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(in)constitucionalidade da castração química para os condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes

(in)constitucionalidade da castração química para os condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes

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O número de abusos sexuais tendo como vítimas, principalmente, crianças e adolescentes cresce cada vez mais no Brasil. Em resposta a esse aumento alarmante, surgiram alguns projetos de lei, como o de nº 552/07, que prevê a castração química para condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes.

RESUMO

O número de abusos sexuais, tendo como vítimas principalmente crianças e adolescentes cresce cada vez mais no Brasil, demonstrando-se assustadores os relatos nos jornais e na mídia televisiva de casos envolvendo menores de quatorze anos. Em resposta a esse aumento alarmante, surgiram alguns projetos de lei, sendo o nº 552/07, de autoria do deputado Gerson Camata, o que teve maior repercussão, encontrando-se atualmente arquivado. O referido projeto de lei prevê uma nova espécie de pena, qual seja a castração química para condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes, que, caso aceitem se submeter ao tratamento, terão a sua pena diminuída em um terço, mas caso o criminoso seja reincidente terá que se submeter obrigatoriamente à castração química. O principal medicamento utilizado é o Depo- Provera que diminui o desejo sexual, porém pode ocasionar alguns efeitos colaterais como queda de cabelo e aumento de peso. Entretanto, surgiram vários debates sobre o assunto, havendo controvérsia se violaria os princípios constitucionais, como o da Dignidade da Pessoa Humana e da Proporcionalidade. Restou demonstrado se tratar de sanção inconstitucional, que não deve ser implementada no ordenamento jurídico, pois fere princípios basilares da nossa Constituição, além de não ser eficaz no que tange às finalidades de retribuição e prevenção da pena.

Palavras-chave: Castração química. Projeto de lei nº 552/07. (In) constitucionalidade

ABSTRACT

 

The number of sexual abuse, with the victims mostly children and teenagers grow increasingly in Brazil, which is scary reports in newspapers and television media of cases involving children under fourteen. In response to this alarming increase, some bills have emerged, No. 552 / 07 being authored by Mr Gerson Camata, which had a greater impact, lying currently closed. That bill provides a new kind of punishment for sex offenders, namely chemical castration for convicted sex offenders against children and adolescents, who, if they accept to undergo treatment, have their penalty reduced by one-third but if the offender is a recidivist will have to undergo mandatory chemical castration. The main drug used is Depo - Provera, which decreases sexual desire, but can cause some side effects like hair loss and weight gain. However, several debates on the subject, there is controversy violate constitutional principles such as the dignity of the human person and proportionality emerged. Left shown it is unconstitutional penalty which should not be implemented in the legal system, because it hurts the fundamental principles of our Constitution, and not be effective with respect to the purposes of retribution and prevention pen.

Keywords: Chemical Castration. Bill No. 552/07. (Un) constitutionality

 

1        INTRODUÇÃO

 

Nas mídias, nos jornais há cada vez mais noticias sobre casos de abuso sexuais e estupros contra crianças e adolescentes que na maioria das vezes são praticados dentro da própria casa da criança por parentes ou vizinhos, o que na maioria das vezes dificulta as denúncias, os crimes dessa natureza incita a comoção popular, no sentido da adoção de penas mais eficientes contra esses criminosos, dentre essas penas está à castração química.

A castração química é feita basicamente, através de doses periódicas e frequentes, de hormônios femininos como o Androcur e o mais conhecido que é o acetato de medroxiprogesterona conhecido com Depro-provera, o tratamento teve ter a junção de acompanhamento psiquiátrico, o hormônio feminino demostra que há uma redução do apetite sexual compulsivo dos indivíduos delituosos e que seus efeitos colaterais, tais como, ocorrência eventual de depressão, desenvolvimento de diabetes, fadiga crônica, alterações na coagulação sanguínea, dentre outros, mas que tecnicamente compensam-se pelos benefícios (HEIDE, 2007).

        A identificação do método contraceptivo para os condenados por crimes sexuais contra crianças e adolescentes é de grande importância à sociedade, como forma de esclarecimento e proteção para a mesma, pois seria um meio hábil de diminuir a libido dos criminosos.

Com essa delimitação as pessoas estarão mais aptas a tomar medidas preventivas face às violações possíveis de serem causadas pelo mesmo e o método da castração pode ser visto como uma maior proteção para a mesma e ainda como uma pena provisória em liberdade para o agressor.

Visualizados seis estados que já usaram da castração química, criando leis, tais como CalifórniaFlóridaGeórgiaTexasLouisiana, e Montana. Sendo a Califórnia o primeiro estado a utilizá-la, bem como, em Iowa e Flórida, que na sequência, os incluíram como pena para criminosos sexuais. Em ambas, num primeiro julgamento, é facultada aos juízes a imposição a castração química, já em caso de reincidência, o tratamento é obrigatório.

Para o meio científico, busca-se complementar o pouco que se tem sobre o assunto, tendo em vista, que a maior parte das pesquisas relacionadas à castração química prioriza a vítima. E o conhecimento do mesmo é fundamental já que é um assunto que está em discussão no mundo todo, e está em análise no governo Brasileiro.

A pena tem várias finalidades, dentre as quais se destacam a ressocialização do condenado e a prevenção geral de crimes. Por mais imperfeita que seja a pena privativa de liberdade é o meio mais eficiente e humano que a civilização conseguiu, para a repressão e a prevenção de crimes.

Existem, porém, outros meios que merecem serem utilizados ou, ao menos, tentados. A castração química é um desses meios. Pesquisas indicam que a reincidência de criminosos sexuais cai de 75 para 2% após a aplicação do hormônio feminino. Trata-se de uma estatística que não pode ser desprezada. Várias pessoas deixariam de ser vitimadas por estupros e atentados violentos ao pudor com o uso dessa alternativa.

Porém, já foi visto que a castração química como pena encontra óbices constitucionais intransponíveis. Inclusive em países com legislação penal bem mais rigorosa, como os Estados Unidos, a questão gera profundos questionamentos.

Além disso, a "ressocialização" do criminoso sexual depende fundamentalmente de sua força de vontade, que deve ser amparada por um consistente tratamento psicológico. A junção desse fator com a castração química pode trazer efetivos avanços na recuperação dessas pessoas.

A alternativa que respeitaria os direitos constitucionais do condenado e colaboraria com a diminuição dos crimes sexuais seria transformar a castração química em um direito. Assim, aquele que se dispusesse a realizar o tratamento seria beneficiado com uma redução da pena que poderia variar entre um e dois terços, em analogia ao benefício da delação premiada, prevista na Lei 8.072/90. A lógica é simples: parte da pena de prisão tornar-se-ia desnecessária, pois a função ressocializadora estaria sendo atingida também por meio da castração química.

O condenado teria a opção de cumprir a pena nos termos da lei atual ou de submeter-se ao tratamento durante todo o período em que ele não estivesse encarcerado. Obviamente, esse tratamento somente poderia ser feito após laudo médico que comprovasse sua necessidade e com o pertinente apoio psicológico.

Atualmente, desde 2007, tramita no Congresso Nacional um projeto de lei para acrescentar ao Código Penal brasileiro a pena de “castração química” a pedófilos condenados que cometeram crimes de estupro e corrupção de menores. A proposta do senador Gerson Camata prevê que o criminoso que aceitar se submeter ao tratamento poderá ter um terço da pena reduzida. O projeto chegou a ser discutido na Comissão de Constituição e Justiça no ano passado, mas acabou sendo enviado para apreciação da Comissão de Direitos Humanos antes de ser votado.

 

2                    MATERIAIS E MÉTODOS

 

Para a realização deste estudo de natureza teórica, por ser uma pesquisa bibliográfica, foram realizadas pesquisascom base de informações retiradas de livros, buscas em artigos científicos e outras informações disponíveis em sites,em monografias, através das bases de dados eletrônicas e biblioteca digital de universidades, no período de 2004 a 2010.

 

3                    RESULTADOS E DISCUSSÕES

 

A castração possui duas vertentes, sendo ela física ou química. A primeira consiste na retirada dos órgãos reprodutores, (pênis e testículos, no caso do homem), com caráter irreversível. A segunda, no entanto, incide em injetar  hormônios femininos capazes de diminuir consideravelmente o nível de testosterona, impedindo assim, que o homem sinta desejo sexual, perdendo a sua libido. Este tem caráter reversível, pois seus efeitos só duram enquanto o mesmo permanecer em tratamento (AGUIAR, 2007).

O primeiro país que sugeriu a inserção da castração química como pena ao condenado foram os Estados Unidos, com a administração de uma substância que quando injetada, destruiria as válvulas de bombardeamento sanguíneos peniano, impedindo que este tivesse ereção. O método tinha caráter irreversível e pouco eficaz, visto que o agressor sexual, apesar de não possuir o pênis, poderia cometer os estupros com os demais membros que não lhe fora amputadoscomo dedos, língua, boca, ou ainda com o uso de objetos, já a castração química inibe o desejo sexual através das injeções de medicamentos hormonais.

O medicamento mais utilizado na castração química que já realizada em alguns países é o Depo-provera (acetato de medroxiprogesterona), a aplicação do hormônio demonstra que há uma redução do apetite sexual compulsivo dos criminosos e que seus efeitos colaterais compensam-se pelos benefícios. Dentre os efeitos, está à ocorrência eventual de depressão, desenvolvimento de diabetes, fadiga crônica, alterações na coagulação sanguínea, incluindo aumento de peso, trombose, hipertensão, hipoglicemia e raras mudanças em enzimas hepáticas. Outros efeitos secundários, tais como a formação de depósitos anormais de gordura no fígado, estão sendo investigados.

Embora seja geralmente considerada mais humana do que castração cirúrgica, a castração química tem atraído muitos críticos. Devido seus efeitos, que além de ser reversível, quando parado de utilizar seus efeitos inibidores são dobrados, aumentando a produção de testosterona acima dos níveis anteriormente verificados e causando uma alteração em sua libido de forma mais intensa do que a originalmente.

A castração química voluntária é uma alternativa à pena de prisão ou diminuição da pena para quem se submete voluntariamente, muito utilizada na Europa, França, Itália, Coréia do Sul e em vários países, tem um resultado satisfatório.

 É, portanto um tratamento reversível, que tem como princípio inibir a libido dos sujeitos que já cometeram algum delito sexual. Porém, muitos especialistas alertam sobre os efeitos colaterais, quem pode ocasionar problemas para a saúde do paciente.

O tratamento com o acetato de medroxiprogesterona é uma resposta inserida no ordenamento jurídico de alguns países com vistas a reduzir as taxas de reincidência de alguns tipos de crimes sexuais, sobretudo nos casos de parafilia — padrão de comportamento sexual no qual, em regra, o desvio se encontra no objeto do desejo sexual, como, por exemplo, crianças — ou em casos em que os desejos biológicos são incontroláveis e expressos em forma de fantasias sexuais que normalmente só podem ser satisfeitas por meio de violência ou compulsão (CONSULTOR JURÍDICO, 2012, p 2).

 

Estudos com o Depo-Provera (acetato de medroxiprogesterona) relacionados à castração química, demonstram que há uma redução do apetite sexual compulsivo dos pedófilos e que seus efeitos colaterais compensam-se pelos benefícios. Dentre estes, está à ocorrência eventual de depressão, desenvolvimento de diabetes, fadiga crônica, alterações na coagulação sanguínea, incluindo aumento de peso, trombose, hipertensão, hipoglicemia e raras mudanças em enzimas hepáticas. Outros efeitos secundários, tais como a formação de depósitos anormais de gordura no fígado, estão sendo investigados.

Embora seja geralmente considerada mais humana do que castração cirúrgica, a castração química tem atraído muitos críticos. Devido seu efeito, que além de ser reversível, quando parado de utilizar seus efeitos inibidores são dobrados, aumentando a produção de testosterona acima dos níveis anteriormente verificados e causando uma alteração em sua libido de forma mais intensa do que a originalmente verificada.

No ordenamento jurídico brasileiro já teve diversas tentativas de inserção de projetos de leis, o que teve mais repercussão foi o de n º 552/07, o que será visto adiante.

O Projeto de Lei supracitado do Senador Gerson Camata propõe acrescentar o art. 261-B ao Código Penal Brasileiro, cominando a pena da castração química ao autor dos crimes tipificados nos artigos 213, 214 (revogado pela Lei n. 12. 015, de 7-8-2009), 218 e 224 (revogado pela Lei 12. 015/2009.) for considerado pedófilo, conforme o Código Internacional de Doenças (SGARBOSSA, JENSEN, 2007).

O projeto inicial surge sob a justificativa de que a pedofilia é uma doença, que por sua vez, é reconhecida pela comunidade científica em todo mundo, cujas conseqüências à sociedade são gravosas.Isso se deve ao fato de menores, incluindo crianças e adolescentes estão em fase de formação tanto física quanto psicológica. Então, quando esses menores são submetidos a torturas por indivíduos com distúrbios mentais podem gerar danos irreparáveis. Assim, mesmo que o pedófilo seja submetido aos mais modernos tratamentos clínicos, por apresentarem deformações psíquicas que impedem sua reabilitação e reinserção na sociedade. Por esse motivo, mesmo países com sistemas carcerários com estruturas exemplares, como o Estados Unidos, adotam a castração visando impedir a reincidência do crime (CAMATA, 2009, p. 2).

O senador Camata avalia a necessidade do procedimento da castração química como forma de debelar a mazela originada nesse tipo de crime em prol da sociedade. Principalmente, pelo fato da pena restritiva de liberdade, aplicada atualmente em nosso país, não ser eficaz, pois na maioria dos casos, o pedófilo sai da prisão sem ter a consciência que sofre de uma doença. Em vista disso, a pena de castração química seria uma forma conscientizadora da punição, pois o molestador terá a plena noção de que os atos libidinosos praticados por ele violam o que é considerado tolerável pela sociedade, sendo, portanto um comportamento doentio (CAMATA, 2009).

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) não votou nessa quarta-feira (16) o relatório do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) sobre o Projeto de Lei nº 552/2007, que modifica o Código Penal e estabelece a diminuição de pena para autores de estupro, atentado violento ao pudor e abuso sexual de crianças e adolescentes que se submeterem a tratamento químico hormonal que reduz a libido.

De acordo com o relatório, o condenado deverá se submeter voluntariamente ao tratamento durante o período de livramento condicional (cumprido fora da prisão). O tratamento será tentado depois que uma comissão, formada por psicólogo e psiquiatra, fizer atendimento psicossocial no período de reclusão. O uso do hormônio semanalmente começa antes da soltura. Em caso de reincidência, a pessoa volta à prisão e perde o direito de diminuir a pena.  Com a emenda o Projeto de Lei nº 552/07 ficou da seguinte forma:

(...) Segundo a proposta, quando o condenado for considerado pedófilo a castração química é um efeito obrigatório decorrente da pena. Contudo, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado propôs emendas que consagram a castração química como voluntária, o que acarretaria na diminuição da pena.

Art. 226-A. Quando os crimes tipificados nos arts. 213, 214 e 218 forem praticados contra pessoa com idade menor ou igual a quatorze anos, observar-se-á o seguinte:

§ 1º. O condenado poderá se submeter, voluntariamente, sem prejuízo da pena aplicada, a tratamento químico hormonal de contenção da libido, durante o período de livramento condicional, que não poderá ser inferior ao prazo indicado para o tratamento.

§ 2º. O condenado que voluntariamente se submeter à intervenção cirúrgica de efeitos permanentes para a contenção da libido não se submeterá ao tratamento químico de que trata o § 1º, e poderá, a critério do juiz, ter extinta a sua punibilidade.

§ 3º. A Comissão Técnica de Classificação, na elaboração do programa individualizador da pena, especificará tratamento de efeitos análogos ao do tratamento hormonal de contenção da libido, durante o período de privação de liberdade, cujos resultados constituirão condição para a realização ou não do tratamento de que trata o § 1º deste artigo.

§ 4º. O condenado referido no § 1º deste artigo que se submeter voluntariamente ao tratamento químico hormonal de contenção da libido, após os resultados insatisfatórios obtidos com o tratamento de que trata o § 3º, terá a sua pena reduzida em um terço.

§ 5º. O condenado reincidente em qualquer dos crimes referidos no caput deste artigo que já tiver se submetido, em cumprimento anterior de pena, ao tratamento de que trata o § 4º deste artigo, não se submeterá a ele novamente.

§ 6º. O tratamento químico hormonal de contenção da libido antecederá o livramento condicional em prazo necessário à produção de seus efeitos e continuará até a Comissão Técnica de Classificação demonstrar ao Ministério Público e ao juiz de execução que o tratamento não é mais necessário.

 

                  Portanto, comina a pena de castração química ou física voluntária para quem cometer os delitos sexuais previstos nos artigos 213, 214, 218 e 224 contra pessoa com idade igual ou inferior a quatorze anos. Após a leitura do art. 226-A, nota-se que há uma delimitação na idade do sujeito passivo, qual seja: igual ou inferior a 14 anos. Além disso, é uma norma penal em branco, pois necessitam da complementação do Código Internacional de Doenças (CID), que, por sua vez, define pedófilo e pedofilia.

A regra do §1º do art. 226-A versa em síntese que o condenado que estiver em gozo do livramento condicional, antes de sair da cadeia poderá voluntariamente se submeter ao tratamento químico hormonal para a contenção da libido, dessa forma objetivando a ressocialização do individuo. Só será obrigatório quando reincidir no crime contra a liberdade sexual.

Válido lembrar que esse método não é definitivo, e mesmo nas hipóteses em que assim o é, há muito anos a técnica é utilizada por laboratório no Brasil por pacientes que voluntariamente os procurar para efetuar o procedimento, não, em verdade, é a popularização midiática do método em razão de aparente tortura que parecer ser. Além do que, em muitos casos trata-se de um distúrbio mental que realmente precisa de um cuidado de ordem médica, sendo outro meio completamente ineficaz como, por exemplo, o cárcere.

O § 2º prevê uma pena definitiva, qual seja, a castração física, que tem por objetivo retirar do homem, através de cirurgia, a retirada dos testículos. Assim, se o infrator optar por essa medida, sua punibilidade será extinta e não haverá aplicação do § 1º. Afora isso, tem ainda os parágrafos 3º ao 6º, sendo previsto que:
                   O §3º. A Comissão Técnica de Classificação, na elaboração do programa individualizado da pena, especificará tratamento de efeitos análogos ao do tratamento hormonal de contenção da libido, ou seja, efeitos parecidos com o de tratamento hormonal, durante o período de privação de liberdade, cujos resultados constituirão condição para a realização ou não do tratamento de que trata o § 1º deste artigo.
                  De acordo com o § 4º, se o tratamento químico voluntário na forma do § 3º tiver resultado insatisfatório, a pena do condenado será reduzida. Além disso, o § 5º aduz que o reincidente, em qualquer desses crimes, que já tenha feito esse tratamento não se submeterá à ele novamente, e o § 6º afirma que o tratamento químico "antecederá o livramento condicional em prazo necessário à produção de seus efeitos e continuará até a Comissão Técnica de Classificação demonstrar ao Ministério Público e ao juiz de execução que o tratamento não é mais necessário".

   Todavia, o projeto já foi emendado duas vezes, tendo em vista que os artigos 214 (Atentado violento ao pudor) e 224 (Presunção de violência) foram revogados pela Lei nº 12.015/09. Essa lei alterou o Titulo VI da Parte Especial do Código Penal, o art. 1º da Lei nº 8072/90, que dispõe sobre crimes hediondos e revogou a Lei nº 2252/54, que tratava sobre corrupção de menores. Com base na segunda e última emenda, o artigo ficou com a seguinte redação: 


Art. 226-A. Em relação aos crimes tipificados nos arts. 217-A e 218 observar-se-á o seguinte:
I o condenado não-reincidente poderá submeter-se, voluntariamente, sem prejuízo da pena aplicada, a tratamento químico hormonal de contenção da libido, durante o período de livramento condicional, que não poderá ser inferior ao prazo indicado para o tratamento;
II  o condenado reincidente em qualquer dos crimes referidos no caput deste artigo será obrigado a submeter-se a tratamento químico hormonal, sem prejuízo da pena aplicada, durante o período de livramento condicional, que não poderá ser inferior ao prazo indicado para o tratamento;

 

                   Vale ressaltar que tem ainda os incisos III e IV, que, em resumo, versam respectivamente sobre as atribuições da Comissão Técnica de Classificação, bem como acerca do condenado, no inciso I, que não teve resultado satisfatório, ter sua pena reduzida em um 1/3. O inciso V fala que o "condenado referido no inciso II deste artigo que já tiver se submetido, em cumprimento anterior de pena, ao tratamento de que trata o inciso III não se submeterá a ele novamente"; e por fim, o inciso VI fala que o tratamento "antecederá o livramento condicional em prazo necessário à produção de seus efeitos e continuará até a Comissão Técnica de Classificação demonstrar ao MP e ao juiz de execução que o tratamento não é mais necessário."

                   Portanto, agora só abrange os crimes de estupro de vulnerável (art. 217-A, CP) e corrupção de menores (art. 218, CP). Essa medida visa impedir que o infrator pudesse vir a delinquir novamente. Atualmente, está localizada na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, pronta para a pauta na comissão, tendo sido devolvida como voto pela aprovação com as duas emendas que apresenta pelo Gabinete do Senador Marcelo Crivella.

Analisando o referido Projeto de Lei, por um lado: reduziria os índices de reincidência em delitos sexuais cujas vítimas sejam crianças e/ou adolescentes, formando em contrapartida uma legião de estéreis e indivíduos com uma série de complicações fisiológicas e gerando assim, mais uma questão a ser resolvida no âmbito da saúde pública. 

Não é a primeira vez que tramita um Projeto de Lei com a ideia de incluir a castração química como medida repressiva, uma vez que tramitou a Emenda Constitucional nº 590/98, de autoria da Deputada Federal Maria Valadão; os Projetos de Lei nº 2.725/97 e nº 7.021/02, ambos de autoria do Deputado Federal WilgbertoTartuce; o Projeto de Lei nº 4399/08, da Deputada Marina Maggessi, o Projeto de Lei nº 5122/09, do Deputado Capitão Assunção; o Projeto de Lei nº 349/11, do Deputado Sandes Júnior, bem como o Projeto de Lei nº 597/11, de autoria do Deputado Marçal Filho.

O Projeto de Lei nº 552/2007 é polêmico no sistema jurídico brasileiro. Tendo em vista que há normas que protegem a integridade do ser humano que não autorizam a violação à integridade física do condenado por parte do Estado. O ordenamento jurídico enumera algumas normas que merecem destaque dentre as quais podemos citar o inciso XLIX do art. 5º da Constituição:

Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade, à igualdade, a segurança e à propriedade, nos termos seguintes”:

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral).

 

Também no art. 5º, o inciso III prevê que ninguém será submetido a tratamento degradante. Ainda, podemos citar a legislação infraconstitucional que no art. 38 do Código Penal aduz: “O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo a todos as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”.

A Lei de Execução Penal (Lei nº 7. 210, de 1984), por sua vez, elenca que: “Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.

Em virtude disso, há fronteiras que são invioláveis que impedem a imposição da vontade do Estado ou de um homem sobre outro resultante do princípio do Estado Democrático de Direito (CCJ, 2009).

Caso, não haja observância dessas normas isso pode implicar na violação do Princípio da Constitucionalidade ou da Primazia da Constituição, que preleciona que a norma, princípio ou instituto que não seja materialmente compatível com a Constituição sofrerá o vício da inconstitucionalidade. Portanto, a recepção de qualquer direito deve estar com consonância com as cláusulas pétreas da Carta Magna (art. 60º, § 4º, IV da CF/ 1988) (SGARBOSSA; JENSEN, 2007).

O Princípio da Proporcionalidade, intimamente ligado ao princípio da razoabilidade, interliga-se ao justo meio utilizado para realização de determinado fim. Este princípio, por sua vez, se subdivide em três; são eles: 1) Princípio da Necessidade; 2) Princípio da Adequação e 3) Princípio da Proporcionalidade tomados como stricto sensu. O primeiro “sub-princípio” corresponde à escolha do meio, que é o mais suave, ou seja, o menos nocivo aos interesses dos cidadãos. O segundo, por sua vez, relaciona-se à correta relação entre esse meio empregado com o alcance do fim esperado. O último, para tanto, é direcionador dos primeiros, visando uma ponderação de valores baseada na razoabilidade e proporcionalidade (BARROS; BORGHOLM, 2009).

Sob essa perspectiva, dos efeitos gerados pela castração química demonstram ter consequências de difícil reparação, levando em consideração as sequelas físicas no sujeito, além da humilhação social, uma vez que para o homem nada mais degradante que perder sua esterilidade.

Dessa forma, a pena prevista no art. 226-A não condiz à proporcionalidade almejada pelo Direito Penal, pois há outros meios de repressão aos crimes sexuais, que punem o infrator sem a necessidade de mutilar o corpo humano e sem violar o objetivo da pena, qual seja de ter a função ressocializadora e de reintegração social, respeitando assim os princípios constitucionais e penais. Ademais, "o Direito Penal não se presta ao aperfeiçoamento espiritual do homem, mas à preservação da paz social" (CARVALHO, 2004, P.83).

Sob a égide dos princípios que norteiam a nossa Constituição podemos constatar que a imposição de penas cruéis e a submissão a um tratamento “degradante” (art. 5º, III, CF) como a castração química fere a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF).

A dignidade da pessoa humana encontra-se no epicentro da ordem jurídica brasileira tendo em vista que concebe a valorização da pessoa humana como sendo a razão fundamental para a estrutura organizacional do Estado e para o Direito. O legislador constituinte elevou à categoria de princípio fundamental da República a dignidade da pessoa humana (um dos pilares estruturais fundamentais da organização do Estado brasileiro), previsto no art. 1º, inciso III da Constituição de 1988. (DA SILVA, 2000, p. 146).

No contexto constitucional a dignidade da pessoa humana não é apenas um atributo, tampouco apenas um valor autônomo, mas que depende da relação social. Nesse contexto, a Constituição representa um contrato social entre os homens e a autoridade estabelecida, num regimento interno de uma sociedade politicamente organizada (CCJ, 2009).

Entretanto, alguns juristas entendem que a castração química seria inconstitucional, pois nossa Carta Magna proíbe as penas perpétuas, cruéis e violadoras da integridade física e moral do condenado.

Violaria também tratados de direitos humanos, dentre eles o Pacto de São José de Costa Rica. Por violar tais dispositivos constitucionais, se aprovada, a Lei de Castração Química poderá ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal.

4                    CONCLUSÃO

A castração química, como anteriormente analisada, consiste na utilização de drogas com a finalidade de inibir o funcionamento dos órgãos reprodutores. Hodiernamente, tem-se utilizado, em alguns países, tal instrumento como forma de punição aos criminosos sexuais, para que estes não voltem a cometer tais crimes, observando os princípios da proporcionalidade, dignidade da pessoa humana, dentre outros, a atuação do Direito Penal se faz necessária quando há lesão de algum bem jurídico relevante. Ocorre que a sua ação deve ser em consonância com a Constituição Federal, uma vez que este é o texto supremo, devendo ser obedecido por todos os outros ramos do direito. Sendo assim, almejando a proporcionalidade da pena, conjuntamente com a preservação dos direitos fundamentais, conclui-se pela inconstitucionalidade do Projeto de Lei nº 552 de 2007, mesmo após ser emendado.

Entende-se, portanto, que a castração química poderia ser utilizada como opção do condenado, e não como direito, uma vez que dentre as pesquisas comentadas no decorrer do trabalho, há a redução da pena. Ademais, corrobora-se que a ideia da importância que a prevenção tem para que esses crimes sejam evitados.

Destarte, dois pontos devem ser analisados, o da submissão voluntária ao tratamento, implicando na diminuição da pena, que pode ser vista como inconstitucional, já que não se pode negar o tratamento médico a quem dele necessitar, e a redução da pena revelam-se um inegável incentivo à sua adesão.

Desta forma, não se vislumbra crueldade ou qualquer afronta ao Princípio da Proporcionalidade outra é que a imposição da pena de castração química é constitucional, sendo um aspecto tormentoso, mas é fácil perceber que majoritariamente os juristas entendem que não, uma vez que a pena corporal seria vedada pelo ordenamento jurídico. Neste sentido, a pena de castração química é tida como cruel e como violadora da dignidade humana. Em que pese tal posicionamento dominante, se faz a discussão acerca do tema, tendo em vista que não é difícil a verificação de posicionamentos contrários, defendendo que a pena não se enquadra como cruel, por não implicar em sofrimento intenso para o agente.

No entanto o que se almeja é a proteção das crianças que devem ser protegidas pelo estado, e o que deve ser avaliado é o que seja mais importante para a sociedade, se é a integridade de um acusado por crime sexual contra crianças e adolescentes ou crianças indefesas que na maioria das vezes são abusadas em seu próprio ambiente familiar sem ter nenhum tipo de proteção, e mais, uma vez que estes criminosos são condenados, voltam à rescindir no mesmo crime.

Se até o momento o projeto de lei não foi aprovado e estar arquivado, como os demais que fora apresentado por entender que fere os princípios constitucionais do preso, e por ser uma pena cruel, o que se deve perguntar é que princípios são violados quando uma criança é abusada sexualmente seja por parentes dentro da própria casa, vizinhos ou estranhos.

5                  REFERÊNCIAS

AGUIAR, Alexandre Magno Fernandes Moreira. O "direito" do condenado à castração química. Jus Navigandi, Teresina, ano 12n. 1593[11] nov. [2007]. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10613>. Acesso em: 21 abr. 2014.

BARROS, Lorena Pinheiro; BORGHOLM, Danielle. O princípio da razoabilidade como parâmetro de mensuração do dano moral. Disponível em: <http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20090505153557272#2>. Publicado em: 11 de maio de 2009. Acesso em 04 de mai. 2014.

BARROSO, Luiz Roberto. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito constitucional. Revista Forense. vol. 336, p.125-136, ano 92, outubro-dezembro de 1996.

 

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