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A violação do princípio da dignidade da pessoa humana do empregado no procedimento de revista íntima no direito brasileiro

A violação do princípio da dignidade da pessoa humana do empregado no procedimento de revista íntima no direito brasileiro

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Havendo a possibilidade de fiscalização por outro tipo de controle, como a utilização de etiquetas magnéticas no produto, uso de dispositivos de som e filmagem, vigilância por serviço especializado, não há qualquer justificativa para a realização de revistas.

“A justiça só pode ser observada por cada um isoladamente se todos concordarem em praticá-la em conjunto.” (PIO XI)

Resumo: A doutrina e a jurisprudência muito discutem acerca da legalidade e limites do direito do empregador em realizar procedimento de revista em seus empregados. Deste procedimento, destaca-se, como forma mais específica, o procedimento de revista íntima, entendido como aquele realizado com o exame do próprio corpo do empregado, com toques e/ou a exigência que ele se dispa. Esse procedimento, contudo, não possui ainda regulamentação legal muito clarano ordenamento jurídico brasileiro, gerando, como já dito acima, discussões acerca da sua legalidade e limites em decorrência da afronta que representa aos direitos à intimidade, privacidade, honra, imagem e dignidadedo trabalhador, fundados na própria dignidade da pessoa humana. Por outro lado, o empregador utiliza-se dos procedimentos de revista íntima fundado no seu poder diretivo, que se justifica no seu direito de propriedade empresarial. Assim, aparentemente, o direito de propriedade do empregador conflita com os direitos personalíssimos do empregado e coma sua dignidade da pessoa humana. A doutrina e jurisprudência têm solucionado essa problemática com base na própria função social da propriedade empresarial, bem como na prevalência do princípio da dignidade da pessoa humana, visto tratar-se de sobreprincípio constitucional que coordena e garante todo o Estado Democrático de Direito.

Palavras-chaves: direito de propriedade, poder diretivo, função social, dignidade da pessoa humana, revista íntima, revista pessoal.

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. DO DIREITO DE PROPRIEDADE. 1.1 O direito de propriedade. 1.2 Fundamento jurídico do direito de propriedade no ordenamento jurídico brasileiro. 1.3 Limites do direito de propriedade. 1.4 O direito de propriedade do empregador e sua função social. 2. DO PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR. 2.1 O poder diretivo do empregador. 2.2 Limites do poder diretivo do empregador. 3. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 3.1 Oprincípio da dignidade da pessoa humana na Constituição Federal de 1988. 3.2 O direito à intimidade, privacidade, honra e imagem na Constituição Federal de 88. 3.3 Adignidade da pessoa humana do empregado e a inviolabilidade do seu direito à privacidade, intimidade,honra e imagem. 4.DA REVISTA DO EMPREGADO. 4.1 Conceito e distinção entre revista íntima e revista pessoal do empregado. 4.2 Legislação brasileira sobre revista do empregado. 4.3Hipóteses admitidas de submissão do empregado à revista conforme posicionamento predominante atual da doutrina e jurisprudência. 4.4 As revistas íntimas. 5.A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA DO EMPREGADO VERSUSO DIREITO DE PROPRIEDADE DO EMPREGADOR NOS PROCEDIMENTOS DE REVISTA ÍNTIMA. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.


INTRODUÇÃO

A presente monografia é o resultado da pesquisa, análise e estudo do procedimento de revista íntima realizado por alguns empregadores em seus empregados à luz da dignidade da pessoa humana do trabalhador no ordenamento jurídico brasileiro.

O tema já gerou e ainda gera muitas discussões na doutrina e jurisprudência quanto a sua legalidade e limites em decorrência da singela regulamentação legal que possui e controvérsias interpretativas de seu texto. Foi exatamente por isso que o tema foi escolhido como objeto deste estudo.

Buscou-se neste trabalho apresentar essa discussão, analisando-se os elementos nela envolvidos sempre em conformidade com o direito brasileiro, em especial, com a Constituição Federal de 88, objetivando-se responder à dúvida quanto à prevalência do poder diretivo do empregador, fundado no seu direito de propriedade, ou dos direitos personalíssimos do empregado, sobretudo, da dignidade da pessoa humana, nos procedimentos de revista íntima, em vista das discussões interpretativas que gera a legislação atual sobre o tema.

Assim, primeiramente, foi realizado o estudo acerca do que é o direito de propriedade propriamente dito e quais são os seus limites jurídicos, passando-se ao estudo do direito de propriedade do empregador enquanto empresário, bem como do poder diretivo e as suas limitações impostas pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Em seguida, foi estudado o princípio da dignidade da pessoa humana conforme a atual Constituição Federal, enfatizando-se o estudo acerca do indivíduo, ser humano, enquanto na qualidade de empregado, passando-se à análise dos seus direitos à privacidade, intimidade, honra e imagem.

Estudou-se ainda o procedimento de revista como gênero, bem como o de revista íntima e pessoal como espécies, a fim de esclarecer o porquê da nomenclatura adotada no presente trabalho para designar o exame realizado diretamente no corpo do trabalhador pelo empregador. Contudo, o estudo foi voltado para o procedimento de revista íntima de acordo com a legislação atual existente sobre o tema e conforme a posição da doutrina e jurisprudência atual acerca da matéria.

Por fim, buscou-se demonstrar qual o entendimento atual predominante, tanto doutrinário como jurisprudencial, acerca da legalidade e limites do procedimento de revista íntima, bem como do aparente conflito existente no caso entre o direito de propriedade do empregador e da dignidade da pessoa humana do empregado, apontando o embasamento jurídico-legal para tanto.

Foi utilizado para elaboração do trabalho o método científico, com pesquisa doutrinária e jurisprudencial, além da realização de consultas a artigos sobre o tema desenvolvido em revistas jurídicas e sites da internet. Para a pesquisa jurisprudencial foram utilizados os sites oficiais dos Tribunais Federais Trabalhistas, bem como sites específicos de pesquisa jurisprudencial.

O trabalho foi ainda desenvolvido na ordem cronológica em que é apresentado a fim de possibilitar ao leitor a melhor compreensão e conclusão acerca da questão central que é abordada, a legalidade e limites do procedimento de revista íntima adotado, por alguns empregadores, diante do aparente conflito que envolve essa discussão entre o direito de propriedade do empregador e a dignidade da pessoa humana do empregado conforme o ordenamento jurídico brasileiro atual, em especial, nos ditames da Constituição Federal de 88.

A importância deste trabalho monográfico e principal objetivo é demonstrar o que é o procedimento de revista íntima de empregados e como esse procedimento se enquadra no ordenamento jurídico brasileiro, em especial, nos termos da atual Constituição Federal, em vista da possível violação dos direitos à intimidade, privacidade, honra, imagem e própria dignidade da pessoa humana do trabalhador.


1. DO DIREITO DE PROPRIEDADE

1.1. O DIREITO DE PROPRIEDADE

Sob um primeiro aspecto, pode-se dizer que o direito de propriedade é direito individual, exclusivo, pleno e absoluto no sentido de que o proprietário detém amplos poderes jurídicos sobre aquilo que lhe pertence, podendo usar, gozar e dispor da sua propriedade da forma que lhe convir, além de poder reavê-la de quem a detenha ou possua injustamente.

Para Orlando Gomes[1] o direito de propriedade define-se como “o direito complexo, se bem que unitário, consistindo num feixe de direitos consubstanciados nas faculdades de usar, gozar dispor e reivindicar a coisa que lhe serve de objeto”. Afirma ainda o autor que a característica essencial de tal direito “é o poder jurídico de dominação da coisa, que fica ileso em sua substancialidade ainda quando sofre certa limitação”.

Já para Luis da Cunha Gonçalves[2], “o direito de propriedade é aquele que uma pessoa singular ou coletiva efetivamente exerce numa coisa determinada em regra perpetuamente, de modo normalmente absoluto, sempre exclusivo, e que todas as outras pessoas são obrigadas a respeitar.”

Carlos Roberto Gonçalves[3] define o direito de propriedade como “o poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar, e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”.

Segundo Washington de Barros Monteiro[4] “constitui o direito de propriedade o mais importante e o mais sólido de todos os direitos subjetivos, o direito real por excelência, o eixo em torno do qual gravita o direito das coisas”.

A definição de propriedade é dada pela doutrina, como as citadas acima, e pela jurisprudência, pois não existe no ordenamento jurídico pátrio uma definição legal do que é propriedade, mas tão somente a delimitação dos poderes do proprietário, conforme se depreende do texto do artigo 1.228 do Código Civil de 2002, in verbis:

“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”

Carlos Roberto Gonçalves[5] diz que a própria origem etimológica de propriedade é incerta, já que existem aqueles que defendam que sua origem estaria ligada a expressão latina proprietas, derivado de proprius, que indicaria o que pertence a uma pessoa, trazendo a ideia de apropriação de um certo bem, corpóreo ou incorpóreo, por alguém. E aqueles que defendam que a palavra origina-se de domare, também de origem latina que significa senhor da casa, correspondendo à ideia de domínio.

Da primeira corrente, depreende-se uma ideia de direito de propriedade mais ampla, que engloba tanto coisas corpóreas como incorpóreas[6]. Já da segunda, capta-se a noção de domínio, que se limitaria aos bens corpóreos, sendo, portanto, espécie do gênero propriedade.

Entretanto, o conceito de propriedade é dinâmico e recebe influências dos regimes políticos e sistemas jurídicos em que é concebida, não existindo, consequentemente, um conceito único na história do referido instituto.

Mas, de acordo com essa análise, pode-se afirmar que o direito de propriedade estaria ligado à ideia de poder que se exerce sobre as coisas que lhe estiverem sujeitas, submetendo-as a sua vontade, o que demonstra a existência de uma ligação muito forte entre o proprietário e sua coisa de forma a originar uma obrigação passiva geral de que ninguém turbe o exercício deste direito pelo seu titular. 

1.2. FUDAMENTO JURÍDICO DO DIREITO DE PROPRIEDADE NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

No Sistema Jurídico Brasileiro o direito de propriedade é garantido pela própria Constituição Federal, no caput e inciso XXII do seu artigo 5º, in verbis:

“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

(...)

XXII.é garantido o direito de propriedade;” (Grifos nossos)

Devido à relevância que lhe é atribuída, o direito de propriedade, juntamente com os direitos à vida, intimidade, honra, liberdade, igualdade e segurança, goza do status de direito fundamental[7], ou seja, é um direito intimamente ligado à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação de poder, protegido no plano constitucional em decorrência de sua importância axiológica, fundamentando e legitimando todo o ordenamento jurídico.

O direito de propriedade faz parte do núcleo imutável da Constituição, ou seja, é cláusula pétrea (artigo 60, § 4º, inciso IV da Carta Maior), direito irrevogável pelo poder constituinte derivado.

Importante aqui mencionar que, doutrinariamente, classifica-se a propriedade, assim como os outros direitos fundamentais citados acima, como direito de primeira geração, assegurado originariamente nas Declarações de Direitos Francesa de 1879 (Declaração dosDireitos do Homem e do Cidadão) e Americana de 1948 (Declaração Universal dos Direitos Humanos)[8].

Os direitos de primeira geração possuem como características principais a titularidade individual e o caráter eminentemente negativo, a exigir um não-fazer por parte do Estado. Características estas que podem ser vistas de forma nítida no direito de propriedade, como abordado na seção anterior.

Todos os direitos de primeira geração, em destaque o direito de propriedade, são considerados símbolos do Estado Liberal e representam a essência da não intervenção do Estado na esfera privada dos cidadãos.

No plano infraconstitucional, o direito de propriedade é assegurado principalmente pelo artigo 1.228 do Código Civil que, conforme já citado na seção anterior, enuncia os poderes do proprietário sobre a coisa que lhe pertence.

1.3. LIMITES DO DIREITO DE PROPRIEDADE

O direito de propriedade assegurado no artigo 5º, inciso XXII da Carta Magna, como qualquer direito, sofre limitações que relativizam a sua ideia de direito absoluto e alteram os contornos individualistas do seu conceito.

Segundo o inciso XXIII do mesmo artigo 5º da Constituição a propriedade deverá observar sua função social, in verbis:

“Art. 5º. (...)

(...)

XXIII.a propriedade atenderá a sua função social;”

Assim, para que o direito de propriedade seja protegido pelo direito brasileiro, impõe a própria Lei Maior o necessário cumprimento de sua função social, que, em linhas gerais, consiste na exigência de que o proprietário, quando da utilização do objeto de sua propriedade, observe não apenas seus interesses particulares.

A ideia de função social não está atrelada apenas à produtividade do bem, mas principalmente àideia de convívio social e aos direitos inerentes à coletividade, justificando-se na finalidade de inserir o indivíduo e sua família em uma coletividade.

Diferentemente, a propriedade individual, sem a ideia de função social, apenas visa à proteção do indivíduo e sua família das necessidades inerentes à própria sobrevivência, limitando-se a um direito individual.

Trata-se, pois, a função social, de uma reconstrução do conceito de propriedade, que passa a incluir a necessidade da observância de deveres extrapatrimoniais do proprietário, visando a harmonização do interesse individual com o coletivo-social.

Observa-se que a função social imposta ao direito de propriedade é uma limitação de ordem interna, inerente ao próprio direito.

Ressalte-se que referida limitação aplica-se desde a propriedade imobiliária até a propriedade intelectual, não se fazendo qualquer distinção.

Não bastasse tal limitação, a Constituição Federal ainda incluiu a função social da propriedade no rol de princípios da ordem pública, que são destinados ao fim de assegurar existência digna a todos, nos termos da justiça social, o que enfatiza a importância e necessidade deste instituto.

O artigo 170 da Constituição assim dispõe, in verbis:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

III.função social da propriedade;”

Nota-se que o direito de propriedade, com a Constituição Federal de 88, passou de simples relação entre o indivíduo e sua coletividade, que tinha o dever de respeitá-la, para um direito complexo, regulamentado não mais por apenas normas privadas, mas também por públicas, em decorrência da grande carga social que sustenta.

Segundo José Afonso da Silva[9], a propriedade:

“Embora prevista entre os direitos individuais, ela não mais poderá ser considerada puro direito individual, relativizando-se seu conceito e significado, especialmente porque os princípios da ordem econômica são preordenados à vista da realização de seu fim: assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.

Assim, como o direito de propriedade foi inserido pela Carta Maior como princípio fundamental da ordem econômica, seu objetivo acaba por refletir em toda a ordem econômica do país, e assim sobre todas as diversas propriedades, tais como, a pública, a privada, a dos bens de consumo, a agrícola, a industrial, a urbana, a rural, a literária, a artística, a científica, a dos bens de produção, a das marcas de indústria e comércio, etc.

Obviamente, o referido reflexo é diverso em cada uma dessas propriedades, visto que são muito diferenciadas possuindo, cada qual, uma regulamentação própria de acordo com suas especificidades.

Eros Roberto Grau[10]afirma nesse sentido que:

“A propriedade, em verdade, examinada em seus distintos perfis – subjetivo,

objetivo, estático e dinâmico –, compreende um conjunto de vários institutos. Temo-la, assim, em inúmeras formas, subjetivas e objetivas, conteúdos normativos diversos sendo desenhados para aplicação a cada uma delas, o que importa no reconhecimento, pelo direito positivo, da multiplicidade da propriedade.”

Sob este aspecto, percebe-se que a propriedade não constitui uma instituição única, mas um conjunto de diversas instituições relacionadas a diversos tipos de bens.A propriedade, além de direito do indivíduo, é também um encargo contra ele, que ficaconstitucionalmente obrigado a retribuir ao grupo social um benefício pela manutenção e uso da propriedade. O que também deve ser observado na propriedade da empresa e em relação ao poder de direção do empregador.

1.4 .O DIREITO DE PROPRIEDADE DO EMPREGADOR E SUA FUNÇÃO SOCIAL

Em decorrência do advento da tecnologia e do avanço do processo produtivo oriundos das Revoluções Industriais houve uma grande organização do capital e do trabalho constituindo-se as empresas, que, consequentemente, passaram a incorporar uma grande quantidade de técnicas de produção e empreendimento.

Tais técnicas foram integradas ao patrimônio do empresário, que hoje pode ser caracterizado, por exemplo, pelos seus meios de produção, que se materializam na empresa; o próprio estabelecimento, que se materializa no imóvel em que se localiza; os bens que compõem o estabelecimento, tais como o maquinário e todo o mobiliário; os modos de produção; invenções; estratégias de atuação no mercado; e o produto.

Cumpre ressaltar que no direito atual o conceito de empresa, sob o aspecto que se visa estudar no presente trabalho, seria o conjunto de bens reunidos pelo empresário para exploração de uma atividade econômica. Deste conceito se depreende a ideia de empresário, que seria aquele que explora a atividade econômica.

Todo o patrimônio do empresário é garantido e protegido pelo direito de propriedade previsto no caput e inciso XXII, do artigo 5º da Carta Magna.

Essa proteção constitucional do direito de propriedade, em específico a do direito de propriedade do empresário, evoluiu paralelamente às necessidades exigidas pelo desenvolvimento tecnológico sofrido no país e as próprias imposições do sistema capitalista. Assim, considera-se a propriedade como elemento que se insere no processo produtivo.

Contudo, o direito de propriedade do empresário, assim como qualquer outro direito de propriedade, não é absoluto e deve observar os limites dados pela sua função social, conforme inciso XXIII do mesmo artigo 5º da Constituição Federal e artigo 170 que, conforme abordado na seção anterior, coloca a função social da propriedade como princípio da ordem econômica nacional.

Eros RobertoGrau[11] analisando essa noção de direito de propriedade diz que:

“A moderna legislação econômica considera a disciplina da propriedade como elemento que se insere no processo produtivo, ao qual converge um feixe de outros interesses que concorrem com aqueles do proprietário e, de modo diverso, o condicionam e por ele são condicionados.”

Assim, para que a proteção constitucional à propriedade do empresário seja efetiva, é necessário que esta atenda a sua função social. Entretanto, esta função social não se limita à mera vinculação do destino produtivo do bem. Mais do que isso, a ideia de função social neste caso, estaria atrelada ao dever da empresa em exercer seu direito de propriedade em prol de outros e não apenas a vontade única e exclusiva de seu proprietário.

Sob este aspecto, o direito de propriedade do empresário, e consequentemente, da empresa, garantido no caput e inciso XXII do artigo 5º da Carta Maior, deve amoldar-se a sua função social, segundo o determinado pelo inciso XXIII do mesmo diploma legal e, sobretudo, aos ditames da atividade econômica nos termos do artigo 170 da Constituição.

Eros Roberto Grau[12]esclarece nesse sentido que:

“O princípio da função social da propriedade impõe ao proprietário – ou a quem detém o poder de controle, na empresa – o dever de exercê-lo em benefício de outrem e não, apenas, de não o exercer em prejuízo de outrem. Isso significa que a função social da propriedade atua como fonte de inspiração de comportamentos positivos – prestação de fazer, portanto, e não, meramente, de não fazer – ao detentor do poder que deflui da propriedade.”

Diante de tudo isso, pode-se entender que a empresa deve visar também atingir interesses diversos ao seu particular, como o dos trabalhadores, cumprindo assim sua função social, quesito obrigatório para que este direito do empresário seja protegido.


2. DO PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR

2.1O PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR

O poder diretivo pode ser conceituado, de forma simplista, como a capacidade do empregador em determinar como deverá ocorrer a prestação de serviços do seu empregado.

Amauri Mascaro Nascimento[13] conceitua o poder diretivo como “a faculdade atribuída ao empregador de determinar o modo como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho, deve ser exercida.”

Alice Monteiro de Barros[14] diz que o poder diretivo pode ser definido pela “capacidade atribuída ao empregador de dar conteúdo concreto à atividade do trabalhador, visando à realização das finalidades da empresa”.

A definição acerca do que seria o poder diretivo do empregador se depreende do próprio conceito de empregador, legalmente dado pelo caput do artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis:

“Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.” (Grifo nosso)

Segundo o artigo acima transcrito, empregador é aquele que, além de contratar e assalariar, dirige a prestação pessoal dos serviços de seus empregados, assumindo os riscos do seu empreendimento. Referido poder corresponde, portanto, ao dever de subordinação do empregado. Ou, nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento[15], “empregador é o ente dotado ou não de personalidade jurídica, com ou sem fim lucrativo, que tiver empregado.”.

Assim, resta evidente que o titular do poder diretivo é o empregador, contudo, importante ressaltar que o direito de exercício de tal poder pode ser, em parte, delegado a prepostos, variando-se a intensidade desse poder de mando concedido de acordo com a natureza da relação de emprego.

A doutrina, em sua maior parte, classifica o poder diretivo em três espécies: o poder organizacional, o poder de controle e o poder disciplinar[16].

Segundo Sandra Lia Simón[17] o poder organizacional ou poder diretivo propriamente dito, seria o poder mais amplo do empregador, que consistiria “na faculdade de ordenar tanto o capital como o trabalho, objetivando a direção e administração do empreendimento”. Para a autora, tal poder compreende os fins econômicos da empresa, a definição de sua estrutura jurídica, a fixação dos cargos e funções bem como das suas respectivas atribuições, dentre outras atividades.

O poder de controle seria o direito do empregador em fiscalizar as atividades profissionais feitas por seus empregados, com o fim de averiguar se as metas que possibilitarão o alcance dos seus objetivos estão sendo cumpridas.

Segundo Amauri Mascaro Nascimento[18] tal poder se justifica porque somente assim o empregador poderá averiguar que “em contrapartida ao salário que paga, vem recebendo os serviços dos empregados”.

Já o poder disciplinar seria a possibilidade do empregador de aplicar penalidades a seus empregados quando deixarem de cumprir as ordens que lhe foram dadas, não desempenhando adequadamente suas atribuições.

Assim, o poder diretivo é amplo e abrange três funções: a relativa às decisões executivas, que são as necessárias à organização do trabalho e se revelam por meio de atos meramente constitutivos, não determinando condutas para os trabalhadores; a função de instrução, que diz respeito às ordens cuja eficácia real depende da observância do trabalhador; e, a função de controle, que é o direito do empregador de fiscalizar as atividades profissionais de seus empregados, por meio, por exemplo, de instalação de equipamentos visuais, instrumentos auditivos e revistas pessoais.

Sob a ótica dessa classificação, pode-se dizer que o poder diretivo em específico encontra-se no poder organizacional, já que os demais, poder disciplinar e poder de controle, visam apenas dar efetividade a ele.

Nesse sentido, a doutrina se divide em três principais correntes que fundamentam a existência do poder direito: a teoria da propriedade privada, a teoria institucional e a teoria contratual.

De acordo com a teoria da propriedade privada, defendida, por exemplo, segundo Sandra Lia Simón[19], por Célio Goyatá, o poder diretivo pertence àquele que tiver a propriedade da empresa, isto é, o poder diretivo é dado ao empregador sob o fundamento de que a empresa é objeto do seu direito de propriedade. O empregador possui tal poder porque é dono.

Já a segunda teoria, a institucional, entende que a empresa (empregador) enquanto instituição possui uma estrutura hierarquizada, fazendo com que o poder de comando surja do órgão que a administra. Essa teoria possui fundamento mais político e social do que jurídico. É defendida, segundo Sandra Lia Simón[20], por Luiz José de Mesquita e Roberto Barretto Prado.

E, a teoria contratual, sustentada, por exemplo, por Maurício Godinho Delgado[21], afirma que o poder diretivo é oriundo dos poderes concedidos ao empregador no contrato de trabalho, sendo, portanto, oriundo da relação de emprego. Em outras palavras, na celebração do contrato de trabalho, se põe sob a responsabilidade do empregador a organização e disciplina do trabalho realizado na empresa, dando-lhe poderes para que tal responsabilidade seja efetivada, e, por outro lado, o empregado aceita se submeter às ordens do empregador de modo a lhe prestar serviços.

A justificativa para a existência do poder diretivo é apresentada por cada uma dessas correntes sob diferentes óticas segundo Sandra Lia Simón[22]. Para a autora, a teoria da propriedade utiliza-se do detentor dos meios de produção, a institucionalista identifica um dos motivos que justificariam o poder diretivo, e a contratualista demonstraria a procedência do poder, isto é, o contrato de trabalho.

Contudo, todas estas teorias são passíveis de crítica: a teoria da propriedade privada, não observa o fato de que atualmente existem empresas em que a propriedade não está associada ao controle; a institucionalista limita-se a determinar uma certa situação de poder, não explicando a liberdade característica da relação de emprego; e a contratualista, apenas reconhece o poder diretivo sob seu aspecto formal.

Sob outra ótica, pode-se afirmar que cada teoria se adapta melhor a uma espécie de poder diretivo (poder organizacional, de controle e disciplinar).

Para Sandra Lia Simón[23] o principal fundamento do poder diretivo do empregador é a propriedade, em vista da essência do capitalismo estar exatamente na propriedade. A autora não desconsidera as demais teorias, entendendo que também são importantes, pois o contrato de trabalho é a forma pela qual a relação entre empregado e empregador se formaliza e as empresas cada vez mais passam a ser vistas como instituições, contudo, fundamenta que:

“A essência do sistema capitalista, instalado na maioria das sociedades do mundo contemporâneo, está exatamente na propriedade: enquanto os trabalhadores dispõem tão somente da sua “força de trabalho”, os capitalistas são os detentores dos meios de produção.

(…)

É o sistema capitalista, portanto, que dá ênfase à propriedade. conseqüentemente, ela deve ser considerada o principal fundamento do poder diretivo do empresário.”

A doutrina ainda se divide em duas correntes quanto à natureza jurídica deste direito inerente ao empregador: a que sustenta que o direito ao exercício do poder diretivo seria um direito potestativo do empregador, de forma que nada poderia impedir seu exercício, isto é, quem se submeter a ele também deverá se sujeitar a ele, sem possibilidade de objeção, defendida, segundo Alice Monteiro de Barros[24], por Karl Larenz; e a que afirma que tal poder seria um direito-função, ou seja, um poder atribuído ao titular para tutelar interesse alheio e não próprio, implicando na existência de obrigações ao titular, sustentada por Amauri Mascaro Nascimento[25] e Sandra Lia Simón[26], por exemplo.

No caso desta última corrente, a participação dos trabalhadores nas decisões da empresa aumentaria gradativamente, limitando-se, dessa maneira, a amplitude do poder patronal de direção a ponto de se transformar em um conjunto de deveres do empregador para com os empregados.

A corrente que dá ao poder de direção a ideia de direito potestativo prevaleceu até o século XIX. Todavia, tal conceituação, segundo o entendimento majoritário atual, é incompatível com a realidade social, visto que o próprio contrato de trabalho e a lei impõem limitações a esse poder. Além disso, a justificativa de direito potestativo torna-se insuficiente para explicar as formas de participação dos trabalhadores na empresa.

Assim, prevalece a corrente que sustenta a ideia de direito-função do poder de comando do empregador, já que tal poder não pode ser fundado exclusivamente no interesse do empresário.  Neste caso, o poder de direção continua sendo um direito potestativo do empregador, não ficando reduzido. Contudo, passa a observar os interesses da empresa como parte de uma sociedade capitalista de massas, e não apenas os interesses do empregador. Tal observância é de suma importância para que os trabalhadores possam exercer a liberdade que é inerente à própria relação de emprego, mesmo que apenas formalmente.

Sandra Lia Simón[27] correlaciona a função social da propriedade da empresa com o poder diretivo do empregador enquanto direito-função:

“Nesse sentido, é possível, ainda, traçar um paralelo entre tal fundamento e a natureza jurídica do poder diretivo, identificando-o como direito-função, pois a empresa não pode visar única e tão somente o interesse exclusivo do capitalista, mas sim deve alcançar interesses diversos, como os dos trabalhadores, da coletividade, ou do Estado.”

Sob este aspecto, a ideia de direito-função do poder diretivo do empregador tem por base a própria função social da propriedade do empresário, conforme artigo 5º, XXIII e 170 da Constituição Federal, e mesmo a função social do contrato, dada pelo artigo 421 do Código Civil de 2002, aplicável subsidiariamente ao Direito do Trabalho conforme parágrafo único do artigo 8º da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis:

“Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”

Assim, o poder diretivo visto como direito-função relaciona-se àideia de que o contrato de trabalho também deverá observar sua função social, atendendo a interesses dos trabalhadores e não apenas do empresário contratante. Tal limitação dá base para o próprio princípio da autonomia contratual, já que, apesar de o poder diretivo do empregador emanar do contrato, este poder sempre deverá ser exercitado com restrições.

2.2LIMITES DO PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR

O exercício do poder diretivo deve observar limites impostos pelo ordenamento jurídico, sobretudo diante dos direitos invioláveis do trabalhador. A subordinação jurídica deste último ao poder de mando do empregador não implica a sujeição a quaisquer tipos de determinações.

Sob uma primeira ótica, pode-se dizer que o poder diretivo do empregador possui limites externos, que seriam os impostos pelo conjunto de normas que compõem o ordenamento jurídico pátrio, e limites internos, que dizem respeito ao próprio exercício do poder de controle, que sempre deverá visar uma forma regular e uma conduta de boa-fé.

Como abordado ao longo do trabalho, a principal limitação desse poder direito, que se encontra fundado no direito de propriedade do empresário, é a sua função social (artigo 5º, XXIII e 170 da Constituição Federal), que deverá sempre ser observada para que este direito seja realmente protegido.

Tal limitação reflete-se no próprio contrato de trabalho que também deverá respeitar uma função social para que tenha validade e eficácia plena (artigo 421 do Código Civil de 2002, aplicado subsidiariamente ao Direito do Trabalho conforme artigo 8º da Consolidação das Leis do Trabalho).

Além disso, o poder diretivo do empregador encontra-se ainda barrado pelo rol de direitos da personalidade garantidos no artigo 5º da Carta Maior, dos quais pode-sedestacar o dever de não discriminar o trabalhador (incisos I e VIII), não obrigá-lo a fazer ou não fazer algo sem ser em virtude de determinação legal (inciso II), não submetê-lo a tortura ou tratamento desumano ou degradante (inciso III), não violar sua liberdade de consciência e crença ou sua intimidade, honra, imagem e vida privada (incisos VI e X).

Deve o empregador ainda observar e cumprir os direitos garantidos ao trabalhador nos artigos 7º, 8º e 9º, que também acabam por ser formas de restrição do seu poderdiretivo.

Há autores que ainda afirmam existir limitação temporal e espacial de tal poder, visto apenas poder ser exercido no local e durante a prestação de serviços; e limitação teleológica, isto é, o empregador somente pode dar ordens de visem alcançar o objetivo da prestação de serviços. Segundo Sandra Lia Simón[28], o jurista Márcio Túlio Viana é defensor da classificação em limitação temporal, espacial e teleológica.

Assim, as ordens dadas por quem não está legitimado a emiti-las, ou contra a lei, ou ainda danosas à integridade física ou moral do trabalhador podem ser desobedecidas. Nestes termos, o empregado não está obrigado a se submeter a situações que o exponham a situações indignas, vexatórias ou mesmo atentatórias a sua dignidade e prestígio profissional.


3. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

3.1O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A palavra dignidade origina-se do latim dignitatis, que significa a qualidade moral que inspira respeito, consideração, honra, virtude. Trata-se da consciência do próprio valor.

Kant[29] afirma que “Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela, qualquer outra coisa como equivalente, mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto, não permite equivalente então ela tem dignidade.”. Sob esta ótica, o ser humano seria um fim em si próprio, tendo, consequentemente, valor absoluto, não podendo ser utilizado como instrumento para algo.  Por tal motivo, diz-se que o ser humano tem dignidade.

Nesse sentido, diz-se que a dignidade da pessoa humana supera a estrutura biológica, sendo um valor fundado nas capacidades originais do ser humano. Logo, a dignidade seria um atributo intrínseco ao homem e a sua essência, nascendo com ele. E, ao longo dos anos e do desenvolvimento do ser, passam a compor a dignidade inicial o pensamento, a intimidade, a imagem, a expressão, a liberdade.

A dignidade trata-se, portanto, de uma questão ética das relações e do respeito que cada ser humano merece e deve receber de todos, não se admitindo discriminação por qualquer razão.

O conceito de dignidade, todavia, não é um conceito atual, foi desenvolvido ao longo da história. A dignidade da pessoa humana é reflexo da conquista pelos povos de todas as nações, tendo em vista as atrocidades por que passou o homem durante toda a sua existência, tais como o nazismo, ditaduras, despotismos, responsáveis pela morte e sofrimento de milhares de pessoas ao longo da história.

Assim, a dignidade da pessoa humana está intimamente ligada às conquistas do ser humano como uma coletividade ao longo de toda a sua existência no planeta. Ser digno é ser merecedor de algo, poder usufruir tudo que foi conquistado por todos os povos.

Por outro lado, o conceito de dignidade da pessoa humana pode variar conforme os povos nos termos de suas culturas, crenças, ideologias, etc. Mas seu conceito em essência sempre será o resultado dos valores éticos, morais e sociológicos do povo, no sentido de reconhecer que cada indivíduo é merecedor de respeito e consideração do Estado e da própria comunidade da qual faz parte, implicando um conjunto de direitos e deveres fundamentais que o protejam de quaisquer tratamentos desumanos ou degradantes, além de lhe garantir condições mínimas de vida. Nesse sentido afirma Airton José Cecchim[30]:

“Embora não se possa defini-la por inteiro, a dignidade humana retrata o extrato axiológico de uma sociedade, em crescente gestação de direitos e garantias, cujo objetivo primordial é o próprio ser humano enquanto pessoa, relegando a outros planos os demais interesses que circunscrevem a espécie humana. Assim, a dignidade é perceptível dentro de uma sociedade igualitária, fundada nos valores sociais e morais.”

Na medida, entretanto, em que o indivíduo age socialmente, poderá ele mesmo acabar violando a dignidade de outrem. Neste caso, o conceito de dignidade passa a ter uma qualidade social no sentido de apenas ser ilimitadamente garantida a alguém quando não se ferir outra dignidade.

Assim, a dignidade da pessoa é irrenunciável e irreversível, indissociável do ser humano.

A Constituição Federal de 88 foi a primeira no país a tratar expressamente da dignidade da pessoa humana[31], conferindo-lhe o status de princípio fundamental, compondo-se como norma insuscetível de alteração pelo poder legislador derivado (cláusula pétrea).  Não bastasse, tal Constituição ainda instituiu esse atributo intrínseco da essência humana como fundamento do Estado Democrático de Direito, tendo, exatamente por isso, supremacia incontestável.

Tal princípio está intimamente ligado à garantia do bem juridicamente mais protegido pela legislação, que é a vida. Sob este aspecto afirma Airton José Cecchin[32]que “Dignidade é vida, e a vida é direito inviolável que merece toda a proteção jurídica possível.”.

O princípio da dignidade da pessoa humana está expresso no artigo 1º da Constituição, em seu inciso III, in verbis:

“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III.a dignidade da pessoa humana;”

Neste contexto, a Carta Maior não tratou do princípio da dignidade da pessoa humana apenas no citado artigo, mas sim em vários de seus artigos e incisos, às vezes de forma explícita, outras de forma implícita.

De forma exemplificativa pode-se citar: o artigo 5º, que aborda a dignidade da pessoa humana com relação aos direitos e garantias individuais e coletivas; os artigos 6º e 7º, que tratam da dignidade da pessoa humana em relação aos direitos sociais; o artigo 8º, que sustenta tal dignidade com relação à liberdade associativa; o artigo 34, VII, “b”, onde se tem a dignidade da pessoa humana assegurada pela intervenção federal; o artigo 266, parágrafo 7º, que prevê adignidade da pessoa humana no livre planejamento familiar; o artigo 277, que garante a dignidade da pessoa humana à criança e ao adolescente e o artigo 230, que garante tal dignidade ao idoso.

Pela análise do texto constitucional, depreende-se que o Estado existe em função das pessoas e não elas em razão dele. Sendo ainda o princípio da dignidade da pessoa humana fonte de legitimidade para o Estado Constitucional.

Nesse sentido,Francisco Fernandez Segado[33]afirma que:

“…a pessoa é umminimuninvulnerável, que todo estatuto jurídico deve assegurar, sublinhamos que a dignidade da pessoa humana é um princípio absoluto. Porquanto, repetimos, ainda que se opte em determinada situação pelo valor coletivo, por exemplo, esta opção não pode nunca sacrificar, ferir o valor da pessoa, como ser humano, dotado desde mínimo intransponível”.

Sobre esta mesma questão afirma ainda Airton José Cecchin[34]:

“É necessário, desse modo, que a dignidade humana seja elevada ao máximo dentro da ordem jurídica, pois representa, em última análise, a própria vida do cidadão, uma vez que possui atributos irrenunciáveis, imprescritíveis e irreversíveis, não sendo permitido dissociá-la do homem, pois é inerente à qualidade de existir.”

Assim, tem-se que o princípio da dignidade da pessoa humana abarca todos os outros princípios e normas do nosso ordenamento jurídico, não podendo, por isso, jamais ser desconsiderado. É a dignidade da pessoa humana valor supremo a ser respeitado, constituindo-se em garantia de um mínimo invulnerável a todo indivíduo.

3.2O DIREITO À INTIMIDADE, PRIVACIDADE, HONRA E IMAGEM NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 88

Etimologicamente, a palavra intimidade origina do latim intimus, superlativo de interior, ligado aideia de íntimo. A palavra privacidade também tem origem latina, derivando de privatus, que significa pertencente a si mesmo.

Na língua portuguesa a palavra intimidade é tida como sinônimo de privacidade, constituindo elemento necessário à convivência entre os homens.

Juridicamente, segundo Alice Monteiro de Barros[35], o direito à intimidade é considerado como tipificação dos direitos da personalidade[36], que são inerentes ao próprio homem e têm por objetivo resguardar a dignidade da pessoa humana.

Segundo a autora, o direitoà intimidade é atualmente conceituado como aquele que objetiva o resguardo de cada pessoa dos sentidos alheios, de outras pessoas, isto é, visa evitar a espionagem e a divulgação de fatos íntimos, tendo como seu fundamento o próprio direito de liberdade de fazer ou não.

A autora afirma ainda que “O direito à intimidade é, portanto, o direito a não ser conhecido em certos aspectos pelos demais. É o direito ao segredo, a que os demais não saibam o que somos ou o que fazemos.”[37].

O direito à vida privada seria relativo ao poder que toda pessoa tem de assegurar a proteção de interesses extrapatrimoniaispor meio da oposição a uma investigação na vida individual, com o objetivo de salvaguardar a liberdade e a paz da vida pessoal e familiar, isto é, privada.

Assim, o direito à privacidade teria maior extensão do que o direito à intimidade, englobando todas as manifestações da esfera íntima, privada e da personalidade.

Contudo, segundo Alice Monteiro de Barros[38], esse entendimento acerca da distinção entre o direito à intimidade e à privacidade não é unânime na doutrina. Afirma a autora que existem alguns juristas, como Carlos Alberto Bittar, que entendem que o direito à intimidade seria gênero do qual a privacidade seria espécie. Neste caso, o direito à intimidade objetivaria o resguardo da vida pessoal do indivíduo de ingerências na sua esfera íntima, enquanto que o direito à privacidade seria apenas uma hipótese particular de suas várias manifestações possíveis.

Segundo a autora, há ainda os que não estabelecem qualquer distinção entre o conceito de intimidade e privacidade, a exemplo de José Cretella Júnior.

Já a palavra honra, assim como privacidade e intimidade, tem origem latina, deriva de honor que está ligado àideia de reputação, honestidade e probidade, modo de vida nos ditames da moral e da preservação da própria dignidade.

O direito à honra é relativo à proteção da dignidade pessoal do indivíduo em relação aos outros, isto é, diz respeito à necessidade de defesa da reputação do indivíduo, compreendendo o bom nome e fama no seio da coletividade (honra objetiva) e no sentimento da própria pessoa, sua estima, sua consciência da própria dignidade (honra subjetiva). O direito à honra é baseado na dignidade da pessoa, é inerente a sua própria condição.

Segundo Luis Antônio Rizatto Nunes[39] a violação ao direito à honra, de acordo com o texto da atual Constituição Brasileira, será um ataque à dignidade da pessoa, independentemente dos seus méritos ou deméritos, isto é, independentemente da sua conduta estar ou não de acordo com a conduta que a sociedade ou a respectiva comunidade adote como parâmetro de honorabilidade ou probidade.

Apesar de a ideia de honra também estar muito ligada à ideia de intimidade, em regra, são direitos distintos. As normas sobre a honra são aplicáveis diante de uma descrição inexata da vida privada da pessoa, enquanto que as normas acerca da intimidade proíbem qualquer descrição da vida privada. Contudo, nada impede que um mesmo ato lesione o direito à honra e à intimidade.

A palavra imagem vem do Latim imago,que significa cópia, aparência, aspecto, da mesma raiz de imitari, relacionada à ideia de copiar, imitar.

Juridicamente, o direito à imagem diz respeito à proteção da imagem, isto é, impressão visual, tanto do semblante da pessoa, como também de qualquer parte distinta de seu corpo. Mas, mais do que isso, diz respeito também às exteriorizações da personalidade do indivíduo em seu conceito social. O direito à própria imagem, assim, é um direito essencial ao homem.

Historicamente, os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem tiveram origem nas declarações de direitos francesa de 1879 (Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão) e americana de 1948 (Declaração Universal dos Direitos Humanos), como uma reação às atrocidades desencadeadas pelas guerras e pelo poder dominante da época.

A Constituição Federal de 88 ao impor a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental de todo o ordenamento jurídico pátrio, conforme abordado na seção anterior, consolidou a força normativa dos direitos à privacidade, honra, intimidade, imagem e a proteção deles à pessoa humana.

Tais direitos estão assegurados pela Constituição Federal de 88 no inciso X do seu artigo 5º, in verbis:

“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

X.são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;” (Grifamos)

Os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem são intrínsecos a todosos seres humanos, fazendo parte da proteção mínima necessária para que toda pessoa possa viver com dignidade e desenvolver plenamente sua personalidade humana.

Assim, em decorrência dessa grande relevância que lhes é atribuída,estes direitos gozam do status de direito fundamental, ou seja, são considerados direitos intimamente ligados à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder, sendoprotegidos no plano constitucional exatamente em decorrência da grande importância que possuem, fundamentando e legitimando todo o ordenamento jurídico.

Assim, classificam-se os direitos à privacidade, intimidade, honra e imagem como direitos individuais relativos à liberdade, com natureza jurídica de direito fundamental inerente à própria pessoa humana, direitos subjetivos.  Possuem como uma de suas principais características a oponibilidade a todos, isto é, erga omnes, a vitaliciedade (duram por toda a vida), a imprescritibilidade, inalienabilidade,indisponibilidade, intransmissibilidade e irrenunciabilidade.

Além disso, fazem parte do rol imutável do texto constitucional, já que também gozam o status de cláusula pétrea (artigo 60, § 4º, inciso IV da Constituição Federal), são direitos irrevogáveis pelo poder constituinte derivado.

Contudo, é importante esclarecer que os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem, assim como os demais direitos de personalidade, não são absolutos e nem ilimitados. Tais direitos encontram seus limites dentro do próprio ordenamento jurídico.

Os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem, direitos da personalidade, são inatos e permanentes, nascendo com a pessoa e a acompanham durante toda sua existência. Têm como finalidade principal proteger as qualidades e os atributos essenciais da pessoa humana, de forma a garantir sua dignidade e impedir agressões de particulares ou do poder público.

Assim, nota-se que os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem, consagram o princípio da dignidade da pessoa humana como ponto fundamental e essencial de todo o ordenamento. A dignidade da pessoa humana é a primeira garantia das pessoas, e osdireitos à intimidade, privacidade, honra e imagem são meios imprescindíveis de proteção da pessoa e todos os seus atributos, de forma a assegurar sua dignidade como valor fundamental.

3.3A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA DO EMPREGADO E A INVIOLABILIDADE DO SEU DIREITO À PRIVACIDADE, INTIMIDADE, HONRA E IMAGEM

O liberalismo econômico deu origem à classe do empresariado capitalista e, em oposição, à classe do proletariado. A importância dessa relação entre capitalismo e trabalho é visível em suas diversas dimensões, contudo, a inobservância do princípio da dignidade da pessoa humana tem levado a relação capital x trabalho a grandes conflitos.

A dignidade do empregado tem sofrido grandes abalos ao longo da trajetória da humanidade de forma contínua, e ainda hoje esse problema está presente. Sobre esta questão afirma Airton José Cecchin[40]:

“A discriminação irracional do trabalhador é mérito da selvageria capitalista que, no intuito devassador de auferir lucros, atribui ao ser humano traços mercantilistas, descartando-o quando não mais lhe convém, sem perquirir sobre a real função social da propriedade.”

A Constituição Federal de 88 constituiu como princípio fundamental a dignidade da pessoa humana no seu artigo 1º, inciso III e, ao tratar dos princípios gerais da atividade econômica no caput do seu artigo 170, dispôs que, in verbis:

“Art. 170.A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)” (Grifos nossos)

Assim, visto que qualquer pessoa é digna e goza do direito à proteção de sua dignidade da pessoa humana, é evidente que o trabalhador, por ser pessoa humana, também tem direito a essa proteção.

O trabalhador, como qualquer pessoa humana, tem garantida e assegurada adignidade da pessoa humana, bem como os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem. O empregado não deve e não pode ser tido como mercadoria. É exatamente a dignidade da pessoa humana do trabalhador que faz prevalecer os seus direitos, barrando qualquer tentativa de desrespeito ou violação.

A Consolidação das Leis do Trabalho também possui preocupação com a integridade do trabalhador em seu local de trabalho, conforme pode ser evidenciado pelo texto de seu artigo 483, que proíbe ao empregador ofender a honra e a boa fama do empregado.

Sobre este aspecto afirma Alice Monteiro de Barros[41]:

“Logo, não só os crimes contra a honra (calúnia, injúria ou difamação), mas outros comportamentos capazes de magoar o empregado na sua dignidade pessoal serão tidos como atentatórios à honra, enquanto a ofensa à boa fama implica expor o trabalhador ao desprezo de outrem.”

O direito à dignidade, assim como os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem, como já mencionado na seção anterior, possuem característica de oponibilidade contra todos, ou seja, erga omnes. Assim, mesmo que o Direito do Trabalho não faça menção específica e expressa a esses direitos, por serem direitos consagrados na Constituição Federal como inerentes à pessoa, são oponíveis contra o empregador, devendo ser respeitados independentemente de seu titular estar dentro do estabelecimento empresarial. A inserção do empregado no processo produtivo não lhe retira o direito à dignidade ou à privacidade, intimidade, honra e imagem.

Assim, inexiste dúvidas acerca da incidência e eficácia dos direitos da personalidade, bem como o da dignidade da pessoa humana na relação laboral, visto que o status de cidadão não é incompatível com a condição de empregado, muito pelo contrário.

Sob este aspecto, afirma Glória P. Rojas Rivero[42], que “embora os direitos fundamentais devam (...) ser considerados à luz do contrato de trabalho, desconhecê-los suporia atentar contra a própria Constituição.”

Os direitos fundamentais da pessoa, em especial os direitos à dignidade e à intimidade, privacidade, honra e imagem, não podem ser afetados quando o empregado é inserido na empresa, admitindo-se, tão somente, que sejam amoldurados na medida imprescindível do correto desenvolvimento da atividade produtiva.


4. DA REVISTA DO EMPREGADO

4.1 CONCEITO E DISTINÇÃO ENTRE REVISTA ÍNTIMA E REVISTA PESSOAL DO EMPREGADO

Revista é o procedimento adotado por alguns empregadores, com base no seu poder diretivo, de examinar o empregado e/ou seus pertences a fim de proteger o patrimônio empresarial de eventual tentativa de dilapidação.

Segundo Sandra Lia Simón[43] o procedimento de revista é “uma forma de concretização do poder de controle do empregador, no sentido de fiscalizar as atividades desempenhadas pelos empregados”.

Como se pode depreender do conceito de revista, tal procedimento tem por fundamento o poder diretivo do empregador que se justifica no seu direito de propriedade, garantido e protegido principalmente pelo artigo 5º, caput e inciso XXII da Constituição Federal de 88.

Distingue-se do conceito de revista, a revista pessoal e íntima. A expressão revista pessoal possui conceito genérico (latu sensu), consistindo em todo e qualquer exame feito pelo empregador no empregado, seja em seus pertences, tais como, sacolas, bolsas e mochilas, ou em seu corpo, a fim de proteger os bens empresariais (patrimônio empresarial) de eventual dilapidação; bem como conceito mais restrito (strictu sensu), relativo apenas àquelas revistas realizadas nos pertences no empregado. Já a expressão revista íntima consiste em procedimento mais invasivo e agressivo ao trabalhador, pois exige o exame do próprio corpo do empregado, com atos de despir e/ou toques ou contatos físicos pelo revistador.

Cumpre aqui ressaltar que, apesar de as palavras revista e vistoria na língua portuguesa terem o mesmo significado (investigar, examinar), juridicamente têm conceitos distintos. Vistoria, no direito brasileiro, estaria mais ligado à ideia de inspeção judicial, exame feito por autoridade ou perito. Enquanto que revista teria o significado acima elucidado, isto é, procedimento realizado pelo empregador de exame dos pertences ou do próprio empregado com o intuito de proteger o patrimônio empresarial de eventual dilapidação.

4.2 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE REVISTA DO EMPREGADO

Até a década de 90, não existia no ordenamento jurídico brasileiro nenhum dispositivo legal que fizesse referência expressa à revista do empregado, apesar de a Constituição Federal de 88 já proteger as pessoas das intromissões ilegítimas, assegurando-lhes o direito à intimidade, privacidade e honra, além do respeito à dignidade humana, conforme inciso III do seu artigo 1º e inciso X do seu artigo 5º, principalmente.

Contudo, segundo Alice Monteiro de Barros[44], com base no poder diretivo do empregador (caput e inciso XXII do artigo 5º da CF e artigo 2º da CLT), a maioria dos juristas brasileiros admitiam as revistas como medida preventiva, de proteção ao patrimônio empresarial, a exemplo de Octavio Bueno Magano, citado pela autora.Enquanto que outros argumentavam haver necessidade de ajuste prévio entre as partes nesse sentido ou previsão no regulamento interno da empresa como o jurista Carlos Alberto Barata Silva, também citado pela autora.

A corrente que entendia pela ilegalidade da revista por entendê-la atentatória ao direito individual do empregado era minoritária.

Entretanto, em decorrência do abuso por parte dos empregadores, em meados da década de 90 foram editadas algumas leis municipais proibindo a revista íntima, como a Lei nº 7.451 de 27/02/1998, do Município de Belo Horizonte e a Lei nº 4.603 de 02/03/1998, do Município de Vitória.

Em 1999, foi editada a Lei nº 9.799, de 26/5/1999, que incluiu o artigo 373-A no capítulo sobre o trabalho da mulher da Consolidação das Leis do Trabalho, vedando, em seu inciso IV, a prática de revistas íntimas em empregadas, in verbis:

“Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:

(...)

VI.proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias;”

Contudo, a legislação brasileira acerca da revista é ainda precária, visto que tal diploma legal proíbe expressamente apenas a revista íntima realizada em empregadas, ferindo o princípio da isonomia, consagrado no caput e inciso I do artigo 5º da Constituição Federal, deixando ainda dúvidas quanto ao alcance da expressão íntima, se abarcaria todo e qualquer tipo de revista, ou apenas aquela realizada no corpo do trabalhador.

Atualmente, é pacífico que o empregado homem também está incluído na proibição do referido artigo em decorrência da igualdade entre homens e mulheres assegurada pela Constituição Federal (caput e inciso I do artigo 5º da Carta Maior). Assim, os empregados homens podem invocar o artigo 373-A inciso IV da CLT por analogia contra a revista íntima.

Nesse sentido, foi formulado o Enunciado nº 15 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho[45] que em sua segunda parte dispõe, in verbis:

“II- Revista íntima. Vedação a ambos os sexos. A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens em face da igualdade entre os sexos inscritas no art. 5º, inc. I, da Constituição da República.”

Cita-se, com o intuito de demonstrar o entendimento nesse sentido, Decisão do Tribunal Regional do Ceará (7ª Região), in verbis:

“AÇÃO ANULATÓRIA. CLÁUSULA CONVENCIONAL AUTORIZADORA DE REVISTA EM EMPREGADOS. NULIDADE.Sendo certo que o art. 373-A, inciso VI, da CLT proíbe o empregador de realizar revistas íntimas nas empregadas, não se admitindo essa prática, também, em relação aos empregados, face ao princípio da igualdade entre os gêneros, erigido ao patamar de direito fundamental pela vigente Constituição da República, tem-se por inválida cláusula de convenção coletiva que autoriza procedimento da espécie, ainda que por pessoa de mesmo sexo.”[46]

Contudo, acerca da abrangência da expressão “íntima”, ainda resta controvérsia. Há divergência, jurisprudencial e principalmente doutrinária, se tal expressão legal diz respeito tão somente àquela revista realizada de forma efetivamente íntima, isto é, debaixo da roupa, por meio de contato físico, ou com a exigência que o empregado se desnude, sendo possível a realização de revista pessoal sob determinadas condições que descaracterizariam o caráter atentatório do procedimento.  Ou, se a expressão também abrangeria a revista pessoal, isto é, aquela realizada nos pertences do empregado, por exemplo, dentro de bolsas, mochilas ou sacolas.

Esclareça-se que a discussão é de grande relevância, posto ser decisiva acerca da proibição ou não pelo artigo celetista da revista pessoal, entendida aqui esta como aquela realizada nos pertences do empregado.

O primeiro posicionamento citado é defendido por Alice Monteiro de Barros[47],Amauri Mascaro Nascimento[48] e Eduardo Pragmácio Filho[49], por exemplo, mas sob a ressalva de que a legalidade do procedimento está adstrita à observância da dignidade da pessoa humana do empregado e seu direito à honra, intimidade e privacidade, conforme garantido constitucionalmente nos artigos 1º, caput e inciso III, 5º, inciso X e 170 principalmente. Sob tal questão a jurista Alice Monteiro de Barros[50] afirma que:

“A nosso ver, a revista se justifica, não quando traduza um comodismo do empregador para defender o seu patrimônio, mas quando constitua o último recurso para satisfazer o interesse empresarial, à falta de outras medidas preventivas. Essa fiscalização visa à proteção do patrimônio do empregador e à salvaguarda da segurança das pessoas, mormente na época em que vivemos, com o fenômeno terrorista atemorizando o mundo.

Não basta a tutela genérica da propriedade, deverão existir circunstâncias concretas que justifiquem a revista. Mister haja, na empresa, no estabelecimento ou no setor bens suscetíveis de subtração e ocultação, com valor material, ou que tenham relevância para o funcionamento da atividade empresarial e para a segurança das pessoas.”

No mesmo sentido, afirma Eduardo Pragmácio Filho[51]:

“A revista a pertences, desde que não cause constrangimentos ao empregado, não é ilegal, podendo, por exemplo, o gerente de uma loja pedir que a vendedora, ao encerrar o expediente, abra a bolsa para verificar se existem peças de roupas ali.”

Ainda acerca da corrente que sustenta a possibilidadeda realização de revista pessoal sob a observância e respeito à intimidade, privacidade, honra e, sobretudo, à dignidade, descaracterizadoo caráter atentatório do procedimento, cita-se, a título exemplificativo, decisão atual da Primeira Turma do Tribunal do Distrito Federal e Tocantins (10ª Região) que entendeu pela licitude da revista pessoal realizada no trabalhador (reclamante) em decorrência da inexistência de conduta negligente, imprudente ou abusiva, pois a fiscalização era realizada em local reservado, distante dos clientes, em todos os trabalhadores que mantinham contato com os produtos e sem contato físico, in verbis:

“REVISTA PESSOAL MODERADA E SEM ABUSOS. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA.A revista pessoal, por si só, não garante o direito ao recebimento da indenização por ofensa à moral. Ainda mais se ficar demonstrado que ela era praticada sem discriminações, de forma moderada, sem abuso nos procedimentos e sem contato físico. Tais circunstâncias, quando evidenciadas, não autorizam o reconhecimento de situação humilhante ou vexatória capaz de gerar a condenação por danos morais, resguardada que estará a integridade física e moral do empregado e, como elemento justificador, o patrimônio do empregador.”[52]

Nesse mesmo sentido, também decidiu a Segunda Turma do Tribunal do Rio Grande do Sul (4ªRegião), in verbis:

“AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. REVISTA PESSOAL. Caso em que não se caracteriza o ato ilícito patronal. Indenização indevida. A revista pessoal do empregado só é causa de dano moral quando realizada de modo abusivo, atingindo a privacidade e a intimidade do trabalhador. O mero exercício do poder de fiscalização, que é inerente ao poder de comando do empregador, através de procedimento impessoal, não caracteriza situação vexatória ao trabalhador, não se reconhecendo, neste caso, o dano moral capaz de gerar direito indenizatório. Decisão que acolheu os fatos como relatados pela reclamada, em virtude da pena de confissão, quanto à matéria de fato, em que incidiu o autor da ação. Sentença confirmada. Recurso não-provido.”[53]

Já o segundo posicionamento é o defendido, por exemplo, por Sandra Lia Simón[54]:

“Ainda que, no Brasil, esse seja o entendimento doutrinário e jurisprudencial predominante, parece difícil acreditar que, nos dias de hoje, com a grande evolução tecnológica, não exista outra forma de controle sobre os produtos que saem furtivamente da empresa. Ainda que não existissem essas formas – o que, repita-se, é bastante questionável -, há meios, previstos na legislação criminal, de se apurar a autoria de delitos como o furto, e o empregador deve, portanto, lançar mão desses meios.

(...)

Verifica-se, portanto, que o entendimento até hoje dominante a respeito da revista não surgiu de um correto juízo de ponderação, posto que se protegeu apenas o direito de propriedade em detrimento do direito à intimidade e à vida privada, bem como de todos os demais valores constitucionais anteriormente citados (honra, imagem, igualdade, presunção de inocência, garantias dos acusados, monopólio estatal da segurança).”

A fim de demonstrar-se a divergência existente, cita-se ainda decisão da primeira turma do Tribunal Regional da Paraíba (13ª Região), que entende ser a revista, tanto íntima como pessoal, medida que ultrapassaria o direito do empregador de proteger seu patrimônio contra eventual dilapidação, ferindo a intimidade do empregado, bem como a fidúcia que rege o contrato de trabalho, in verbis:

“DANO MORAL. REVISTA PESSOAL. CONFIGURAÇÃO.Cumpre ao empregador criar mecanismos assecuratórios de que o trabalhador a ser contratado corresponderá à fidúcia depositada por ocasião do exercício das funções. A idoneidade moral do trabalhador, portanto, pode e deve ser aferida antes da contratação, não sendo moralmente admissível que o empregado tenha que prová-la dia após dia, submetendo a sua intimidade à inspeção regular do empregador. Desse modo, a revista pessoal ou mesmo a íntima afigura-se procedimento desproporcional porque ultrapassa o âmbito do poder fiscalizador do empregador, e configura dano à honra subjetiva do empregado a ensejar reparação nos moldes constitucionalmente previstos.”[55]

Sob essa mesma linha de pensamento, entenderam os Tribunais Regionaisde São Paulo (2ª Região), da Bahia (5ª Região) e do Paraná (9ª Região) ser qualquer procedimento de revista atentatório à dignidade da pessoa humana do trabalhador, ferindo seu direito à honra, intimidade e privacidade, visto que tal prática ultrapassa os limites do poder diretivo do empregador, in verbis:

“RECURSO ORDINÁRIO. DANOS MORAIS. REVISTA DO EMPREGADO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.É certo que o empregador detém o pode diretivo, que lhe permite traçar as diretrizes para o atingimento de suas metas. Todavia,essa prerrogativa não se sobrepõe jamais ao princípio da dignidade humana. Os cuidados patronais pela preservação de seu patrimônio encontram limite intransponível nos direitos personalíssimos. A par disso, a revista do empregado não pode resultar em injustificada invasão de privacidade,porque invioláveis a intimidade, a vida privada,a honra e a imagem das pessoas, direitos estes assegurados por norma constitucional. O ato de submeter o reclamante ao constrangimento de ser selecionado na fila dos empregados e ter de levantar a camisa em público configura-se invasão de privacidade e é atentatório à dignidade da pessoa humana. A revista de pertences ou pessoal não pode ser vista como regra ou condição contratual, pois nem mesmo a autoridade policial está autorizada a proceder dessa forma sem mandado.A revista sem autorização judicial inverte a ordem jurídica vigente no sentido de que ninguém é culpado senão mediante prova em contrário.”[56]

“SUPERMERCADO. REVISTA PESSOAL (ÍNTIMA OU NÃO). DANO MORAL. A revista pessoal, seja ela íntima ou não, viola a dignidade da pessoa humana e a intimidade do trabalhador, direitos fundamentais de primeira geração que, numa ponderação de valores, têm maior intensidade sobre os direitos de propriedade e de autonomia da vontade do empregador. Além disso, não há dúvida quanto à opção axiológica adotada pelo constituinte de 1988 da primazia do SER sobre o TER; da pessoa sobre o patrimônio; do homem sobre a coisa.”[57]

“REVISTA EM PERTENCES DO EMPREGADO. INEXISTÊNCIA DE CONTATO CORPORAL. DANO MORAL CONFIGURADO. A realização de revista pelo empregador nos pertences de seus empregados (independentemente de serem ou não obrigados a retirar de dentro de suas mochilas o conteúdo respectivo), viola em qualquer situação, a presunção de inocência garantida pelo texto constitucional a cada cidadão (CF, artigo 5º, LVII). Denota, na verdade, uma inversão de valores morais e sociais onde o bem patrimonial se sobrepõe ao bem maior do ser humano, a sua honra, a sua dignidade, os valores sociais e éticos, comuns ao homem médio que vive em sociedade, elevados, expressos e assegurados na Lei Maior, que acabariam por ser relegados, subvertidas a escala de valores estabelecida como fundamento da própria República Federativa do Brasil: a dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, III). Considerando o avanço da tecnologia para segurança das empresas, a qual envolve eficientes e aparatosos sistemas de câmaras de vídeo, capazes, por si só, de salvaguardar o patrimônio do empregador sem ofender a dignidade do obreiro, qualquer revista, ainda que não envolva toque corporal entre vistoriador e vistoriado, importa em violação da presunção de inocência imanente a todo cidadão, tutelada também na Constituição Federal (CF, artigo 5º, LIV). Recurso da reclamada a que se nega provimento, mantendo-se a condenação imposta em sentença pelo pagamento da indenização por danos morais.”[58]

A primeira parte do enunciado nº 15 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, já citado acima, também converge nesse sentido, in verbis:

“I- Revista. Ilicitude. Toda e qualquer revista, íntima ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade do trabalhador.”

Apesar da divergência, tem-se hoje como entendimento majoritário tanto dos tribunais quanto dos doutrinadores, que o artigo celetista proíbe qualquer tipo de revista íntima, permitindo a revista pessoal desde que indispensável e insubstituível por outro procedimento menos atentatório aos direitos individuais do empregado, não devendo aindaser discriminatória e envolver circunstâncias atentatórias à dignidade da pessoahumana do trabalhador, sendo respeitada sua intimidade, privacidade, honra e imagem.

Nesse sentido demonstraser o entendimento da Seção Especializada em Dissídios Individuais do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, que tem como um de seus principais objetivos pacificar questões controvertidas na jurisprudência trabalhista, especificamente das Turmas deste Tribunal. Cita-se, a título ilustrativo, decisão atual em que se entendeu pela legalidade do procedimento de revista pessoal adotado pelo empregador, inverbis:

“EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA CONHECIDO E PROVIDO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. REVISTA MODERADA EM BOLSAS E SACOLAS. INVIABILIDADE DA CONDENAÇÃO POR PRESUNÇÃO DE CONSTRANGIMENTO. A C. Turma reformou o entendimento do eg. Tribunal Regional que havia caracterizado como passível de indenização por dano moral o procedimento da reclamada em revistar seus empregados ao final de cada expediente, com exceção dos médicos e dos diretores, que tinham acesso por outra portaria para adentrar ou sair do estabelecimento. A revista de bolsas e sacolas daqueles que adentram no recinto empresarial não constitui, por si só, motivo a denotar constrangimento nem violação da intimidade da pessoa. Retrata, na realidade, o exercício pela empresa de legítimo exercício regular do direito à proteção de seu patrimônio, se ausente abuso desse direito, quando procedida a revista moderadamente, não há se falar em constrangimento ou em revista íntimae vexatória, a atacar a imagem ou a dignidade do empregado. Decisão da C. Turma mantida. Embargos não conhecidos.”[59]

Por outro lado, corre no Congresso Nacional um Projeto de Lei da Deputada Alice Portugal, que “Dispõe sobre a proibição de revista íntima de funcionários nos locais de trabalho e trata da revista íntima em ambientes prisionais”[60].

O Projeto proíbe expressamente a prática de revista íntima em empregadas pela empresa, entendidas estas como aquelas que exijam o ato de desnudar-se ou expor o corpo, como já proibido pelo artigo celetista 373-A, impondo ainda, a empresa que descumprir a determinação, multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e, no caso de reincidência, multa de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), sem prejuízo das sanções penais e direito da empregada em pleitear perante a Justiça do Trabalho danos materiais e morais.

O Projeto já foi aprovado pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), devendo agora passar por votação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e do Plenário do Senado Federal.

4.3 HIPÓTESES ADMITIDAS DE SUBMISSÃO DO EMPREGADO À REVISTA CONFORME POSICIONAMENTO PREDOMINANTE ATUAL DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA

Como demonstrado na seção anterior, alegislação brasileira acerca dos procedimentos de revista em empregados ainda é precária, deixando muitas lacunas e dúvidas a serem resolvidas pela doutrina e jurisprudência.

O posicionamento majoritário atual acerca do tematem sustentado que o procedimento de revista se justifica quando constitua o último meio para proteger o patrimônio empresarial da dilapidação e a própria segurança das pessoas, à falta de outras medidas preventivas. Assim, não bastaria a tutela genérica do direito de propriedade do empregador, devendo existir circunstâncias concretas que justifiquem a revista. Sendo necessário ainda, segundo Alice Monteiro de Barros[61] que “… haja, na empresa, bens suscetíveis de subtração e ocultação, com valor material, ou que tenham relevância para o funcionamento da atividade empresarial...”.

Assim, a indispensabilidade da revista para a proteção do patrimônio empresarial é o requisito que limita a própria realização da revista. Havendo a possibilidade de fiscalização por outro tipo de controle, como a utilização de etiquetas magnéticas no produto, uso de dispositivos de som e filmagem, vigilância por serviço especializado, não há qualquer justificativa para a realização de revistas.

Quando a revista for utilizada pelo empregador, conforme acima exposto, jamais poderá exigir que os empregados se desnudem, com contato físico, toques, exames no corpo do trabalhador pelo empregador ou seus prepostos. A revista nunca poderá ser degradante ao trabalhador, vexatória, humilhante.

Deverá ainda ser de forma geral, impessoal e realizada por meio de critério objetivo, isto é, realizada em todos os empregados sem discriminação, ou nos empregados sorteados no dia, por numeração, ou ainda em todos os integrantes de determinado setor ou turno, etc. Deverá ocorrer sempre mediante ajuste prévio com a entidade sindical, comissão de fábrica ou empregados, de forma a não se permitir suspeitas e respeitando de forma máxima a dignidade da pessoa humana e os direitos à intimidade, privacidade e honra do trabalhador.

Assim, é inadmissível a realização de procedimento de revista por várias vezes ao dia, sem motivo excepcional justificável, bem como aquela efetuada em uma ou algumas pessoas, ainda que de forma superficial e respeitosa, pois as colocam em posição de suspeita, sendo ato totalmente discriminatório e arbitrário, além de violar o próprio princípio da presunção de inocência[62].

Exige-se ainda que a revista seja realizada mediante algumas garantias, como, por exemplo, na presença de um representante dos empregados, ou, na ausência, na presença de um colega de trabalho a fim de que não ocorram abusos.

Além disso, a revista deve ser realizada sempre no local de trabalho, devendo, em regra, ser realizada na saída da jornada laboral. Admitindo-se sua realização no início da jornada de forma excepcional, em decorrência da particularidade da situação, como, por exemplo, no caso de minas, a fim de evitar-se a entrada com materiais que possam acionar os explosivos pondo em risco a segurança do local de trabalho e do patrimônio empresarial.

Nesse sentido, afirma Sandra Lia Simón[63]:

“Sendo imprescindível a efetivação da revista, esta deverá atender aos demais requisitos: só pode ser realizada na saída dos locais de trabalho, através de um sistema de seleção automática e mediante acordo entre o empregador e a representação dos trabalhadores.”

Amauri Mascaro Nascimento[64] afirma nessa mesmalinha que:

“…a revista dos empregados vem sendo considerada pelos Tribunais como um direito de fiscalização do empregador. No entanto, se se torna abusiva da dignidade do trabalhdor, não encontrará acolhida nas decisões judiciais. terá que ser moderada, respeitosa, suficiente para que seus objetivos sejam atingidos.”

Logo, a recusa do empregado a se submeter a procedimento de revista será legítima quando tal procedimento envolver circunstâncias que afrontam sua dignidade da pessoahumana e seus direitos individuais, em especial o direito à privacidade, intimidade, honra e imagem.

Note-se que, para o entendimento jurídico atual majoritário, a revista, dentro dos limites acima elucidados, não atenta contra a intimidade, honra, privacidade, imagem e dignidade do trabalhador. Trata-se de medida que pode ser adotada pelo empregador em defesa de seu patrimônio. Contudo, a não observância de um desses ditames será suficiente para a caracterização da revista abusiva, atentatória aos direitos individuais do trabalhador, sobretudo à sua dignidade. Efetivamente, a maneira como realizada a revista é que definirá a sua legalidade ou não.

4.4 AS REVISTAS ÍNTIMAS

Conforme demonstrado no capítulo anterior, apesar de a doutrina e jurisprudência divergirem acerca da extensão da expressão “íntima” do inciso VI do artigo 373-A da CLT às revistas pessoas (entendidas estas como aquelas realizadas nos pertences do empregado), é pacífico o entendimento de que a revista de caráter íntimo, isto é, aquela realizada com a exigência de que os empregados se desnudem, com toques e/ou contatos físicos no corpo do trabalhador é atentatória à sua honra, privacidade, intimidade, imagem e, sobretudo, dignidade da pessoahumana, assegurados, principalmente, pelos artigos 1º, caput e inciso III, 5º, inciso X  e 170 da Constituição Federal.

Argumenta-se nesse sentido que inexistem situações que justifiquem e/ou autorizem o empregador a realizar o procedimento de revista em seus empregados quando esta os impõem a necessidade de se despirem, por mais “respeitosa” que seja a conduta do preposto responsável pelo procedimento, visto tratar-se de situação de extremo constrangimento, com total desrespeito do direito a preservação da intimidade, privacidade, honra, imagem e dignidade do trabalhador.

O empregador jamais poderá investir-se de poderes de polícia[65] e submeter seus empregados a situações de grande constrangimento e vergonha, vexatórias e humilhantes.

O contrato de trabalho envolve uma fidúcia mínima entre as partes contratantes, isto é, entre empregado e empregador, vigorando o princípio da boa-fé laboral[66]. Logo, não deve restar dúvidas quanto à integridade moral do trabalhador contratado.

A inserção do empregado no ambiente de trabalho não lhe retira os direitos personalíssimos. É fato pacífico que a celebração de contrato laboral enseja a submissão do empregado ao poder diretivo do empregador, sofrendo, por consequência, algumas limitações aos seus direitos da personalidade. Todavia, tal fato não justifica a total abdicação dos referidos direitos em prol do interesse patronal, pois, do contrário, haveria degradação da subordinação jurídica, levando o empregado a um estado de completa sujeição, o que é incompatível com o fim e objetivo de toda a legislação trabalhista.

Assim, as condições mínimas garantidas ao empregado enquanto ser humano poderão, tão somente, serem amoldadas à relação de trabalhado para que ela tenha um correto desenvolvimento.

A título ilustrativo cita-se entendimento da jurista Alice Monteiro de Barros[67] que afirma ser inadmissível a realização de revistas que exijam que os empregados se dispam, com contatos físicos e/ou toques no empregado pelo empregador ou seus prepostos:

“Portanto, considera-se atentatória à intimidade a inspeção que exige que o indivíduo se desnude completamente, ainda que perante pessoasdo mesmo sexo, e se submeta a exame minucioso, detalhado, prolongado ou em presença de outros. A revista nessas condições encontra limite no respeito à dignidade do trabalhador.”

(...)

Concluímos, portanto, pela impossibilidade de revista que implique sejam os empregados desnudados, independentemente de ser respeitosa a vistoria.”

Nesse mesmo sentido, cita-se algumas ementas do Tribunal Regional de São Paulo (2ª Região), que entende que as revistas consistentes em abaixar a calça ou levantar a saia e abrir a blusa com ou sem exames e toques ao corpo do trabalhador constituem ato ofensivo a sua intimidade, privacidade, honra e, em especial, dignidade, asseguradospela Constituição Federal nos artigos 1º, caput e inciso III, 5º, inciso X e 170 principalmente, in verbis:

“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. CONFIGURAÇÃO. O empregador, no exercício do poder de fiscalização tem o direito de adotar medidas com vistas a proteger o patrimônio empresarial.No entanto, esse poder não pode transbordar o dever indeclinável de respeito à dignidade da pessoa do trabalhador.A revista íntima do empregado, obrigando-o a despir suas vestes, ainda que de forma parcial, é uma maneira de subjugar o trabalhador, colocando-o em situação de investigado.Há outros meios dos quais o empresário deve se valer para exercer permanente fiscalização de seu patrimônio,porém a forma menos onerosa de exercê-la é através da revista pessoal. Trata-se de conduta que agride a dignidade do laborista, ao ter que, rotineiramente, demonstrar que é honesto, a despeito do princípio da boa-fé das partes contratantes que rege, indistintamente, a execução de qualquer contrato.”[68]

“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. Prática que repugna ao sentido de respeito à individualidade da pessoa, à intimidade,à discrição, à vergonha porque o padrão social não consagra a normalidade de se expor (nudez) a qualquer pessoa, mesmo que do mesmo sexo. A vistoria feita de forma institucional caracteriza uma invasão à intimidade, além de um permanente estado de desconfiança da honestidade alheia. Dano configurado.”[69]

“INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. Configura-se como vexatório e humilhante procedimento adotado pela reclamada,para realização de revista íntima, onde o trabalhador é obrigado a ficar completamente despido ou apenas em trajes íntimos, vez que o "homem médio" sente-se constrangido com tal exposição na frente de estranhos e o procedimento configura-se como afronta à sua moral e dignidade, autorizando o pagamento de indenização pelos danos causados.Recurso Ordinário da reclamada não provido.”[70]

Transcreve-se também ementas de outros Tribunais, a fim de se demonstrar o mencionado posicionamento jurisprudencial acerca da matéria, in verbis:

“EVISTA ÍNTIMA. ILEGALIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DEVIDA.Qualquer tipo de revista íntima perpetrada pelo empregador em seus empregados viola a dignidade e intimidade do trabalhador, valores esses protegidos constitucionalmente (arts. 1º, III e 5º, X, CF). Tal prática vai de encontro ao quanto disposto no art. 373-A, VI, da CLT.”[71]

“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. CARACTERIZAÇÃO DE ABUSO DO PODER DIRETIVO NA RELAÇÃO LABORAL.Constitui-se ato abusivo a realização de revistas íntimas, especialmente quando há determinação para o empregado desnudar-se, ferindo direito de personalidade protegido constitucionalmente. Sendo assim, compro-vada a sua ocorrência, é devida a indenização por danos morais decorrentes do ato praticado, razão por que merece reforma a decisão singular.”[72]

“DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. REVISTA DO EMPREGADO. DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. o poder diretivo do empregador o autoriza a fiscalizar a prestação do trabalho, máxime quando esta envolve o manuseio de dinheiro, mas não a proceder a revista da pessoa do empregado, obrigando-o a desnudar-se, ainda que diante de pessoa do mesmo sexo, prática lesiva à dignidade e à intimidade do trabalhador, ensejando reparação por dano moral.”[73]

“REVISTA ÍNTIMA. DANO MORAL CONFIGURADO.A prática de revistas íntimas é ensejadora de dano moral, por afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana e violação à intimidade do trabalhador. Inteligência dos arts. 1º, III, e 5º, X, da Constituição Federal. Recurso provido no aspecto.”[74]

Por fim, transcreve-se dois arestos que demonstram o entendimento da Seção Especializada em Dissídios Individuais do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que o procedimento de revista íntima é ilícita, pois atenta aos direitos individuais do empregados, sobretudo sua dignidade, in verbis:

“PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E MULTA PREVISTA NO ART. 538 DO CPC. Toda a questão já havia sido tratada pela Turma que, no acórdão primeiro, expendeu fundamentação em relação a todos os aspectos questionados. Assim, correto se afigura o acórdão recorrido quando rejeitou os Embargos de Declaração e, entendendo serem protelatórios, aplicou a multa prevista no art. 538 do CPC. Portanto, não se verifica negativa de prestação jurisdicional e, tampouco, revela-se viável a exclusão da multa imposta.SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHA. A Súmula 357 desta Corte no sentido de que "não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador" tem aplicabilidade também em casos como o presente, em que se discute a validade da prova testemunhal quando a testemunha litiga contra o mesmo empregador em ação com idêntico objeto.

DANO MORAL. Os fatos narrados pelo Tribunal Regional são suficientes para se ter como configurado o dano moral com ofensa à intimidade da reclamante consistente na submissão da empregada a revista íntima, ainda que praticada por pessoa do mesmo sexo. Assim, a decisão regional em vez de violar o art. 5º, inc. X, da Constituição da República, atendeu aos seus ditames bem como ao disposto no art. 1º, inc. III, da Constituição da República, assegurando a inviolabilidade da intimidade e a dignidade da pessoa humana, constituindo esse último direito um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

BASE DE CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO. A teor da Súmula 422 desta Corte, não se conhece de recurso para o TST "quando as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que fora proposta".Recurso de Embargos de que não se conhece.”[75] (Destaque nosso)

“EMBARGOS. DANOS MORAIS. REALIZAÇÃO DEREVISTA ÍNTIMA. CONHECIMENTO DO RECURSO DE REVISTA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. Nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 37 da C. SBDI-1, a Turma é soberana na análise de divergência jurisprudencial.

DANOS MORAIS - REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. A C. Turma conheceu do Recurso de Revista da Reclamante por divergência jurisprudencial, a evidenciar a não-ocorrência de revisão do conjunto probatório. No mérito, julgou segundo os fatos revelados pelo acórdão regional. Incólume o Enunciado nº 126/TST.

DANOS MORAIS. RECONHECIMENTO DO DANO. PREVISÃO NORMATIVA DA REVISTA. 1. O Eg. Tribunal Regional consignou que a Reclamante era submetida a revistas diárias, nas quais lhe era demandado abaixar as calças até os joelhos e levantar a camisa até os ombros. 2. Demonstrada a violação à honra e intimidade da Reclamante, não aproveita à Reclamada a alegação de previsão normativa da revista. A autorização de realização do procedimento não se comunica com a abusividade dos meios empregados, razão da condenação.

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO1 - O arbitramento do dano moral, pelas próprias circunstâncias que o definem, ocorre de maneira necessariamente subjetiva, segundo critérios de justiça e eqüidade, ainda que, em cada situação específica, seja dada ao magistrado a oportunidade de fixar parâmetros à apreciação do dano sofrido.2 - O dano moral tem o escopo de, por um lado, compensar a vítima pelo dano sofrido e, por outro, punir o infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia. Na fixação desse valor, levam-se em conta as condições econômicas e sociais das partes envolvidas, bem como a gravidade da falta cometida.3. Assim, em sendo plausível o quantum fixado pela C. Turma, que levou em consideração o dano causado e a condição econômica da Reclamada, não há falar em sua alteração, a fortiori pela inexistência de firme critério legal.Embargos não conhecidos.”[76](Destaque nosso)

Ressalte-se aqui que, a revista íntima por si só já é atentatória a dignidade do empregado, independentemente do procedimento a ser realizado em todos os empregados, sem discriminação, conforme posicionamento doutrinário e jurisprudencial atual, acima já demonstrado.

Esclareça-se, contudo, que a exigência de que os empregados, sem qualquer discriminação entre eles, sejam submetidos à revista por preposto do mesmo sexo, em local reservado, sem contato físico, com a exigência apenas de que retire os sapatos, levante a bainha da calça até a altura dos joelhos, levante as mangas e solte os cabelos não constitui procedimento atentatório à intimidade do trabalhador para a jurisprudência e doutrina predominante, pois, segundo essa corrente, não há em tal procedimento ato atentatório aos direitos individuais do trabalhador ou a sua dignidade. Ressaltando-se apenas que, o procedimento apenas será lícito quando não houver qualquer outro meio eficaz de proteger o patrimônio patronal.

Cita-se, nesse sentido, decisão do Tribunal Regional do Paraná (9ª Região), que afirma que o fato de os empregados terem que levantar a bainha da calça e abrirem a jaqueta, bem como suas bolsas e sacolas para a revista visual na saída do expediente, não configura procedimento ilegal, nem viola os direitos individuais e a dignidade do trabalhadorin verbis:

“REVISTA EM BOLSAS E JAQUETAS. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL.Por mais que a abertura da bolsa e jaquetas perante a recepcionista pudesse causar constrangimentos ao Autor, tal situação não tem o condão de se caracterizar como dano moral, tendo em vista que o procedimento adotado pela empresa não era abusivo e se direcionava indistintamente a todos os empregados, tendo sido adotados os devidos cuidados para não expor o empregado e nem tratá-lo de forma discriminatória."ORecorrente alega que a revista realizada nos seus pertences causou-lhe grande constrangimento, violando o seu direito à intimidade, ensejando indenização justa que venha a coibir atos semelhantes no futuro por parte do Recorrido e a amenizar a desonra sofrida. Não lhe assiste razão. A Constituição Federal dispõe expressamente que "é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem"(art. 5º, V, CF) e que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação"(art. 5º, X, CF). A revista pessoal de trabalhador, efetuada no âmbito da relação empregatícia, vem sendo admitida como legítima quando essa fiscalização apresente-se como meio de proteger o patrimônio do empregador, desde que diretamente relacionado com o próprio objeto da atividade econômica empreendida ou com a segurança interna da empresa. Tal situação decorre do fato de que os direitos fundamentais das partes envolvidas, quais sejam, o direito de propriedade da empresa (art. 5º, XXII, CF) e o direito à intimidade do empregado (art. 5º, X, CF)- não são absolutos, devendo ser interpretados de modo a um não excluir a incidência do outro, tendo em conta ainda os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Conforme apurado na audiência de instrução, a empresa procedia diariamente à revista visual e em bolsas de seus funcionários ao final do expediente, de forma regular e dentro de parâmetros razoáveis, tendo o Recorrente declarado em seu depoimento pessoal que "tinha que erguer a barra da calça, a camisa e mostrar a parte interna da jaqueta para a recepcionista" e que "caso estivesse com alguma bolsa, tinha que mostrar o conteúdo dela", destacando que "todos os empregados submetiam-se à revista"(fl. 66, itens 14 e 24). O preposto da Recorrente afirmou que "a revista ocorria na saída da Loja, sendo que o empregado que laborava na portaria pedia para o empregado abrir bolsa ou sacola para mostrar o conteúdo", inclusive ressaltando que "não havia revista pessoal"(fl. 67, item 08). A testemunha JOSEMIR esclareceu que "tal tipo de revista era igual para todos os empregados, com exceção da chefia"(fl. 67, item 12). Por mais que a abertura da bolsa e jaquetas perante a recepcionista pudesse causar constrangimentos ao Recorrente, tal situação não tem o condão de se caracterizar como dano moral, tendo em vista que o procedimento adotado pela empresa não era abusivo e se direcionava indistintamente a todos os empregados, tendo sido adotados os devidos cuidados para não expor o empregado e nem tratá-lo de forma discriminatória. Esse é o posicionamento seguido no âmbito desta C. 4ª Turma, como se constata pelas ementas a seguir transcritas: "DANO MORAL-REVISTA-INDENIZAÇÃO INDEVIDA-A Reclamada reconheceu que realizava revistas em sacolas ou bolsas transportados pelos empregados, quando estes deixavam o local de trabalho. Entretanto, tal conduta não pode ser considerada como ilícita, pois as revistas eram direcionadas a todos os empregados e eram procedidas de forma superficial, sem qualquer abuso. Ademais, não restou comprovado qualquer prejuízo à integridade moral do Reclamante, de forma que é indevida a indenização postulada. (TRT PR 03752-2005-872-09-00-5, Rel. Desemb. Arnor Lima Neto, publicado em 26-06-2007)" "REVISTAS EM BOLSAS, MOCHILAS E SACOLAS-DANO MORAL-NÃO CONFIGURADO-Não resta configurado o dano moral quando a revista limita-se à averiguação do conteúdo de bolsas, mochilas e sacolas. O procedimento utilizado pela reclamada não se traduz prática abusiva ou discriminatória que tenha atingido a intimidade, privacidade, dignidade e honra do reclamante. À reclamada cumpre zelar pelo seu patrimônio podendo usar, para tanto, do seu direito de fiscalização, neste incluído o direito de proceder revistas em seus funcionários, desde que não exceda o seu poder diretivo. Trata-se de norma interna de procedimento, que visa resguardar o patrimônio, a idoneidade e a" saúde "financeira da empresa, o que é de interesse inclusive dos empregados que dependem financeiramente da empregadora.(TRT PR 08650-2006-002-09-00-0, Rel. Desemb. Sérgio M. R. Lemos, publicado em 13-06-2008)" Nada a prover."(TRT PR 00867-2008-005-09-00-3 (RO).”[77] (Grifo nosso)


5. A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA DO EMPREGADO VERSUSO DIREITO DE PROPRIEDADE DO EMPREGADOR NOS PROCEDIMENTOS DE REVISTA ÍNTIMA

Como já demonstrado nos capítulos anteriores, os direitos à intimidade, privacidade, honra, imagem e dignidade da pessoa humana, garantidos e assegurados pela Constituição Federal nos seus artigos 1º, caput e inciso III, 5º, inciso X e 170, são direitos indisponíveis e irrenunciáveis, além de terem oponibilidade erga omnes. A mesma Constituição ainda assegura o direito de propriedade no caput e inciso XXII do seu artigo 5º.

No ambiente laboral, o empregador possui o poder diretivo (artigo 2º da CLT), fundado no seu direito de propriedade, para assegurar a execução do trabalho e exigir que o serviço seja corretamente prestado por seus empregados.

De outro lado, os empregados, enquanto seres humanos, possuem assegurados os direitos da personalidade e a garantia de respeito a sua dignidade da pessoa humana, impondo algumas restrições ao exercício do poder diretivo do empregador, para que o serviço seja exigido de forma respeitosa e humanitária.

Os direitos da personalidade do trabalhador, por consequência, também sofrem algumas limitações naturais decorrentes da celebração do contrato de trabalho e aceitação do controle do empregador.

Assim, o legislador, ao reconhecer o poder diretivo do empregador, legitimou a limitação dos direitos da personalidade do empregado em decorrência das exigências do desenvolvimento da atividade laboral, entretanto, o poder de direção também é submetido a limites, em especial, o respeito à dignidade da pessoa humana do empregado e seus direitos à privacidade, intimidade, honra e imagem.

Essa relação entre poder diretivo do empregador, fundado no direito de propriedade,e direitos da personalidade do empregado, fundados na dignidade da pessoa humana, está presente em várias situações do cotidiano da prestação de trabalho. Ambos os direitos devem ser respeitados, todavia, por serem naturalmente antagônicos, acabam por surgir algumas controvérsias acerca da extensão da proteção a ser conferida a cada um deles.

Nesse contexto, acaba sendo inevitável a colisão entre o direito de propriedade do empregador, assegurado no caput e inciso XXII do artigo 5º da CF/88, com os direitos da personalidade e a dignidade da pessoa humana do empregado, garantidos pelos artigos 1º, caput e inciso III, 5º, inciso X e 170 da CF/88 principalmente. Em outras palavras, o exercício do direito fundamental de propriedade do empregador aparentemente colide com o exercício do direito fundamental à honra, intimidade, privacidade, imagem e dignidade do empregado.

Edilson Pereira de Farias, citado por Sandra Lia Simón[78], afirma que esse conflito direto entre dois direitos fundamentais de titulares diferentes se caracteriza quando o pressuposto de fato de um direito “interceptar o pressuposto de fato de outro direito fundamental”. É o que acontece no caso em que o empregador, fundamentado no seu direito de propriedade, exige que seus empregados se submetam às revistas íntimas, afrontando seus direitos de intimidade, privacidade, honra, imagem e, em especial, dignidade da pessoa humana.

Para este caso do procedimento de revistas íntimas, em que se tem instaurado aparentemente um conflito entre o direito de propriedade do empregador e os direitos de personalidade do empregado, em especial o direito à dignidade da pessoa humana, entende a doutrina e jurisprudência de forma pacífica que o direito à privacidade, honra, intimidade, imagem e, sobretudo, dignidade do empregado enquanto pessoa humana, prevalecem sobre o direito de propriedade do empresário. Isto porque a dignidade da pessoa humana é um sobrepricípio constitucional que coordena e garante todo o Estado Democrático de Direito Brasileiro, sendo sua observância a própria condição para a existência humana.

Entende-se que todo o ordenamento jurídico brasileiro e, portanto, também o Direito do Trabalho, converge no sentido de proteger e salvaguardar os valores pessoais que são a própria condição da existência humana, visto que, sem a efetiva proteção deles, comprometer-se-ia a condição humana, a vida em sociedade e a existência do próprio Estado. Obviamente, diante da grande relevância, devem os direitos inerentes à personalidade prevalecer sobre os valores materiais, que se caracterizam como necessidade humana secundária.

A Constituição Federal de 88 colocou a dignidade da pessoa humana como o mais importante princípio a ser seguido, revelando-o como verdadeiro valor supremo a ser respeitado e protegido por todo o ordenamento.

Assim, no ambiente laboral, apesar de o empregador ter garantido seu poder de direção, fundado no seu direito de propriedade, para que possa garantir a efetivação da sua atividade empresarial, este poder jamais poderá se sobrepor as garantias humanas mínimas asseguradas por todo o ordenamento jurídico a todas as pessoas enquanto seres humanos, e, portanto, a todos os trabalhadores.

Sob este aspecto, afirma Maurício Godinho Delgado[79]:

“Sabiamente, a Carta Magna percebeu que a valorização do trabalho é um dos mais relevantes veículos de valorização do próprio ser humano, uma vez que a larga maioria dos indivíduos mantém-se e se afirma, na desigual sociedade capitalista, essencialmente, por meio de sua atividade laborativa.”

Cita-se abaixo algumas ementas atuais do Tribunal Regional de São Paulo (2ª Região) que demonstram o entendimento no sentido acima mencionado, in verbis:

“REVISTA ÍNTIMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. No confronto entre o direito de propriedade do empregador e o direito à dignidade da pessoa humana do empregado, este deve prevalecer sobre o primeiro, pois traduz princípio fundamental sobre o qual se esteia o próprio Estado Democrático de Direito (art. 1º, III, CF), e do qual decorre, necessariamente,outro direito fundamental, o da inviolabilidade da intimidade, que encontra assento constitucional no art. 5º, X, da Constituição da República, que assegura, expressamente,o direito à indenização pelos danos materiais e morais decorrentes da sua violação. Assim, é manifesto que as revistas íntimas realizadas pela ré, exigindo que os empregados ficassem em trajes sumários diante de seguranças ou de seus prepostos, ocasionava constrangimento de ordem moral ao reclamante, pois a situação é nitidamente vexatória, decorrendo daí o dever de indenizar o dano moral causado.”[80]

“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. Violação do princípio da dignidade humana. Indenização. Desde o advento do Direito do Trabalho, a proteção à pessoa do trabalhador era a pedra de toque desse ramo especializado da ciência jurídica. Some-se a isso a evolução dos ordenamentos jurídicos, notadamente após a segunda metade do século XX, em que se constatou que assegurar apenas a igualdade formal não era o bastante para garantir os ideais tão caros aos liberais do século XIX (igualdade, fraternidade e solidariedade). A adesão do Brasil à ONU e a conseqüente Declaração Universal dos Direitos Humanos impõe ao operador do direito diretrizes na interpretação e aplicação das normas jurídicas.Nesse contexto, a intangibilidade pessoal do empregado é direito cuja proteção não se limita ao trabalhador enquanto tal, mas a qualquer ser humano. A relação de trabalho subordinada confere alguns poderes ao empregador, mas não autoriza a relativização do direito à incolumidade física.Destarte, a revista íntima não se justifica, seja pelo poder diretivo, seja pelo direito de propriedade, cuja construção doutrinária teve por fundamento a vetusta concepção do empregado como um dos elementos de produção, e não como ser humano.”[81]

“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. PROVA TESTEMUNHAL. OFENSA À DIGNIDADE HUMANA (artigo 1º, III, CF), A HONRA E A IMAGEM (artigo 5º, X, CF). CONFLITO COM DIREITO DE PROPRIEDADE. Aplicação da técnica do sopesamento, da ponderação, pois nenhum direito constitucional pode derrogar outro. Prevalece o direito à honra e à imagem do trabalhador, com vistas à valorização da dignidade humana, verdadeiro superprincípio constitucional, em aplicação, inclusive, da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares. Recurso da reclamada parcialmente provido.”[82]

Além disso, no conflito envolvendo o direito de propriedade, a própria Constituição Federal apresenta a solução, visto que o referido direito de propriedade está submetido ao cumprimento de sua função social, isto é, ao seu uso sempre de acordo com o interesse social de forma a não servir para atos atentatórios à lei, seus princípios e aos próprios valores sociais, conforme artigo 5º, inciso XXIII e artigo 170 da Carta Maior. A observância da função social da propriedade nada mais visa do que proteger o seu uso de forma indevida e contra o que todo o ordenamento jurídico visa proteger.

Assim, utilizando o empregador do seu direito de propriedade para proceder revistas íntimas em seus empregados, em total afronta a seus direitos de intimidade, privacidade, honra, imagem e dignidade, age em desconformidade com a função social de sua propriedade, em total afronta ao valor do trabalho humano. Nesse sentido é o ensinamento de Sandra Lia Simón[83]:

“Em alguns casos, a própria Constituição dá a solução para o conflito. Por exemplo, o direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII) convive com a possibilidade de desapropriação, condicionada está última à necessidade ou utilidade pública, ou ao interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro (art. 5º, inciso XXIV).”

Portanto, o empregador que se utiliza do seu poder diretivo, e por consequência, de seu direito de propriedade, a fim de justificar procedimento atentatório aos direitos e garantias mínimos assegurados aos seus empregados enquanto seres humanos, não atua em conformidade com a exigência do inciso XXIII do artigo 5º e artigo 170 da CF/88de cumprimento da função social da propriedade, deixando, por consequência, de ser amplamente protegida pelo direito.

Verifica-se, assim, que o poder de direção do empregador, fundado no seu direito de propriedade, encontra limites que visam proteger os direitos fundamentais do empregado enquanto pessoa humana, direitos estes fundados no próprio princípio norteador de todo o ordenamento jurídico pátrio, que é a dignidade da pessoa humana, visto que a Constituição Federal de 88 colocou o ser humano como valor supremo a ser respeitado, sendo nítida a prevalência do ser em detrimento do ter.


CONCLUSÃO

Em conformidade com toda a pesquisa, análise e estudo realizado acerca do tema do presente trabalho monográfico, conclui-se que o direito de propriedade é entendido como aquele direito individual, pleno e absoluto no sentido de que o proprietário detém amplos poderes jurídicos sobre o que lhe pertence. Éassegurado a todos os indivíduos, inclusive àquele na qualidade de empregador, enquanto empresário, a fim de proteger todo o seu patrimônio de eventuais turbações.

Referido direito autoriza e assegura ao empregador o uso do poder diretivo para que possa determinar como deverá ocorrer a prestação de serviços por parte de seus empregados, segundo os seus interesses particulares empresariais.

Contudo, o direito de propriedade não é absoluto e deve seguir os limites impostos por sua função social, isto é, seu uso em conformidade não apenas com os interesses particulares do empregador, mas também os dos trabalhadores enquanto partes do organismo empresarial e da própria sociedade como um todo.

O poder diretivo, por consequência, também se limita à função social da propriedade, devendo ainda ser utilizado pelo empregador sempre em respeito aos direitos do empregado assegurados por todo o ordenamento jurídico, em especial, seu direito à intimidade, privacidade, honra, imagem e, sobretudo, dignidade.

Sob outra face, a dignidade da pessoa humana é um atributo intrínseco do próprio ser humano e à sua essência, com ele se desenvolvendo. É indissociável ao ser humano.

Exatamente por isso a Constituição Federal de 88 conferiu-lhe o status de princípio fundamental, integrando-a a parte do rol imutável de seu texto.  Colocou-a ainda como atributo intrínseco do Estado Democrático de Direito, sendo valor supremo a ser respeitado e garantia mínima a todo indivíduo.

Da dignidade da pessoa humana desdobram-se os direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem, que são direitos intrínsecos a todos os seres humanos, fazendo parte da proteção mínima necessária para que toda pessoa possa viver com dignidade e desenvolver plenamente sua personalidade. Exatamente em decorrência da importância destes direitos, a Carta Maior também lhes conferiu o status de direito fundamental e cláusula pétrea, tendo oponibilidade erga omnes, sendo, ainda, indisponíveis e irrenunciáveis.

O empregado, exatamente por ser pessoa humana na qualidade específica de trabalhador tem assegurado todos estes direitos que devem ser respeitados pelo seu empregador.

Por outro lado, o procedimento de revista é aquele utilizado por alguns empregadores a fim de proteger seu patrimônio empresarial de eventual depreciação. Pode ser realizada em caráter pessoal, entendida como aquele exame feito nos pertences do trabalhador como bolsas, sacolas e mochilas, ou em caráter íntimo, entendida como aquela realizada no próprio corpo do empregado com toques e/ou exigência que se dispa.

A legislação acerca do procedimento de revista no ordenamento jurídico brasileiro é ainda singela, limitada ao quanto disposto no artigo 373-A da Consolidação das Leis do Trabalho. Referido dispositivo legal deixa dúvidas interpretativas acerca da abrangência de sua aplicação, bem como da extensão dos limites que impõe, principalmente no que concerne as sua aplicabilidade ao empregado do sexo masculino, visto referir-se apenas à empregada mulher, e quanto ao significado da expressão íntima.

Acerca da sua aplicabilidade aos empregados do sexo masculino, a doutrina e jurisprudência são pacíficas quanto à extensão da referida legislação ao trabalhador do sexo masculino por analogia, posto que a Constituição Federal assegura a igualdade entre homens e mulheres nos termos do princípio da isonomia.

Já quanto à extensão da expressão íntima, apesar de ainda existir discussão, a doutrina e jurisprudência dominante têm entendido ser relativa tão somente àquela revista realizada no corpo do empregado, com toques e/ou a exigência que se desnude, sendo, portanto, tão somente esta proibida pelo artigo celetista.

Referido entendimento decorre da análise como um todo do ordenamento jurídico brasileiro, posto que a revista de caráter íntimo, independentemente da forma como é realizada, mesmo que respeitosa, já é atentatória aos direitos à intimidade, privacidade, honra e imagem do empregado, sobretudo, sua dignidade da pessoa humana.

Apesar de, aparentemente, existir um conflito entre o direito de propriedade do empregador e os direitos personalíssimos do empregado, fundados na dignidade da pessoa humana, o próprio ordenamento jurídico oferece a solução, posto que, limita o uso da propriedade empresarial conforme sua função social e coloca a dignidade da pessoa humana como sobreprincípio constitucional, que coordena e garante todo o Estado Democrático de Direito Brasileiro, sendo sua observância e respeito a própria condição para a existência humana.

Assim, apesar do empregador ter garantido seu direito de propriedade, este direito apenas será coberto pela proteção jurídica se seu uso sempre for de acordo com o interesse social de forma a não servir para atos atentatórios à lei e aos próprios valores sociais, jamais se sobrepondo as garantias individuais mínimas, em especial, a dignidade da pessoa humana, objetivo maior de proteção de todo o ordenamento jurídico pátrio e própria condição de existência do Estado Democrático de Direito Brasileiro.


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Notas

[1]Orlando Gomes,Direitos reais, 8ª Edição, Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 84 apud Sandra Lia Simón, A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 113.

[2]Luis da Cunha Gonçalves, Da propriedade e da posse, Volume IV, Lisboa: Ática, 1952, p. 89,apud Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, p. 208.

[3] Direito Civil Brasileiro, p. 209.

[4] Curso de Direito Civil, p. 83.

[5]Direito Civil Brasileiro, p. 208.

[6] Corpóreas são aquelas coisas que existem materialmente e são objeto de direito. Já as incorpóreas, ao contrário, seriam aquelas que podem ser objeto de direito, mas inexistem materialmente. Segundo Sílvio de Salvo Venosa: “Bens corpóreos são aqueles que nossos sentidos podem perceber: um automóvel, um animal, um livro. Os bens incorpóreos não têm existência tangível. São direitos das pessoas sobre as coisas, sobre um produto de seu intelecto ou em relação à outra pessoa, com valor econômico: direitos autorais, créditos, invenções”. (Direito Civil parte geral, p. 285).

[7] Os direitos fundamentais são aqueles caracterizados como individuais, visto que pertencem exclusivamente ao indivíduo, devendo o Estado observá-los, cumpri-los e respeitá-los. Esses direitos têm, assim, a função de assegurar os direitos individuais mínimos a todos. No entendimento de José Joaquim GomesCanotilho os direitos fundamentais são: "(...) direitos do particular perante o Estado, essencialmente direito de autonomia e direitos de defesa.". (Direito Constitucional e teoria da Constituição, p. 1378).

[8] Tais declarações, segundo Airton José Cecchin, tinham como objetivo assegurar que não mais se repetiriam as atrocidades desencadeadas pelas guerras, assim como, garantir que os direitos individuais mínimos de cada indivíduo fossem respeitados pelo poder dominante, não sofrendo qualquer restrição. (A dignidade humana nas relações de trabalho, p. 72).

[9]José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional positivo, 13ª Edição, São Paulo: Malheiros, 1997 apud Sandra Lia Simón, A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 114.

[10] A ordem econômica na Constituição de 1998, p. 253.

[11]A ordem econômica na Constituição de 1998, p. 253.

[12]A ordem econômica na Constituição de 1998, p. 255.

[13]Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 225.

[14] Curso de Direito do Trabalho, p. 576.

[15]Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 49.

[16]Alguns autores ainda acrescentam a esta classificação o poder regulamentar, que seria um poder do empregador de legislar no âmbito da empresa, isto é, criar regulamentos ao contrato de trabalho, sempre respeitando o ordenamento jurídico, a exemplo do jurista Amauri Mascaro Nascimento (Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 229).

[17] A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 107.

[18] A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 227.

[19]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 110.

[20]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 110.

[21] Princípios constitucionais do trabalho, p. 170.

[22]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 109.

[23]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 111.

[24]Curso de Direito do Trabalho, p. 576.

[25]Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 214.

[26]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 106.

[27]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 118.

[28]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 110-111.

[29]Direito e estado no pensamento de Immanuel Kant, Brasília: UnB, 1991, p. 68, apud Tânia GiandoniWolkoff Giorgi, Princípios constitucionais e o princípio da dignidade humana, p. 258.

[30] A dignidade humana nas relações de trabalho, p. 93.

[31]A primeira Constituição a tratar de forma explícita da dignidade da pessoa humana foi a Constituição Alemã de Weimar de 1919, da seguinte forma, segundo Tânia GiandoniWolkoff Giorgi: “O respeito à pessoa humana é um limite constitucional ao poder legislativo”. (Princípios constitucionais e o princípio da dignidade humana, p. 259).

[32] A dignidade humana nas relações de trabalho, p. 92.

[33]Francisco Fernandez Segado, Teoria jurídica de losderechosfundamentales em laconstituiciònespañolade 1978 y em suinterpretaciòn por el Tribunal Constitucional, Revista de informação legislativa, 121/69 – 102, Brasíla, 1994, p. 74 aput Tânia GiandoniWolkoff Giorgi, Princípios constitucionais e o princípio da dignidade humana, p. 262.

[34]A dignidade humana nas relações de trabalho, p. 92.

[35] Proteção à intimidade do empregado, p. 28.

[36] Os direitos da personalidade estão vinculados ao reconhecimento de valores da pessoa como ser humano, necessários ao desenvolvimento de seu potencial e higidez psíquica, moral e física, como a vida, a integridade, o nome, a imagem, a honra e a privacidade. Segundo o jurista italianoAdriano de Cupis: ‘‘...,existem certos direitos sem os quais a personalidade restaria uma susceptibilidade completamente irrealizada, privada de todo o valor concreto: direitos sem os quais todos os outros direitos subjetivos perderiam todo o interesse para o indivíduo — o que equivale a dizer que, se eles não existissem, a pessoa não existiria como tal.’’. (Adriano de Cupis, Os direitos da personalidade, Livraria Morais, p. 17, apud Leonardo Roscoe Bessa, Direitos da personalidade, p. 01).

[37]Proteção à intimidade do empregado, p. 29.

[38]Proteção à intimidade do empregado, p. 29-30.

[39] O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana – doutrina e jurisprudência, p. 51.

[40]A dignidade humana nas relações de trabalho, p. 70.

[41] Proteção à intimidade do empregado, p. 33.

[42] Glória P. Rojas Rivero, La Libertas de expresióndeltrabajador,Madrid: Trotta, 1991, p. 39, apud Sandra Lia Simón, A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 128.

[43]A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 146.

[44]Proteção à intimidade do empregado, p. 73.

[45]Realizada em 2008pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), Tribunal Superior do Trabalho (TST), Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENAMAT) e Conselho Nacional das Escolas de Magistratura do Trabalho (CONEMATRA), visou o debate das grandes questões do Direito do Trabalho e de outras matérias afetas à competência do Judiciário Trabalhista.

[46] TRT 7ª Região. Processo nº: 0186000-79.2009.5.07.000.0, Relator (a): Antonio Marques Cavalcante Filho, Data de Julgamento: 27/07/2010, Pleno do Tribunal, Data de Publicação: 03/09/2010, DEJT, acessado em: 04/07/2011.

[47] Curso de Direito do Trabalho, p. 583.

[48]  Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 148.

[49] Revista íntima no ambiente de trabalho, p. 01.

[50]Curso de Direito do Trabalho, p. 583.

[51]Revista íntima no ambiente de trabalho, p. 01.

[52]TRT 10ª Região, Processo nº: 00844-2008-102-10-00-2, Relator (a): Pedro Luis Vicentin Foltran, 1ª Turma, Data de Julgamento: 29/10/2008, Data de Publicação: 07/11/2008, DEJT, acessado em: 04/07/2011.

[53]TRT 4ª Região, Processo nº: 01772-2007-561-04-00-2, Relator (a): Flávio Portinho Sirangelo, 2ª Turma, Data de Julgamento:05/03/2009, DJE, acessado em: 06/07/2011.

[54] A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 147-148.

[55]TRT 13ª Região, Processo nº: 00369.2009.025.13.00.4, Ação Civil Pública nº: 111490 PB, Relator (a): Ana Clara de Jesus Maroja Nobrega, 1ª Turma, Data de Julgamento: 27/10/2009, Data de Publicação: 18/12/2009, DJ, acessado em: 06/07/2011.

[56]TRT 2ª Região, Processo nº: 01579-2005-312-02-00-4, Relator (a): Marcelo Freire Gonçalves, 12ª Turma, Data de Julgamento: 26/03/2009, Data de Publicação: 03/04/2009, DJ, acessado em: 06/07/2011.

[57]TRT 5ª Região, Processo nº: 0143200-69.2009.5.05.0007, Relator (a): Cláudio Brandão, 2ª Turma, Data de Publicação: 20/06/2011, DJ, acessado em: 06/07/2011.

[58]TRT 9ª Região, Processo nº: 31937-2008-651-09-00-5, Relator (a): RosemarieDiedrichs Pimpão, 2ª Turma, Data de Publicação: 02-02-2010, DJPR, acessado em: 06/07/2011.

[59]TST, Processo nº: E-RR - 615854-67.1999.5.09.5555, Relator (a): Aloysio Corrêa da Veiga, SDI-1, Data de Publicação: 19/10/2007, DJ, acessado em: 06/07/2011.

[60]Ver conteúdo completo.

[61] Proteção à intimidade do empregado, p.74.

[62] O princípio da presunção de inocência é desdobramento do princípio do devido processo legal, previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, segundo o qual, enquanto o acusado não for condenado por uma sentença transitada em julgado, ostentará o estado de inocência. Assim, todos se presumem inocentes, devendo o Estado comprovar a culpabilidade do acusado.

[63] A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 147.

[64] Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 148.

[65] O poder de polícia, de forma genérica, pode ser conceituado como sendo a atividade administrativa, isto é, inerente ao Estado, que limita o exercício dos direitos individuais em benefício da segurança e bem estar da coletividade, abrangendo tantos os atos do executivo quanto do legislativo, refletindo-se como medidas do Estado que visam delinear a liberdade e a propriedade dos cidadãos.

[66]O contrato de trabalho baseia-seem uma relação de fidúcia, em que há confiança recíproca entre empregado e empregador. Assim, a boa-fé pressupõe o caráter fiduciário da relação contratual, ou seja,o empregador espera do trabalhador qualidade de serviço, honestidade, etc., e o trabalhador, um tratamento condigno e o pagamento do salário combinado, por exemplo.

[67] Curso de Direito do Trabalho, p. 585.

[68]TRT 2ª Região. Processo nº: 00134-2007-015-02-00-3, Relator (a): Rosa Maria Zuccaro, Data de Julgamento: 24/02/2010, 2ª Turma, Data de Publicação: 05/03/2010, DJ, acessado em: 14/07/2011.

[69]TRT 2ª Região. Processo nº: 01114-2006-014-02-00-2, Relator (a): Rafael E. Pugliese Ribeiro, Data de Julgamento: 04/05/2010, 6ª Turma, Data de Publicação: 14/05/2010, DJ, acessado em: 14/07/2011.

[70]TRT 2ª Região. Processo nº: 00209-2007-023-02-00-0, Relator (a): Davi Furtado Meirelles, Data de Julgamento: 08/04/2010, 14ª Turma, Data de Publicação: 23/04/2010, DJ, acessado em: 14/07/2011.

[71]TRT 5ª Região. Processo nº:0000575-05.2010.5.05.0192, 4ª Turma, Data de Publicação: 05/05/2011, DJ, acessado em: 14/07/2011.

[72]TRT 22ª Região. Processo nº: 00736-2008-004-22-00-9, Relator (a): Manoel Edilson Cardoso, Data de Julgamento: 09/09/2008, 2ª Turma, Data de Publicação: 23/9/2008, DJT/PI, acessado em: 14/07/2011.

[73]TRT 1ª Região. Processo nº: 01438-2006-015-01-00-2, Relator (a): Dalva Amélia de Oliveira, Data de Julgamento: 25/03/2008, 9ª Turma, Data de Publicação: 08/04/2008, DORJ, acessado em: 14/07/2011.

[74]TRT 6ª Região. Processo nº: 0000202-05.2010.5.06.0011, Relator (a): Dinah Figueirêdo Bernardo, Data de Publicação: 21/06/2011, DJ, acessado em: 16/07/2011.

[75]TST, Processo nº: ED-RR - 19900-83.2003.5.01.0042, Relator (a): João Batista Brito Pereira, SDI-1, Data de Publicação: 21/08/2009, DEJT, acessado em: 16/07/2011.

[76]TST, Processo nº: ED-RR - 641571-42.2000.5.02.5555, Relator (a): Maria Cristina IrigoyenPeduzzi, SDI-1, Data de Publicação: 13/08/2004, DJ, acessado em: 16/07/2011.

[77]TRT 9ª Região. Processo nº: 485-2009-245-9-0-6, Relator (a): Luiz Eduardo Gunther, 4 ª Turma, Data de Publicação: 02/02/2010, DJPR, acessado em: 17/07/2011.

[78]Edilson Pereira de Farias, Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de informação e expressão, Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, Editor, 1996, p. 93, apud Sandra Lia Simón, A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 122.

[79] Princípios constitucionais do trabalho, p. 125.

[80]TRT 2ª Região. Processo nº: 00155-2007-072-02-00-3, Relator (a): Adalberto Martins, Data de Julgamento: 28/05/2009, 12ª Turma, Data de Publicação: 05/06/2009, DJ, acessado em: 19/07/2011.

[81] TRT2ª Região. Processo nº: 01473-2007-303-02-00-1, Relator(a): Rovirso Aparecido Boldo, Data de Julgamento: 10/02/2010, 8ª Turma, Data de Publicação: 19/02/2010, DJ, acessado em 19/07/2011.

[82]TRT 2ª Região. Processo nº: 00207-2006-441-02-00-5, Relator (a): Francisco Ferreira Jorge Neto, Data de Julgamento: 15/07/2010, 12ª Turma, Data de Publicação: 23/07/2010, DJ, acessado em 19/07/2011.

[83] A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 123.


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BARALDI, Cristiane. A violação do princípio da dignidade da pessoa humana do empregado no procedimento de revista íntima no direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3421, 12 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22999. Acesso em: 23 abr. 2024.