Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/24193
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O novo divórcio e o Estatuto das Famílias

O novo divórcio e o Estatuto das Famílias

Publicado em . Elaborado em .

Há controvérsia na doutrina em relação à Emenda Constitucional nº 66/2010, a Emenda do Divórcio. No entanto, tais discussões poderão ser amenizadas ou mesmo findadas com o advento do chamado Estatuto das Famílias.

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo visa analisar a Emenda Constitucional n. 66/2010, que foi promulgada em 13 de julho de 2010, juntamente com as várias discussões doutrinárias a seu respeito, os seus efeitos e as perspectivas para o futuro. O objeto da referida reforma constitucional foi a modificação do art. 226, § 6º da Carta Magna, que passou a vigorar com a seguinte redação: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.”

Tal emenda, também chamada pela doutrina de “Novo Divórcio”, tem a intenção de fazer desaparecer o lapso temporal de 02 anos de separação de fato e a prévia separação judicial como requisitos para a propositura das ações de divórcio, assim, permanecendo, tão somente, o divórcio direto e sem necessidade de qualquer decurso de tempo para a sua propositura.

O que se quer é trazer à tona a análise dos impactos trazidos com a Emenda, os seus reflexos e as discussões que foram suscitadas. No entanto, para se chegar a isso é necessário expor uma visão geral do divórcio desde o seu surgimento, sendo perceptível a sua evolução paralela com a sociedade. Pode-se afirmar, então, que o objetivo geral deste trabalho é dissertar, à luz da doutrina e jurisprudência pátria, sobre os efeitos trazidos pela alteração constitucional e as perspectivas para o futuro. Como objetivos específicos têm- se a análise histórico- evolutiva do divórcio até o advento da atual reforma na Carta Magna, as discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca do fim da separação judicial e da culpa, os principais artigos do Código Civil que foram afetados pela Emenda 66 e, ainda, os entendimentos da doutrina sobre como ficaram as ações de separação judicial que ainda não foram sentenciadas e, também o estado civil do separado judicialmente a partir da mudança.

Nesse sentido, esta monografia tem sua estrutura baseada nos próximos capítulos, que estão organizados na seguinte ordem: Histórico do Divórcio; A Emenda Constitucional n. 66/2010 e seus efeitos; Estatuto das Famílias: O passo seguinte? .

O primeiro capítulo (Histórico do Divórcio) inicia-se com as diversas definições de casamento que progrediram com as sociedades, fazendo-se presente nos conceitos iniciais a figura da indissolubilidade do vínculo matrimonial. Posteriormente, busca-se estabelecer uma análise histórico-evolutiva do divórcio no Brasil, passando pelo período de indissolubilidade do vínculo conjugal, pela Lei que instituiu o Divórcio no Brasil, qual seja Lei n. 6.515/1977, pelo divórcio com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e com o Código Civil de 2002, pela Lei do Divórcio Extrajudicial ou Administrativo (que trouxe a possibilidade da separação e do divórcio consensuais serem feitos no cartório perante o tabelião de notas) e, por fim, pela Emenda Constitucional n. 66/2010 e suas críticas iniciais.

No segundo capítulo observa-se a repercussão da Emenda 66 na separação judicial, no fim da culpa pelo término do casamento, apresentando-se entendimentos doutrinários e jurisprudenciais diversos acerca de cada questão. Outrossim, observam-se os efeitos desta em relação a guarda dos filhos, o uso do sobrenome pelo cônjuge culpado e a questão dos alimentos devidos ao cônjuge culpado. Este capítulo traz, ainda, como subcapítulo, outros efeitos da inovação, que são as questões de direito intertemporais, analisando como devem ser resolvidas as situações transitórias e as já consolidadas que foram atingidas pela inovação. Na última subseção, discutem-se os principais artigos do Código Civil que são considerados afetados com o advento do Novo Divórcio.

Finalmente, o terceiro e último capítulo dispõe sobre mais uma grande novidade que pode repercutir nos questionamentos surgidos com a Emenda Constitucional n. 66/2010. Trata-se de um substitutivo do Projeto de Lei, PL n. 674/2007, que institui o chamado Estatuto das Famílias. No entanto, esse ainda não foi incorporado no ordenamento jurídico pátrio, uma vez que foi aprovado apenas pela Câmara dos Deputados, estando no aguardo de sua votação pelo Senado Federal (essa informação ainda é atual?). Este Estatuto irá retirar do Código Civil toda a matéria de Direito de Família passando a discipliná-la e, além disso, trará novos regramentos em certos aspectos da disciplina.

Portanto, pode-se observar que o tema abordado no seguinte trabalho é bastante palpitante e de grande importância, uma vez que trata de discussões acerca do “Novo Divórcio”, que são atuais e relevantes para a sociedade. Por conseguinte, resta claro a necessidade de um estudo mais aprofundado de cunho legislativo, bibliográfico e jurisprudencial sobre o tema, para que as famílias brasileiras se atualizem e entendam tais mudanças, as quais ainda encontram-se em amadurecimento.


2 HISTÓRICO DO DIVÓRCIO

 

 

2.2 ANTECEDENTES

Diversos são os autores que trazem conceitos acerca do casamento, sendo este um instituto que reflete concepções originais ou tendências filosóficas. Dessa forma, temos que Modestino[1], escritor da época clássica do Direito Romano, denota as idéias predominantes no período clássico, e diz que ”o casamento é a conjunção do homem e da mulher, que se unem para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano”.

Posteriormente à definição supracitada, surgiu uma segunda conceituação romana acerca do casamento, que foi a de Ulpiano, consagrada nas Institutas de Justiniano, que nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves[2], ”desfigurou aquela noção tão grandiosa e sacramental, desaparecendo a alusão ao direito divino e a referência à perenidade do consórcio de vidas”.

No direito Brasileiro, em meados do Século XIX, Laffayette[3] definiu o casamento como sendo “o ato solene pelos quais duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre, sob a promessa recíproca de fidelidade no amor e na mais estreita comunhão de vida”. Esta conceituação é bastante pragmática e denota uma realidade diferente da atualidade. Nesse contexto, procurou- se dar ênfase a solenidade do ato e a indissolubilidade do vínculo criado pelo casamento.

Contemporaneamente, pode- se, então, visualizar conceitos mais abrangentes do instituto que se adéquam em certa medida à realidade social que está sendo vivenciada, como se vê na definição feita pela doutrinadora Maria Helena Diniz[4]: “O casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família”. Segundo a autora, “o matrimônio é a peça-chave de todo o sistema social, constituindo o pilar do esquema moral, social e cultural do país” [5].

Percebe- se que no conceito de Modestino o casamento é visto como algo divino, que deve perdurar por toda a vida, enquanto, no de Maria Helena Diniz, o casamento é algo que visa o auxílio dos cônjuges com intuito de constituir família. Nesta última definição não está presente a visão sacramental e de união perpétua do casamento. Diante disso, pode- se inferir que as definições de casamento foram se modificando de acordo com a evolução dos costumes e das tendências filosóficas que os influenciavam. Nas palavras do doutrinador Caio Mário:

É óbvio que a noção conceitual do casamento não pode ser imutável. As ideias que convinham ao povo hebreu do Velho Testamento, que satisfaziam o grego, que abrandavam aos romanos, que vigiam na Idade Média, e mesmo as que predominavam no Século XX – já que não atendem às exigências da nossa geração, que assiste a uma profunda transformação do social, do político, do econômico. E, sendo a família um organismo em lenta, mas constante mutação, o casamento que a legitima há de aperfeiçoar- se às condições ambientes e contemporâneas.[6]

Isso faz concluir que as definições, assim como as características essenciais do casamento se modificam de acordo com a história, refletindo sempre a realidade da sociedade a que pertencem.

Caio Mário[7] defende que, ao contrário do que se pensa, a indissolubilidade do casamento não é a regra. Nos povos primitivos assim como nas civilizações antigas, o casamento era suscetível de rompimento, salvo algumas exceções.

 Assim, no direito Romano, o que se admitia era a perda da affectio maritalis. Nas palavras de Venosa:

No direito Romano, o casamento dissolvia- se pela morte de um dos cônjuges, pela perda da capacidade e pela perda da affectio maritalis. Desse modo, a perda da afeição matrimonial era, mais do que um conceito de separação, uma consequência do casamento romano. Desaparecendo a affectio, desparecia um dos elementos do casamento.[8]

A esse propósito, segundo o autor mencionado, na época clássica, em decorrência do contato existente de outros povos com a civilização grega, houve modificação nos costumes primitivos e, consequentemente, enfraquecimento da organização e estabilidade familiar. Sendo também possível, aqui, a extinção do vínculo matrimonial.[9]

No entanto, com o fortalecimento cada vez maior do Cristianismo, segundo Venosa[10], “a doutrina sobre a indissolubilidade do vínculo conjugal ganha forma definitiva no século XII, ao mesmo tempo em que se cria a teoria da separação de corpos, que faz cessar a vida em comum sem possibilidade de contrair novas núpcias”.

Carlos Roberto Gonçalves[11] assevera, em sua obra civilista, que foi o Concílio de Trento (1545 a 1553), que consagrou o dogma do sacramento do matrimônio para os católicos e a indissolubilidade do vínculo, motivo pelo qual o Cristianismo era contra o divórcio e tomava providências para dificultá-lo.

 O casamento surgiu como indissolúvel, no Brasil, uma vez que este país foi descoberto durante o Apogeu do Cristianismo. Tal vínculo era considerado, nas palavras de Gagliano Stolze e Pamplona Filho[12], como um “pacto submetido às regras do Direito Natural, como consequência de preceito divino, dito pelo próprio Cristo”. Nesse contexto, era vivenciada uma enorme resistência jurídica à extinção do vínculo conjugal, somente sendo admitida no caso de morte ou do reconhecimento de nulidade do matrimônio.

Desta sorte, o casamento no Brasil perdurou por muito tempo como sendo indissolúvel onde apenas existia a figura do “desquite”. Nas palavras de Gagliano Stolze e Pamplona Filho:

Nessa fase, há apenas o desquite, instituto de influência religiosa que gerava somente a dissolução da sociedade conjugal, com a manutenção do vínculo conjugal e a impossibilidade jurídica de contrair formalmente novas núpcias, o que gerava tão só “famílias clandestinas”, destinatárias do preconceito e da rejeição social.[13]

Assim, devido a grande influência da Igreja Católica, o direito Canônico  influenciava de forma decisiva a civilização e, por conseguinte, a legislação daquela época. Diante disso, a resistência ao divórcio era enorme e encontrava-se inclusive positivada em todas as Constituições Brasileiras anteriores ao advento da Emenda Constitucional n. 9, de 28 de junho de 1977.

  Conclui- se que por muito tempo o casamento, no Brasil, foi bastante influenciado pelas regras do Direito Canônico, que não admitia insucesso no matrimônio, permitindo, tão somente, a “separação de corpos”. Tal situação não abria margem aos “separados” de contrair novo matrimônio. Maria Berenice Dias[14] defende que tudo isto decorreu do intuito de o Estado dar proteção ao patrimônio do casal em detrimento da felicidade dos próprios cônjuges.

 No entanto, diante das mudanças e do amadurecimento no pensamento da sociedade, adveio a Emenda Constitucional n. 9/77, que introduziu a possibilidade da dissolução do vínculo conjugal, nos casos expressos em lei, desde que se obedecesse ao lapso temporal de prévia separação judicial por mais de 03 (três) anos.

2.3 EVOLUÇÃO DO DIVÓRCIO NO BRASIL

No Brasil-Império, a indissolubilidade do casamento se manteve, pois nesta época, a Influência da Igreja continuava quase que absoluta, prevalecendo, ainda, o Concilio Tridentino e a Constituição Primeira do Arcebispado da Bahia.[15]

Com a Proclamação da República em 1889, houve definitivamente uma separação entre Estado e Igreja. Logo, com essa divisão era necessário que o país, enquanto Estado laico, passasse a disciplinar acerca dos casamentos. Com o Decreto 181\1890, foi instituído o casamento civil no Brasil e, consequentemente, o divórcio, com acepção diversa da atual, de acordo com Silvio Rodrigues:

Trouxe a previsão de uma espécie de divórcio, na qual o liame matrimonial era apenas atenuado, ficando os cônjuges desobrigados de alguns deveres conjugais, como a coabitação e a fidelidade, pois o desquite acarretava apenas a separação de corpos do casal. Com o advento do Código de 1916, a palavra desquite foi introduzida no Direito Brasileiro, pois o mencionado decreto usava a expressão divórcio. De qualquer forma, aquele Código trouxe poucas modificações e nada inovou ao direito anterior, apenas o nome do Instituto.[16]

 Portanto, segundo o mencionado doutrinador, mesmo com o advento do Código Civil de 1916, não houve inovações de grande relevância em relação ao decreto supracitado, mas houvera tão só uma troca de denominações, que de divórcio passou a chamar-se “desquite”. Acerca disso, o promotor e professor de direito de família, Dimas Messias de Carvalho relata que:

O Código Civil de 1916 adotou os mesmos princípios do Dec. 181/1890, com poucas modificações, mantendo o casamento exclusivamente civil, sem reconhecer o religioso, até a Constituição de 1934, entretanto, substituiu o vocábulo divórcio por desquite, mais apropriado, já que nas legislações estrangeiras, o divórcio era admitido como dissolução do vínculo conjugal, o que não era permitido no Brasil.[17]

Segundo Maria Berenice Dias[18] o desquite significava “não quites”, ou seja, alguém em débito para com a sociedade. Tal fato demonstra a resistência e o preconceito de forma severa por parte desta.

Enfatiza- se que as próprias Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 mantiveram a indissolubilidade do casamento sem grandes mudanças significativas. Nas palavras de Gagliano Stolze e Pamplona Filho[19], “a resistência positivada ao divórcio era de tal ordem que até os textos constitucionais traziam previsão da indissolubilidade do casamento, o que perdurou até nossa penúltima Constituição”.

Em 1977, o divórcio foi instituído no Brasil através da Emenda Constitucional nº 9 de 28 de junho de 1977, de autoria do Senador Nelson Carneiro, que foi regulamentada pela Lei 6.515/77. Dessa forma, Silvio Rodrigues nos esclarece que:

A Lei 6.515, de 26 de dezembro de 1977, regulamentou o divórcio e veio permitir o divórcio a vínculo em duas hipóteses, uma de caráter permanente e outra de caráter transitório, a saber: a) poderá a separação judicial, dadas as condições configuradas na lei, ser sempre convertida em divórcio. b) poderá o divórcio ser obtido após a separação de fato por mais de cinco anos iniciada antes de dezembro de 1977.[20]

Esta lei inovou ao permitir a hipótese de divórcio vincular, que é aquele que dissolve completamente o vínculo conjugal de forma a permitir novo casamento. Além disso, deu nova denominação ao desquite, que passou a se chamar separação judicial. Nas palavras de Dimas Messias de Carvalho:

A Lei 6.515 de 26 de dezembro de 1977, chamada Lei do Divórcio, regulou os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento. Manteve o divórcio ao vínculo e passou a designar o desquite como separação judicial, revogando o Capítulo I e parte do Capítulo II do Título IV do Código Civil de 1916 ( arts. 315 a 328) que tratava da Dissolução da Sociedade Conjugal e Proteção da Pessoa e dos Filhos.[21]

A lei acima expendida estabelecia, como regra, a modalidade de divórcio- conversão, que acontecia quando depois de separado judicialmente por 03 (três anos), o casal poderia requerer a conversão da separação em divórcio. Entretanto, abria também a possibilidade do divórcio direto, porém este estava somente ao alcance dos casais separados de fato há mais de 05(cinco) anos em 28 de junho de 1977. Impende destacar que esse divórcio era admitido somente uma única vez.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o instituto do Divórcio foi alterado profundamente. Convém destacar os ensinamentos do doutrinador Dimas Messias:

A Constituição Federal de 1988, em seu art.226, §6º, alterou profundamente o divórcio, reduzindo o prazo de conversão para um ano (eram três); admitiu o direto em qualquer época (só era permitido para as separações de fato anteriores à EC n. 09/77); reduziu o prazo para dois anos de separação de fato (eram cinco) e não colocou limites ao número de divórcios, limitado pelo art.38 da lei 6.515/77 em apenas uma vez, ao dispor que:

Art. 226.(...)

(...)

§6º. O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. [22]

Assim, a Constituição Federal de 88 reduziu o prazo da separação judicial e de fato para 1 (um) ano no caso de divórcio conversão e de 2 anos para divórcio direto, respectivamente. Sendo uma importante mudança a possibilidade do divórcio ser realizado inúmeras vezes, ou seja, sem haver um número limitado.

Isto posto, Paula Maria Tecles Lara[23] ressalta que, nesse contexto, o indivíduo passou a ser mais importante do que seu patrimônio, sendo abolido o caráter patrimonialista da prévia separação judicial, já que deixou de ser elemento necessário a dissolução da sociedade e do vínculo conjugal, importando- se muito mais com a dignidade da pessoa dos cônjuges.

 Após a Constituição Federal de 1988, adveio a Lei n. 7.841, de outubro de 1989, que tinha por finalidade adaptar a nova lei do divórcio à Carta Magna. Segundo Carlos Roberto Gonçalves:

A Lei n. 7.841, de 17 de outubro de 1989, limitou- se a adaptar a Lei do divórcio à nova Constituição. Deu, porém, nova redação ao art. 40 da referida lei, excluindo qualquer possibilidade de discussão a respeito da causa eventualmente culposa da separação. O único requisito exigido para o divórcio direto passou a ser, assim, a comprovação da  separação de fato por mais de dois anos.[24]

Em 2002, o novo Código Civil manteve o mesmo sentido da Constituição Federal, prevendo a existência da separação judicial ou separação de fato como requisito para o pedido do divórcio. Assim, Caio Mário esclarece que:

O Código Civil, seguindo a linha de orientação da Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, abraçou a teoria do “divórcio-remédio”, sem prejuízo da separação judicial pura e simples (contenciosa ou consensual), que provoca a dissolução da sociedade conjugal sem a ruptura do vínculo matrimonial.[25]

Logo, no art. 1.571 do atual Código, fora repetido o art. 2º da Lei nº 6.615/77:

Art.1.571. A sociedade conjugal termina:

I-                   pela morte de um dos cônjuges;

II-                 pela nulidade ou anulação do casamento;

III-              pela separação judicial;

IV-              pelo divórcio.[26]

Dessa forma, Sílvio Venosa chama atenção para o seguinte aspecto:

No cotejo dessa norma, fica bem claro que a separação judicial faz terminar a sociedade conjugal, mas o vínculo do casamento somente dissolve- se pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. É exatamente essa informação que consta do §1º do art. 1572, o qual acrescenta que se aplica a presunção estabelecida no Código para o ausente[27].

Portanto, Venosa adverte para o fato do novo Código ter incluído a morte presumida, também, como forma de rompimento do vínculo conjugal, que, anteriormente, na Lei do Divórcio, se dava, tão somente, pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. Insta ressaltar, ainda, que a Lei 6.515/77 permanece em vigor naquilo não regulado pelo Código Civil de 2002, em especial as disposições de natureza processual.

 De acordo com o doutrinador Dimas Messias de Carvalho[28], “o Código Civil voltou a regular a dissolução da sociedade matrimonial, do vínculo conjugal e a proteção da pessoa dos filhos, nos moldes da Lei do divórcio. Contudo, trouxe pequenas alterações no que tange, especialmente, a redução dos prazos da separação consensual e remédio”.

A Lei nº 11.441, de 05 de janeiro de 2007, veio tornar possível a separação e o divórcio consensuais, administrativamente ou extrajudicial, desde que obedecidos alguns requisitos. Nesse sentido, o autor supracitado assevera que:

A Lei 11.441, de 04 de janeiro de 2007, trouxe grande inovação ao direito pátrio, permitindo- se a separação e o divórcio consensuais administrativamente ou extrajudicial, mediante escritura pública perante o tabelião de notas, não havendo filhos menores ou maiores incapazes, desde que assistidos por advogado. A escritura pública de separação e o divórcio extrajudicial constituíram título hábil para o registro civil e o registro de imóveis, produzindo todos os efeitos jurídicos.[29]

Para a maioria da doutrina, a referida lei veio para desafogar o judiciário. Ela é considerada tão benéfica que não existe previsão de qualificação específica aos separados extrajudicialmente, sendo abarcados pelo gênero “separação legal ou jurídica”. Diante disso Dimas Messias ensina que:

 A inovação na legislação é tamanha, ao permitir administrativamente atos até então exclusivos do judiciário, que sequer existe previsão de qualificação do estado civil das pessoas separadas extrajudicialmente. Como se sabe, a qualificação civil da pessoa separada legalmente, diferenciando- se da separação de fato, é separada judicialmente, não existindo previsão para a separada extrajudicialmente ou administrativamente. A separação legal ou jurídica passou a ser gênero que comporta as espécies de separação judicial e extrajudicial, necessitando, doravante, ser modificado o estado civil da pessoa separada judicialmente para separada legalmente ou juridicamente.[30]

Ainda sobre a Lei em comento, a professora Maria Luiza Póvoa Cruz[31] defende que “tal inovação revela- se reformadora quanto à dinâmica a que se propõe para desafogar o judiciário, e inovadora quanto aos meios de atingir os seus objetivos cravando- se na nossa jurisfera como um meteoro incandescente, provocando efeitos não imaginados pelo legislador.”

Vê-se, portanto, que a Lei 11.441/2007 foi um importante passo para o divórcio no Direito de Família Brasileiro, sendo fator que de certo influenciou na promulgação da Emenda 66, de 13 de julho de 2010. 

Dessa forma, a EC n. 66/2010 foi um avanço maior ainda na legislação Brasileira e fruto de enorme desempenho do IBDFAM- Instituto Brasileiro de Direito de Família, sobre isso Grisard Filho preleciona que:

A EC n.66/2010 foi um grande avanço na legislação brasileira e fruto de enorme empenho do IBDFAM- Instituto Brasileiro de Direito de Família, liderado por seu dinâmico presidente Rodrigo da Cunha Pereira, após deliberação em plenário no IV Congresso Brasileiro de Direito de Família, realizado em Belo Horizonte, no sentido de ser apresentada Emenda Constitucional com o objetivo de unificar no divórcio todas as hipóteses de cessação da vida conjugal, restando apresentadas as PECs 413/05 e 33/07, subscritas pelos deputados e associados do IBDFAM Antônio Carlos Biscaia, ex- promotor de justiça em vara de família, e Sérgio Barradas Carneiro, consolidadas no substitutivo do Deputado Joseph Bandeira.[32]

Ocorre que a mudança não foi vista com bons olhos por todos. Alguns integrantes da Igreja Católica criticaram a sua promulgação, sob o argumento de que irá causar a banalização do divórcio. Nas palavras do vice- presidente da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil), Dom Luiz Soares Vieira:

Se facilitar muito, eu acho que se banaliza mais ainda o matrimônio, que já está banalizado. O único problema é esse. Daqui a pouco, a pessoa vai na frente de qualquer juiz e diz que não é mais casada e depois vai na frente de qualquer ministro da Igreja e casa de novo. É banalizar demais uma coisa que é muito séria.[33]

Com argumento contrário, o próprio Presidente da CNBB, Dom Geraldo Lyrio Rocha entende que a nova proposta ao invés de estimular o divórcio, estimula casamentos. Diante disso asseverou que:

Isso é secundário em relação à questão fundamental. Mesmo que a legislação do país permita o divórcio, para a Igreja, o divórcio não é permitido de forma alguma. A Igreja reafirma a indissolubilidade e a estabilidade do matrimônio.[34]

No entanto, tal discussão não gerou repercussão entre os estudiosos do direito de família, ao contrário, já que foi vista quase pela unanimidade como medida inovadora e benéfica.

A emenda foi promulgada em 13 de julho de 2010, dando nova redação ao §6º da Constituição Federal de 1988. Esta excluiu do texto constitucional a separação jurídica, o divórcio por conversão e a necessidade de prazo para a decretação do divórcio. Logo, passou a valer a seguinte redação:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(...)

§6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.[35]

Tem-se que o Novo Divórcio, para a grande maioria dos doutrinadores, aboliu do ordenamento jurídico a separação jurídica. Na opinião deles, não mais se justifica no momento atual este instituto, posto que no momento anterior, quando da introdução do divórcio no Brasil, através da EC 09/1977, existia no país grande resistência da Igreja frente ao temor de se ocorrer uma “enxurrada” de divórcios e consequente enfraquecimento da família, fato que não se concretizou. Logo, naquela época, por tal razão se justificava a existência de uma prévia separação para posterior decretação do divórcio. Nas palavras de Dimas Messias:

Os temores não se concretizaram e a experiência histórica demonstrou que o divórcio, ao invés de enfraquecer, fortaleceu as famílias, possibilitando que casais que já não possuíam afeto se libertassem do vínculo, constituindo novos casamentos, felizes e estruturados.[36]

Assim, este estudo visa à análise da EC n. 66/2010, com os seus efeitos, discussões doutrinárias e perspectivas, que serão melhores apresentados no decorrer deste trabalho.


3 A EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010 E OS SEUS EFEITOS

 

 

3.1 O OBJETO DA EMENDA

O novo divórcio, que foi instituído pela Emenda Constitucional 66/2010, veio, de acordo com Pablo Stolze e Pamplona Filho[37], com intuito de facilitar a implementação do divórcio no Brasil, passando este a ser reconhecido como o simples exercício de um direito potestativo. Assim, para muitos, a mudança extirpou a figura do divórcio conversão, passando a vigorar, tão somente, o divórcio direto e sem a necessidade de qualquer lapso temporal, podendo ser proposto a qualquer tempo.

Ocorre que, com tal inovação, a doutrina tem enfatizado alguns pontos fundamentais, como a questão da extinção da separação jurídica, da desnecessidade da exigência de prazo de separação de fato para propor ação de divórcio, do fim da culpa, dentre outros aspectos, que serão a seguir analisados.

3.2 O FIM DA SEPARAÇÃO JURÍDICA?

Com o advento da Emenda Constitucional 66/2010, muitos autores defendem o fim da separação jurídica, como já foi dito. No entanto, tal entendimento não é unanimidade, visto que outros juristas argumentam pela persistência da separação mesmo diante dessa mudança. Assim, trata- se de discussão atual e consistente, a persistência ou não da separação jurídica, a qual encontra- se refletida na jurisprudência pátria.

Sobre tal divergência Maria Berenice Dias defende que:

Como o tema é novo, a maioria dos textos são publicados em jornais ou estão disponíveis na internet. Mas a grande maioria de quem escreveu sobre a novidade sustenta que acabou a separação judicial, e, com ela, a exigência de prazos e a identificação das causas para a concessão do divórcio. O entendimento diametralmente oposto, sustentando que a mudança não é autoaplicável e não pode ser implementada antes de regulamentada pela lei ordinária, tem poucos adeptos. Mas há também posições singulares. Mesmo diante da reforma, persistiria a possibilidade da separação, quando esta for a vontade de ambos os cônjuges.[38]

Diante disso, para que se possa aprofundar em tal debate é necessário diferenciar a separação do divórcio. Assim, tem-se que separação judicial foi prevista expressamente no direito brasileiro desde a EC 09/77, a qual abriu a possibilidade de dissolução do casamento pelo divórcio. Com a separação, era dissolvida a sociedade conjugal, colocando-se fim a determinados deveres do casamento, como o de coabitação, fidelidade recíproca, facultando- se, também, a realização da partilha patrimonial. Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona enfatizam:

Como sabemos a separação judicial era medida menos profunda que o divórcio. Com ela dissolvia- se, tão somente, a sociedade conjugal, ou seja, punha- se fim a determinados deveres decorrentes do casamento, como o de fidelidade recíproca, facultando- se também, em seu bojo, a realização da partilha patrimonial. Nesse sentido, estabelecia o art.1.576 do Código Civil:

Art.1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens.[39]

Portanto, a separação judicial não dissolve o vínculo matrimonial como no divórcio, mas sim, a sociedade conjugal, que no escólio de Carlos Roberto Gonçalves[40], ”é o complexo de direitos e obrigações que formam a vida em comum dos cônjuges.” Dessa forma, tal separação não permite aos cônjuges que contraiam novas núpcias, mas apenas extingue alguns deveres pertinentes ao casamento. Além disso, nesta existe a possibilidade de reconciliação, o que não acontece no divórcio.

Logo, não se pode confundir sociedade conjugal com vínculo matrimonial, visto que este último não se dissolve apenas com a separação. O vínculo conjugal somente é extirpado pela morte de um dos cônjuges, divórcio, nulidade ou anulação do casamento e morte presumida.

Com a mudança na Carta Magna, Gagliano Stolze e Pamplona Filho acompanhados da maioria dos civilistas, defendem o desaparecimento da separação jurídica no Direito Brasileiro, juntamente com alguns dispositivos do Código que a regulavam, por achar que esta se tornou inútil. Diante disso, os doutrinadores supracitados arguem que:

Sob o prisma jurídico, com o divórcio, não apenas a sociedade conjugal é desfeita, mas também o próprio vínculo matrimonial, permitindo- se novo casamento; sob o viés psicológico, evita- se a duplicidade de processos – e o strepitus fori – porquanto pode o casal partir direta e imediatamente para o divórcio; e, finalmente, sob a ótica econômica, o fim da separação é salutar, já que, com isso, evitam- se gastos judiciais desnecessários por conta da duplicidade de procedimentos.[41]

O doutor em direito civil e advogado Paulo Luiz Netto Lobo utiliza embasamentos ainda mais incisivos pela extinção da separação jurídica, afirmando sobre a força normativa da Carta Maior de revogar a legislação ordinária:

Há grande consenso, no Brasil, sobre a força normativa própria da Constituição, que não depende do legislador ordinário para produzir seus efeitos. As normas constitucionais não são meramente programáticas, como antes se dizia. É consensual, também, que a nova norma constitucional revoga a legislação ordinária anterior que seja com ela incompatível. A norma constitucional apenas precisa de lei para ser aplicável quando ela própria se limita "na forma da lei". Ora, o Código Civil de 2002 regulamentava precisamente os requisitos prévios da separação judicial e da separação de fato, que a redação anterior do parágrafo 6º do artigo 226 da Constituição estabelecia. Desaparecendo os requisitos, os dispositivos do Código que deles tratavam foram automaticamente revogados, permanecendo os que disciplinam o divórcio direto e seus efeitos. O entendimento de que permaneceriam importa tornar inócua a decisão do constituinte derivado e negar aplicabilidade à norma constitucional.

(...)

Não podemos esquecer da antiga lição de, na dúvida, prevalecer a interpretação que melhor assegure os efeitos da norma, e não a que os suprima. Isso além da sua finalidade, que, no caso da EC 66, é a de retirar a tutela do Estado sobre a decisão tomada pelo casal.[42]

Há, ainda, quem argumente que a separação jurídica não existe mais, em decorrência da própria necessidade de se acompanhar a desenvoltura social atual, onde se prospectou a autonomia privada. Nesse sentido:

 O direito de família, em especial, a separação, deve ser repensado à luz dessa autonomia privada. Por meio da autonomia privada, o indivíduo pode autodeterminar sua vida, conduzi- la da forma como melhor lhe convir em busca de sua felicidade, sempre respeitando os direitos de terceiros e as limitações constitucionais à sua liberdade.[43]

A contrário sensu, a opinião do Juiz de Direito André Köhler Berthold[44] é de que não houve mudança alguma com a nova emenda, sob a alegação de que “o que está na Constituição pode ser proibido por lei, a não ser que a própria Constituição proíba tal restrição”. Assim, este interpretou a Emenda sob uma ótica diferente da maioria dos civilistas. O autor supracitado diz que no seu ponto de vista “nada mudou quanto ao divórcio, só podendo ser concedido ao casal separado judicialmente há mais de um ano, ou separado de fato há mais de dois[45]”.

O desembargador Luiz Felipe Brasil Santos[46] comunga de pensamento parecido com o anterior. Ele argumenta ser cedo para comemorar o fim da separação judicial, visto que esta ainda persiste na legislação ordinária. Enfatiza que a própria Emenda 66/10 silenciou a esse respeito. Consequentemente, entende subsistir, ainda, a figura da separação judicial e do decurso de lapso temporal para a propositura da ação de divórcio. Esse doutrinador vai mais além, e defende ser necessária uma lei que regulamente tal emenda, para que se possa falar em extinção da separação judicial.

Tratando sobre o tema, o desembargador esclarece que:

Por aí se vê que a eliminação da referência constitucional aos requisitos para a obtenção do divórcio não significa que aquelas condicionantes tenham sido automaticamente abolidas, mas apenas que, deixando de constar no texto da Constituição, e subsistindo exclusivamente na lei ordinária (Código Civil) - como permaneceram durante 40 anos, entre 1937 e 1977 -, está agora aberta a porta para que esta seja modificada. Tal modificação é imprescindível e, enquanto não ocorrer, o instituto da separação judicial continua existente, bem como os requisitos para a obtenção do divórcio. Tudo porque estão previstos em lei ordinária, que não deixou de ser constitucional. E isso basta![47]

Por conseguinte, nas divergências ora apresentadas, também se indaga acerca da extinção do prazo da separação de fato para a propositura do divórcio. Entretanto, essa contenda tem por base os mesmos argumentos citados anteriormente. Isto porque uns entendem pela não revogação do Código Civil, sendo mantido tal requisito juntamente com a separação judicial; enquanto os outros defendem a vontade do legislador ao proferir a Emenda 66/2010, deixando de existir tanto um como o outro.

Resta claro, portanto, que a persistência ou não da separação judicial e extrajudicial e da necessidade do decurso de tempo da separação de fato para a ação de divórcio, após o advento da Emenda n. 66/2010, tornaram- se pontos de discordância entre alguns estudiosos do direito de família. Trata- se de uma questão interpretativa acerca da inovação. Diante disso, tal discussão também se reflete na jurisprudência, como se pode averiguar:

SEPARAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE CONVERSÃO EM DIVÓRCIO. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 66/10. APLICAÇÃO IMEDIATA E PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. DETERMINAÇÃO DE REGULAR ANDAMENTO DO FEITO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS CAPÍTULOS DA SENTENÇA. (Apelação Cível Nº990.10.357301-3, Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator: Caetano Lagrasta, unanimidade – Julgado em 10.11.10)[48]

APELAÇÃO CÍVEL. SEPARAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE CONVERSÃO EM DIVORCIO. IMPOSSIBILIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010. NOVA REDAÇÃO AO § 6º DO ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. VIGÊNCIA DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (ART. 1.580 DO CÓDIGO CIVIL). REQUISITOS PRESERVADOS, POR ORA. 1. A aprovação da Emenda Constitucional nº 66/2010, ao dar nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, efetivamente suprimiu, do texto constitucional, o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos . 2. Não houve, porém, automática revogação da legislação infraconstitucional que regulamenta a matéria. Para que isso ocorra, indispensável seja modificado o Código Civil, que, por ora, preserva em pleno vigor os dispositivos atinentes à separação judicial e ao divórcio. Inteligência do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42). NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. [49]

No primeiro caso supramencionado trata-se de ocorrência da aplicação imediata da Emenda 66/2010. Todavia, no segundo, trata- se de recurso cuja sentença indeferiu a inicial. No entanto, foi negado provimento a apelação em unanimidade pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, onde, mesmo tendo mantida a sentença, mudou o seu fundamento da decisão de 1º grau. Eles entendem que com a promulgação da alteração constitucional, nada mudou. Desta maneira, o órgão colegiado considera em pleno vigor os dispositivos atinentes a separação judicial e ao divórcio previstos no Código Civil de 2002.

Outra questão interessante a ser suscitada é a respeito da continuação de ação cautelar de separação de corpos com o Novo Divórcio. Na visão de Gagliano e Pamplona Filho[50], é possível ao cônjuge prejudicado intentar pedido de separação de corpos, mesmo partindo do pressuposto de extinção da separação jurídica, já que poderá haver situações que acarretem o inequívoco interesse jurídico em intentar tal medida com intuito de afastar do domicílio conjugal o cônjuge, como por motivos graves, violência física, ameaça, torturas, maus- tratos, dentre outras causas.

3.3 O FIM DA CULPA?

O novo divórcio trouxe à tona a polêmica sobre a necessidade da verificação da culpa pelo fim do casamento. Assim, é necessário que se trace um breve histórico a respeito do tema, para um melhor entendimento.

Tem- se que no Código Civil de 1916 não havia a figura do divórcio, uma vez que o casamento era indissolúvel. Nesta época, existia apenas o desquite, que poderia ser consensual ou litigioso. Assim, no desquite litigioso, mesmo sem se falar em extinção do vínculo conjugal, já se discutia a questão da culpa, posto que somente alguma ocorrência de uma das condutas culposas, previstas na época, autorizaria o desenlace. Aqui, o questionamento acerca da culpa estava extremamente presente. O doutrinador Dimas Messias, utilizando a idéia trazida por Leonardo Barreto Moreira Alves ressalta que:

No Código Civil de 1916, a família era caracterizada pelo binômio casamento e indissolubilidade do vínculo conjugal. Assim, a separação (desquite) dependia de prova de culpa e impunha sanções severas ao cônjuge declarado culpado, privando-o de direitos fundamentais à sua própria dignidade humana, como alimentos, uso do nome e guarda dos filhos, com o propósito inequívoco de colocar um freio e desestimular o pedido de separação por apenas um dos consortes.[51]

No entanto, com a promulgação da Emenda nº 09/77 e a sua regulamentação pela lei do divórcio, passou-se a classificar três tipos de separações, quais sejam: separação-remédio, separação-falência e separação-sanção. A separação- remédio deriva de doença incurável que torna impossível o vínculo conjugal, já a separação- falência decorre do fato de o casamento não mais existir por constatação de sua falência fática, não tendo mais nenhum dos cônjuges interesse em mantê-lo. Diante disso, houve certo arrefecimento na discussão da presença da culpa, estando assente com força somente na separação- sanção.

Com o Código Civil de 2002, foi mantido o “estatuto da culpa” e nesse contexto, conforme dispõe Maria Berenice Dias, “a indicação de forma tarifada foi ressuscitada, o que foi chamada de no mínimo retrógrado, por ser cópia da legislação do ano de 1916, o que já havia sido banido pela Lei do Divórcio[52]”.

De acordo com a referida doutrinadora, para propor a ação de separação ou divórcio litigioso, somente o cônjuge considerado “inocente” poderia fazê-la, apontando o requerido como “culpado” e declinando os motivos do pedido de separação, que encontram- se presentes no art. 1573 do Código Civil de 2002 [53], como se vê adiante:

Art. 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes motivos:

I - adultério;

II - tentativa de morte;

III - sevícia ou injúria grave;

IV - abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo;

V - condenação por crime infamante;

VI - conduta desonrosa.

Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.[54]

Entretanto, a autora supracitada também chama atenção para o fato da própria jurisprudência ter passado, posteriormente, a reconhecer como desnecessária a identificação de conduta culposa para o fim do casamento. Diante disso, observa- se os seguintes julgados:

SEPARAÇÃO JUDICIAL LITIGIOSA. CULPA. Já se encontra sedimentado o entendimento de que a caracterização da culpa na separação mostra-se descabida, porquanto seu reconhecimento não implica em nenhuma sequela de ordem prática. Precedentes desta Corte. ALIMENTOS. Não faz jus a alimentos a mulher que tem qualificação profissional, está inserida no mercado de trabalho há mais de vinte anos e ainda dispõe de condições de incrementar sua renda mensal, tendo em vista o reduzido horários de trabalho - apenas quatro horas diárias. PARTILHA DE BENS. Indevida a determinação de partilha de bens na razão de 50% para cada um dos consortes sem que antes seja realizada a avaliação do patrimônio e oportunizada às partes a formulação de pedido de quinhão. Deve-se evitar ao máximo o indesejado condomínio. Apelo parcialmente provido. Divórcio decretado. (SEGREDO DE JUSTIÇA).[55]

AÇÃO DE DIVÓRCIO CUMULADA COM ALIMENTOS. BINÔMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE CORRETAMENTE AFERIDO. DECISÃO CORRETA, NA FORMA E NO CONTEÚDO, QUE, INTEGRALMENTE, SE MANTÉM. O objeto da obrigação alimentícia depende não só das necessidades de quem recebe, mas também dos recursos de quem presta (art. 1.694, § 1º, do CC de 2002). Em se tratando de divórcio direto ou separação consensual, onde não cabe perquirição de culpa, os alimentos serão fixados com fiel observância do binômio possibilidade-necessidade, descabendo qualquer outra averiguação já que visa a sobrevivência do beneficiário. IMPROVIMENTO DOS RECURSOS.[56]

Logo, pode- se concluir que o instituto da culpa já estava, de certo, enfraquecido. Assim, com o advento da Emenda n. 66/2010, a maior doutrina vem advogando o desaparecimento de tal questionamento, sob o argumento de que, com o fim da separação jurídica, desaparecem, também, as causas objetivas e subjetivas para a dissolução da sociedade conjugal. Ademais, o Estado deixará de afrontar o direito à privacidade, intimidade e dignidade da pessoa humana. Na lição de Fernando Sartori:

Diante da possibilidade de o divórcio ser decretado sem prévia separação judicial, exigindo- se como requisito apenas a constatação de um fato objetivo- a separação de fato por mais de dois anos-, não existe mais razão para apurar a eventual conduta culposa praticada pelos cônjuges para se decretar a separação judicial. Acresça- se, o fato de o casamento não ser mais considerado a única forma de entidade familiar reconhecida pelo ordenamento jurídico, o que acarreta a perda do interesse por parte do Estado em querer preservá-lo e, quando isso não for possível, punir o responsável por seu término. Diante dos valores constitucionais, a manutenção da família, seja ela fundada no casamento ou na união estável, só se justifica quando as pessoas encontrarem nela a felicidade, a sua realização pessoal. Não bastasse, a apuração da culpa como causa da separação agride o princípio da dignidade da pessoa humana. Não pode o Estado exigir que os cônjuges discutam sua vida íntima em juízo num processo cujo fim é certo.[57]

Entrementes, a opinião contrária à supracitada proclama a subsistência da culpa mesmo com o fim da separação judicial, enfatizando que a discussão deverá se estender, agora, ao divórcio direto, como explica Amaral Salles:

Portanto, reputamos prematura a interpretação de alguns renomados juristas que afirmam que com a PEC do divórcio nunca mais se poderá discutir a culpa na ruptura da vida em comum. No nosso entender, a vedação da discussão da culpa no divórcio se aplica apenas aos casos de conversão de separação, judicial ou não, em divórcio. Nos casos de divórcio direto defendemos ser possível, sim, examinar a culpa e todos os demais temas próprios da separação, tais como alimentos, guarda de filhos, partilha, etc.[58]

Deve-se ressaltar, que está se falando sobre o fim da percepção da culpa para a decretação do divórcio e não para efeitos de responsabilização civil do cônjuge que descumpriu os deveres matrimoniais e causou danos ao outro. Dessa forma, não se pode afirmar que a imputação de culpa nas relações conjugais está excluída do ordenamento jurídico brasileiro. Sobre o assunto, assevera Dimas Messias:

Ao casarem, os cônjuges assumem os deveres de fidelidade recíproca, coabitação, mútua assistência moral e material, respeito e consideração mútua e a cuidarem da prole (art. 1.566, CC), importando responsabilidade a quebra injustificada das obrigações morais e materiais que assumiu, quando se torna gravosa a outro. A culpa deixou de ser relevante na dissolução do casamento, mas evidentemente não acabou no direito de família, o que seria nefasto ao casamento, por torná-lo um compromisso jurídico sem qualquer responsabilidade, importando seus deveres, meras faculdades, desobrigatórios, irrelevantes juridicamente.[59]

Sobre a referida discussão da culpa no fim do casamento, para efeito de responsabilização civil, cumpre ainda atentar para a posição minoritária, citada por Alex Quaresma Ravache[60], na qual aduz que ela deve ocorrer no mesmo processo de divórcio, e não no juízo de responsabilidade civil, como propõe a doutrina dominante.

Em suma, conforme o entendimento preponderante, conclui- se que a apuração acerca de quem tem a culpa não é mais necessária para o divórcio, mas sim, apenas, para efeito de responsabilização civil, como forma de preservar o respeito aos deveres conjugais.

Ao se considerar o fim da culpa no divórcio, é importante observar três efeitos, quais sejam, em relação à guarda dos filhos do casal, na questão de alimentos e uso do nome pelo cônjuge culpado. Tem- se que há pouca discussão quanto à guarda dos filhos e uso do nome, visto que cuida de questão quase superada no direito de família. Assim, poder- se- ia o cônjuge “culpado” ter para si a guarda dos filhos desde que oferecesse melhores condições psicológicas, dentre outras, ao saudável desenvolvimento destes. Nas palavras de Gagliano Stolze e Pamplona Filho:

Vale dizer, se não há razão fundada no resguardo do interesse existencial da criança ou do adolescente, o cônjuge que apresentar melhores condições morais e psicológicas poderá deter a sua guarda, independentemente da aferição da culpa no fim da relação conjugal. Claro está, todavia, que o deferimento dessa guarda unilateral só será possível depois de esgotada a tentativa de implementação da guarda compartilhada. Num caso ou noutro, vale lembrar, o elemento culpa não é vetor determinante para o deferimento da guarda.[61]

Em relação ao uso do nome, os renomados mestres acima mencionados defendem que:

Independentemente de quem tenha sido o responsável pelo fim do matrimônio (pois não se há de se perquirir a culpa ou inocência de nenhum dos consortes), qualquer das partes poderá, a todo tempo, optar por retornar ao nome de solteiro, mediante procedimento judicial de modificação de nome civil, a ser conduzido pelo juízo de direito competente para apreciar questões atinentes a alterações em registros públicos.[62]

Quanto aos alimentos devidos ao cônjuge “culpado”, a tendência é considerar, como único fundamento para a sua fixação, o binômio necessidade do alimentando e possibilidade do alimentante. O que se confirma também nas decisões de órgãos colegiados, como se vê adiante:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEPARAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE EXONERAÇÃO DOS ALIMENTOS PROVISÓRIOS FIXADOS EM FAVOR DA EX-MULHER QUE RECEBE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE NECESSIDADE. A obrigação alimentária vincula-se à cláusula rebus sic stantibus, podendo ser revisada sempre que ocorre alteração no binômio possibilidade e necessidade, sendo possível o pleito de redução, majoração ou exoneração de alimentos. A fixação dos alimentos não está embasada na culpa, mas sim na comprovação da dependência econômica daquele que pede. Comprovado que a ex-mulher, ao contrário do que declarado na inicial, recebe auxílio-doença previdenciário, com valor correspondente a 1,6 salários mínimos, valor superior ao pensionamento pleiteado, cabível a revogação da liminar que fixou o encargo alimentar, restando a questão submetida à dilação probatória na ação principal. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70029099629, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 10/06/2009).[63]

Quanto a partilha dos bens no divórcio, a culpa pelo fim do casamento, também, predominantemente em nada influi, posto que a divisão do patrimônio conjugal se dá apenas com base no regime de bens aplicável.

3.4 QUESTÕES DE DIREITO INTERTEMPORAL

Partindo-se do pressuposto da defesa da maior doutrina, que é pela extinção da separação judicial e extrajudicial após o advento da Emenda 66/2010, serão analisadas a seguir as situações consolidadas e transitórias que foram atingidas por tal inovação. De acordo com Dimas Messias de Carvalho:

Ocorre que várias situações já consolidadas ou transitórias foram surpreendidas com a EC n.66/2010, especialmente pela não recepção da separação de direito e o divórcio por conversão, exigindo solução de acordo com o ordenamento jurídico, obedecendo- se a coisa julgada, o direito adquirido e os princípios do direito intertemporal. O direito intertemporal disciplina as relações jurídicas surgidas em um período, sob a vigência de uma lei, e as consequências sob o domínio de uma norma subsequente a anterior, estabelecendo princípios reguladores, entre eles o da irretroatividade da lei para preservar os também princípios do direito adquirido, da coisa julgada e do ato jurídico perfeito.[64]

Logo, quanto ao estado civil dos antigos separados de direito, nada foi modificado, não possuindo a norma constitucional qualquer eficácia sobre situações já consolidadas. Sendo assim, caso tenham interesse poderão pleitear o divórcio a qualquer tempo, diferentemente do que se observava antes. Sobre o assunto o referido doutrinador leciona que:

Em outras palavras, os separados de direito continuam a ostentar o mesmo estado civil, até decidirem reconciliar, divorciar, ou, ainda, um deles falecer, ocasião em que o sobrevivente passa ao estado civil de viúvo, já que o vínculo do casamento não foi dissolvido com a separação.[65]

 O casal separado judicialmente não está impedido de proceder a um pedido de reconciliação, visto que tal possibilidade está prevista na separação. Cabe destacar, que não se encontra presente a possibilidade de reconciliação no divórcio. Assim, com o fim da separação jurídica, tal faculdade deixou de existir. Calha transcrever as palavras de Gagliano Stolze e Pamplona Filho:

Na mesma linha, se as partes se reconciliarem após o trânsito em julgado, ou seja, após o reconhecimento definitivo do divórcio, nada mais poderá ser feito senão contrair novas núpcias com o mesmo cônjuge, não havendo limites, como dito, para o ato de se casar com a mesma pessoa. (desde que atendidas as regras de validade do matrimônio).[66]

E como ficarão os processos de separação judicial em curso que ainda não foram sentenciados?

A doutrina tem divergido, surgindo várias opiniões. Dentre elas, José Fernando Simão proclama que, frente à extinção da separação jurídica com a EC n.66/2010, todas as ações que tem por objeto a separação jurídica devem ser extintas sem julgamento de mérito por impossibilidade jurídica superveniente do pedido, elencada no art. 267, VI do CPC.

No entanto, segundo Gagliano e Pamplona Filho[67], o juiz deverá dar oportunidade à parte autora (no procedimento contencioso) ou aos interessados (no procedimento de jurisdição voluntária), mediante concessão de prazo, para que façam um pedido de adaptação da ação ao novo sistema constitucional, convertendo- o em divórcio. Na visão dos referidos autores: é necessário que o juiz chame as partes e abra um prazo para dizerem se tem interesse na conversão e se não se manifestarem, o processo deverá ser em extinto sem o enfrentamento do mérito por perda do interesse processual superveniente, conforme o art. 267, VI, do CPC.

Já a insigne Maria Berenice Dias[68], diverge dos autores multicitados, ao ponto que defende que o Juiz deverá converter o processo de separação em ação de divórcio de pronto, sem prévio requerimento das partes. Cabendo a estas a expressa oposição à conversão, ocasião em que o Juiz deverá extinguir o processo por impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que não pode o Magistrado prolatar sentença declarando direito que não está mais previsto em Lei.

Como meio de demonstrar aplicação prática a essa controvérsia, Dimas Messias de Carvalho[69] cita uma decisão proferida pelo Juiz da 1º Vara Cível da comarca de Minas Gerais:

No dia 14 de julho de 2010, data em que a Ec n.66/2010 foi publicada, o juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Lavras / MG, Núbio de Oliveira Parreiras, já aplicou a nova norma. Após orientar as partes e seus advogados em audiência de instrução, com a concordância converteu a separação litigiosa em divórcio e extinguiu o vínculo conjugal, acolhendo a nova orientação constitucional.[70]

 A opinião de Dimas Messias[71] sobre o assunto é na essência a mesma de Gagliano e Pamplona Filho, retro referenciada, diferindo apenas se as partes se recusarem a readequarem o pedido ou não se manifestarem no prazo concedido, ocasião em deverá ser extinto o processo, sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, conforme disposto no artigo 267, VI, do Código de Processo Civil.

Segundo o referido doutrinador, quanto às ações de separação ajuizadas após a publicação da EC n.66/2010, estas devem ser extintas sem resolução de mérito por impossibilidade jurídica do pedido, com base no art. 267, VI do Código de Processo Civil[72].

De acordo com Maria Berenice Dias[73], o divórcio judicial e administrativo, com a extinção da separação jurídica passa por modificação no seu procedimento, tendo em vista que não necessita mais a indicação de testemunhas para prova da existência do decurso de prazo de dois anos. Nesse contexto, se já não se falava na “cláusula de dureza”, agora, então, que se confirma o aniquilamento de tal conduta ultrapassada.

3.5 PRINCIPAIS ARTIGOS DO CÓDIGO CIVIL AFETADOS

Na análise dos artigos do Código Civil que foram afetados, parte- se do pressuposto de que, com o advento da Emenda 66/2010, ocorreu a extinção da separação jurídica, uma vez que esta permanecendo, não há que se falar em qualquer modificação na legislação infraconstitucional.

Desta sorte, a doutrina dominante traz algumas alterações no Código Civil e noutras legislações como nas lei de Alimentos (Lei n.5.478/68), Lei dos Registros Públicos (Lei 6.015/77), Lei do Divórcio, Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90). Todavia, serão observadas neste trabalho apenas algumas mudanças importantes ocorridas no Código Civil.

Diante do que foi dito, é necessário se atentar ao fato de que não há nessa questão apenas um entendimento, ou seja, mesmo a doutrina que admite a extinção da separação jurídica, traz algumas divergências quanto à interpretação ou adequação da legislação à Emenda.

Assim, será demonstrado adiante, basicamente, o entendimento de três grandes autores que se destacam no Direito de Família e que tratam do tema brilhantemente, quais sejam, Maria Berenice Dias, Gagliano Stolze e Pamplona Filho, para que não se torne confusa a análise dos principais dispositivos do Código Civil que foram atingidos.

O art. 10 do Código Civil trata das situações que geram necessidade de averbação no registro público e, prevê, entre elas, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal (ou reconciliação). Ocorre que, segundo entendimento majoritário, estes institutos não mais existem e, portanto, não há espaço para esses tipos de averbação. Ressalta- se que isso não se aplica aos que já estavam separados judicialmente e, após a mudança constitucional, decidiram se reconciliar.

            O art. 1.562 dispõe essencialmente sobre a possibilidade de se requerer a separação de corpos, antes de se mover ação de nulidade do casamento, a de anulação, a de separação judicial, a de divórcio direto ou a de dissolução de união estável. Segundo Maria Berenice Dias[74], com o fim da separação judicial, “é impositivo se excluir tal referência, permanecendo o artigo no que concerne às outras espécies de ações”.

Já o dispositivo que trata dos deveres matrimoniais, que antes, em virtude do seu descumprimento, levaria à separação, permanece intacto, uma vez que a obrigação recíproca entre cônjuges quanto a tais deveres persiste. Em caso de desrespeito a algum dos incisos elencados tais como fidelidade recíproca, continuará cabível, inclusive, ação de reparação de danos.

No artigo 1.571 estão arroladas as causas que levam a extinção da sociedade conjugal, e dentre elas está a separação judicial, como percebe- se na transcrição abaixo:

Art. 1.571. A sociedade conjugal termina:

I - pela morte de um dos cônjuges;

II - pela nulidade ou anulação do casamento;

III - pela separação judicial;

IV - pelo divórcio.

§ 1o O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente.

§ 2o Dissolvido o casamento pelo divórcio direto ou por conversão, o cônjuge poderá manter o nome de casado; salvo, no segundo caso, dispondo em contrário a sentença de separação judicial.[75]

Gagliano Stolze e Pamplona Filho defendem que o artigo supracitado foi amplamente atingido pela Emenda n.66/2010. Nesse sentido eles esclarecem que:

Encontra- se tacitamente revogado o inciso III, por conta da supressão da separação judicial. O §2º, na mesma linha, quedou- se tacitamente, não apenas por conta do desaparecimento da separação, mas também, por não mais haver a classificação tradicional do divórcio em direto e indireto.[76]

Sobre os artigos 1.575 e 1.576 do CC, Maria Berenice Dias tem entendimento divergente de Gagliano Stolze e Pamplona Filho, posto que aquela entende que onde consta “separação judicial” passará a se entender separação de fato; no entanto, estes defendem que tais dispositivos foram prejudicados.

O art. 1.577 dispõe que a todo tempo é possível a reconciliação, independentemente da causa responsável pela separação judicial. Porém, é nítido que, como já foi mencionado, não havendo em se falar mais em separação judicial, tal dispositivo foi completamente afetado, subsistindo apenas aos que se encontravam separados judicialmente quando da entrada em vigor da Emenda 66. Essa é a compreensão predominante.

Quanto ao art. 1.578, que antes admitia que o cônjuge culpado na ação de separação perdesse o direito a usar o nome do outro, ao entender de Maria Berenice Dias[77] parou de vigorar após a Emenda 66, uma vez que não se fala mais em cônjuge culpado pelo fim da relação. Assim, respeita- se exclusivamente a vontade de qualquer dos cônjuges de voltar ao nome de solteiro ou continuar usando o sobrenome de casado.

Não há mais que se falar, também, em prazo para a concessão do divórcio como está disposto no art. 1.580 do Código Civil de 2002. Portanto, considera- se revogado tal dispositivo.Já aqueles artigos que tratam apenas do divórcio, como o 1.581 e 1.582, entende- se como perfeitamente inalterados.

Por fim, os artigos 1.702 e 1.704 dispõem sobre alimentos devido ao cônjuge em razão de culpa pela separação judicial, os quais foram revogados, pois, para a atual concepção do divórcio a matéria está perfeitamente regulada pelo art. 1.694, onde vê- se necessário apenas a análise do binômio necessidade- possibilidade.

Em suma, depreende- se que não foram poucos os artigos do Código Civil que estão sendo considerados afetados pela Emenda do Novo Divórcio. Como se pode ver, a mudança de interpretação de alguns dispositivos, a total ou parcial supressão de outros, não se trata de questão clara e pacificada entre todos os doutrinadores. Diante desse problema, alguns civilistas estão clamando por uma lei que venha a regulamentar tal inovação, objeto de tantas controvérsias, como é o caso do desembargador Luiz Felipe Brasil Santos que sustenta:

Em conclusão, embora admita que a linha de pensamento que sustento representa uma visão politicamente incorreta, em um tempo em que a versão midiática, até do direito, tende a preponderar – penso que, por não haver qualquer incompatibilidade entre o novo texto do § 6º do art. 226 da Constituição Federal e os dispositivos correspondentes do Código Civil, estes últimos subsistem em sua inteireza, até que sejam objeto de modificação por lei específica.[78]

Ocorre que os estudiosos do direito de família estão ansiosos pelo resultado de um projeto de lei, que está tramitando no Congresso Nacional, tendo em vista que este poderá, por sua vez, responder aos tantos questionamentos suscitados com o Novo Divórcio. Assim, no capítulo seguinte será dada uma visão aprofundada de tal projeto, que tem a intenção de criar um Estatuto para o Direito de Família.


4 ESTATUTO DAS FAMÍLIAS: O PASSO SEGUINTE?

O Direito de Família é algo em constante evolução, pois é influenciado pelas mudanças de costumes na sociedade. Assim, está em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 674/2007, que visa retirar o Direito de Família do Código Civil, instituindo o chamado “Estatuto das Famílias”, que traz em linguagem simples a tradução e a regulamentação das novas relações familiares. Sobre o assunto Silvio Venosa:

O Projeto de Lei nº 674, denominado Estatuto das Famílias, apresenta-se agora em fase legislativa mais avançada, com nova versão e várias alterações em relação ao projeto primitivo. De plano se aponta que essa norma irá derrogar todos os artigos do livro de família do Código Civil de 2002. O Código Civil vigente pecou por várias omissões e por fazer apenas tímidas inovações quando a sociedade tanto esperava da nova lei. O projeto, por exemplo, ao conceituar o parentesco (artigo 9º), define que resulta da "consanguinidade, da socioafetividade e da afetividade". O código teve rebuços em citar a socioafetividade como modalidade do parentesco, limitando-se a mencionar que o parentesco pode resultar de "outra origem", além do parentesco natural ou civil (artigo 1.593), exigindo esforço interpretativo desnecessário numa época em que a socioafetividade já vinha sendo reconhecida de há muito pela doutrina e pela jurisprudência do país. De fato, essa modalidade de parentesco derivada da convivência, do afeto e do amor, independente do vínculo biológico, desempenha papel importante nas relações de família em todos os níveis. É assente que não há lei perfeita: o Código Civil longe está de sê-lo, assim como projeto do estatuto, ainda que sofra inúmeras alterações, não o será. Contudo, trata-se de microssistema atual que procura atender anseios de nossa sociedade, na medida do política e sociologicamente aceitável e possível.[79]

De autoria do Deputado Sérgio Barradas, o Projeto de Lei do Estatuto das Famílias foi fruto de um grande esforço do Instituto Brasileiro de Direito de Família- IBDFAM, após longas discussões entre os seus 5.000 sócios, aproximadamente.

Assim, no dia 15.12.2010, foi aprovado o substitutivo de tal Projeto de Lei pela Câmara dos Deputados, cuja autoria pertence ao Deputado Cândido Vaccarezza, restando agora, portanto, a sua aprovação pelo Senado Federal e posterior sanção pela Presidenta da República.

Este projeto está trazendo inovações em vários aspectos do Direito de Família, posto que tem como principal função a de adequar este ramo do direito à realidade social existente, incorporando, assim, parte da jurisprudência ao seu texto. O Deputado Eliseu Padilha[80], relator do projeto, enfatiza que “se está trazendo para o Direito de Família brasileiro avanços que se veem em todo o mundo, porque a nossa legislação está fora de seu tempo”.

Dentre as possíveis mudanças trazidas pelo Estatuto, estão: O reconhecimento expresso à posse do estado de filho e à socioafetividade (art.73 e 205), não se mencionam a participação final nos aquestos e o regime de separação obrigatória de bens, além disso, a alteração do regime de bens poderá ser efetivada por escritura pública (art. 37, § 3º) e desde que não contrarie regras e princípios do Estatuto; a união estável, aqui, adquire caráter de estado civil, sendo também reconhecida como espécie de família a entidade parental (grupos de irmãos sem pais); não há impedimento à constituição de união estável estando separado apenas de fato um dos parceiros (§ 2º do art. 61); a posse do estado de filho permitirá investigar ascendência genética, sem gerar relação de parentesco (art. 67, § 2º e 73). E, ainda, são trazidas as figuras do abuso sexual, da violência física e o abandono material, moral ou afetivo, como fator que interfere sensivelmente na perda ou suspensão da autoridade parental, dentre outras.

No âmbito do divórcio, o Estatuto das Famílias foi adaptado à Emenda n. 66/2010, e não traz mais em seu texto a separação judicial, admitindo- a como extinta, mas apenas as figuras da separação de corpos e do divórcio. Quanto ao divórcio extrajudicial, este foi estendido a casais com filhos menores, desde que realizado de forma amigável e as questões relacionadas aos interesses dos filhos já estiverem dirimidas judicialmente.

Além de tudo isso, o “Código das Famílias” trará a tona um procedimento de cobrança de pensão alimentícia numa forma mais simples e ágil, além de facilitar as questões processuais em geral, incentivando a conciliação e mediação como formas contundentes de dissolver conflitos. Nas palavras de Rodrigo da Cunha Pereira:

Mais que facilitar os procedimentos processuais em geral, o Estatuto incentiva a conciliação e a mediação como eficazes técnicas de dirimir conflitos, desestimula a litigiosidade e imprime mais responsabilidades às partes envolvidas em processo judicial.[81]

Ainda, sobre a mudança nas questões processuais Maria Berenice Dias afirma que:

Mas certamente as grandes novidades estão nas normas processuais. Pela vez primeira as demandas de família têm princípios próprios e ferramentas processuais que garantem sua efetividade. Assim, todos os processos têm tramitação prioritária, sendo possível a cumulação de medidas cautelares e a concessão de antecipação de tutela. Haverá sempre conciliação prévia que pode ser conduzida por juiz de paz ou conciliador judicial. O Ministério Público intervém somente nos processos em que há interesses dos menores de idade ou incapazes. O divórcio pode ser extrajudicial quando as questões relativas aos filhos menores ou incapazes já estiverem acertados judicialmente. Na ação de investigação de paternidade, quando o autor requer o benefício da assistência judiciária, cabe ao réu proceder ao pagamento do exame genético, se não gozar do mesmo benefício.[82]

No entanto, como toda inovação, o Estatuto das Famílias também tem pontos polêmicos, como a regulamentação das uniões homoafetivas como entidade familiar, que foi retirada do projeto e, ainda, a possibilidade de serem prestados alimentos decorrente das uniões estáveis em que o companheiro é casado. Sobre isso esclarece Maria Berenice Dias:

O que o Projeto já aprovado reconhece é que as pessoas que não estão separadas de fato não podem manter união estável. Mas caso tal ocorra - o que infelizmente ainda acontece - ou seja, quando um homem além da família constituída pelo casamento mantém outra mulher, por muitos anos, impedindo que ela estude ou trabalhe, de todo injustificável que, quando da separação, ele não lhe preste alimentos. Resguardada a meação da esposa, mister que os bens que a ele pertencem, sejam partilhados com quem se dedicou uma vida ao companheiro e ajudou a amealhá-los. Os exemplos são muitos. De todo descabido que quem manteve uma união por mais de 30 anos, tendo com a parceira um punhado de filhos, reste sem nada no final da vida. Aliás, esta é a solução que vem sendo reconhecida pela justiça, tanto estadual como federal, que determina, inclusive, a divisão da pensão por morte.[83]

É importante destacar que caso seja promulgado o substitutivo do Projeto de Lei n. 674/2007, as indagações acerca da Emenda 66/2010 estarão, de certo, resolvidas, uma vez que não se poderá mais defender a eficácia dos artigos do Código Civil de 2002, que tratam dessa questão específica, já que passaria a valer, tão somente, o Estatuto das Famílias a respeito do tema. Assim, o que resta aos Brasileiros é aguardar a resposta do Senado, já que com a promulgação do Estatuto será dado um grande passo adiante, posto que “cairão por terra” boa parte dos questionamentos advindos com a Emenda 66/2010.

Por fim, tal Estatuto é um grande passo a ser dado no Direito de Família uma vez que irá adequar as relações sociais à realidade atual, reafirmando a laicização do Estado, com o seu respeito à dignidade da pessoa humana, passando a não mais intervir na autonomia privada, como verdadeiro Estado Democrático de Direito.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como demonstrado, o casamento perdurou por muito tempo, no Brasil, como sendo indissolúvel. Nas próprias Constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967, ele foi mantido dessa forma, o que enfatiza a grande influência que a Igreja Católica, na figura do Direito Canônico, exerceu sobre o país.

Assim, após a laicização do Estado, o divórcio foi instituído no Brasil, através da Emenda Constitucional n. 09 de 28 de junho de 1977, que foi regulamentada pela Lei 6.515/77.

Tal instituto surgiu de forma tímida, visto que ainda existia preconceito da sociedade com as pessoas divorciadas. Todavia, com a Constituição Federal de 1988, o divórcio passou a se mostrar mais forte e concreto, entretanto, para a sua decretação era necessária a existência de pelo menos 01 ano de prévia separação judicial ou 02 anos de anterior separação de fato.

Ocorre que em 2007 adveio a Lei 11.441 que passou a permitir a separação e o divórcio consensuais extrajudiciais, desde que observadas algumas exigências. Nesse contexto, deve- se atentar que o termo separação judicial passou a se tornar inadequado, uma vez que não abrange a separação extrajudicial, sendo estas, espécies do gênero separação jurídica ou legal, que é a atual nomenclatura mais apropriada.

Logo, tem- se que a referida lei foi um grande passo para que se operasse, posteriormente, uma mudança maior ainda, que é a Emenda Constitucional n. 66/2010. Nessa esteira, é nítida a mudança no pensamento das famílias brasileiras em relação ao divórcio, que com o passar dos tempos, passou a ser visto sob um prisma diferente de forma a sempre se adequar aos novos anseios sociais.

Com a Emenda n. 66/2010, o legislador teve a intenção de facilitar o divórcio no Brasil, extirpando a necessidade de separação jurídica e de qualquer decurso de tempo para a sua propositura. Porém, tal inovação trouxe polêmicas, isto porque foi entendida de formas diversas pela doutrina. Para alguns doutrinadores, como o desembargador Luiz Felipe Brasil Santos e André Köhler Berthold, a alteração constitucional não operou qualquer mudança. Eles defendem a persistência da separação jurídica, bem como os requisitos para obtenção do divórcio, uma vez que a Emenda silenciou a esse respeito e tais exigências ainda persistem na Legislação Ordinária, que é o Código Civil de 2002. 

No entanto, a maioria dos estudiosos do direito de família interpretam a Emenda n. 66/2010 de forma a acatar a intenção do legislador com a sua criação. Sob esta ótica, eles advogam pelo fim da separação jurídica (judicial e extrajudicial) e pela desnecessidade de qualquer decurso de prazo para a propositura da ação de divórcio, tendo sido os artigos que tratam da separação judicial do Código Civil de 2002 e de outras legislações infraconstitucionais afetados. Assim, observou- se, também, que tais controvérsias estão refletidas na própria jurisprudência pátria.

Mas não só a extinção da separação jurídica é objeto dos debates, a manutenção ou não do questionamento de quem é o culpado pelo fim do casamento, que antes estava presente na separação judicial litigiosa, também está sendo atingido. Enquanto uns entendem que o questionamento perdura mesmo com a extinção da separação jurídica, se estendendo agora ao divórcio, outros argumentam que com o fim da separação jurídica, desaparecem também as causas objetivas e subjetivas para a dissolução da sociedade conjugal. Para os últimos, que são a grande maioria da doutrina, com essa medida, o Estado deixará de afrontar o direito à privacidade, à intimidade e a dignidade da pessoa humana.

No entanto, é entendimento quase unânime a possibilidade de o cônjuge que descumpriu os deveres conjugais e causou danos ao outro ser responsabilizado, de forma que não se pode afirmar que a imputação de culpa nas relações conjugais está totalmente excluída do ordenamento jurídico brasileiro. O que se discute nesse âmbito é sobre o procedimento a ser seguido, se tal pedido deve vir junto na ação de divórcio ou no juízo de responsabilidade civil.

Observou- se, também, que a discussão do fim da culpa pelo casamento não tem mais repercussão em relação à partilha dos bens, a guarda dos filhos do casal, ao uso do nome pelo cônjuge “culpado”. No que diz respeito aos alimentos devidos ao cônjuge “culpado” a tendência atual é de ser analisado apenas o binômio necessidade do alimentando e possibilidade do alimentante.

Dentre os efeitos trazidos pela Emenda Constitucional n. 66/2010, tem- se, ainda, o problema das situações consolidadas ou transitórias que foram atingidas pela novidade, não havendo pacificação total da doutrina em relação a como deve proceder o juiz quando o processo de separação judicial está em curso e ainda não foi sentenciado.

Além de tudo isso, partindo- se do pressuposto do entendimento predominante, que é o da extirpação da separação jurídica, a própria doutrina tem percepções diferentes a respeito de alguns dispositivos do Código Civil que foram afetados.

Em suma, pode perceber que existem muitas questões controversas entre os doutrinadores acerca da Emenda Constitucional n. 66/2010. No entanto, tais discussões poderão ser amenizadas ou mesmo findadas com o advento do chamado Estatuto das Famílias, o qual, como já mencionado, é um substitutivo do Projeto de Lei n. 674/2007. Este, ao retirar do Código Civil de 2002 toda a matéria pertencente ao direito de família, poderá também adequar este ramo do direito a realidade social hodierna.

Como consequência da Emenda 66, tal Estatuto, caso seja aprovado, trará grandes benefícios, já que ele não citará mais em seu texto a separação jurídica, mas tão somente a separação de corpos e o divórcio, tornando desnecessária uma lei específica para regular aquela mudança constitucional, além de conceder mais espaço à conciliação e mediação.

 Destarte, muitos questionamentos e discussões suscitadas a respeito da Emenda Constitucional n. 66/2010 poderão ser pacificados de forma que irá beneficiar as famílias brasileiras, com uma menor intervenção do Estado nas suas relações, e permitindo uma mais célere e ágil resolução dos conflitos.


REFERÊNCIAS

ASSIS JR, Luiz Carlos de. A inviabilidade da manutenção da separação como requisito para o divórcio frente à autonomia privada. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=592> Acesso em 14 abr. 2011.

BERTHOLD, André Köhler. O divórcio ficou mais rápido? Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2284159/o-divorcio-ficou-mais-rapido> Acesso em 14 abr.2011.

BRASIL. Código Civil. 8. Ed. São Paulo: Rideel, 2009.

BRASIL, Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 22 abr. 2011.

BRASIL. Constituição(1988). Constituição da República Federativa do Brasil.

Brasília, DF: Senado, 1988.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70039476221. 8ª Câmara Cível.  Relator Luiz Felipe Brasil Santos. 13/01/2011. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70021725817. Sétima Câmara Cível. Relatora Maria Berenice Dias. 23.04.2008. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação Cível nº 2009.001.47997. Primeira Câmara Cível. Relator Maldonado de Carvalho. 27.10.2009. Disponível em: <http://portaltj.tjrj.jus.br>. Acesso em: 23 abr. 2011.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70039476221.Oitava Câmara Cível. Relator Luiz Felipe Brasil Santos. 21.10.2010. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php?nome_comarca=Tribunal+de+Justi%E7a&versao=&versao_fonetica=1&tipo=1&id_comarca=700&num_processo_mask=70039476221&num_processo=70039476221&codEmenta=3960851&temIntTeor=true>.Acesso em: 23 abr. 2011.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento nº 70029099629. Sétima Câmara Cível. Relator André Luiz Planella Villarinho. 10.06.2009. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

CONSULTOR JURÍDICO. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-dez-16/camara-deputados-aprova-projeto-cria-estatuto-familias>. Acesso em 22 abr. 2011.

DIAS, Maria Berenice, Divórcio Já!: comentários à Emenda 66 de 13 de julho de 2010. 1. ed. .São Paulo: RT, 2010.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O Novo Divórcio. 1.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 5.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva , 2008.

LAGRASTA, Caetano. Direito de Família: Novas Tendências e Julgamento Emblemáticos e o Estatuto das Famílias. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=711>. Acesso em: 23 abr. 2011.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Separação era instituto anacrônico. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=654> Acesso em: 16 abr. 2011.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família. 14. Ed. rev . e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Estatuto das Famílias. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=708>. Acesso em 22 abr. 2011.

RAVACHE, Alex Quaresma. Divórcio, separação e culpa após a Emenda Constitucional 66/2010. Disponível em: < http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.29540> Acesso em: 17 abr. 2011

SALLES, Gladys Maluf Chamma Amaral. A PEC do divórcio e a discussão da culpa. Disponível em:

 <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=624> Acesso em: 17 abr. 2011.

SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Emenda do Divórcio: Cedo para Comemorar. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=648> Acesso em: 14 abr. 2011.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 8. Ed. São Paulo: Atlas S. A., 2008.

VENOSA, Sílvio de Salvo. O Projeto do Estatuto das Famílias. Disponível em: <http://www.silviovenosa.com.br/artigo/o-projeto-do-estatuto-das-familias>. Acesso em 22 abr. 2011.


Notas

[1] MODESTINO apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. 5.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva , 2008, p. 21.

[2]  GONÇALVES, Carlos Roberto, op. cit., p. 21.

[3] LAFAYETTE apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família. 14. Ed. rev . e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 52.

[4] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p.37.

[5]  Ibidem., p. 37

[6] PEREIRA, Caio Mário da Silva. op. cit., p. 52.

[7] Ibidem., p.275.

[8] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 8. Ed. São Paulo: Atlas S. A., 2008, p. 151.

[9] Ibidem., p. 151.

[10] VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit.,p. 152.

[11] GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 249.

[12] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O Novo Divórcio. 1.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 34.

[13] Ibidem., p. 39.

[14] DIAS, Maria Berenice, Divórcio Já!: comentários à Emenda 66 de 13 de julho de 2010. 1. ed. .São Paulo: RT, 2010. p. 17.

[15] PEREIRA Caio Mário da Silva. op. cit., p. 277.

[16] RODRIGUES, Silvio. op. cit., p. 202.

[17] CARVALHO, Dimas Messias de. op. cit., p. 2.

[18] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 17.

[19] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit., p. 39.

[20] RODRIGUES, Sílvio. op. cit., p. 227.

[21] CARVALHO, Dimas Messias de. op. cit., p. 3.

[22] Ibidem., p. 3.

[23] LARA, Paula Maria Tecles apud DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 20-21.

[24] GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit.  p. 74.

[25] PEREIRA, Caio Mário da Silva. op. cit., p. 281.

[26] BRASIL. Código Civil. 8. Ed. São Paulo: Rideel, 2009.

[27] VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p. 156.

[28] CARVALHO, Dimas Messias de. op. cit., p. 4.

[29] Ibidem., p. 4.

[30] Ibidem., p. 4.

[31] CRUZ, Maria Luiza Póvoa apud CARVALHO, Dimas Messias de. Op.cit.., p.4.

[32]GRISARD FILHO, Waldyr apud CARVALHO, Dimas Messias de. op. cit., p. 5.

[33] VIEIRA, Luis Soares apud GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit., p. 52.

[34] ROCHA, Geraldo Lyrio apud GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit., p. 52.

[35] BRASIL. Constituição(1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

[36] CARVALHO, Dimas Messias de. op. cit., p. 5.

[37] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit., p. 55.

[38] DIAS, Maria Berenice. op. cit.,  p. 28.

[39] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit., p. 55.

[40] GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 201.

[41] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. op. cit.,  p. 56.

[42] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Separação era instituto anacrônico. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=654> Acesso em: 16 abr. 2011.

[43] ASSIS JR, Luiz Carlos de. A inviabilidade da manutenção da separação como requisito para o divórcio frente à autonomia privada. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=592> Acesso em 14 abr. 2011.

[44] BERTHOLD, André Köhler. O divórcio ficou mais rápido? Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2284159/o-divorcio-ficou-mais-rapido> Acesso em 14 abr.2011.

[45]   Ibidem.

[46]  SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Emenda do Divórcio: Cedo para Comemorar. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=648> Acesso em: 14 abr. 2011.

[47]  Ibidem.

[48] LAGRASTA, Caetano. Direito de Família: Novas Tendências e Julgamento Emblemáticos e o Estatuto das Famílias. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=711>. Acesso em: 23 abr. 2011.

[49] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70039476221. 8ª Câmara Cível.  Relator Luiz Felipe Brasil Santos. 13/01/2011. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

[50] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 98.

[51] ALVES, Leonardo Barreto Moreira apud CARVALHO, Dimas Messias de, op. cit., p. 28.

[52] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 48.

[53] Ibidem., p. 48.

[54] BRASIL. Código Civil. 8. Ed. São Paulo: Rideel, 2009.

[55] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70021725817. Sétima Câmara Cível. Relatora Maria Berenice Dias. 23.04.2008. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

[56] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação Cível nº 2009.001.47997. Primeira Câmara Cível. Relator Maldonado de Carvalho, 27.10.2009. Disponível em: <http://portaltj.tjrj.jus.br>. Acesso em: 23 abr. 2011.

[57]  SARTORI, Fernando apud GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 91.

[58] SALLES, Gladys Maluf Chamma Amaral. A PEC do divórcio e a discussão da culpa. Disponível em:

 <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=624> Acesso em: 17 abr. 2011.

[59] CARVALHO, Dimas Messias de, op. cit., p. 79-80.

[60] RAVACHE, Alex Quaresma. Divórcio, separação e culpa após a Emenda Constitucional 66/2010. Disponível em: < http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.29540> Acesso em: 17 abr. 2011.

[61] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O Novo Divórcio. 1.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 102.

[62]  Ibidem., p. 110.

[63] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento nº 70029099629, Sétima Câmara Cível, Relator André Luiz Planella Villarinho. 10.06.2009. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site>. Acesso em: 23 abr. 2011.

[64]  CARVALHO, Dimas Messias de, op. cit., p. 47.

[65] Ibidem., p. 47.

[66] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 138.

[67] Ibidem., p. 140-141.

[68] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 130.

[69] CARVALHO, Dimas Messias de op. cit., p. 50-51.

[70] Ibidem., p. 50.

[71] Ibidem., p. 51.

[72] Ibidem., p. 51.

[73] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 131-132.

[74] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 167-168.

[75] BRASIL, Código Civil, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 22 abr. 2011.

[76] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 124.

[77] DIAS, Maria Berenice, op. cit., p. 170.

[78] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70039476221.Oitava Câmara Cível. Relator Luiz Felipe Brasil Santos 21.10.2010. Disponível em:

<http://www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php?nome_comarca=Tribunal+de+Justi%E7a&versao=&versao_fonetica=1&tipo=1&id_comarca=700&num_processo_mask=70039476221&num_processo=70039476221&codEmenta=3960851&temIntTeor=true>.Acesso em 23 abr. 2011.

[79] VENOSA, Sílvio de Salvo. O Projeto do Estatuto das Famílias. Disponível em: <http://www.silviovenosa.com.br/artigo/o-projeto-do-estatuto-das-familias>. Acesso em 22 abr. 2011.

[80] CONSULTOR JURÍDICO. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-dez-16/camara-deputados-aprova-projeto-cria-estatuto-familias>. Acesso em 22 abr. 2011.

[81] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Estatuto das Famílias. Disponível em: < http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=708>. Acesso em 22 abr. 2011.

[82] DIAS, Maria Berenice. O Estatuto da Ética. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=698 >. Acesso em 23 abr. 2011.

[83] Idem.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Nara Oliveira de Almendra. O novo divórcio e o Estatuto das Famílias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3575, 15 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24193. Acesso em: 25 abr. 2024.