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O caso Escher e outros vs. Brasil e o sigilo das comunicações telefônicas.

A fundamentação como garantia de efetividade dos direitos humanos

O caso Escher e outros vs. Brasil e o sigilo das comunicações telefônicas. A fundamentação como garantia de efetividade dos direitos humanos

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A demanda decorreu da violação de direitos humanos por monitoramento ilegal de linhas telefônicas de membros dirigentes de organizações sociais vinculadas ao MST, e posterior divulgação aos meios de comunicação de trechos selecionados dos diálogos interceptados.

Resumo: O presente estudo se propõe a analisar a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Escher e Outros vs. Brasil, no qual o país foi condenado pela violação dos deveres de proteção a garantias judicias, à honra e à dignidade e à liberdade de associação, em virtude de interceptações telefônicas ilícitas de comunicações de membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e posterior divulgação de trechos das conversas por agentes públicos. O objetivo é extrair da decisão lições que aproximem o Brasil um pouco mais de um sistema penal e processual penal verdadeiramente democrático, em conformidade com os compromissos que a nação firmou no âmbito internacional. Espera-se que o caso contribua para que o Estado brasileiro leve a sério o direito fundamental ao sigilo das comunicações telefônicas e o dever-garantia da fundamentação de toda e qualquer decisão judicial, especialmente daquelas que relativizam direitos fundamentais.

Palavras-chave: “Corte Interamericana de Direitos Humanos”. “Interceptações Telefônicas”. “Dignidade da Pessoa Humana”. “Liberdade de Associação”. “Fundamentação”.

Sumário: 1. Introdução.2. Exposição dos fatos que originaram a demanda.3. A violação da obrigação de proteger a Honra e a Dignidade (art. 1.1 c/c 11, da CADH).4. A violação da obrigação de respeitar a liberdade de associação (art. 1.1 c/c 16 da CADH).5. A violação da obrigação de proteger as garantias judiciais e de garantir o pleno exercício da proteção judicial (arts. 8.1 e 25.1 c/c 1.1 da CADH).6. A violação da obrigação de respeitar a “Cláusula Federal” e do dever de adotar medidas necessárias ao seu cumprimento (art. 28 c/c 1.1 e 2 da CADH).7. As reparações às vítimas. 8. A supervisão do cumprimento da sentença.9. Reflexões acerca da condenação do Brasil no caso Escher: o desrespeito cultural ao sigilo das comunicações telefônicas. 10. Breves considerações sobre o dever-garantia da motivação na decisão judicial que autoriza interceptações telefônicas a partir do caso Escher. 11. Considerações Finais.


1. Introdução

No caso Escher e Outros vs. Brasil, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) julgou[1]uma representação contra o país originada da denúncia de diversas organizações não-governamentais[2] (ONGs) ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), segundo a qual o Brasil teria violado os artigos 1.1 (Obrigação de Respeitar dos Direitos), 2 (Dever de Adotar Disposições de Direito Interno), 8.1 (Garantias Judiciais), 11 (Proteção da Honra e da Dignidade), 16 (Liberdade de Associação), 25 (Proteção Judicial) e 28 (Cláusula Federal) da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH - Pacto de San José da Costa Rica)[3].

A demanda decorreu da violação de direitos humanos por monitoramento ilegal de linhas telefônicas de membros dirigentes[4] das organizações sociais “Cooperativa Agrícola de Conciliação Avante Ltda.” (COANA) e “Associação Comunitária de Trabalhadores Rurais” (ADECON), ambas vinculadas ao MST, e posterior divulgação aos meios de comunicação de trechos selecionados dos diálogos interceptados.

O presente estudo se propõe a analisar minuciosamente a decisão da Corte para dela extrair lições que aproximem o Brasil um pouco mais de um sistema penal e processual penal verdadeiramente democrático, em conformidade com os compromissos que a Nação firmou no âmbito internacional.


2. Exposição dos fatos que originaram a demanda

No dia 28/04/1999, o Sub-comandante e Chefe do Estado Maior da Polícia Militar do Paraná, coronel Valdemar Kretschmer, solicitou ao então Secretário de Segurança Pública do Estado do Paraná, Cândido Martins, que procedesse aos trâmites necessários ante o Juízo da Comarca de Loanda para realizar a interceptação e monitoramento de comunicações telefônicas de linhas da COANA. No mesmo dia, o ex-secretário de segurança autorizou o coronel Kretschmer a apresentar o requerimento.

Assim, em 05/05/1999, o major Waldir Copetti Neves, Chefe do “Grupo Águia” da Polícia Militar do Paraná, representou à Vara Única de Loanda pela interceptação e monitoramento de uma linha telefônica instalada na sede da COANA, “em virtude das fortes evidências de estar sendo utilizada pela liderança do MST para práticas delituosas”.

A solicitação mencionava supostos indícios de desvios por parte da diretoria da COANA de recursos financeiros concedidos através do Programa Nacional de Agricultura Familiar (PRONAF) e do Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária (PROCERA) aos trabalhadores do assentamento “Pontal do Tigre”, no município de Querência do Norte/PR. Referia-se, ainda, ao assassinato de Eduardo Aghinoni, cuja autoria estava sendo investigada e suspeitava-se que, dentre os motivos do crime, estivesse o desvio desses recursos.

A Vara de Loanda recebeu essa solicitação, iniciando o procedimento de Pedido de Censura de Terminal Telefônico nº 41/99. No mesmo dia, a juíza titular, Elisabeth Khater, autorizou o pedido de interceptação através de uma simples anotação na margem da petição, na qual escreveu “Recebido e Analisado. Defiro. Oficie-se. Em 05.05.99”. A juíza não notificou o Ministério Público da decisão adotada.

No dia 12/05/1999, o Terceiro Sargento da Polícia Militar, Valdecir Pereira da Silva, apresentou à juíza Khater um segundo requerimento de interceptação telefônica, reiterando o pedido de intervenção daquela linha e, sem qualquer motivação ou fundamento, incluindo uma segunda linha telefônica, agora instalada na sede da ADECON.

O pedido foi prontamente concedido, através de uma anotação similar à anterior, e também não se notificou o Ministério Público.

No dia 25 do mesmo mês, o Major Neves solicitou o cancelamento da interceptação do terminal telefônico, pois o monitoramento realizado até aquela data já teria “surtido o efeito esperado”. A juíza atendeu, mais uma vez, ao requerimento e encaminhou ofício à companhia telefônica.

Em 07/06/1999, à noite, fragmentos dos diálogos gravados foram reproduzidos no “Jornal Nacional” da Rede Globo de Televisão, um dos telejornais de alcance nacional de maior audiência no país.

No dia posterior, o ex-secretário de segurança do Paraná realizou uma coletiva de imprensa com jornalistas de diversos meios, na qual comentou a atuação da polícia em operações de desocupação realizadas nos acampamentos do MST; ofereceu explicações sobre as interceptações telefônicas; e expôs sua opinião sobre as conversas divulgadas e as providências que a Secretaria de Segurança adotaria a respeito.

Na coletiva, foi reproduzido o áudio de algumas conversas interceptadas e, por meio da assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança, foi entregue aos jornalistas presentes um material com trechos transcritos dos diálogos interceptados.

Na mesma data e nos dias seguintes, fragmentos das gravações foram novamente divulgados pela imprensa televisiva e escrita. Algumas reportagens anunciavam que os trabalhadores semterra planejavam determinados crimes e que o ex-secretário de segurança havia tornado público novos trechos das fitas durante a coletiva de imprensa.

Em 01/07/1999, o major Neves enviou um ofício à juíza Khater, entregando-lhe 123 fitas com conversas telefônicas gravadas durante a interceptação de ambas as linhas telefônicas, no qual foram realizadas certas acusações contra o MST. De acordo com o documento, a primeira etapa das gravações ocorreu entre os dias 14 e 26 de maio de 1999. A segunda etapa, para a qual não constava pedido, nem autorização, nos autos ocorreu entre os dias 9 e 23 de junho de 1999. Não foram apresentadas as transcrições integrais do material obtido, mas apenas resumos dos trechos considerados relevantes para a polícia.

Apenas em 30/05/2000, ou seja, mais de um ano depois das ordens de interceptação, a juíza Khater enviou pela primeira vez os autos do Pedido de Censura para análise do Ministério Público.

Em 8/09/2000, a promotora de justiça atuante na comarca, Nayani Kelly Garcia,requereu que fosse declarada a nulidade das interceptações, com a inutilização das fitas, pelos seguintes argumentos:(a) umpolicial militar sem vínculos com a Comarca de Loanda e que não presidia nenhuma investigação criminal não teria legitimidade para solicitar a interceptação telefônica; (b) o pedido fora elaborado de modo isolado, sem fundamento em uma ação penal ou investigação policial; (c) a interceptação da linha telefônica da ADECON fora requerida pelo sargento Silva, sem nenhuma explicação; (d) o Pedido de Censura não foi anexado a um processo penal ou investigação policial; (e) as decisões que autorizaram os pedidos não foram fundamentadas; e (f) o Ministério Público não foi notificado acerca do procedimento.

A promotora manifestou, ainda, que tais fatos evidenciavam que a diligência não possuía o objetivo de investigar e elucidar a prática de crimes, mas sim monitorar os atos do MST, ou seja, possuía cunho estritamente político, em total desrespeito ao direito constitucional à intimidade, à vida privada e à livre associação.

A juíza Khater rejeitou o parecer ministerial, argumentando que não resultara provada a ilegalidade das interceptações. Entretanto, determinou a incineração das fitas, o que ocorreu no dia 23 de abril de 2002.

Visando a reparação das ilegalidades, já em 19/08/1999, o MST e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) apresentaram ao Ministério Público uma representação criminal contra o ex-secretário de segurança, a juíza Khater, o coronel Kretschmer, o major Neves e o sargento Silva, solicitando a investigação de suas condutas pelo possível cometimento dos crimes de usurpação da função pública, interceptação telefônica ilegal, divulgação de segredo de justiça e abuso de autoridade. O Ministério Público enviou a notitia criminis ao Tribunal de Justiça e instaurou-se a Investigação Criminal nº 82.516-5.

Em 6/10/2000, o Tribunal de Justiça emitiu o acórdão nº 4745 do Órgão Especial, ordenando o arquivamento da investigação dos funcionários públicos mencionados no que tange à interceptação telefônica, e o envio dos autos ao juízo de primeira instância para análise da conduta do ex-secretário de segurança, em relação à divulgação dos diálogos interceptados. Na referida decisão, o Tribunal de Justiça considerou que os equívocos que a juíza Khater cometeu configuravam, em uma primeira análise, faltas meramente funcionais.

Concluída a investigação, em 11/04/2001, o Ministério Público ofereceu denúncia contra o ex-secretário de segurança, que, mediante decisão da Segunda Vara Criminal da Comarca de Curitiba, de 23/12/2003, foi condenado em primeira instância às penas reclusão, de dois anos e quatro meses, e multa, sendo a pena privativa de liberdade substituída por prestação de serviços comunitários. Em 19/01/2004, o ex-secretário interpôs recurso de apelação, julgado em 14/10/2004, pela Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, que reverteu a decisão de 1º grau, para absolvê-lo, considerando que “o apelante não quebrou o sigilo dos dados obtidos pela interceptação telefônica, uma vez que não se pode quebrar [...] o sigilo de dados que já haviam sido divulgados no dia anterior em rede de televisão”.

Desde 05/10/1999, a COANA, a ADECON e seus representantes já haviam impetrado perante o TJPR um Mandado de Segurança contra a ordem da juíza Khater, solicitando a suspensão das interceptações telefônicas. Em 05/04/2000, órgão fracionário do Tribunal de Justiça entendeu que as interceptações já haviam cessado e que, portanto, a ação havia perdido seu objeto, ordenando a extinção da ação sem julgamento do mérito. Dessa decisão os impetrantes opuseram embargos de declaração, para que o Tribunal se manifestasse quando ao pedido de destruição das fitas. O recurso acabou rejeitado, ao argumento de que seu pedido somente poderia ser analisado se o mérito do mandado de segurança tivesse sido examinado.

Em 17/11/1999, foi oferecida uma denúncia administrativa contra a juíza Khater referente a sua conduta nos autos do Pedido de Censura. Em 28/09/2001, a Corregedoria-Geral de Justiça resolveu várias denúncias administrativas contra a mesma juíza e entendeu que a questão já fora apreciada por ocasião do arquivamento da investigação criminal contra ela pelo TJPR, ordenando, então, o arquivamento. 

Posteriormente, atendendo à recomendação do Relatório da Comissão Interamericana, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República enviou o caso para a revisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o qual recusou tal pedido por entender que a ação penal abordou a matéria sem deixar qualquer resíduo para a atuação do órgão corregedor em sede administrativa, ficando evidente a ausência do interesse procedimental.

Além de tudo, as vítimas promoveram ações civis de reparação de danos morais contra o Estado do Paraná, que quando da prolação da sentença pela Corte ainda não haviam sido julgadas definitivamente.

Em função de todos esses fatos, o caso foi admitido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 02/03/2006, sendo elaborado um relatório de mérito, que continha recomendações ao Estado. O Brasil foi notificado, sendo-lhe concedido o prazo de dois meses para comunicar as medidas adotadas a fim de cumprir as recomendações. Entretanto, após três sucessivas prorrogações sem que houvesse o cumprimento, a Comissão acabou submetendo a demanda à jurisdição da Corte Internacional[5].

Em 07/04/2008, as ONGs representantes apresentaram seu escrito sobre solicitações, argumentos e provas[6], através de advogados constituídos.

O Brasil apresentou contestação, onde suscitou três preliminares: (a) o descumprimento pelos representantes dos prazos previstos no Regulamento da Corte para apresentar seus argumentos e provas[7]; (b) a impossibilidade de alegar violações não consideradas durante o procedimento perante a Comissão Interamericana; e (c) a falta de esgotamento dos recursos judiciais internos.

A Corte entendeu que a primeira alegação não configurava propriamente uma exceção preliminar, porque não impugnaria a admissibilidade da demanda ou a possibilidade de conhecimento e julgamento do caso, razão pela qual se trataria de uma questão probatória.

Quando iniciou a análise da prova produzida nos autos, o Tribunal afirmou que os procedimentos perante si não estão sujeitos às mesmas formalidades das atuações judiciais internas e que a incorporação de determinados elementos ao acervo probatório deve ser efetuada em atenção às circunstâncias do caso concreto, tendo presentes os limites que impõe o respeito à segurança jurídica e ao equilíbrio processual entre as partes[8]. Embora reconhecendo que o escrito dos representantes foi extemporâneo, vez que o prazo terminava em um domingo, e a petição foi entregue na segunda-feira, entendeu, na linha de outros precedentes invocados, que o atraso mínimo não afetava a segurança jurídica ou o equilíbrio processual das partes, porquanto o direito internacional dos direitos humanos cuida da devida e completa proteção desses direitos.

Na segunda preliminar, o Brasil alegou que a violação ao art. 28 da Convenção Americana (cláusula federal) não fora mencionada antes da representação formal à Corte, sendo incluída na demanda a partir de uma informação de que haveria dificuldades de comunicação da União com o Estado do Paraná para cumprimento das recomendações da Comissão. Tal violação não poderia ser valorada, ainda, pois o dispositivo em questão seria apenas uma regra de interpretação da CIDH.

O Tribunal entendeu que a Comissão Interamericana tem autonomia e independência no exercício de seu mandato e que não lhe caberia revisar o procedimento perante o órgão, salvo em casos de erro grave, que possa vulnerar o direito de defesa das partes, devendo o prejuízo ser comprovado. No entanto, o Brasil não demonstrou tal lesão.Além disso, a natureza jurídica do art. 28 da CADH não é relevante, pois o Brasil reconhecera integralmente a competência da Corte para julgar qualquer caso relativo à interpretação e aplicação de todos os dispositivos da Convenção[9].   

Em relação aos recursos judicias internos, terceira preliminar arguida, o Brasil sustentou que o Mandado de Segurança[10]impetrado perante o Tribunal de Justiça do Paraná não era o recurso apropriado para cessar as supostas violações dos direitos humanos, mas sim o Habeas Corpus. Como o Mandado de Segurança teria sido extinto sem análise do mérito, as vítimas deveriam ter interposto recurso ordinário constitucional. Poderiam ter promovido, também, uma ação ordinária para declaração da ilegalidade da prova e destruição das fitas, mas não o fizeram. E a ação penal sobre a divulgação das conversas gravadas tramitou de acordo com o devido processo legal e em um prazo razoável, de modo que a Corte atuaria como uma quarta instância de revisão se analisasse o mérito da causa.

As organizações representantes alegaram que o TJPR não mencionou em sua decisão a suposta inadequação da via processual utilizada e que, desse modo, teria reconhecido implicitamente a validade da ação mandamental para o fim pretendido. Se o Tribunal interno tivesse entendido que a questão deveria ser analisada mediante outra ação, poderia ter tramitado a petição como Habeas Corpus ou extinguido o processo por inadequação do pedido. Como as interceptações já haviam terminado quando do desacolhimento dos embargos declaratórios, não havia mais interesse em levar o caso até o STJ, através de um recurso ordinário constitucional, porque esse meio não se prestaria para que se obtivesse a sanção dos agentes públicos envolvidos nas ilegalidades.

A Corte entendeu que, durante o transcurso da interceptação telefônica ou posteriormente, as pessoas interceptadas e gravadas gozavam de sua liberdade de locomoção. Desse modo, o instrumento cabível seria realmente o Mandado de Segurança, e não o Habeas Corpus. Já quanto à alegação de que caberiam outras ações, entendeu que os “recursos” que devem ser esgotados são aqueles que resultem adequados na situação particular da violação de direitos humanos alegada, de modo que a destruição das fitas não determinaria o término ou a reparação daquelas violações ocorridas, mas apenas poderiam ser um meio de evitar novas divulgações e prevenir violações futuras.

O Brasil alegou que as vítimas denunciaram os fatos ao Ministério Público e que o Tribunal do Paraná decidiu arquivar a investigação no tocante aos policiais militares e à juíza de direito, ordenando o curso da ação penal somente no tocante ao ex-secretário de segurança pública do Paraná, pela divulgação das fitas gravadas. Ao final do processo, o funcionário público foi absolvido por decisão de 2ª instância, que teria observadoas garantias do devido processo legal e da duração razoável do processo. Dessa forma, de acordo com o princípio da subsidiariedade, deveria ser respeitada a solução interna do Estado, até porque não seria manifestamente ilegal.

A Comissão manifestou-se no sentido de que a atividade investigatória para apurar as violações fora incompatível com os padrões consagrados pela Convenção Interamericana.

A Corte consignou que os representantes haviam esgotado a via penal, uma vez que, quando a Comissão Interamericana emitiu o Relatório de Admissibilidade da causa, a ação penal já havia transitado em julgado, com o arquivamento do caso em relação aos policiais e à juíza e a absolvição do secretário de segurança. Em relação à alegação de funcionar como quarta instância, a Corte afirmou que não determina responsabilidades individuais, mas apenas dos Estados signatários da Convenção. Assim, cabe à Corte avaliar se o Estado violou ou não suas obrigações internacionais em decorrência das atuações de seus órgãos judiciais, o que pode implicar a análise de procedimentos internos para estabelecer suas compatibilidades com os padrões da Convenção Americana. Por fim, a CIDH reconheceu que não há necessidade de mencionar os artigos da Convenção que os representantes consideram violados[11].

O Brasil encaminhou representantes ao Tribunal e nomeou o Dr.Roberto de Figueiredo Caldas[12] comojuiz ad hocpara participar do julgamento da causa.

Durante a instrução, as partes apresentaram diversos documentos. Foram juntadas declarações de 8 testemunhas e 2 peritos, prestadas perante agentes dotados de fé pública.

Considerando as peculiaridades da causa, a então Presidente da Corte, Cecilia Medina Quiroga, convocou uma audiência pública, que ocorreu em 03/12/2008, na Cidade do México, para oitiva direta de outras 3 testemunhas, apresentação de laudos periciais propostos pela Comissão[13] e pelo Brasil[14]e alegações finais orais das partes.

Posteriormente,foram remetidas também as alegações finais escritas. A Presidente solicitou a legislação interna vigente na época dos fatos, jurisprudência dos tribunais superiores brasileiros e informações sobre os recursos internos (mandado de segurança, embargos de declaração e recurso ordinário constitucional).

Em 15/05/2009, a Corte recebeu um parecer do Núcleo de Direitos Humanos da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, na qualidade de amicus curiae, onde a instituição apresentou uma análise dos recursos internos utilizados pelas vítimas e sua compatibilidade com a jurisprudência nacional e internacional.


3. A violação da obrigação de proteger a Honra e a Dignidade (art. 1.1 c/c 11, da CADH)

A Comissão alegou a violação do direito à vida privada, à honra e à reputação das supostas vítimas ao atribuir ao Estado a responsabilidade pela interceptação e gravação das conversas telefônicas, pela divulgação de seu conteúdo e pela negativa do Poder Judiciário de destruir o material gravado. 

O Brasil sustentou que não existiu violação, porque o processo em que foram determinadas as interceptações não teria apresentado nulidades. A eventual falha no procedimento não teria causado prejuízo à honra e à dignidade das pessoas. A responsabilidade dos agentes envolvidos fora examinada na jurisdição interna, não sendo admissível a revisão desses procedimentos na instância internacional.

A Corte considerou que os fatos do caso se produziram num contexto de conflito social relacionado à reforma agrária em vários estados brasileiros, dentre eles o do Paraná, o que motivou o Estado a implementar uma série de medidas e políticas públicas para enfrentar o problema[15].

Nessa época, as vítimas eram membros das organizações sociais ADECON, cujo objetivo era o desenvolvimento comunitário e integração de seus membros através de atividades culturais, desportivas e econômicas, e COANA, que buscava a integração de agricultores na promoção das atividades econômicas comuns e na venda de produtos, as quais tinham vinculação indireta com o MST, com o qual compartilhavam o objetivo de promover a reforma agrária.

No momento dos fatos noticiados, a Constituição brasileira previa a inviolabilidade da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assim como o sigilo das comunicações telefônicas (art. 5º, X e XII, da CF) e já estava vigente a lei nº9.296/96, que regulamenta os requisitos para o procedimento de interceptação telefônica.

O artigo 11 da Convenção proíbe toda ingerência arbitrária ou abusiva na vida privada das pessoas, enunciando diversos âmbitos da mesma, como a vida privada de suas famílias, seus domicílios e suas correspondências. Nesse sentido, a Corte já sustentou que o âmbito da privacidade caracteriza-se por estar isento e imune a invasões ou agressões abusivas ou arbitrárias por parte de terceiros ou da autoridade pública[16].

Ainda que as conversações telefônicas não se encontrem expressamente previstas no artigo 11 da CADH, trata-se de uma forma de comunicação incluída no âmbito de proteção da vida privada[17]. O artigo 11 protege as conversas realizadas através das linhas telefônicas instaladas nas residências particulares ou nos escritórios, seja seu conteúdo relacionado a assuntos privados do interlocutor, seja com o negócio ou a atividade profissional que desenvolva[18].

Desse modo, o artigo 11 aplica-se às conversas telefônicas independentemente do conteúdo destas, podendo, inclusive, compreender tanto as operações técnicas dirigidas a registrar esse conteúdo, mediante sua gravação e escuta, como qualquer outro elemento do processo comunicativo, tal qual, por exemplo, o destino das chamadas que saem ou a origem daquelas que ingressam; a identidade dos interlocutores; a frequência, hora e duração das chamadas; ou aspectos que podem ser constatados sem necessidade de registrar o conteúdo da chamada através da gravação das conversas. Finalmente, a proteção à vida privada se concretiza com o direito a que sujeitos distintos dos interlocutores não conheçam ilicitamente o conteúdo das conversas telefônicas ou de outros aspectos, como os já elencados, próprios do processo de comunicação.

A fluidez informativa que existe atualmente coloca o direito à vida privada das pessoas em uma situação de maior risco, devido à maior quantidade de novas ferramentas tecnológicas e à sua utilização cada vez mais frequente. Esse progresso, especialmente quando se trata de interceptações e gravações telefônicas, não significa que as pessoas devam estar em uma situação de vulnerabilidade frente ao Estado ou aos particulares. Portanto, o Estado deve assumir o compromisso de adequar aos tempos atuais as fórmulas tradicionais de proteção do direito à vida privada.

Inobstante, conforme se depreende do artigo 11.2 da Convenção, esse direito não é direito absoluto e, podendo ser restringido pelos Estados quando as ingerências não forem abusivas ou arbitrárias. Para tanto, devem estar previstas em lei, perseguir um fim legítimo e ser necessárias em uma sociedade democrática[19].

 Por último, o artigo 11 da Convenção reconhece que toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra, proíbe qualquer ataque ilegal contra a honra e reputação e impõe aos Estados o dever de oferecer a proteção da lei contra tais ataques. Em termos gerais, o direito à honra se relaciona com a autoestima e valia própria, enquanto a reputação se refere à opinião que outros têm de uma pessoa[20].

A Comissão Interamericana em sua denúncia alegou que as intervenções telefônicas foram ilegais, ilegítimas e nulas, porque (1) o pedido para interceptar a linha da ADECON foi posterior ao início do monitoramento; (2) o pedido foi feito por um policial militar, o qual não possuía competência funcional para tanto, já que as investigações recaíam exclusivamente sobre a Polícia Civil; (3) as vítimas não estavam sendo formalmente investigadas quando do pedido; (4) as interceptações duraram 49 dias, sem que houvesse autorização de ampliação do prazo legal de 15 dias; (5) a decisão que autorizou as escutas não foi devidamente fundamentada, tampouco indicou a forma como elas deveriam ser procedidas ou o seu prazo de duração; (6) o Ministério Público não foi notificado da quebra de sigilo telefônico.

Os representantes agregaram que somente tiveram acesso a uma parte da transcrição das fitas gravadas e que o objetivo das mesmas foi desvirtuado, eis que os trechos degravados não diziam respeito a investigações sobre desvios de recursos públicos ou homicídio, e sim às estratégias que os trabalhadores sem-terra iriam adotar para enfrentar as perseguições contra eles pelo Judiciário e pela Polícia Militar.

O Brasil alegou que o Pedido de Censura não apresentou vícios que pudessem resultar em uma violação dos direitos humanos. Aduziu que a lei nº 9.296/96 permite que o Juiz ordene interceptações telefônicas de ofício, o que suprimiria eventuais falhas em relação à suposta incompetência das autoridades que as solicitaram. Manifestou que uma eventual falha no pedido teria como consequência a nulidade das provas produzidas por esse meio, na hipótese de que fossem incluídas em algum processo criminal, e não o prejuízo à honra ou à dignidade das pessoas. As supostas vítimas não teriam sido afetadas pela prova ilicitamente produzida, haja vista que as fitas gravadas não foram utilizadas como prova em uma ação penal contra elas. No que correspondia à sua iniciativa, o Estado teria realizado todas as medidas pertinentes nas esferas penal, civil e administrativa para apurar as condutas dos envolvidos. E a inércia das vítimas em não se valer de todos os recursos adequados não poderia gerar a responsabilidade internacional do Estado.

A Corte concluiu que, no caso Escher, como as conversas telefônicas das vítimas eram de caráter privado e tais pessoas não consentiram no seu conhecimento por terceiros, sua interceptação por parte de agentes do Estado causou uma ingerência em suas vidas privadas.

Segundo a CIDH, para que esteja conforme com a Convenção Americana, uma ingerência deve cumprir com os seguintes requisitos: (a) estar prevista em lei, (b) perseguir um fim legítimo e (c) ser idônea, necessária e proporcional. Via de consequência, a falta de algum desses requisitos determina que a intervenção seja contrária ao Pacto de San José da Costa Rica.

No Brasil, a interceptação telefônica é permitida pelo art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal, combinado com as disposições da lei nº 9.296/96.De acordo com o artigo 1º desta lei, a interceptação telefônica deve ter o propósito de investigar criminalmente ou de instruir um processo penal. No caso, apesar de indicar a necessidade de investigar supostas práticas delitivas, quais sejam, o homicídio de Eduardo Aghinoni e o desvio de recursos públicos, a solicitação do major Neves não foi apresentada no marco de um procedimento investigativo que tivesse por objeto a verificação dos fatos. O pedido de interceptação sequer mencionou os autos da investigação do homicídio que se encontrava a cargo da polícia civil de Querência do Norte, cujo delegado de polícia também não teria sido notificado a respeito. Outrossim, tampouco constava que, na época dos fatos, existisse uma investigação pelo suposto desvio de recursos públicos por parte dos dirigentes da COANA ou da ADECON.

O pedido do sargento Silvaapontou o propósito das interceptações pretendidas, nem sua vinculação com uma investigação ou processo penal. Desse modo, em detrimento do artigo 8º da Lei nº 9.296/96, o Pedido de Censura foi uma diligência isolada, que não tramitou em autos anexos a um procedimento de investigação ou processo criminal iniciados previamente. Portanto, ambas as solicitações descumpriram o disposto nos artigos supracitados.

Os pedidos de interceptação, bem como as decisões que os concederam, não expuseram quais eram os indícios razoáveis de autoria ou de participação dos membros da COANA e da ADECON nas infrações penais supostamente investigadas; os meios que seriam empregados para realizar a interceptação solicitada; ou mesmo, de forma clara, osfatos objeto da investigação. Tampouco as decisões demonstraram que o meio empregado era o único viável para obter tal prova. Em consequência, concluiu-se que não foram observados os artigos 2º e 4º da lei nº 9.296/96.

Quanto às pessoas competentes para solicitar a interceptação telefônica, o artigo 3º da lei nº 9.296/96 estabelece que a autoridade policial poderá fazê-lo no marco da investigação criminal. Segundo o perito Luiz Flávio Gomes, a autoridade policial poderá ser militar apenas na hipótese de investigação militar.

À luz do artigo 144 da Constituição brasileira, a investigação dos fatos delitivos indicados no pedido de interceptação, por sua natureza comum, competia exclusivamente à polícia civil. Portanto, as únicas autoridades policiais legitimadas a solicitar a interceptação das linhas telefônicas da COANA e da ADECON eram o delegado de polícia a cargo da investigação ou o secretário de segurança, em substituição ao primeiro.

No caso Escher, apesar de o ex-secretário Cândido Martins ter avalizado o pedido formulado pelo coronel Kretschmer, sua autorização só foi juntada aos autos do Pedido de Censura depois que a medida já havia sido concluída, anexada ao relatório policial de entrega das fitas gravadas. Dessa maneira, a Vara de Loanda não se manifestou sobre a mesma. Ao contrário, a juíza Khater emitiu suas autorizações com base nos pedidos apresentados pelo major Neves e pelo sargento Silva, ambos policiais militares, em cujo texto escreveu a simples anotação de que havia apreciado tais pedidos e os concedia.

Conquanto a interceptação telefônica pudesse ser determinada de ofício pela magistrada, suas decisões expressam que, ao ordená-la, a juíza atuou autorizandoas solicitações dos policiais militares, e não por iniciativa própria. Logo, concluiu-se que não foi observadotambém o artigo 3º da lei nº 9.296/96.

A magistrada não expôs em sua decisão a análise dos requisitos legais, os elementos que a motivaram a conceder a medida, nem a forma e o prazo em que se realizaria a diligência, a qual implicaria a restrição de um direito fundamental das supostas vítimas, tudo em descumprimento ao artigo 5º da lei nº 9.296/96.

A primeira fase das interceptações concernentes às duas linhas telefônicas sedesenvolveu durante 13 dias, entre 14 e 26 de maio de 1999, baseada na segunda autorização judicial já mencionada. A seguinte etapa de interceptações se deu por umperíodo de 22 dias, entre 9 e 30 de junho de 1999, em contrariedade ao artigo 5º da lei nº 9.296/96, o qual determina que a medida não poderá exceder ao prazo de 15 dias, podendo ser renovado por igual período de tempo, quando se comprove que a prova é indispensável.

Nesse contexto, a Corte ressaltou que não constava no procedimento do Pedido de Censura requerimento ou autorização para prorrogar as interceptações telefônicas. Em 25/05/1999, o major Neves requereu à Vara de Loanda o término das interceptações, o que foi autorizado pela juíza Khater na mesma data. Em consequência, o segundo período de interceptação foi executado sem a autorização do juiz competente, violando o artigo 1º da lei nº 9.296/96. Mais ainda, essa prática poderia ser considerada delitiva à luz do artigo 10 dessa lei, que tipifica o crime de “realizar interceptação de comunicações telefônicas […] sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei”.

As ordens de interceptação não foram notificadas ao Ministério Público, que só recebeu os autos do Pedido de Censura em 30/05/2000, ou seja, mais de um ano depois que as ordens haviam sido emitidas e 11 meses depois que as interceptações telefônicas haviam cessado.

O artigo 6º, parágrafo 1º, da lei das interceptações determina que se a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada,será determinada sua transcrição. No entanto, as transcrições do material gravado não aportaram aos autos do Pedido de Censura. Desta feita, não se observou o estabelecido no artigo 6º da lei nº 9.296/96.

A Corte conclui que as interceptações e gravações das conversas telefônicas objeto do caso não observaram os artigos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 8º da lei nº 9.296/96 e, por isso, não estavam fundadas em lei. Em consequência, ao descumprir o requisito de legalidade, não seria necessário continuar com a análise quanto à finalidade e à necessidade da interceptação.

Assim,a Corte entendeu que o Estado violou o direito à vida privada, reconhecido no artigo 11 da Convenção Americana, em relação com a obrigação consagrada no artigo 1.1 do mesmo tratado, em prejuízo de Arlei José Escher, Dalton Luciano de Vargas, Delfino José Becker, Pedro Alves Cabral e Celso Aghinoni.

A Comissão alegou também que as gravações encontravam-se em poder dos órgãos de Estado e eram resguardadas pelo instituto do segredo de justiça, de modo que os entes sobre os quais recaía a responsabilidade de zelar por esse segredo descumpriram seu dever legal. Os representantes alegaram que, no mesmo dia em que foi concedida uma coletiva de imprensa divulgando trechos das interceptações, fragmentos descontextualizados de algumas ligações interceptadas foram exibidos no noticiário noturno “Jornal Nacional”. O ex-secretário de segurança pública do Paraná imputou às vítimas a prática de crimes não comprovada judicialmente, como a posse ilegal de armas e um suposto plano para matar policiais e membros do poder judiciário.

O Brasil asseverou que foi instaurada uma ação penal para averiguar a parcela de responsabilidade do ex-secretário na suposta violação de sigilo e o mesmo acabou absolvido, com trânsito em julgado, pela atipicidade do fato, eis que ficou provado que não fora tal funcionário que divulgara parcialmente as fitas.  Assim, o Estado alegou que a conduta de Cândido Martins não deveria ser discutida pela Corte, pois não haveria elementos para configurar a violação ao art. 11 da Convenção.

A Corte entendeu que o Estado detinha o controle dos meios para esclarecer os fatos sucedidos e que não houve investigação sobre a entrega das fitas à emissora de televisão. Embora a Corte não tenha tido acesso direto às gravações que foram divulgadas, considerou altamente provável que o material tivesse sido entregue à rede de televisão e contivesse a gravação de conversas das vítimas, em função de outras provas que vieram aos autos (notícias veiculadas posteriormente na mídia). Dessa forma, entendeu que as vítimas sofreram ingerência em suas vidas particulares.

O ex-secretário declarou que, na coletiva de imprensa, apenas esclareceu questionamentos sobre trechos que já haviam sido divulgados na mídia. Contudo, os jornalistas ouvidos perante a Corte afirmaram que, na reunião, o secretário colocou novos trechos de áudios de algumas fitas gravadas para que eles ouvissem e que foram distribuídas pela Assessoria de Imprensa cópias da transcrição de algumas dessas conversas.

Assim, concluiu a Corte que houve ingerência na vida privada, na honra e na reputação das vítimas, já que tiveram elas seus nomes associados à prática de atividades delitivas.

Em termos gerais, a Corte considera que manter sigilo quanto às conversas telefônicas interceptadas durante uma investigação penal é um dever estatal: (a) necessário para proteger a vida privada das pessoas sujeitas a uma medida de tal natureza; (b) pertinente para os efeitos da própria investigação; e (c) fundamental para a adequada administração da justiça. No caso em questão, tratava-se de informações que deveriam permanecer apenas em conhecimento de um reduzido número de funcionários policiais e judiciais e o Estado falhou em sua obrigação de mantê-la sob o devido resguardo.

Logo, a Corte considerou que, ao divulgar as conversas privadas que se encontravam sob segredo de justiça, sem respeitar os requisitos legais, o Estado violou os direitos à vida privada, à honra e à reputação das vítimas, reconhecidos nos artigos 11.1 e 11.2 da CADH, conexo com a obrigação de respeito consagrada no artigo 1.1 do mesmo tratado.


4. A violação da obrigação de respeitar a liberdade de associação (art. 1.1 c/c 16 da CADH)

A Comissão alegou que a interceptação, monitoramento e gravação das comunicações telefônicas das vítimas foram realizados com o objetivo de exercer o controle de suas atividades associativas, e que a publicação dessas comunicações, resguardadas por segredo de justiça, foi efetuada expressamente para deslegitimar o trabalho das associações de que faziam parte as vítimas. Tais violações teriam configurado um modo de restrição velada à liberdade de associação.

Os representantes aduziram que a criminalização e perseguição por parte dos agentes do Estado feriu o direito à livre associação dos membros da COANA e da ADECON e impediu que as entidades lutassem pela promoção dos direitos humanos, especialmente pelo direito à terra. Tais associações perderam prestígio junto a empresas e bancos, o que impossibilitou a obtenção de novos recursos financeiros.

O Brasil alegou que a Comissão não apresentou fatos concretos que denotassem a efetiva violação do direito de associação, que não se confunde com direito à reunião[21]. Para o Estado, não haveria provasda ligação entre a COANA e a ADECON e o MST, de modo que o argumento de que as interceptações tiveram como objetivo restringir a atuação dos sem-terra ou perseguir seus líderes não tinha coerência. A interceptação telefônica não violaria, por si só, o direito à liberdade de associação, que só existiria quando houvesse irregularidades nos procedimentos e quando fossem causados danos. O Brasil salientou, por fim, que implementou diversas medidas em âmbito nacional para incentivar as associações de trabalhadores rurais e proteger os defensores dos direitos humanos[22].

O Tribunal indicou que o artigo 16.1 da Convenção Americana estabelece queaqueles que estão sob a jurisdição dos Estados-partes têm o direito de associar-selivremente com outras pessoas, sem intervenção das autoridades públicas que limitemou maculem o exercício do referido direito. Trata-se, pois, do direito a agrupar-se com afinalidade de buscar a realização comum de um fim lícito, sem pressões ou intromissõesque possam alterar ou desvirtuar tal finalidade.Além das obrigações negativas mencionadas, a Corte Interamericana observouque da liberdade de associação também derivam obrigações positivas de prevenir osatentados contra a mesma, proteger a quem a exerce e investigar as violações a essaliberdade. Essas obrigações positivas devem ser adotadas inclusive na esfera de relaçõesentre particulares, se o caso assim exigir.

A Corte destaca que a Convenção Americana reconhece o direito de associar-selivremente e, ao mesmo tempo, estabelece que o exercício de tal direito pode estarsujeito a restrições previstas por lei, desde que persigam um fim legítimo e resultem necessárias em uma sociedade democrática. Dessa forma, osistema estabelecido pela Convenção resulta equilibrado e idôneo para harmonizar oexercício do direito de associação com a necessidade de prevenir e investigar eventuaiscondutas que o direitointerno tipifique como delitivas.

O Tribunal considerou provado que, no caso Escher, o Estado interceptou egravou, sem cumprir os requisitos legais, as conversas telefônicas pertencentes a duasorganizações sociais. Não cumpriu sua obrigação de custodiar as informações privadasinterceptadas e divulgou-as sem autorização judicial, tudo isso violando o artigo 11 daConvenção, em relação com o artigo 1.1 da mesma.

Apesar deo Estado ter afirmado que a interceptação das comunicações não era contrária àliberdade de associação, pois perseguia um fim legítimo – a investigação do delito –, nãose evidenciounos autos que as finalidades declaradas pela autoridade policial noseu pedido de interceptação telefônica (suposta investigação da morte de um dosintegrantes de COANA e supostos desvios de recursos públicos)fossem as queefetivamente se perseguiam.

A Corte verificou que nenhum dos fragmentos ressaltados pela Polícia Militar no relatório das fitas gravadas tinha qualquer relação com o propósito investigativo indicado no pedido de interceptação. Até o Ministério Público teria reconhecido que a interceptação não possuía objetivo determinado, mas visava a monitorar as atividades do MST.

A Corte notou, portanto, que a ingerência do Estado nas comunicações da COANA e da ADECON além de não cumprir com os requisitos legais, não atendeu ao fim pretensamente legítimo ao qual se propunha, ou seja, a investigação criminal dos delitos alegados, e trouxe consigo o monitoramento de ações dos integrantes de tais associações.

Através dos depoimentos pessoais das vítimas, o Tribunal reputou provado que o monitoramento ilegal e imotivado das comunicações telefônicas das associações e sua posterior divulgação causaram temor, conflitos e afetações à imagem e à credibilidade das entidades.Dessa maneira, alteraram o livre e normal exercício do direito de associação dos membros da COANA e da ADECON, implicando uma interferência contrária à Convenção Americana.Assim, o Estado violou o direito à liberdade de associação reconhecido no artigo 16 da Convenção Americana, em relação com o artigo 1.1 do referido tratado.


5. A violação da obrigação de proteger as garantias judiciais e de garantir o pleno exercício da proteção judicial (arts. 8.1 e 25.1 c/c 1.1 da CADH)

A inexistência de um “recurso” efetivo contra as violações dos direitos reconhecidos pela Convenção Americana constitui uma transgressão desse mesmo instrumento pelo Estado-parte, deixando as pessoas indefesas. Não basta que os recursos existam formalmente, mas também é preciso que seja efetiva sua aplicação pela autoridade competente.

No caso Escher, a Comissão Interamericana aduziu que as vítimas buscaram os tribunais pátrios para conseguir a proteção aos seus direitos, porém não obtiveram uma resposta satisfatória. Segundo o órgão, dos litígios internos emergiu “coisa julgada fraudulenta”, que resulta de um litígio no qual não são respeitadas as regras do devido processo ou no qual os juízes não atuam com independência e imparcialidade.

Instados, os representantes sustentaram que o Estado não assegurou uma investigação administrativa eficiente para apurar a responsabilidade dos agentes públicos envolvidos e não garantiu um “recurso judicial”, com prazo razoável, para reparar civilmente os danos causados. Os representantes alegaram que a juíza Khater violou a imparcialidade, ao outorgar 45 mandados de reintegração de posse em favor de latifundiários da região noroeste do Paraná, com os quais teria vínculos de amizade, tudo em um período de tempo mínimo, o que teria influenciado no deferimento dos pedidos de quebra de sigilo telefônico. O mesmo se aplicaria ao TJPR, que não iniciou um procedimento para estabelecer a responsabilidade da magistrada no âmbito administrativo, apesar das fortes evidências de que ela havia cometido uma ilegalidade.

Concluíram que a juíza Khater não apenas não foi considerada responsável pela sua conduta, como também foi premiada tanto no âmbito funcional, ao ser promovida para a Comarca de Londrina, como na esfera política, ao ser condecorada pelo Poder Legislativo com o título de cidadã honorária do Estado do Paraná.

O Brasil defendeu-se, sustentando que não houve violação, porque as vítimas dispunham de dois “recursos” no direito interno (recurso ordinário constitucional e habeas corpus) e deles não fizeram uso.

O Estado reconheceu que a decisão judicial que autorizou a interceptação das linhas telefônicas se deu por um erro da Juíza no que se refere ao procedimento legal que deve ser seguido. Porém, o erro foi investigado nas esferas penal, administrativa e civil, tendo ficado estabelecido que a juíza não agira de má-fé ou com dolo, não havendo ilicitude. Desse modo, não seria o caso de ser analisado novamente na esfera internacional. Além disso, oex-secretário de segurança foi absolvido em 2ª instância e o Mandado de Segurança impetrado tramitou de acordo com o devido processo legal.

Segundo o Brasil, a discussão acerca da imparcialidade e independência do Tribunal de Justiça do Paraná para julgar o caso só foi alegada pelos representantes, e não fez parte do Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. Além disso, como houve apuração do caso junto à Corregedoria do TJPR não havia elementos que apontassem para as violações apontadas, razão pela qual a Corterejeitou tais alegações.

A CIDH consignou que, para cumprir a obrigação de garantir direitos, os Estados não só devem prevenir, mas também investigar as violações aos direitos humanos reconhecidos na Convenção e procurar, se possível, o restabelecimento do direito violado e a reparação dos danos produzidos pelas violações de direitos humanos.

É certo que odever de investigar é uma obrigação de meio, e não de resultado, que deve ser assumido pelo Estado como um dever jurídico próprio, e não como uma simples formalidade condenada de antemão a ser infrutuosa, ou como uma mera gestão de interesses particulares, que dependa da iniciativa processual das vítimas ou dos seus familiares ou do aporte privado de elementos probatórios. A existência dessa garantia constitui um dos pilares básicos da Convenção Americana e do próprio Estado de Direito em uma sociedade democrática.

Para que o Estado cumpra o disposto no artigo 25 da Convenção não basta que os “recursos” existam formalmente, sendo necessário que tenham efetividade. Tal obrigação implica que o recurso seja idôneo para combater a violação, e que seja efetiva sua aplicação pela autoridade competente.

Para determinar se houve ou não violação das obrigações internacionais do Estado membro, a Corte precisou examinar seus processos internos. A Corte então examinou as alegações concernentes ao mandado de segurança, à ação penal, ao procedimento administrativo e à ação civil, à luz dos padrões estabelecidos na Convenção Americana.

A Corte observou que o mandado de segurança foi manejado quando já haviam cessado as interceptações. Quanto à destruição das fitas, havia recurso interno próprio, e não foi utilizado pelas vítimas. Então, não houve violação dos arts. 8 e 25 da Convenção.

No tocante à jurisdição penal, o TJPR considerou que o mero requerimento de escuta telefônica não configurava ilícito penal e que não havia evidências de que a Magistrada tivesse agido com dolo. Quanto ao ex-secretário, que divulgou trechos das interceptações, o feito foi remetido ao 1º grau e originou ação penal, na qual o secretário foi originalmente condenado, e absolvido em sede recursal, sob o fundamento de que não teria havido quebra de sigilo, já que os dados já teriam sido divulgados um dia antes pela televisão.

A Corte indicou, contudo, que ficara provado que o ex-secretário havia divulgado, sem autorização judicial, novos trechos das interceptações em sua coletiva de imprensa. Quanto aos primeiros trechos divulgados um dia antes, havia suspeita sobre um policial militar, e não houve qualquer investigação por parte do Estado. Assim, a Corte concluiu que o Brasil não atuou com a devida diligência.

No procedimento administrativo que apurou a falta funcional da juíza, a Corregedoria do TJPR concluiu que a questão já fora analisada quando do acórdão que decidiu pelo arquivamento da investigação contra a mesma. No entanto, a Corte entendeu que a Corregedoria deveria ter motivado sua decisão em relação à ausência de falta funcional e não ter-se limitado a indicar que os fatos já haviam sido analisados pelo TJPR, que afirmara que sua atuação não configurava ilícito penal, mas poderia constituir falta funcional. O órgão administrativo deveria ter estabelecido as razões que o fizeram chegar a tal conclusão. Assim, a Corte entendeu que o Estado descumpriu seu dever de motivar a decisão quanto à responsabilidade administrativa.

No tocante às ações civis, a Corte observou que seus ajuizamentosdependia da iniciativa dos interessados. Apenas duas das vítimas ajuizaram ações cíveis, nenhuma delas com sentença definitiva até a data do julgamento pela Corte.

Assim, a Corte não encontrou elementos que demonstrassem a existência de violação aos direitos consagrados nos artigos 8 e 25.1 da Convenção Americana no que concerne ao mandado de segurança e às ações civis, mas, em relação ao processo penal e ao procedimento administrativo, concluiu que o Estado violou os direitos previstos nos arts. 8.1 e 25.1, em conexão com o art. 1.1, todos da Convenção Americana.


6. A violação da obrigação de respeitar a “Cláusula Federal” e do dever de adotar medidas necessárias ao seu cumprimento (art. 28 c/c 1.1 e 2 da CADH)

A salvaguarda dos direitos previstos na Convenção prescinde de qualquer referência à divisão interna de competências ou organização das entidades componentes de uma federação. As unidades federativas, como parte do Estado Federal, encontram-se igualmente vinculadas pelo disposto nos tratados internacionais ratificados por esse último. Assim, a Comissão alegou que o Brasil deveria ter colaborado para que o Estado do Paraná cumprisse com as disposições da Convenção.

O Brasil sustentou que o art. 28 da CADH é uma regra de interpretação e aplicação da mesma, de modo que não há falar-se em violação do dispositivo.

A Corte consignou que tem competência para interpretar e aplicar todas as disposições da Convenção, não só as que reconhecem direitos específicos, mas também as que estabelecem obrigações de caráter geral. Dessa forma, o Estado não pode alegar sua estrutura federal para deixar de cumprir uma obrigação internacional.

No caso Escher, o Brasil manifestou dificuldades de comunicação com uma entidade componente do estado federal em uma reunião de trabalho que nem sequer estava programada com antecedência, e em um de seus escritos. A Corte entendeu que tais manifestações não significariam nem acarretariam, isoladamente, um descumprimento da “Cláusula Federal”. A Corte advertiu que, no trâmite do processo, o Estado jamais opôs sua estrutura federal como escusa para descumprir uma obrigação internacional.O Tribunal não constatou, então, descumprimento das obrigações emergentes do artigo 28 da Convenção Americana, em relação com os artigos 1 e 2 do mesmo tratado.


7. As reparações às vítimas

A Comissão apontou que as vítimas envidaram grandes esforços econômicos a fim conseguir justiça no âmbito doméstico, o que foi reforçado pelos representantes, que aduziram ter sofrido perseguições e sido impedidos de exercer livremente suas atividades profissionais como pequenos produtores rurais e membros das cooperativas por aproximadamente cinco anos.

A Corte entendeu que não aportaram aos autos provas do dano material alegado. Portanto, não fixou indenização por dano material pelos supostos ingressos não percebidos relativos à atividade laboral das vítimas, devido à falta de elementos que comprovassem que as essas perdas realmente ocorreram e, eventualmente, quais teriam sido.

A Comissão Interamericana afirmou, ainda, que as vítimas passaram por sofrimento psicológico, angústia, incerteza e mudanças pessoais. Os representantes acrescentaram que tais atos lhes produziram ansiedade e medo e um ambiente de perseguição contra os segmentos sociais aos quais pertencem. Agregaram que os ofendidos também sofreram pela falta de uma devida investigação das alegadas perseguições.

A Corte estabeleceu que uma sentença declaratória da existência de violação constitui, per se, uma forma de reparação. Entretanto, considerando as circunstâncias do caso e as consequências que as violações cometidas puderam causar às vítimas, estimou pertinente determinar o pagamento de uma compensação pelos danos imateriais. Fixou-se em US$ 20.000,00 (vinte mil dólares dos Estados Unidos da América)[23] para cada vítima o valor dos danos imateriais, a serem pagos diretamente aos beneficiários dentro de 1 ano, a partir da notificação da sentença.

Além da indenização pelos danos morais, a Corte estabeleceu a obrigação de publicar a sentença no Diário Oficial, em dois jornais de ampla circulação nacional e regional de alguns capítulos da sentença e da parte resolutiva, e da íntegra,nos sites oficiais da União Federal e do Estado do Paraná.

Não se reputou necessária a realização de um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional pela violação dos direitos humanos.

Além disso, constituiu-se a obrigação de investigar os fatos e atuar em consequência no tocante à entrega e divulgação das fitas com as conversas gravadas[24] e de continuar promovendo cursos de capacitação em direitos humanos para funcionários da justiça e da polícia[25].

A Corte rejeitou o pedido dos representantes para ordenar a revogação da lei estadual nº 15.662/07, que concedeu o título de cidadã honorária do Estado do Paraná à juíza Khater, porque não foi demonstrado que seus termos fossem atentatórios aos direitos previstos na Convenção.

Por fim, o Tribunal determinou o pagamento de US$ 10.000,00 (dez mil dólares dos Estados Unidos da América), a ser dividido entre as vítimas,em função dos gastos com o deslocamento para assistir à audiência pública realizada na Cidade do México.


8. A supervisão do cumprimento da sentença[26]

A supervisão do cumprimento de suas decisões é uma faculdade inerente às funções jurisdicionais da CADH. Em virtude do caráter definitivo e inapelável de suas sentenças[27], estas devem ser imediatamente cumpridas pelo Estado de forma integral. Os Estados devem acatar suas obrigações convencionais internacionais de boa fé e não podem alegar motivos de ordem interna para deixar de assumir sua responsabilidade já estabelecida. As obrigações convencionais dos Estados partes vinculam todos os poderes e órgãos do Estado.

O Brasil alegou que teria dificuldades de publicar todos os trechos apontados pela Corte em jornais de ampla circulação nacional e regional, em razão da extensão final, que acarretaria custos muito superiores às indenizações. Ademais, a linguagem seria pouco acessível, perdendo-se o caráter reparatório.

Os representantes sugeriram reduzir o texto para incluir apenas alguns parágrafos, o que foi acompanhado pela Comissão Interamericana, tendo em vista o desejo expressado pelas vítimas.

A Corte ressaltou que a linguagem técnica, a extensão e o tamanho da fonte utilizada na publicação não impedem que os interessados possam ler e compreender o conteúdo, já que isso é levado em conta na hora da elaboração da decisão.

Quanto aos custos elevados, consignou que a publicação da sentença constitui uma medida de satisfação, que tem uma repercussão pública e uma natureza distinta das medidas de compensação. Desse modo, os gastos para executá-la não podem ser comparados com as indenizações por danos morais, que tem alcances e objetos distintos. O valor supostamente elevado das publicações não pode justificar o descumprimento dessa medida, que faz parte da reparação integral das vítimas. Para tanto, as formas alternativas de cumprimento propostas[28] não teriam o mesmo alcance da publicação nos jornais dos termos estabelecidos na sentença.

Nada obstante, a Corte valorou positivamente a vontade dos representantes, que trouxeram uma proposta de texto menor, com a inclusão de menos parágrafos, sem notas de rodapé.

Em 19/06/2012, a Corte realizou nova supervisão de cumprimento de sentença[29] e verificou que, em 20/05/2010, o Brasil expediu o decreto nº 7.158/10, no qual autorizou a Secretaria de Direitos Humanos a realizar o pagamento às vítimas dos montantes fixados na sentença, assim como a restituição de custas e gastos. Os representantes informaram que o Brasil efetuou os pagamentos. Assim, a Corte concluiu que o Estado deu cumprimento integral aos pontos resolutivos da sentença que previam indenizações.

O Brasil também publicou as partes pertinentes no Diário Oficial e nos jornais “O Globo” e “Correio Paranaense”, além de disponibilizar a íntegra nos sites oficiais da Secretaria de Direitos Humanos, da Presidência da República, da Procuradoria-Geral da República, do Tribunal de Justiça do Paraná e do Governo do Estado do Paraná, dando cumprimento a esta medida de reparação.

No tocante ao dever de investigar, o Brasil alegou que não seria possível cumprir tal determinação, pois, tanto no âmbito civil, quanto no âmbito penal, os fatos já estariam prescritos pelo direito interno, o que inviabilizaria novas investigações. A Comissão observou que a prescrição já estaria operada antes mesmo da sentença, mas que, mesmo assim, a Corte determinara a obrigação de investigar.

Para a CIDH, durante o procedimento de mérito, nenhuma das partes informaram acerca de eventual prescrição dos fatos. Em matéria penal, a prescrição determina a extinção da pretensão punitiva pelo decurso do tempo, e geralmente limita o poder punitivo do Estado para perseguir a conduta ilícita e sancionar os seus autores. Entretanto, a jurisprudência do Tribunal admite a inaplicabilidade da prescrição penal em casos de graves violações massivas e sistemáticas aos direitos humanos, tais como desparecimento forçado de pessoas, execução extrajudicial e tortura, o que não se aplicava ao caso Escher. Quando a sentença foi prolatada não fora declarada a improcedência da prescrição, porém foi determinada a investigação penal de determinadas condutas, o que não descartava que os fatos estivessem prescritos. Diante disso, a Corte deu por concluída a supervisão nesse ponto.

Ao final, a Corte Interamericana deu por encerrado o Caso Escher e outros, em razão de o Estadodo Brasil ter dado cumprimento integral aos pontos resolutivos da sentença emitida em 09/07/2009 e determinou o arquivamento da demanda.


9. Reflexões acerca da condenação do Brasil no caso Escher: o desrespeito cultural ao sigilo das comunicações telefônicas

Quando a Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu o caso Escher à CIDH, considerou a valiosa oportunidade de aperfeiçoamento da jurisprudência sobre a tutela do direito à privacidade e à liberdade de associação, assim como dos limites do exercício do poder público.

É importante recordar que o sistema regional interamericano de proteção dos direitos humanos, desenvolvido após a Segunda Guerra Mundial, é composto de uma pluralidade de tratados e convenções e de vários órgãos jurisdicionais. Na América, há tanto o subsistema de proteção da Organização dos Estados Americanos (OEA), fundado no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966), como o subsistema fundado na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969). Um país fazer parte do primeiro subsistema (p. ex. EUA), e não do segundo. Mas quem faz parte do segundo, necessariamente também integra o primeiro, caso do Brasil, que reconheceu a jurisdição da Corte Interamericana em 1998.

Do ponto de vista jurisdicional, o subsistema da CADH, baseia-se, fundamentalmente, no trabalho dos dois órgãos: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (sediada em Washington/EUA), espécie de 1ª instância do subsistema, e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (localizada em San José da Costa Rica), espécie de 2ª instância.

Cada um desses órgãos é composto por sete membros, queatuam individual e autonomamente, isto é, sem nenhuma vinculação com os seus governos, e também não representam o país de sua nacionalidade,nomeados e eleitos pelos Estados na Assembleia-Geral da OEA. 

A Comissão e a Corte desempenham suas funções de acordo com as atribuições que lhes foram outorgadas por distintos instrumentos legais no decorrer da evolução do sistema interamericano. Apesar das especificidades de cada órgão, em linhas gerais, os dois supervisionam o cumprimento, por parte dos Estados, dos tratados interamericanos de direitos humanos e têm competência para receber denúncias individuais de violação desses pactos. Assim, os órgãos do sistema têm competência para atuar quando um Estado-parte for acusado da violação de alguma cláusula contida em um tratado ou convenção.

A Comissão é o primeiro órgão a tomar conhecimento de uma denúncia individual, e só em uma segunda etapa poderá apresentar a denúncia perante a Corte. O procedimento inicial tem sua fase de conciliação, em que o Estado-parte é notificado a adotar determinadas medidas. Quando infrutífera a tentativa, vem a fase de produção de provas e de decisão. Qualquer pessoa pode se dirigir à Comissão, independentemente de advogado.

Já a Corte Interamericana cumpre duas espécies de funções: contenciosa (quando há conflito) e consultiva (preventiva). É uma instância judicial autônoma. A fase prévia de todo processo desenrola-se perante a Comissão. O procedimento dentro da Corte está regido pela Convenção, pelo seu regulamento, assim como pela sua jurisprudência.

Um país que seja palco de muitas violações aos direitos humanos pode ser excluído das ações do Banco Mundial ou do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e, se não cumprir as decisões da Comissão ou da Corte, o assunto torna-se político e é levado ao conhecimento da OEA, podendo ocorrer até mesmo o banimento da organização[30].

O Caso Escher acabou tornando-se a segunda condenação do Brasil no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos[31]. A Comissão, por seu turno, já impôs incontáveis recomendações (medidas cautelares) contra o Brasil (casos Urso Branco, Presidio de Araraquara, Febem-Tatuapé, Maria da Penha, etc.) e admitiu diversos outros casos, ainda em tramitação (Margarida Alves, Cadeia de Guarujá, Marte de bebês em Cabo Frio, José Dutra da Costa, Márcio Lapoente, Gabriel Pimenta, etc.).

Os fatos nele apurados estão inseridos em um período de incremento da perseguição de grupos ligados aos movimentos defensores da reforma agrária no Estado do Paraná. Na época, autoridades e ruralistas se uniram em uma campanha que resultou no aumento dos índices de violência no campo, valendo-se da espionagem e da incriminação das organizações de trabalhadores rurais. Foi a chamada “Era Lerner”, em alusão ao então governador do Paraná, Jaime Lerner, durante a qual se registraram 16 homicídios de trabalhadores rurais.

O caso das interceptações ilegais é emblemático do processo de criminalização dos movimentos sociais. Foi uma tentativa de neutralizar as estratégias de reivindicação e resistências dessas organizações através do uso da máquina estatal.

A decisão foi relevante para que o Brasil voltasse maiores atenções para conflitos dessa natureza. A propósito, essa discussão foi levada em consideração na elaboração do anteprojeto de novo Código Penal[32], quando se tipificou o crime de terrorismo, em seu art. 239, inserindo uma cláusula de exclusão da tipicidade quando se tratar de “conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua finalidade” (§7º).

Com efeito, ao condenar o Estado Brasileiro, a Corte de San José da Costa Rica reafirmou a importância e a normatividade do sigilo das comunicações telefônicas, inserto no âmbito de proteção do direito fundamental a não sofrer ingerências arbitrárias ou abusivas na vida privada por parte do Estado ou de particulares (artigo 11 da CADH)[33]

A sentença reafirmou que a intangibilidade das conversas telefônicas não é, contudo, absoluta, podendo sofrer restrições quando estas não tenham cariz abusivo ou arbitrário, e observem a legalidade (pressupostos, circunstâncias autorizadoras e procedimento probatório definidos, de forma clara e detalhada, na lei), a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.

A decisão judicial autorizadora da flexibilização do direito fundamental deve estar fundamentada de maneira substancial, através de argumentação racional que considere as alegações das partes processuais e os elementos informativos carreados aos autos, além de demonstrar a ponderação de todos os requisitos legais da medida.

Ademais, a Corte entendeu ser dever do Estado assegurar o sigilo sobre o teor de comunicações interceptadas durante investigação criminal, para fins de: (a) proteção da vida privada dos alvos da interceptação; (b) resguardo da eficácia da própria apuração dos fatos; e (c) viabilização de adequada administração da Justiça. Isso significa que o seu teor deve ser acessível a um número reduzido de servidores públicos, os quais têm o dever de sigilo.

A condenação brasileira representou um importante avanço no âmbito da proteção dos direitos humanos, porque o país assumiu suas responsabilidades internacionais, cumpriu a decisão da Corte, e não rompeu com a cláusula federal. Nada obstante, também revela profundas disparidades no âmbito interno, sejam relativas ao direito constitucional, ao direito penal ou ao processual penal.

No âmbito do direito à privacidade, o precedente jurisprudencial assegura a importância, arcabouço de proteção e densa estrutura normativa do direito fundamental à inviolabilidade de comunicações telefônicas, que contrasta com a cultura de banalização do emprego da medida cautelar de interceptação verificada na prática forense contemporânea[34], à míngua dos valores democráticos hauridos da CADH.

Com efeito, malgrado se trate de meio de busca de prova de cariz excepcional, cuja finalidade é permitir a descoberta e localização de provas materiais, o que se observa, na prática, é sua vulgarização como instrumento investigativo prima ratio, mesmo havendo outras formas possíveis de apuração dos fatos, tal qual revelou ser o caso Escher.

No Brasil, não raras vezes as interceptações telefônicas ainda são autorizadas exclusivamente com base em notícias-crime anônimas ou sem a imprescindível instauração formal de procedimento investigativo previsto em lei, ou até mesmo nos autos de procedimentos administrativos ou processos judiciais de natureza extrapenal. Tampouco são incomuns decisões judiciais autorizadoras da medida ou de sua prorrogação que possuem fundamentação aparente, sequer ponderando casuisticamente os requisitos constitucionais (artigo 5º, XII, LIII e LIV da Lei Magna) e legais (artigos 1º e 2º da lei nº 9.296/96).

A “fetichização midiática”[35] em muito contribui para uma certa aceitação social e impunidade do crime de divulgação do conteúdo sigiloso de conversas telefônicas interceptadas que estão sob a guarda do Estado[36]. Parece prevalecer a concepção de que o direito ao sigilo de comunicações telefônicas supostamente seria subterfúgio para acobertar atos criminosos, o que demanda seu pronto sacrifício em prol do combate à criminalidade.

Entretanto, a decisão da CIDH corrobora o entendimento de que essa grave deformação cultural impede a percepção da importância desse direito como instrumento de proteção da cidadania contra o arbítrio, a onipotência e o exercício abusivo do poder estatal[37].

Vários casos polêmicos envolvendo o tema foram objeto de discussão nas Cortes Superiores do país nos últimos anos[38], sinalizando que, ainda que timidamente e com posições divergentes, a jurisprudência pátria tem, aos poucos, se conformado com os compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro na tutela dos direitos humanos.

Espera-se, pois, que o caso Escher e outros vs. Brasil contribua para que o Poder Judiciário brasileiro leve a sério, na expressão de Dworkin[39], o direito fundamental ao sigilo de comunicações telefônicas no país.


10. Breves considerações sobre o dever-garantia da motivação na decisão judicial que autoriza interceptações telefônicas a partir do caso Escher

“A ideia de limitação de poder decorre da noção de garantia, constituindo barreiras de defesa contra as arbitrariedades.” [40]

A decisão judicial criminal que impõe restrições aos direitos fundamentais do cidadão[41] representa uma nítida manifestação de poder que, por sua natureza constritiva, deve ser objeto de controle por parte da sociedade e das partes envolvidas no processo. Esse controle é levado a efeito por meio da análise da motivação judicial, a qual revelará a validade, ou não, do discurso, à luz da Constituição Federal.

A fundamentação consiste no conjunto de motivos, razões ou argumentos de fato e, especialmente, de direito, em que se apoia uma decisão judicial. Fundamentar uma decisão significa exteriorizar de maneira racional os critérios que servem de apoio ao que ficou decidido. Estará satisfeita essa exigência quando implícita ou explicitamente for possível conhecer o conjunto de reflexões que levaram o Juiz a tomar a decisão que tomou. A motivação deve guardar coerência lógica com a decisão final[42].

No Estado Democrático de Direito, a motivação justifica-se a partir de um plano de análise endoprocessual, no qual as partes devem conhecer as razões da decisão judicial para dela poder recorrer e, em sede recursal, para que o órgão julgador possa controlar a atividade jurisdicional da instância inferior; e extraprocessual, permitindo o controle social da atividade jurisdicional, tornando possível a sua legitimação como atividade democrática.

Por meio da motivação, é possível avaliar as decisões judiciais, legitimando-as por meio de asserções, que serão verificáveis ou refutáveis[43]. Assim, a motivação constitui-se no veículo pelo qual os direitos fundamentais coletivos adquirem capacidade transformadora da realidade social. E, como ensina Canotilho, a proteção desses direitos se faz necessária para a consagração do próprio Estado:

[...] os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa).[44]

O primeiro e talvez mais importante aspecto de uma motivação judicial que obedeça à disposição constitucional hoje vigente é a independência do Judiciário(em relação aos demais órgãos estatais), garantia crucial para assegurar também a imparcialidade do juiz e a correta administração da justiça (contra decisões arbitrárias)[45]. Nas palavras de Ferrajoli, independência da magistratura como ordem e do magistrado como indivíduo[46]

Somente o sistema acusatório, em que todos os poderes instrutórios são retirados da figura do juiz e entregues às partes, é capaz de dar máxima efetividade à imparcialidade ou, mais apropriadamente, à neutralidade, que decorre não de uma virtude moral, mas de uma estrutura de atuação[47]. É que o sistema acusatório exige um “juiz-espectador”, e não admite um “juiz-ator”[48].

Na estrutura de um Estado de Direito[49], conquista do racionalismo liberal ante os regimes absolutistas arbitrários, há submissão de todo o poder à legalidade, o que vale às decisões judiciais, as quais devem demonstrar o seu apoio nas regras do ordenamento jurídico. E a observância da lei (princípio da legalidade) é única forma de controlar o excesso[50].

Para uma motivação válida, é indispensável que as partes possam efetivamente influenciar na decisão (contraditório)[51] e que o juiz demonstre que levou em conta todos os seus argumentos e as provas que produziram. Então, a motivação sobre os fatos é necessária como uma garantia de racionalidade e de controle da valoração das provas.

Assim, ao possibilitar o controle do itinerário lógico seguido pelo juiz para chegar à decisão, a motivação realiza a importante função de assegurar a efetividade do contraditório, evidenciando se as diversas escolhas adotadas durante aquele percurso resultaram da positiva apreciação das provas e argumentos trazidos pelas partes ou, ao contrário, constituem produto de ponderações solitárias do autor do provimento, sem consideração ao que foi trazido pelo diálogo processual.[52]

Quanto à valoração probatória, o Brasil adota o sistema do “livre convencimento motivado” (persuasão racional), no qual há certa liberdade de seleção e valoração das provas angariadas. Contudo, essa liberdade do julgador deve ser fundada em bases racionais, não existindo mais espaço para um sistema de “prova legal”. O juiz é “livre” para obter o seu convencimento, porquanto não está vinculado a regras legais sobre o peso de cada prova, o que não significa que seu poder de valoração seja totalmente ilimitado. Encontra limites na lógica, na experiência e nos conhecimentos científicos.

O valor fundamental da motivação é ser uma garantia processual cognoscitiva, entrelaçando o juízo à prova sobre a matéria fática concretizadora da hipótese acusatória, assim como à estrita legalidade quanto à matéria de direito. Nesse sentido, será racional uma motivação que demonstre a análise frontal da integralidade dos argumentos das partes[53], bem como de todas as provas produzidas a partir do contraditório[54].

Sendo assim, poder-se-á perceber que a decisão judicial se colocou como o resultado de uma ponderada reflexão sobre todos os pontos debatidos e produzidos no processo, não se constituindo em um ato de puro subjetivismo do julgador (decisionismo), o que viabiliza, mais uma vez, um controle objetivo da atividade jurisdicional.

Dessa forma, válida será aquela motivação que se apresentar vinculada ao caso sub judice, ou seja, aquele discurso justificativo que se coloca de todo casuístico, entrelaçando-se, apenas e tãosomente, aos pontos debatidos na causa criminal.

Não se admitem fórmulas prontas, hipóteses em que haverá verdadeira ausência de motivação. Da mesma forma, colocam-se como inválidas as motivações contraditórias, implícitas e per ralationem (que se reportam a motivações anteriores), pois, ao não serem coerentes e explícitas, deixam de representar uma verdadeira motivação.

Assim, a falta de motivação não é caracterizada somente na absoluta omissão do magistrado. É possível encontrá-la nos textos "vazios", ou seja, em que há aparência da motivação. O juiz apenas reproduz frases programadas, com sentidos vagos e genéricos. Na motivação incompleta, a contradição pode ser interna, quando as premissas e a conclusão são logicamente incompatíveis; ou externa, quando não é possível atingir determinada conclusão valendo-se das considerações acerca de fatos e provas empregadas.

No sistema constitucional-democrático o poder não é autolegitimado, sua validação depende da estrita observância das regras do devido processo penal, dentre elas o dever-garantia da fundamentação dos atos decisórios. Logo, a motivação é fundamental para avaliação do raciocínio desenvolvido na valoração da prova, através de argumentos seguros e válidos, submetidos ao contraditório e refutáveis pelas partes.

Em última análise, a motivação permite aferirse a racionalidade da decisão predominou sobre o poder[55], o que nos leva a deduzir que essa garantia vem justificada não apenas por razões técnico-jurídicas, mas também por razões políticas[56]. Na célebre concepção de Heleno Fragoso, o dever de motivar “é o diafragma que separa o poder discricionário do arbítrio”[57].

O exercício do poder público, em qualquer de seus aspectos, notadamente quando ligado à restrição de uma garantia fundamental, deve ser realizado segundo padrões de "legitimação racional e objetiva". Deve ser orientado por procedimentos que satisfaçam as exigências de uma “correção argumentativa”como forma de buscar o "consenso [...] por meio de uma atuação estatal que possa refletir os anseios e valores compartilhados pela maioria dos membros da comunidade política"[58].

Portanto, ao passo que a fundamentação das decisões é instrumento de controle da racionalidade, é, principalmente, limite ao arbítrio. E nisso reside seu núcleo de garantia[59].

Na seara penal, não se pode desconsiderar que a motivação deverá ser necessariamente influenciada pelo princípio da presunção de inocência, que dita a maneira pela qual o acusado é tratado durante toda a persecução. Nesse ponto, a fundamentação permitirá ponderar se na construção da argumentação empreendida e revelada na motivação houve a interferência de qualquer fator criminológico ou de política criminal inconstitucionais, e se a interpretação dos dispositivos se deu conforme a “presunção de culpa”, implícita ao sistema processual penal infraconstitucional, ou, ao contrário, em consonância com o preceito fundamental da presunção de inocência[60].

No que tange às interceptações telefônicas, fala-se de uma medida cautelar inaudita altera pars, cujo controle judicial é anterior ao contraditório (contraditório diferido). Aqui, a fundamentação deve ser encarada como a salvaguarda do direito à intimidade e deve atender à legalidade estrita. O juiz será o único controlador da devassa na vida do particular. Por isso, torna-se ainda mais relevante que tenha total independência frente ao órgão acusador.

O deferimento de uma medida tão gravosa só pode ocorrer quando presentes todas as exigências legais. Consequentemente, a motivação da decisão deve ser exaustiva, razoável, convincente e proporcional[61]. É por meio dela que se vai apreciar se o juiz decidiu com conhecimento da causa, ou não, e se sua convicção é legítima ou arbitrária[62]. Por esta razão, a motivação há de ser completa, possuindo as razões de fato e de direito que levaram o magistrado a construir sua convicção. Do contrário, a decisão possuirá vícios insanáveis[63].

É evidente que, no momento de motivar sua decisão, o juiz não pode simplesmente repetir as palavras da lei (não pode exteriorizar uma motivação genérica).

Nos casos de escutas, a interceptação é excepcional e afeta um dos direitos mais importantes do ser humano, que é o sigilo de suas comunicações. Assim, o conteúdo da decisão que exerce o controle judicial prévio da medida cautelar deve conter diversos requisitos, dentre os quais estão (a) a indicação dos concretos indícios de autoria ou participação; (b) as provas da materialidade de uma infração punida com reclusão; (c) a necessidade da medida, em virtude da inexistência de outros meios para a obtenção de provas; (d) a descrição clara da situação objeto da investigação; (e) a indicação do sujeito passivo, quando possível; (f) a individualização da linha telefônica que servirá de fonte para a captação; (g) os meios que serão empregados para a execução; (h) a duração e intensidade da medida; (i) a proporcionalidade no caso concreto; e, sobretudo, (j) o resguardo do sigilo da medida.

A falta de motivação permitiria uma invasão indevida na privacidade alheia, o que representaria a vulneração do direito constitucional ao sigilo das comunicações e, consequentemente, conflitaria com o direito à tutela judicial efetiva, ocasionando a nulidade do seu resultado. Reconhecida a nulidade da autorização judicial, nenhum valor possuiria a prova produzida, porque obtida ilícita ou ilegitimamente.

Cabe referir que os vícios na justificação da decisão judicial determinam a nulidade “absoluta” do ato, sendo que seu reconhecimento independeria de provocação das partes, bem como não seria necessária a demonstração do dano, uma vez que atinge o interesse público e o prejuízo é evidente[64].

A lei 9.296/96 determina que a captação das comunicações telefônicas não poderá exceder o prazo de 15 dias, que é computado a partir do dia do começo, por tratar-se de medida restritiva[65]. Nas renovações, exige-se a comprovação da indispensabilidade e da inexistência de outros meios disponíveis. O Juiz poderá renovar a interceptação a cada 15 dias[66], desde que se mantenha-se a proporcionalidade da medida, sempre em decisões devidamente fundamentadas[67].

Pois bem. Todas as violações de direitos humanos apontadas pela Corte Interamericana no caso Escher e Outros vs. Brasil decorreram de decisões judiciais desprovidas de fundamentação, precisamente em casos de pedidos de interceptação telefônica, onde os pressupostos e requisitos legais são bastante específicos, não se admitindo margem à discricionariedade. Ficou demonstrado que a ausência de motivação no caso escondia não só uma possível parcialidade da magistrada competente, como também os fins espúrios aos quais se devia o interesse em interceptar as comunicações das vítimas. E as ilegalidades foram ainda maiores, na medida em que sequer se preservou o sigilo dos dados colhidos, expondo as vidas dos particulares no palco midiático, com falsas imputações de crimes. A ausência de fundamentação no caso impossibilitou até mesmo a responsabilização funcional dos envolvidos, contribuindo para a ineficácia de proteção aos direitos fundamentais.

Nesse sentido, a decisão do Tribunal é um alerta que vem paulatinamente sendo prestigiado pelas Cortes Superiores no Brasil[68] de que nenhuma decisão judicial, interlocutória ou final, sobretudo na área penal, pode ficar isenta de motivação legal e racionalmente orientada. É o que disciplina a Convenção Americana de Direitos Humanos quando afirma que os processos sob sua regência devem ser fundamentados[69] e é também o que reconheceu o Constituinte de 1988, quando inseriu a norma do art. 93, IX[70], segundo a qual serão fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.  

Então, conclui-se que a motivação é um dever-garantia da efetividade da cognição judicial, isto é, de que todas as decisões judiciais, tanto finais, como no curso do processo, constituem o resultado de uma efetiva apreciação, pelo juiz, de todas as questões de fato e de direito suscitadas, e não apenas as convicções pessoais do magistrado[71]. Seu principal valor reside justamente na garantia da natureza cognitiva, e não potestativa, do juízo, vinculando o direito à estrita legalidade, e o fato à prova da hipótese acusatória[72].

Seu desrespeito configura, portanto, violação de uma das mais relevantes garantias judiciais reconhecidas internacionalmente e dá abertura ao ferimento de outros tantos direitos e liberdades da pessoa humana, reconhecidos em múltiplos tratados e convenções, como, no âmbito interamericano, o Pacto de San José da Costa Rica.


11. Considerações Finais

O estudo do Caso Escher enseja reflexões em dois planos distintos. No plano internacional, que não foi o foco do presente artigo, porém em hipótese alguma pode ser desconsiderado, deve-se exaltar o trabalho que vem sendo levado a cabo pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Desde sua organização, em 1979, o Tribunal tem combatido firmemente as violações aos direitos fundamentais inscritos na Convenção Americana de Direitos Humanos nos principais países da América Latina.  

No plano interno, o caso nos permite visualizar que o Brasil, a despeito de sua posição de liderança política e econômica, e de contar com uma Carta Fundamental dita “cidadã” das mais evoluídas do mundo, há muito tempo é palco de gravíssimas transgressões dos direitos humanos, sem que se note uma postura institucional, estatal e cultural de mudança. Ainda são raros os casos concretos em que o Estado, no mais das vezes por meio do Poder Judiciário, adota medidas reparatórias eficazes para restaurar a ordem constitucional. Porém, ainda mais escassas são as medidas sistêmicas para que isso se opere, sobretudo nos moldes em que tanto a Constituição de 1988, quanto o Pacto de San José da Costa Rica, preconizam.

Ainda não se consolidou a consciência de que o Brasil integra um sistema interamericano de proteção aos direitos humanos. Talvez por essa razão, as Cortes do país ainda se valham com tamanha timidez dos precedentes externos e dos próprios mandamentos da Convenção Americana.

A tendência é de que se opere uma abertura cada vez maior dessas questões, especialmente em face da globalização e do desenvolvimento do direito internacional público. Ao menos no Ocidente e nos países de tradição democrática, com o grau de evolução racional que hoje se atingiu, não é mais plausível que se admitam determinadas omissões estatais. As nações estão compelidas a aderir, dentro dos sistemas regionais de proteção, a determinadas diretrizes inarredáveis. Do contrário, corre-se o risco de um inadmissível retrocesso civilizacional.

Cremos que o Brasil reúne todas as condições para que gradualmente amplie a proteção aos direitos humanos e assimile as práticas e recomendações internacionais pertinentes, a fim de que, em um futuro próximo, possa consolidar-se como um verdadeiro Estado Democrático de Direito e, porque não, finalmente integrar o rol de países desenvolvidos, conquistando uma participação mais ampla na Organização das Nações Unidas (ONU).

Em sua primeira visita oficial ao Brasil após ser eleito presidente dos Estados Unidos da América, Barack Obama reconheceu o cenário atual: o Brasil é o país do presente! Devemos ter em mente que essa é a perspectiva com que hoje nos enxergam. Então, comecemos agora a traçar um novo e planejado futuro que preste um tributo às conquistas das gerações passadas.


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Notas

[1] A sentença foi prolatada em 06/07/2009. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Escher e outros vs. Brasil: Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_200_por.pdf>. Acesso em: 29 out. 2012.

[2] Justiça Global, Rede Nacional de Advogados Populares, Terra de Direitos e Comissão Pastoral da Terra.

[3] Adotada no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA) em San José da Costa Rica em 22 de novembro de 1969. Em vigor internacional desde 18 de julho de 1978. Promulgada no Brasil pelo Dec. nº 678, de 6 de novembro de 1992. 

[4] A Comissão interamericana emitiu relatórios de admissibilidade e de mérito a respeito de Arlei José Escher, Dalton Luciano de Vargas, Delfino José Becker, Pedro Alves Cabral, Celson Aghinoni e Eduardo Aghinoni (excluído porque faleceu antes do início das interceptações). Os representantes, por outro lado, apresentaram uma lista de 34 pessoas que seriam supostas vítimas, as quais não haviam sido integralmente nominadas quando oferecida a denúncia perante a Comissão, em 2000, pois somente em 2004 foi possível o acesso integral às transcrições das gravações. A Corte entendeu, contudo, que as vítimas devem estar elencadas na demanda e no relatório da Comissão (art. 50 da CADH), a quem cabe identificar com precisão e na devida oportunidade processual os supostos ofendidos de um caso perante a corte.

[5]A Corte Interamericana é competente para julgar a demanda, porque o Brasil é Estado-parte da Convenção Americana de Direitos Humanos desde 25/09/1992, tendo reconhecido sua competência contenciosa em 10/12/1998 (art. 62.3 da CADH).

[6] Art. 23 do Regulamento da CIDH (Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/reglamento.cfm>. Acesso em 29 out. 2012).

[7] Artigos 23.1 e 36 do Regulamento da CIDH.

[8] O mesmo entendimento foi utilizado para a alegação posterior do Brasil de que algumas declarações prestadas tiveram apenas a firma reconhecida, mas não foram tomados diante de um agente dotado de fé pública. Não se verificou, nestes casos, abalo à segurança jurídica e ao equilíbrio processual entre as partes.

[9] Art. 62.3 da CADH.

[10] Observe-se que a Sentença da Corte refere-se ao Mandado de Segurança, ao Habeas Corpus e mesmo à Ação Penal como “recursos” no sentido literal da palavra, ou seja, como meios destinados a resolver determinados problemas, e não necessariamente como remédios processuais aptos a impugnar decisões judiciais dentro de uma mesma relação jurídica processual.

[11] Art. 28.f do Regulamento da CIDH.

[12] Recentemente eleito juiz titular da CIDH pela Assembleia-geral da OEA para o mandato de 2013/2018. É o segundo juiz brasileiro a integrar a Corte. O primeiro foi Antonio Augusto Cançado Trindade, que permaneceu de 1994 a 2008, quando foi eleito Juiz da Corte Internacional de Justiça (CIJ), sediada na Haia, tendo exercido a Presidência em duas oportunidades.

[13] Parecer do Dr. Luiz Flávio Gomes sobre a lei nº 9.296/96, que regulamenta a interceptação de comunicações telefônicas no Brasil.

[14] Parecer da Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura sobre os recursos internos cabíveis no caso.

[15] Dentre elas, a implementação de um Plano Nacional de Combate à Violência no Campo, a elaboração de um Manual de Diretrizes Nacionais para a Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração da Posse Coletiva e a criação de uma Política Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos.

[16] Caso dos Massacres de Ituango Vs. Colômbia. Exceção Preliminar, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 1º de julho de 2006. Série C No. 148, par. 194; Caso Escué Zapata Vs. Colômbia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 4 de julho de 2007. Série C No. 165, par. 95; e Caso Tristán Donoso Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de janeiro de 2009. Série C No. 193, par. 55.

[17] Caso Tristán Donoso Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de janeiro de 2009. Série C No. 193, par. 55.

[18] ECHR. Case of Halford v. the United Kingdom, judgement of 27 May 1997, Reports 1997-III, pars. 44 e 45.

[19] Caso Tristán Donoso Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.

Sentença de 27 de janeiro de 2009. Série C No. 193, par. 56.

[20] Caso Tristán Donoso Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.

Sentença de 27 de janeiro de 2009. Série C No. 193, par. 57.

[21] Diferentemente da liberdade de associação, o direito de reunião não implica necessariamente a criação de ou participação em entidade ou organização, mas pode manifestar-se em uma união esporádica ou congregação para perseguir os mais diversos fins, desde que estes sejam pacíficos e conformes à Convenção.

[22] Citou, por exemplo, o Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos.

[23] Indenização por dano imaterial e restituição de custas e gastos diretamente às vítimas, sem incidência de qualquer tributo. Em caso de falecimento, os valores deveriam ser pagos aos herdeiros. Conversão em moeda nacional, segundo a cotação da bolsa de Nova Iorque do dia anterior ao pagamento.

[24] Em sede de “demanda de interpretação da sentença”, a Corte esclareceu que o dever de investigação, com a correspondente ação penal, dizia respeito à conduta do ex-secretário de segurança no tocante à divulgação das conversas telefônicas e à entrega de fitas com as conversas gravadas a um meio de comunicação.

[25] O Estado informou sobre a implementação de diversos cursos relativos a direitos humanos, com ênfase no direito à privacidade e à liberdade de associação, dirigidos a funcionários da Administração, juízes e membros da polícia.

[26] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Resolução da CIDH de 17 de maio de 2010: Supervisão de Cumprimento de Sentença. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/supervisiones/escher_17_05_10_por.pdf>. Acesso em: 29 out. 2012.

[27] Art. 67 da CADH.

[28] O Brasil propôs a leitura de partes da decisão no programa oficial de rádio “A Voz do Brasil”, a publicação de um resumo do caso e da sentença em linguagem acessível, num espaço aproximado de um quarto de página de jornal de ampla circulação nacional; e/ou a publicação integral da sentença em outras páginas da web oficiais com grande quantidade de acessos.

[29] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Resolução da CIDH de 19 de junho de 2012: Supervisão de Cumprimento de Sentença. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/supervisiones/escher_19_06_12_por.pdf>. Acesso em: 29 out. 2012.

[30] GOMES, Luiz Flávio e MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Comentários à Convenção Americana sobre direitos humanos: Pacto de San José da Costa Rica. Coleção Ciências Criminais, v. 4. 2. ed. rev, atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

[31] O Brasil já fora condenado no caso Ximenez Lopes e absolvido, por ausência de provas, no Caso Nogueira de Carvalho. Após o caso Escher, no mesmo ano de 2009, veio a condenação pela morte de Sétimo Garibaldi durante um despejo judicial em Querência do Norte/PR.

[32] PLS 236/2012.

[33] No mesmo sentido: CIDH, Caso Tristán Donoso vs. Panamá, sentença de mérito de 27.01.2009 (§§ 55 a 57). Disponível em: <http://corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_193_ing.pdf>. Acesso em 20 out. 2012.

[34] CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A farra dos grampos telefônicos no Brasil. Gazeta Mercantil, Caderno A, p. 13, 18.08.2008.

[35] BATISTA, Nilo. A criminalização da advocacia. Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre, n. 20, p. 85-91, out./dez. 2005.

[36] Artigo 10 da lei nº 9.296/96.

[37] MALAN, Diogo. Caso Escher e outros vs. Brasil e sua importância para o processo penal brasileiro. Disponível em: <http://alexandremoraisdarosa.blogspot.com.br/2012/07/caso-escher-e-outros-vs-brasil-e-sua.html>. Acesso em: 26 out. 2012.

[38] Paradigmático é o caso da chamada “Operação Satiagraha”, na qual houve o compartilhamento das gravações oriundas do monitoramento telefônico dos investigados entre a Polícia Federal, a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e um ex-agente do (Serviço Nacional de Informações) SNI, contratado como investigador particular pelo Delegado que coordenava a operação. Neste caso, em Habeas Corpus impetrado perante o Superior Tribunal de Justiça entendeu-se que o abuso de poder era manifesto e que ocorreu uma intromissão estatal abusiva e ilegal na esfera da vida privada, o que acarretou violações da honra, da imagem e da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, o STJ concedeu a ordem para anular todas as provas produzidas naquela investigação e, por derivação, desde o início, a própria ação penal dela originada (HC 149250/SP, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2011, DJe 05/09/2011). Cabe frisar que da decisão o Ministério Público interpôs Recurso Extraordinário, o qual foi devidamente admitido, estando pendente de julgamento definitivo pelo Supremo Tribunal Federal.

[39] DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Tradução Nelson Boeira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

[40] GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A Motivação Das Decisões Penais. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p. 23-4.

[41]Há quem distinga os direitos humanos dos direitos fundamentais pelo plano em que se aplicam. Os direitos humanos são aqueles direitos inerentes às pessoas humanas que permeiam a órbita do direito internacional, ou seja, possuem uma titularidade universal supranacional, enquanto os direitos fundamentais são aqueles direitos humanos reconhecidos positivamente pelas Constituições, que se caracterizam como instrumentos limitativos do poder estatal e vinculativos do poder constituinte derivado na órbita do direito interno de cada Estado (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 11 ed. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2012). 

[42] GOMES, Luis Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação Telefônica. São Paulo: RT, 1997, p. 213.

[43] SCHEID, Carlos Eduard. A motivação das decisões penais a partir da teoria garantista. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 163.

[44] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional E Teoria Da Constituição. 5 ed. Coimbra: Almedina, 2001, p. 405.

[45] CARVALHO, Salo de. Pena e Garantias: Uma leitura do garantismo de Luigi Ferrajoli no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 13-4.

[46] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Madrid: Editoral Trotta, 2000, p. 584.

[47] BINDER, Alberto M. O descumprimento das formas processuais: elementos para uma crítica da teoria unitária das nulidades no processo penal. Tradução Angela Nogueira Pessoa. Revisão Fauzi Hassan Choukr. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 49.

[48] LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 234.

[49]A legalidade, a separação de poderes e a proteção dos direitos fundamentais são os princípios desse novo Estado. Este é o governo das leis, dividido em órgãos com atribuições específicas e que, ao mesmo tempo, sofrem controles recíprocos (checks and balances). É um sistema de organização social em que os direitos fundamentais dos cidadãos são as fronteiras que não podem ser ultrapassadas pelo poder estatal. Conforme ZIPPELIUS, Reinhold. Teoria Geral Do Estado. Tradução Karin Praeske-Aires Coutinho. Coordenação J. J. Gomes Canotilho. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 383, os princípios do Estado de Direito servem como instrumentos para prevenir uma expansão totalitária, isto é, um exercício incontrolado do poder do Estado.

[50] NOJIRI, Sérgio. O Dever de Fundamentar as Decisões Judiciais. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 41.

[51]MALAN, Diogo Rudge. Direito ao confronto no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

[52] GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A Motivação Das Decisões Penais. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p.101.

[53]“[...] A fundamentação dos atos decisórios qualifica-se como pressuposto constitucional de validade e eficácia das decisões emanadas do Poder Judiciário. A inobservância do dever imposto pelo art. 93, IX, da Carta Política, precisamente por traduzir grave transgressão de natureza constitucional, afeta a legitimidade jurídica do ato decisório e gera, de maneira irremissível, a consequente nulidade do pronunciamento judicial. Precedentes. A decisão judicial deve analisar todas as questões suscitadas pela defesa do réu. Reveste-se de nulidade o ato decisório, que, descumprindo o mandamento constitucional que impõe a qualquer Juiz ou Tribunal o dever de motivar a sentença ou o acórdão, deixa de examinar, com sensível prejuízo para o réu, fundamento relevante em que se apóia a defesa técnica do acusado.” (grifo nosso) (STF, HC 74073, Relator:  Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 20/05/1997, DJ 27-06-1997 PP-30227 EMENT VOL-01875-03 PP-00597).

[54] SCHEID, Carlos Eduard. A motivação das decisões penais a partir da teoria garantista. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 161.

[55] LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 253.

[56]Segundo alerta MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de Inocência no Processo Penal Brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 322, essa legitimidade política propiciada pela motivação não significa dizer que o julgador deverá tomar-se subserviente da opinião pública ou da "opinião publicada", assumindo discursos punitivos ou liberais desprovidos de justificação constitucional. Deve haver, na consciência judicial, uma clara diferença entre a "responsabilidade social do juiz" de informar com clareza e precisão todos os caminhos fáticos e jurídicos escolhidos em sua decisão, sem com isso se deixar guiar por razões outras que se distanciem dos fatos demonstrados nos autos ou das razões constitucionais impostas pela lei.

[57] FRAGOSO, Heleno Cláudio. A motivação da sentença na aplicação da pena. Revista Forense. Rio de Janeiro, nº 227, 1969, p. 17.

[58]GOMES FILHO, Antônio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2001, p. 76.

[59] LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1063.

[60]MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de Inocência no Processo Penal Brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 322.

[61] GOMES, Luis Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação Telefônica. São Paulo: RT, 1997, p. 214.

[62] FAYET, Ney. A sentença criminal e suas nulidades. Rio de Janeiro: Aidê, 1987, p. 49-50.

[63] CARVALHO, Salo de; CARVALHO, Amilton Bueno de. Aplicação da pena e garantismo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 32.

[64] GOMES FILHO, Antônio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 203.

[65] “[...] 2. Em relação às interceptações telefônicas, o prazo de 15 (quinze) dias, previsto na Lei nº 9.296/96, é contado a partir da efetivação da medida constritiva, ou seja, do dia em que se iniciou a escuta telefônica e não da data da decisão judicial. [...]” (grifos nossos) (HC 135771/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 04/08/2011, DJe 24/08/2011).

[66] “[...] É possível a prorrogação do prazo de autorização para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando o fato é complexo a exigir investigação diferenciada e contínua. Não configuração de desrespeito ao art. 5º, caput, da L. 9.296/96. [...]” (grifos nossos) (STF, HC 83515, Relator:  Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2004, DJ 04-03-2005 PP-00011 EMENT VOL-02182-03 PP-00401 RTJ VOL-00193-02 PP-00609). “RECURSO EM HABEAS CORPUS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRAZO DE VALIDADE. PRORROGAÇÃO. POSSIBILIDADE. Persistindo os pressupostos que conduziram à decretação da interceptação telefônica, não há obstáculos para sucessivas prorrogações, desde que devidamente fundamentadas, nem ficam maculadas como ilícitas as provas derivadas da interceptação. Precedente. Recurso a que se nega provimento.” (grifos nossos) (STF, RHC 85575, Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 28/03/2006, DJ 16-03-2007 PP-00043 EMENT VOL-02268-03 PP-00413).

[67] GOMES, Luis Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação Telefônica. São Paulo: RT, 1997, p. 219.

[68] Citem-se, exemplificativamente, as seguintes recentes decisões do STF e do STJ sobre o tema: “[...] I – A fixação das penas-base acima do mínimo legal não foi devidamente fundamentada, haja vista que o magistrado sentenciante não declinou adequadamente as razões de fato que determinaram a consideração negativa das circunstâncias judiciais, em patente violação ao dever de fundamentação das decisões judiciais, previsto no art. 93, IX, da Constituição Federal. II – Ordem concedida para determinar ao juízo de primeiro grau que refaça a dosimetria da pena.” (grifos nossos) (STF, HC 112569, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 02/10/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-207, DIVULG 19-10-2012, PUBLIC 22-10-2012); “[...] 1. A fixação da pena é uma operação lógica, formalmente estruturada, sendo imperioso promover-se a fundamentação em todas as suas etapas. Mencionar que a culpabilidade "ressoa gravíssima" não constitui fundamentação idônea, visto que o grau de reprovabilidade da conduta do acusado não passou do habitual ao crime em comento. [...] 5. Outrossim, não constitui fundamentação adequada considerar as consequências do delito como desfavoráveis apenas pela alegação de que são "prejudiciais e danosas", devendo, pois, ser expurgado o acréscimo decorrente do exame genérico feito pelo julgador. [...]” (grifos nossos) (STJ, HC 130.366/ES, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 16/08/2012, DJe 27/08/2012).

[69] Art. 66.1 da CADH.

[70] Segundo WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Controle das decisões judiciais por meio de recursos de estrito direito e de ação rescisória. São Paulo: RT, 2001, p. 20-22, “o art. 93, IX, da CF vigente deu status de garantia constitucional à regra de que todos os julgamentos do Poder Judiciário sejam públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. O inciso subseqüente (art. 93, X) determina, outrossim, que todas as decisões administrativas dos tribunais sejam motivadas. O art. 5º, II, da CF consagrou expressamente o princípio da legalidade: ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Estes três dispositivos da Constituição federal consagram e viabilizam o princípio da legalidade no direito brasileiro vigente. O juiz está, portanto, vinculado à lei. E há de fundamentar, portanto, todas as suas decisões, na lei, embora não exclusivamente. Com esta exigência, têm-se: (a) uma garantia contra o arbítrio; (b) uma garantia contra a influência de pontos de vista pessoais (= subjetivismo); (c) controle de raciocínio do juiz; (d) possibilidade (técnica) de impugnação (pois, na verdade, quando se impugna uma decisão judicial, se atacam diretamente seus fundamentos para, indiretamente, atingir-se a decisão, i. e., a decisão propriamente dita); (e) maior grau de previsibilidade; (f) aumento da repercussão das normas de direito. Esta atitude do nosso legislador constitucional evidencia de modo inequívoco que, ainda que se admita tenha o juiz padrões mais flexíveis, quer-se a continuidade do método de que haja padrões para decidir, porque se valoriza a segurança e a previsibilidade, apesar de todas as dificuldades decorrentes da inegável flexibilização dos padrões que hoje se constata em toda parte".

[71] GOMES FILHO, Antônio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2001, p. 96-7.

[72] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. Madrid: Editoral Trotta, 2000, p. 623.


ABSTRACT: This study intends to analyze the judgment of the Inter-American Court of Human Rights in the case of Escher et al. v. Brazil, in which the country was convicted for violating the obligation to respect the rights to honor and dignity (privacy), to freedom of association, to a fair trial, and to judicial protection, due to illegal telephone communications interceptions from members of the Movement of Landless Rural Workers and subsequent dissemination of excerpts of the recorded conversations by public officials. The goal is to extract from the decision lessons that could approximate Brazil a little more to a truly democratic criminal justice system and criminal procedure, in accordance to the commitments signed by the nation internationally. It is hoped that the case contributes for the Brazilian state to take seriously the fundamental right to confidentiality of telephone communications and the duty-assurance of justification of any judicial decision, especially those which relativize fundamental rights.

KEYWORDS: "Inter-American Court of Human Rights". "Telephone interceptions". "Dignity of the Human Person". "Freedom of Association". "Justification".


Autor

  • Carlo Velho Masi

    Advogado criminalista (OAB-RS 81.412). Vice-presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas no Estado do Rio Grande do Sul (ABRACRIM-RS). Mestre e Doutorando em Ciências Criminais pela PUC-RS. Especialista em Direito Penal e Política Criminal: Sistema Constitucional e Direitos Humanos pela UFRGS. Especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra/IBCCRIM. Especialista em Ciências Penais pela PUC-RS. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela UNISINOS. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC-RS. Membro da Comissão Nacional de Judicialização e Amicus Curiae da ABRACRIM. Membro da Comissão Especial de Políticas Criminais e Segurança Pública da OAB-RS. Parecerista da Revista Brasileira de Ciências Criminais (RBCCRIM) e da Revista de Estudos Criminais (REC) do ITEC. Coordenador do Grupo de Estudos Avançados Justiça Penal Negocial e Direito Penal Empresarial, do IBCCRIM-RS. Foi moderador do Grupo de Estudos em Processo Penal da Escola Superior de Advocacia (ESA/OAB-RS). Coordenador Estadual Adjunto do IBCCRIM no Rio Grande do Sul. Membro da Associação das Advogadas e dos Advogados Criminalistas do Estado do Rio Grande do Sul (ACRIERGS). Escritor, pesquisador e palestrante na área das Ciências Criminais. Professor convidado em diversos cursos de pós-graduação.

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MASI, Carlo Velho. O caso Escher e outros vs. Brasil e o sigilo das comunicações telefônicas. A fundamentação como garantia de efetividade dos direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3645, 24 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24469. Acesso em: 19 abr. 2024.