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Arrepio ao direito do consumidor à informação: o caso das cervejas de milho transgênico

Arrepio ao direito do consumidor à informação: o caso das cervejas de milho transgênico

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Fabricantes substituem em grande quantidade a cevada da cerveja brasileira por milho transgênico e o consumidor não é informado.

A boa-fé objetiva, estampada no artigo 422 do Código Civil brasileiro pode ser considerada o cânone máximo das relações contratuais modernas, impondo às partes, dentre outras coisas, deveres anexos de comportamento. Destacam-se a lealdade, a solidariedade, a probidade, a ética, a cooperação e a informação. Todos os pactos devem se submeter aos influxos desta cláusula geral.

Com efeito, e ainda diante de previsão expressa do estatuto consumerista em seu artigo 6º, III, a informação é considerada direito básico do consumidor. Mostra a preocupação do legislador com os desdobramentos da boa-fé acima referida alcançando, evidentemente, as relações de consumo. No entanto, nem sempre esse direito é respeitado, como no caso atual da maioria das cervejas nacionais.

É cediço que o brasileiro em geral gosta bem de uma cervejinha. E normalmente das próprias brasileiras. Cervejas importadas, sobretudo belgas, tidas como as melhores do mundo, costumam ser mais fortes e/ou mais adocicadas. Aí vai do gosto de cada um. De uns tempos pra cá, no entanto, a qualidade da nossa bebida vem caindo e agora sabe-se bem o porquê. Anote-se, por oportuno, que a divulgação foi por uma pesquisa e não pelos fabricantes/fornecedores.

A despeito das (sutis) diferenças entre as marcas, uma coisa que não mudava era a principal matéria-prima desta famosa bebida: a cevada. A cerveja era quase toda composta de cevada. Repetindo, não mudava, por que agora (ou já há algum tempo) vem sendo substituída em grande proporção pelo milho, o que afeta o sabor e, mais ainda, a qualidade da cerveja brasileira, que já não tem boa aceitação no mercado mundial, mas que por aqui é muito consumida.

A maioria das cervejarias nacionais usa o milho em grande escala para substituir a cevada na fabricação das cervejas, diminuindo a qualidade, mas, em contrapartida, baixando sensivelmente os custos. E como a sensibilidade do bebedor normalmente não é lá essas coisas, dá-lhe imposições nocivas do mercado! E os bebedores incautos e não informados vão engolindo, literalmente.

Há uma normativa que estipula um nível máximo de substituição da cevada na composição da cerveja em 45%. Nem é preciso dizer que praticamente todas operam com o uso do milho no limite máximo. Mas não informam ao consumidor. Para disfarçar o golpe criaram o eufemismo “cereais não-maltados”. E pronto. É flagrante o desrespeito ao direito à informação. Informação pela metade ou falha não é informação de boa-fé e não respeita os ditames legais.

Aliás, nem mesmo se vislumbra a real necessidade de tamanha deturpação já que o Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo e algumas fábricas chegam a atingir lucros de até 49% com a venda da bebida. O consumidor poderia ser mais respeitado, sem dúvida.

E o arrepio ao citado direito à informação não para por aqui. Outro dado preocupante e alarmante ligado ao assunto é que o milho produzido no país é praticamente todo transgênico. Ainda não se sabe efetivamente e cientificamente os impactos capazes de causar no organismo humano os alimentos geneticamente modificados. E isso também não é informado. A legislação brasileira prevê, no entanto, que todos os alimentos e bebidas que possuam transgênicos em sua composição têm de trazer essa informação no rótulo. Nos das cervejas nunca se viu...

As grandes corporações, como de (péssimo) hábito vêm reiteradamente desrespeitando direitos comezinhos dos consumidores brasileiros. Talvez já passe da hora de uma fiscalização mais eficaz e de punições eficientes.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PENNA, Bernardo Schmidt. Arrepio ao direito do consumidor à informação: o caso das cervejas de milho transgênico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3967, 12 maio 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27942. Acesso em: 24 abr. 2024.