho refere-se ao dano moral da seguinte forma:

O que configura e o que não configura o dano moral? Na falta de critérios objetivos, essa questão vem-se tornando tormentosa na doutrina e jurisprudência, levando o julgador a situação de perplexidade. Ultrapassadas as fases da irreparabilidade do dano moral e da sua inacumulabilidade com o dano material, corremos o risco de ingressar na fase da sua industrialização, onde o aborrecimento banal ou a mera sensibilidade são apresentados como dano moral, em busca de indenizações milionárias[102].

E acrescenta ademais que:

[…] só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio do seu bem estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos.

Dor, vexame, sofrimento e humilhação são consequências e não causa. Assim como a febre a efeito de uma agressão orgânica, dor, vexame e sofrimento só poderão ser considerados dano moral quando tiverem por causa uma agressão à dignidade de alguém[103].

Nessa linha, o dano moral por ter mensuração subjetiva, para ser indenizável deve  demonstrar que fato ocorrido não gerou apenas um mero dissabor, mas lesionou a esfera personalíssima da pessoa - seus direitos de personalidade, como por exemplo, intimidade, vida privada, honra e imagem[104]. É o caso por exemplo, do alimentante - não genitor que tem sua família destruída, por ter sido condenado a prestar alimentos ao nascituro - filho de outrem.

Frise-se que o assunto ainda é pouco sólido. A jurisprudência ainda não se manifestou a respeito. O pouco tempo de promulgação da Lei 11.804/2008 é um dos fatores para esse silêncio dos Tribunais. A doutrina também é escassa, pouco se escreveu a respeito dos alimentos gravídicos e ainda menos sobre a responsabilidade civil daquele que ajuizou ação de prestação alimentícia. Resta, assim, aguardar a evolução doutrinária e o preenchimento jurisprudencial que são pilastras para a aplicação da lei ao caso concreto.

3.8. APLICAÇÃO DA LEI NOS JUÍZOS

A Lei 11.804/2008, conforme mencionado anteriormente, foi promulgada na data de 05/11/2008. Para que essa lei seja aplicada nos Tribunais de Justiça em tão curto espaço de tempo, os processos em sua maioria já deviam estar em tramitação, ou em grau de recurso.

Os processos de alimentos em favor do nascituro possuem como tempo máximo de seu objeto - nove meses, período coincidente ao tempo de gravidez, haja vista que após o nascimento do feto não há que se falar em ação de alimentos gravídicos e sim em ação de alimentos.

Diante disso, são poucos os Tribunais de Justiça que aplicaram a lei de alimentos gravídicos e disponibilizaram os respectivos acórdãos. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, vanguardista nas decisões de alimentos ao nascituro, prolatou decisões nas quais os alimentos gravídicos foram julgados a partir da prova de indícios de paternidade, conforme se pode observar:

EMENTA: ALIMENTOS GRAVÍDICOS. LEI Nº 11.804/08. DIREITO DO NASCITURO. PROVA. POSSIBILIDADE. 1. Havendo indícios da paternidade apontada, é cabível a fixação de alimentos em favor do nascituro, destinados à gestante, até que seja possível a realização do exame de DNA. 2. Os alimentos devem ser fixados de forma a contribuir para a mantença da gestante, mas dentro das possibilidades do alimentante e sem sobrecarregá-lo em demasia. Recurso parcialmente provido[105].

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. LEI Nº 11.804/08. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DA PATERNIDADE. O deferimento de alimentos gravídicos à gestante pressupõe a demonstração de fundados indícios da paternidade atribuída ao demandado, não bastando a mera imputação da paternidade (Lei 11.848/08). Ônus da mulher diante da impossibilidade de se exigir prova negativa por parte do indigitado pai. Ausente comprovação mínima das alegações iniciais, resta inviabilizada, na fase, a concessão dos alimentos gravídicos, a esta altura prejudicado em razão do nascimento da criança, prosseguindo a ação de alimentos com regular instrução probatória[106].

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por sua vez, aplicou ao caso concreto a conversão dos alimentos gravídicos em pensão alimentícia, de acordo com o Acórdão abaixo transcrito:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. VERBA ALIMENTAR FIXADA EM 50% DO SALÁRIO MÍNIMO. INDÍCIOS DE PATERNIDADE VERIFICADOS POR MEIO DA PROVA TESTEMUNHAL PRODUZIDA. EXISTÊNCIA DE RELACIONAMENTO AMOROSO ENTRE AS PARTES NÃO CONTESTADA PELO AGRAVANTE. NASCIMENTO DA CRIANÇA. CONVERSÃO AUTOMÁTICA EM PENSÃO ALIMENTÍCIA EM FAVOR DO MENOR. RESIGNAÇÃO ACERCA DO QUANTUM ARBITRADO. EXEGESE DO ART. 6º DA LEI 11.804/08. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Os alimentos gravídicos foram instituídos pela Lei 11.804/08, que regulamenta este direito da gestante, bem como a forma como será exercido. Compreendem quantia equivalente à necessária contribuição do pai no que tange aos gastos adicionais da mulher durante o período de gravidez, como consultas, exames e alimentação especial, por exemplo, além de incluírem despesas com o parto, internação, medicamentos e demais prescrições[107].

A ação de alimentos gravídicos, como outrora já explanado, destina-se a condenar o suposto pai a cobrir as despesas decorrentes da gravidez, desde a concepção até o parto. Logo, se a ação de alimentos ao nascituro for proposta depois do parto deverá ser extinta por carência de ação. Nem a conversão dos alimentos gravídicos em pensão alimentícia pode ser requerida se em um primeiro momento não foram fixados os alimentos em favor do nascituro. Nesse sentido, é curial o exame do recente acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo a seguir colacionado:

EMENTA: ALIMENTOS GRAVÍD1COS - Demanda deduzida depois do nascimento da criança - Carência da ação – Natureza do instituto, que visa propiciar à gestante auxílio material da concepção ao parto - Exegese da Lei 11.804/08 - Conversão em pensão alimentícia para a criança (art. 6A, § ún., da mesma Lei) inviável, por terem sido fixados os gravídicos muito tempo depois do nascimento, desvirtuando sua finalidade - Sentença reformada – Apelo a que se dá provimento[108].

A Lei 11.804/2008, a qual regulou os alimentos gravídicos, em decorrência do seu breve lapso temporal em vigência, ainda não criou lastro suficiente para a sua efetiva aplicação, ademais, os Tribunais não esgotaram a matéria nem firmaram jurisprudências capazes de suprir todas as omissões do referido texto legal.


CONCLUSÃO

Com a vigência da Lei 11.804, de 5 de novembro de 2008, originou-se mais uma modalidade de prestação de alimentos – os chamados alimentos gravídicos.

Durante muito tempo, os doutrinadores e juristas discutiram a possibilidade do nascituro ser  beneficiado pela pensão alimentícia. O debate fundamentava-se, sobretudo, na determinação da personalidade civil do ser humano, a qual tem previsão legal no artigo 2. º do Código Civil.

A respeito da personalidade civil do nascituro versam três correntes, as quais foram detalhadamente abordadas no trabalho. A Lei de Alimentos Gravídicos, no entanto, inclina-se à ideia de que a personalidade civil inicia-se com a concepção do nascituro, pois dispõe que os alimentos deverão ser prestados da concepção ao parto, em valor suficiente para alcançar as despesas adicionais do período de gravidez ou que dela sejam decorrentes.

É certo que os alimentos visam à manutenção do alimentado de forma digna. A Constituição da República assegura, no artigo 5.°, caput, dentre outros direitos, o direito fundamental à vida. Mais adiante, prevê proteção especial às gestantes, crianças e adolescentes (artigos 201 e 227). A proteção conferida pela nova lei, portanto, coaduna-se com as diretrizes constitucionais, ao permitir que o nascituro representado pela sua genitora proponha ação de alimentos.

Baseado nisso, merece o nascituro, representado por sua genitora, demandar em processo judicial, buscando a tutela do seu direito à pretensão alimentar. Justamente por possuir o direito à vida, busca-se o seu desenvolvimento saudável dentro do ventre materno. Sendo assim, quando necessários, deve o pai prestar alimentos ao nascituro, para propiciar à gestante condições para manter a sua gravidez de forma sadia.

A Lei de Alimentos Gravídicos, a qual regulamentou esse direito, por ser relativamente recente, merece atenção especial quanto aos seus aspectos processuais, porque seu texto legal não aprofunda ou inova nesse sentido. O artigo 11 da nova lei, limita-se a estabelecer a aplicação supletiva das Leis 5.478/1968 (Lei de Alimentos) e a Lei 5.869/1973 (Código de Processo Civil) no que couber.

Na oportunidade em que foram analisadas a capacidade e legitimidade do nascituro, concluiu-se que ele tem capacidade de agir e capacidade processual, e ainda legitimidade ativa para propor a ação de alimentos gravídicos, se devidamente representado no processo. Ademais, defende-se que se, por má-técnica processual a demanda for ajuizada figurando no polo ativo a genitora, a ação não deverá ser declarada nula, se caracterizado que o pedido formulado é dirigido em favor do que está por vir.

O art. 10 da Lei 11.804/2008, o qual atribuía responsabilidade civil objetiva a parte autora da ação de alimentos gravídicos quando a paternidade fosse negativa, foi vetado pelo presidente da república. Pois assim sendo, ao problema apresentado pela lacuna da lei, foi defendida a responsabilidade civil subjetiva de quem imputou ser pai aquele que não era.

Nesses termos, o dano causado a outrem pela imputação culposa (sentido amplo) de paternidade, pode ser reparado tanto por meio da indenização por dano material quanto pela indenização por dano moral. Caso não seja comprovada a má-fé ou o enriquecimento ilícito da parte alimentada, sustenta-se no presente estudo, que a reparação deve ser pleiteada em desfavor daquele que desde o início deveria ser condenado, quem seja, o real genitor do nascituro.

A conversão, revisão e extinção dos alimentos gravídicos também foram abarcados no conteúdo deste trabalho. A conversão, de acordo com o explanado, é automática, procedimento que visa a assegurar a mesma proteção conferida ao nascituro ao recém-nascido. No que diz respeito a revisão aplicam-se as regras gerais dos alimentos, baseadas no binômio necessidade e possibilidade. A extinção da obrigação alimentar gravídica, por sua vez, ocorre quando há a interrupção da gravidez (ex. aborto espontâneo) e ainda por meio da ação negativa de paternidade, se julgada procedente.

Por derradeiro, foram colacionados acórdãos hodiernos, pelos quais buscou-se demonstrar a aplicação concreta da Lei 11.804/2008 e ainda os rumos que estão sendo tomados diante dos pontos omissos do dispositivo referido.


REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. Tutela Civil do Nascituro. 1. ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

ARRUDA, Thomas Roberto. O Direito de Alimentos: doutrina, jurisprudência e processo. São Paulo: Leud, 1982, p. 72/73.

DE PALÁCIO E SILVA. Vocabulário Jurídico. Atualização Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves. 15.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

CAHALLI, Yussef Said. Dos Alimentos. 3ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

___________________. Dos Alimentos. 6.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: parte especial. 1.ª ed. vol. 2, São Paulo: Saraiva, 2003.

CHINELATO, Silmara Juny. Estatuto Jurídico do Nascituro: O Direito Brasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz, ALVES, Jones Figueiredo (Coord.). Novo Código Civil: Questões Controvertidas no Novo Código Civil. v. 6, São Paulo: Método, 2007, p.44.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ª.ed. São Paulo> Revista dos Tribunais, 2009.

DINIZ, Maria Helena Diniz. Código Civil Anotado. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

___________________. Curso de Direito Civil Brasileiro. 23.ª ed. vol. V, São Paulo: Saraiva, 2008.

___________________ Curso de Direito Civil Brasileiro. 21.ª ed. v. 7. São Paulo: Saraiva, 2007.

GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. 11.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

___________________. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 6.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008

GOMES, Orlando. Direito de Família. Atualização Humberto Theodoro Junior. 11.ª ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1998.

JUNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 11ª.ed. v.1, Salvador: JusPodivm, 2009.

JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil: Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 14.ª ed. v. II, p. 709

MONTEIRO, Washington de Barros. Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva. Curso de Direito Civil: Parte Geral. 37ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

___________________. Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva. Curso de Direito Civil: Direito de Família. 37ª. ed. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2004

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23.ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

PEREIRA, Caio Mário. Instituições de Direito Civil. Atualização Tânia Pereira da Silva. 14.ª ed. v. 5, Rio de Janeiro: Forense, 2004.

PUSSI, Willian Artur. Personalidade Jurídica do Nascituro. 2.ª ed. Curitiba: Juruá, 2008.

REALE, Miguel. O projeto do Novo Código Civil: situação após a aprovação pelo Senado Federal. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. 28.ª ed. vol. VI, São Paulo: Saraiva, 2004.

SEMIÃO, Sérgio Abdalla. Os direitos do Nascituro: aspectos cíveis, criminais e do biodireito. 2.ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

TARTUCE, Flávio. A situação jurídica do nascituro: uma página a ser virada no Direito Brasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz, ALVES, Jones Figueiredo (Coord.). Novo Código Civil: Questões Controvertidas no Novo Código Civil. v. 6, São Paulo: Método, 2007, p. 86.

TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

WALD, Arnoldo. Direito de Família. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981.

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 9ª ed. v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mãe ganha direito de pedir em nome próprio alimentos em favor de filhos. Disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=94325. Acesso em 28 out. 2009.

DIAS, Maria Berenice. Alimentos Gravídicos?. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=430. Acesso em 14 out. 2009.

___________________. Alimentos para a vida. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=466. Acesso em 14 out. 2009.

FREITAS, Douglas Phillipis Freitas. Alimentos Gravídicos e a Lei 11.804/08 - Primeiros Reflexos. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=468. Acesso em 14 out. 2009.

MARTINI, Miguel. Entrevista concedida para o site Zenit. Disponível em: http://www.zenit.org/article- 16388?l=portuguese. Acesso em 27 set. 2009.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.399028 / SP. Quarta Turma. Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 26/02/2002.

_______________________.Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 931556/RS. Terceira Turma. Relator:  Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17/06/2008.

_______________________.Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Habeas Corpus n. 100070002991. Segunda Câmara Criminal. Relator: Adalto Dias Tristão, julgado em 28/03/2007.

______________________.Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70006429096. Sétima Câmara Civil.  Relator: Sérgio Fernando de Vasconcelos Chaves, julgado em 13/08/2003.

______________________.Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70016812299. Sétima Câmara Civil.  Relator: Luiz Felipe Brasil dos Santos, julgado em 01/09/2006.

_____________________. Tribunal de Justiça de Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70030552160. Sétima Câmara Cível.  Relator: André Luiz Planella Villarinho, julgado em 16/09/2009.

_____________________. Tribunal de Justiça de Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70028804847. Sétima Câmara Cível.  Relator: Sérgio Fernando Vasconcellos Chaves, julgado em 30/09/2009.

_____________________.Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n.º 193.648. Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Relator: Renan Lotufo, julgado em 14/07/1993.

_____________________.Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n.º 137.023-0/0-00 0. Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo.  Relator: José Cardinale, julgado em 23/10/2006.

_____________________. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n.º 646.712-4/5-00. Sétima Câmara de Direito Privado. Relator: Álvaro Passos, julgado em 16/09/2009.


Notas

[1] DE PALÁCIO E SILVA. Vocabulário Jurídico. Atualização Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves. 15.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 1051.

[2] CHINELATO, Silmara Juny. Estatuto Jurídico do Nascituro: O Direito Brasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz, ALVES, Jones Figueiredo (Coord.). Novo Código Civil: Questões Controvertidas no Novo Código Civil. v. 6, São Paulo: Método, 2007, p.44.

[3] GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. 11.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 82 e 83.

[4] ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. Tutela Civil do Nascituro. 1. ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p.11.

[5] ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. op. cit., p.17.

[6] Idem, p.19.

[7] PUSSI, Willian Artur. Personalidade Jurídica do Nascituro. 2.ª ed. Curitiba: Juruá, 2008, p. 55.

[8] SEMIÃO, Sérgio Abdalla. Os direitos do Nascituro: aspectos cíveis, criminais e do biodireito. 2.ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 46.

[9] Idem, p. 48.

[10] Idem, ibidem.

[11] PORCHAT, Reinaldo apud PUSSI, William Artur. op. cit., p. 59 e 60.

[12] SEMIÃO, Sérgio Abdalla. op. cit., p. 47.

[13] PUSSI, Willian Artur. op. cit., p. 60.

[14] ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. op. cit., p. 26.

[15] PUSSI, William Artur. op. cit., p. 64.

[16] TARTUCE, Flávio. A situação jurídica do nascituro: uma página a ser virada no Direito Brasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz, ALVES, Jones Figueiredo (Coord.). Novo Código Civil: Questões Controvertidas no Novo Código Civil. v. 6, São Paulo: Método, 2007, p. 86.

[17] GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. op. cit., p.80.

[18] ALMEIDA, Silmara J.A. Chinelato. op. cit., p.145.

[19] RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Parte Geral. 34.ª ed. vol. 1,  São Paulo: Saraiva, 2003, p.36.

[20] RÁO ,Vicente (1978) apud  ALMEIDA, Silmara J.A. Chinelato. op. cit., p.147.

[21] SEMIÃO, Sérgio Abdalla. op. cit., p. 158-91.

[22] PUSSI, William Artur. op. cit.,  p. 85.

[23] MONTEIRO, Washington de Barros. Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva. Curso de Direito Civil: Parte Geral. 37ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.66.

[24] SARAIVA, Gastão Grossé apud ALMEIDA, Silmara J.A. Chinelato. op. cit., p. 147.

[25] PUSSI, William Artur. op. cit., p. 88.

[26] DINIZ, Maria Helena Diniz. Código Civil Anotado. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 8 e 9.

[27] ALMEIDA, Silmara J.A. Chinelato. op. cit., p.168.

[28] REALE, Miguel. O projeto do Novo Código Civil: situação após a aprovação pelo Senado Federal. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 08.

[29]TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 03.

[30]MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23.ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.35.

[31] JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil: Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 14.ª ed. v. II, p. 709.

[32] ALMEIDA, Silmara J.A. Chinelato. op. cit., p. 254 e 255.

[33] CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: parte especial. 1.ª ed. vol. 2, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 108 e 109.

[34] PUSSI, William Artur. op. cit., p. 413.

[35] BRASIL. Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Habeas Corpus n. 100070002991. Segunda Câmara Criminal. Relator: Adalto Dias Tristão, julgado em 28/03/2007.

[36] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.399028 / SP. Quarta Turma. Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 26/02/2002.

[37] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 931556/RS. Terceira Turma. Relator:  Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17/06/2008.

[38] RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. 28.ª ed. vol. VI, São Paulo: Saraiva, 2004, p. 373.

[39] GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves. op. cit., p. 450.

[40] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 23.ª ed. vol. V, São Paulo: Saraiva, 2008, p. 561.

[41] GOMES, Orlando. Direito de Família. Atualização Humberto Theodoro Junior. 11.ª ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1998, p. 527.

[42]CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 6.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 15 e 16.

[43]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 449.

[44]DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 558.

[45]GOMES, Orlando. Direito de Família. op. cit., p. 436 e 437.

[46]CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 36.

[47]Idem, p. 42.

[48]CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 43.

[49]CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 44.

[50]Idem, p. 45 e 46.

[51]GOMES, Orlando. op. cit., p. 427.

[52]CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 20.

[53]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 452.

[54]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 455 e 456.

[55] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ª.ed. São Paulo> Revista dos Tribunais, 2009, p. 465.

[56]PEREIRA,  Lafayette Rodrigues apud GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 462.

[57] MONTEIRO, Washington de Barros. Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva. Curso de Direito Civil: Direito de Família. 37ª. ed. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 374.

[58]GONÇALVES, Carlos Roberto.  op. cit., p. 470.

[59]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 470.

[60]MONTEIRO, Washington de Barros. op. cit., p. 375.

[61] GOMES, Orlando. op. cit., p. 430.

[62]CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 521

[63] DIAS, Maria Berenice. Alimentos Gravídicos?. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=430. Acesso em 14 out. 2009.

[64] GIORGIS, José Carlos Teixeira. Alimentos Gravídicos. Disponível em  http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=465. Acesso em 28 out. 2009.

[65] DIAS, Maria Berenice. Alimentos para a vida. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=466. Acesso em 14 out. 2009.

[66] PEREIRA, Caio Mário. Instituições de Direito Civil. Atualização Tânia Pereira da Silva. 14.ª ed. v. 5, Rio de Janeiro: Forense, 2004,  p. 517.

[67] DE PALÁCIO E SILVA. op. cit., p. 1051.

[68]CAHALLI, Yussef Said. Dos Alimentos. 3ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 533.

[69]  GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 489.

[70]  CAHALLI, Yussef Said. Dos Alimentos.6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 553.

[71] GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 489.

[72] DIAS, Maria Berenice. op. cit. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=466. Acesso em 14 out. 2009.

[73] ARRUDA, Thomas Roberto. O Direito de Alimentos: doutrina, jurisprudência e processo. São Paulo: Leud, 1982, p. 72/73.

[74] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70006429096. Sétima Câmara Civil.  Relator: Sérgio Fernando de Vasconcelos Chaves, julgado em 13/08/2003.

[75] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70016812299. Sétima Câmara Civil.  Relator: Luiz Felipe Brasil dos Santos, julgado em 01/09/2006.

[76] BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n.º 646.712-4/5-00. Sétima Câmara de Direito Privado. Relator: Álvaro Passos, julgado em 16/09/2009.

[77] MARTINI, Miguel. Entrevista concedida para o site Zenit. Disponível em: http://www.zenit.org/article- 16388?l=portuguese. Acesso em 27 set. 2009.

[78] DE PALÁCIO E SILVA. op. cit., p. 550.

[79] FREITAS, Douglas Phillipis Freitas. Alimentos Gravídicos e a Lei 11.804/08 - Primeiros Reflexos. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=468. Acesso em 14 out. 2009.

[80] FREITAS, Douglas Phillipis Freitas. op. cit. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=468. Acesso em 14 out. 2009.

[81]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 451.

[82] WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de      Conhecimento. 9ª ed. v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 216.

[83] JUNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de      Conhecimento.  11ª.ed. v.1, Salvador: JusPodivm, 2009, p. 219.

[84] Idem, p. 220.

[85] WAMBIER, Luiz Rodrigues. op. cit., p.138.

[86] CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 6.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 354.

[87] BRASIL.Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n.º 193.648. Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Relator: Renan Lotufo, julgado em 14/07/1993.

[88] BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n.º 137.023-0/0-00 0. Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo.  Relator: José Cardinale, julgado em 23/10/2006.

[89] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mãe ganha direito de pedir em nome próprio alimentos em favor de filhos. Disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=94325. Acesso em 28 out. 2009.

[90]Idem.

[91]GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 501

[92] FREITAS, Douglas Phillipis Freitas. op. cit. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=468. Acesso em 14 out. 2009.

[93]Idem.

[94] DIAS, Maria Berenice. op. cit.. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=466. Acesso em 14 out. 2009.

[95] DE PALÁCIO E SILVA. op. cit., p. 720.

[96] GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 6.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 14 e 15.

[97] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 21.ª ed. v. 7. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 41.

[98] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 7ª.ed. v. 4, São Paulo: Atlas,  2007, p. 32.

[99] FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8.ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 36 e 37.

[100] LIMA, Fátima Maria Costa Soares. Alimentos Gravídicos. Disponível em http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=543. Acesso em 16 out. 2009.

[101] WALD, Arnoldo. Direito de Família. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 32.

[102] FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8.ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 83.

[103] Idem., p. 83 e 84.

[104] GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 6.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 55.

[105] BRASIL. Tribunal de Justiça de Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70028804847. Sétima Câmara Cível.  Relator: Sérgio Fernando Vasconcellos Chaves, julgado em 30/09/2009.

[106] BRASIL. Tribunal de Justiça de Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70030552160. Sétima Câmara Cível.  Relator: André Luiz Planella Villarinho, julgado em 16/09/2009.

[107] BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Agravo de Instrumento n.º 2009.015437-9. Terceira Câmara de Direito Cível. Relator: Marcus Túlio Sartorato, julgado em 25/08/2009.

[108] BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível com Revisão n.º 663.773-4/7-00. Sexta Câmara de Direito Privado. Relator: José Percival Albano Nogueira Junior, julgado em 01/10/2009.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Andressa Hiraoka. O direito fundamental do nascituro em receber alimentos à luz da Lei nº 11.804/08. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3266, 10 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21972. Acesso em: 24 abr. 2024.