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Breves notas sobre o recurso especial eleitoral e o novo Código de Processo Civil

Breves notas sobre o recurso especial eleitoral e o novo Código de Processo Civil

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Existe uma forte tendência, na Justiça Eleitoral e no Supremo Tribunal Federal, à prevalência das normas do Código Eleitoral (lei especial) em detrimento do Código de Processo Civil (lei geral), o que encontra eco na própria redação do art. 15 do novo CPC.

Sumário:1. A Justiça Eleitoral e o Direito Processual Comum. 2. O Recurso Especial Eleitoral. 3. A admissibilidade do Recurso Especial Eleitoral e o Novo Código de Processo Civil. 4. O Tribunal Superior Eleitoral e os recursos repetitivos. 5. O Tribunal Superior Eleitoral e a repercussão geral do Recurso Extraordinário. 6. A Justiça Eleitoral e o Agravo em Recurso Especial. 7. Conclusões


1. A Justiça Eleitoral e o Direito Processual Comum

Na prática da Justiça Eleitoral enquanto ramo especializado do Poder Judiciário da União, é frequente o questionamento acerca da aplicabilidade das regras processuais vigentes: Código Eleitoral ou Código de Processo Civil?

O próprio legislador pátrio, no Novo Código de Processo Civil, tenta resolver tal questão in abstrato:

Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente. (grifou-se)

Já o legislador de 1965, ao redigir o Código Eleitoral, procurou dar solução ao tema, adotando a mesma fórmula, mencionada de forma expressa somente em relação ao direito processual penal e, logicamente, aplicável ao recurso especial eleitoral criminal, cuja pertinência é inegável, em vista da uniformidade de tratamento dos recursos excepcionais desde a Lei n.º 8.950/1994:

Art. 364. No processo e julgamento dos crimes eleitorais e dos comuns que lhes forem conexos, assim como nos recursos e na execução, que lhes digam respeito, aplicar-se-á, como lei subsidiária ou supletiva, o Código de Processo Penal.

Antes mesmo das supramencionadas normas, já a antiga Lei de Introdução do Código Civil (Decreto-Lei n.º 4.657/1942), renomeada pela Lei n.º 12.376/2010 como Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, já indicava uma solução de aplicação geral:

Art.2.º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

[...]

§ 2.º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

Todavia, como é possível deduzir, a questão não se resume a tamanha simplicidade, uma vez que resta claro o intento do legislador pátrio em colocar o Novo Código de Processo Civil como centro da normatividade processual, fazendo-lhe avançar em áreas reguladas por processualidades próprias. Desse modo, remanescem indagações sobre em que situações existe, efetivamente, a lacuna legislativa apta a embasar a aplicação supletiva e subsidiária do diploma processual comum:

a) quais normas serão integral ou parcialmente adotadas?

b) quais textos serão absolutamente ignorados, por haver regramento específico na legislação eleitoral, e quais serão adotados, a despeito da existência de norma eleitoral vigente, mas que eventualmente seja tida por superada pela nova legislação?

c)       quais regras serão incorporadas como diretriz interpretativa, aplicada pelos operadores do Direito Eleitoral em conjunto com regras eleitorais já vigentes?

  1. quais normas serão, igualmente, adotadas em processos/procedimentos de caráter penal?

É certo que somente a jurisprudência e a doutrina poderão, respondendo a tais questionamentos, fixar os paradigmas da processualística eleitoral conjugada com o Novo Código de Processo Civil. Por outro lado, é provável que tais discussões se prolonguem ao longo do tempo, sem que haja, necessariamente, consenso.

No entanto, as atividades cartorária e judicial da Justiça Eleitoral não poderão esperar por tais definições, devendo aplicar de pronto muitas das novas normas em conjunto com a legislação eleitoral.

O Supremo Tribunal Federal já foi invocado a pronunciar-se sobre  questão deveras similar, no rito do mandado de segurança, em discussão na qual se debatia a aplicabilidade, ao caso concreto, ou da Lei n.º 1.533/1951 (hoje substituída pela Lei n.º 12.016/2009), ou do Código Eleitoral. A ementa é esclarecedora:

“MANDADO DE SEGURANÇA - DECISÃO DENEGATÓRIA - RECURSO ORDINÁRIO - MATÉRIA ELEITORAL - PRAZO - INOBSERVÂNCIA DO TRÍDUO LEGAL (CÓDIGO ELEITORAL, ART. 281) - INTEMPESTIVIDADE - RECURSO NÃO CONHECIDO. MANDADO DE SEGURANÇA - DECISÃO DENEGATÓRIA - SIGNIFICADO DESSA EXPRESSÃO. - Para efeito de interposição do recurso ordinário, qualificam-se como decisões denegatórias tanto as que indeferem o mandado de segurança, apreciando-lhe o mérito, quanto aquelas que dele não conhecem, com a conseqüente extinção do processo, sem julgamento da controvérsia material suscitada. Precedentes.

PRAZO RECURSAL EM MATÉRIA ELEITORAL. - Os recursos em matéria eleitoral acham-se submetidos, quanto ao respectivo prazo de interposição, a regramento normativo próprio, definido em legislação especial. A disciplina legislativa dos recursos eleitorais tem, no próprio Código Eleitoral, a sua pertinente sedes materiae, razão pela qual esse tema - tratando-se da definição dos prazos recursais - não sofre o influxo das prescrições gerais estabelecidas na legislação processual comum. Esse entendimento ajusta-se à exigência de celeridade que constitui diretriz fundamental na regência do processo eleitoral e, especialmente, na disciplina dos recursos interponíveis em seu âmbito. Em tema de prazos recursais em sede eleitoral, a precedência jurídica cabe ao que dispuserem as normas de direito eleitoral, porque são estas - e não a legislação processual comum - que constituem o estatuto de regência peculiar à disciplinação da matéria. Eventuais conflitos normativos que se registrem na definição legal dos prazos recursais, envolvendo proposições incompatíveis constantes do Código Eleitoral e da legislação processual comum, qualificam-se como meras antinomias aparentes, posto que passíveis de solução à luz do critério da especialidade, que confere primazia à lex specialis, em ordem a bloquear, em determinadas matérias, a eficácia e a aplicabilidade da regra geral, ensejando, desse modo, com a prevalência da norma especial, a superação da situação antinômica ocorrente.

DENEGAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA EM MATÉRIA ELEITORAL - PRAZO RECURSAL. O recurso ordinário, cabível das decisões do Tribunal Superior Eleitoral que denegarem, originariamente, mandado de segurança, deve ser interposto no prazo de três (3) dias, consoante prescreve o art. 281 do Código Eleitoral (lex specialis), não derrogado pela superveniência da Lei n. 8.950/94 no ponto em que esta deu nova redação ao art. 508 do CPC.

TEMPESTIVIDADE E CONTROLE DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL. - O controle da tempestividade dos recursos - precisamente por constituir pressuposto legal de ordem pública - revela-se matéria suscetível até mesmo de conhecimento ex officio pelo Supremo Tribunal Federal, independendo, em conseqüência, de qualquer formal provocação dos sujeitos da relação processual. A prolação de um juízo positivo de admissibilidade, pelo Tribunal a quo, não tem, ante a provisoriedade de que se reveste esse ato decisório, o condão de constranger o órgão judiciário ad quem a conhecer do recurso interposto, de tal modo que o Supremo Tribunal Federal, nos recursos de sua competência - ainda que admitidos estes pela Presidência do Tribunal inferior - poderá, sempre, recusar-lhes trânsito nesta esfera jurisdicional, se e quando ausente o requisito da tempestividade.”

(RMS 22406, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 19/03/1996, DJ 31-05-1996 PP-18804 EMENT VOL-01830-01 PP-00099 – grifou-se)

Desse modo, a par das inúmeras dúvidas que surgirão da praxis forense especializada, é certo que têm-se vetores importantes a indicar as soluções para eventuais conflitos aparentes de normatividade, privilegiando, como diretriz geral, a prevalência das normas do Código Eleitoral (lei especial) em detrimento do Novo Código de Processo Civil (lei geral).


2. O Recurso Especial Eleitoral

O Código Eleitoral (Lei n.º 4.737/1965) estabeleceu a denominação e os atuais contornos do recurso especial eleitoral com rigorismo, de modo a torná-lo o recurso de estrito direito afeto à Justiça Eleitoral:

Art. 276. As decisões dos Tribunais Regionais são terminativas, salvo os casos seguintes em que cabe recurso para o Tribunal Superior:

I - especial:

a) quando forem proferidas contra expressa disposição de lei;

b) quando ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais.

Veja-se, portanto, que, ao contrário do recurso especial da Justiça Comum, hodiernamente previsto no art. 541 do Código de Processo Civil de 1973, para causas cíveis, e no art. 26 da Lei n.º 8.038/90, para processos em geral, incluindo os de natureza criminal (ambos regramentos serão sucedidos pelos arts. 1029 e seguintes, c/c art. 1.072, IV, do Novo Código de Processo Civil), que tiveram sua origem somente com o art. 105, III, “c”, da Constituição de 1988, o recurso especial eleitoral já contemplava as funções de preservar e de uniformizar a interpretação da legislação ordinária vigente.

Curiosamente, ao mesmo tempo em que a nova sistemática recursal do constituinte de 1988 trouxe a bipartição da competência, até então reservada exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, dividindo-a com o então recém-criado Superior Tribunal de Justiça, houve também a ampliação da abrangência recursal do Tribunal Superior Eleitoral, modelo até hoje vigente:

Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais.

(...)

§ 4.º Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando:

I - forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei;

II - ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais;

No ponto, pois, resta absolutamente afastada a hipótese de aplicabilidade de regras que detalham eventual fungibilidade (novidade) e prejudicialidade (já vigente) entre o recurso especial e o recurso extraordinário, visto que ambas as competências são exercidas simultaneamente, com plenitude, pelo Tribunal Superior Eleitoral:

Art. 1.031. Na hipótese de interposição conjunta de recurso extraordinário e recurso especial, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.

§ 1.º Concluído o julgamento do recurso especial, os autos serão remetidos ao Supremo Tribunal Federal para apreciação do recurso extraordinário, se este não estiver prejudicado.

§ 2.º Se o relator do recurso especial considerar prejudicial o recurso extraordinário, em decisão irrecorrível, sobrestará o julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal.

§ 3.º Na hipótese do § 2o, se o relator do recurso extraordinário, em decisão irrecorrível, rejeitar a prejudicialidade, devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça para o julgamento do recurso especial.

Art. 1.032. Se o relator, no Superior Tribunal de Justiça, entender que o recurso especial versa sobre questão constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral e se manifeste sobre a questão constitucional.

Parágrafo único. Cumprida a diligência de que trata o caput, o relator remeterá o recurso ao Supremo Tribunal Federal, que, em juízo de admissibilidade, poderá devolvê-lo ao Superior Tribunal de Justiça.

Art. 1.033. Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial.

Desse modo, compete ao Tribunal Superior Eleitoral, em cognição plena, preservar a integridade do direito positivo legal e constitucionalmente estabelecidos e uniformizar sua interpretação em última instância, observada a possibilidade de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal nas hipóteses cabíveis. Inexistem, pois, s.m.j., alterações de monta no recurso especial eleitoral por conta do Novo Código de Processo Civil, competindo aos operadores do Direito, enquanto permanecer com a atual redação, tão somente seguir interpretando o art. 276, I, do Código Eleitoral conforme a Constituição.


3. A admissibilidade do Recurso Especial Eleitoral e o Novo Código de Processo Civil

Uma das inovações a causar alto impacto aos estudiosos do Direito Processual Civil, sobretudo aos operadores diretamente vinculados aos Tribunais Superiores, é a supressão do juízo bipartido da admissibilidade recursal: pelo novo procedimento, o chamado “juízo de delibação”, efetuado pelo tribunal “a quo” (Cortes de Apelação da Justiça Comum – Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça), é extinto em relação ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, remanescendo somente o juízo de admissibilidade do(s) juízo(s) “ad quem”, ou seja, do(s) próprio(s) Tribunal(is) Superior(es).

Veja-se o texto legal:

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão remetidos ao respectivo tribunal superior.

Parágrafo único. A remessa de que trata o caput dar-se-á independentemente de juízo de admissibilidade. (grifou-se)

No entanto, como percebe-se da própria redação de diversos dispositivos legais relativos aos recursos extraordinários “lato sensu” no Novo Código de Processo Civil (arts. 1.029, § 3.º, 1.031, 1.032, 1.033, 1.034 e 1.035) somente ao Tribunal Superior da Justiça Comum e à Corte Suprema incide tal novidade, em razão do caráter especial de norma preexistente que regula, com inteireza, o processamento dos recursos especiais eleitorais, nele incluindo o juízo de admissibilidade:

Art. 278. Interposto recurso especial contra decisão do Tribunal Regional, a petição será juntada nas 48 (quarenta e oito) horas seguintes e os autos conclusos ao presidente dentro de 24 (vinte e quatro) horas.

§ 1.º O presidente, dentro em 48 (quarenta e oito) horas do recebimento dos autos conclusos, proferirá despacho fundamentado, admitindo ou não o recurso.

§ 2.º Admitido o recurso, será aberta vista dos autos ao recorrido para que, no mesmo prazo, apresente as suas razões.

§ 3.º Em seguida serão os autos conclusos ao presidente, que mandará remetê-los ao Tribunal Superior. (grifou-se)

É possível, apenas, que uma etapa procedimental seja invertida, aproximando-se do regramento vigente no Código de Processo Civil de 1973: o § 2.º do art. 278 poderá vir a ser interpretado em vista do “caput” do art. 9.º, que inova ao dispor que “Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida”. Assim, a parte recorrida, em vez de chamada a falar nos autos unicamente em caso de admissão do recurso excepcional, seria intimada previamente ao despacho, manifestando contrarrazões em todos os processos.

Portanto, s.m.j., têm-se, aqui um evidente caso de inaplicabilidade substancial do Novo Código de Processo Civil em relação ao recurso especial eleitoral, uma vez que há, tão somente, um espaço mínimo para a supletividade e/ou a subsidiariedade no procedimento relativo ao juízo de admissibilidade feito pelos Tribunais Regionais Eleitorais.


4. O Tribunal Superior Eleitoral e os recursos repetitivos

Introduzido no ordenamento jurídico pátrio, em relação ao recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, pela Lei n.º 11.672/2008, o rito dos recursos repetitivos visou a conferir maior celeridade de resolução a casos análogos que, em número crescente, aportavam ao Tribunal da Cidadania.

Assim, com a inserção do art. 543-C ao Código de Processo Civil de 1973, “quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito”, passou-se a dar resolução acerca da interpretação da legislação ordinária federal e/ou da uniformização da jurisprudência entre tribunais a poucos casos, selecionados por sua representatividade da controvérsia, permanecendo todos os demais processos, relativos à mesma temática, sobrestados na origem.

Proferido o julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça, assim determina o § 7.º do art. 543-C, conforme o respectivo enquadramento do litígio:

Art. 543-C, § 7.º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem:

I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou

II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.

Tratou-se, pois, de uma tentativa de racionalizar o trabalho da Corte Superior, conferindo celeridade a um maior número de julgamentos, pois acarretaria um menor o quantitativo de causas idênticas para pautar e para julgar (não se olvidando dos possíveis peticionamentos e sustentações orais que cada feito, implicando um efeito cascata com as respectivas movimentações), com economia processual e de recursos.

Sem dúvida, outros dois intentos foram perseguidos pelo legislador pátrio com o instituto: (1) o estabelecimento de “leading cases” de observância compulsória pelos juízos e tribunais locais, com a vinculação a precedentes (o que, em conjunto com outras medidas, é chamado por alguns doutrinadores de “commonlawlização” do Direito brasileiro); (2) o efeito pedagógico de tais precedentes, visto que a pulverização do enquadramento dos casos no próprio Tribunal de origem ocasiona retrabalho àqueles que venham a contrariar a jurisprudência consolidada na Corte Superior.

O novel diploma processual civil reitera, com algumas novidades, tal instituto, nos seguintes termos:

Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.

§ 1.º O presidente ou o vice-presidente de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal selecionará 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia, que serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça para fins de afetação, determinando a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitem no Estado ou na região, conforme o caso.

§ 2.º O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso especial ou o recurso extraordinário que tenha sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se sobre esse requerimento.

§ 3.º Da decisão que indeferir este requerimento caberá agravo, nos termos do art. 1.042.

§ 4.º A escolha feita pelo presidente ou vice-presidente do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal não vinculará o relator no tribunal superior, que poderá selecionar outros recursos representativos da controvérsia.

§ 5.º O relator em tribunal superior também poderá selecionar 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia para julgamento da questão de direito independentemente da iniciativa do presidente ou do vice-presidente do tribunal de origem.

§ 6.º Somente podem ser selecionados recursos admissíveis que contenham abrangente argumentação e discussão a respeito da questão a ser decidida.

Art. 1.039.  Decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada.

Parágrafo único.  Negada a existência de repercussão geral no recurso extraordinário afetado, serão considerados automaticamente inadmitidos os recursos extraordinários cujo processamento tenha sido sobrestado.

Art. 1.040.  Publicado o acórdão paradigma:

I - o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior;

II - o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior;

III - os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior;

IV - se os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.

§ 1.º A parte poderá desistir da ação em curso no primeiro grau de jurisdição, antes de proferida a sentença, se a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia.

§ 2.º Se a desistência ocorrer antes de oferecida contestação, a parte ficará isenta do pagamento de custas e de honorários de sucumbência.

§ 3.º A desistência apresentada nos termos do § 1.º independe de consentimento do réu, ainda que apresentada contestação.

Art. 1.041. Mantido o acórdão divergente pelo tribunal de origem, o recurso especial ou extraordinário será remetido ao respectivo tribunal superior, na forma do art. 1.036, § 1.º.

§ 1.º Realizado o juízo de retratação, com alteração do acórdão divergente, o tribunal de origem, se for o caso, decidirá as demais questões ainda não decididas cujo enfrentamento se tornou necessário em decorrência da alteração.

§ 2.º Quando ocorrer a hipótese do inciso II do caput do art. 1.040 e o recurso versar sobre outras questões, caberá ao presidente do tribunal, depois do reexame pelo órgão de origem e independentemente de ratificação do recurso ou de juízo de admissibilidade, determinar a remessa do recurso ao tribunal superior para julgamento das demais questões.

Contudo, esse inovador instituto de “abstrativização” do julgamento de questões de estrito direito em causas individuais nada significou às atividades do Tribunal Superior Eleitoral, que não adotou sua ritualística na resolução dos recursos especiais eleitorais desde que foi estatuído em 2008. Portanto, a tendência é, s.m.j., que tal entendimento siga prevalecendo perante a Justiça Eleitoral.


5. O Tribunal Superior Eleitoral e a repercussão geral do Recurso Extraordinário

Assim como nos demais ramos do Poder Judiciário, em qualquer demanda (judicial, saliente-se) é possível o cabimento do recurso extraordinário diante de decisão colegiada de última instância da Justiça Eleitoral, excetuados os casos de cabimento do recurso ordinário.

É o comando da Magna Carta:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

[…]

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição;

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

[...]

§ 3.º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

O instituto da repercussão geral, introduzido pela Emenda Constitucional n.º 45/2004, foi detalhado através da Lei n.º 11.418/2006, a qual acrescentou novos dispositivos ao Código de Processo Civil de 1973:

Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo.

§ 1.º Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.

§ 2.º O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da repercussão geral.

§ 3.º Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal.

§ 4.º Se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário.

§ 5.º Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

§ 6.º O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

§ 7.º A Súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão.

Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.

§ 1.º Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte.

§ 2.º Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos.

§ 3.º Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se.

§ 4.º Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar,liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada.

§ 5.º O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral.

O legislador ordinário de 2015, então, igualmente embasado na Constituição, reproduziu, com algumas inovações, o Código de Processo Civil de 1973, assim regulamentando o instituto da repercussão geral no recurso extraordinário:

Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo.

§ 1.º Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.

§ 2.º O recorrente deverá demonstrar a existência de repercussão geral para apreciação exclusiva pelo Supremo Tribunal Federal.

§ 3.º Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que:

I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal;

II - tenha sido proferido em julgamento de casos repetitivos;

III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal.

§ 4.º O relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

§ 5.º Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional.

§ 6.º O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de origem, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso extraordinário que tenha sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se sobre esse requerimento.

§ 7.º Da decisão que indeferir o requerimento referido no § 6.º caberá agravo, nos termos do art. 1.042.

§ 8.º Negada a repercussão geral, o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos extraordinários sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica.

§ 9.º O recurso que tiver a repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.

§ 10 Não ocorrendo o julgamento no prazo de 1 (um) ano a contar do reconhecimento da repercussão geral, cessa, em todo o território nacional, a suspensão dos processos, que retomarão seu curso normal.

§ 11 A súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão.(grifou-se)

Desse modo, além dos demais requisitos intrínsecos e extrínsecos do recurso extraordinário, cabe à parte do processo enfatizar em sua insurgência, em preliminar específica, “a existência [...] de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”, a fim de justificar sua admissão pelo Pretório Excelso.

E, inequivocamente, tal requisito incide também aos processos nos quais, após o julgamento pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, houver apelo extremo ao Supremo Tribunal Federal.

Exemplificativamente, transcreve-se um despacho de admissibilidade proferido pela Presidência do Tribunal Superior Eleitoral:

“Recurso extraordinário em recurso especial eleitoral. Eleições 2008. Ausência de prequestionamento e de repercussão geral. Recurso extraordinário inadmitido.

[...]

6. Ademais, o acórdão do Tribunal Superior Eleitoral assentou que não ficou demonstrada a divergência jurisprudencial, questão atinente aos pressupostos de admissibilidade dos recursos, sem repercussão geral, conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal:

'PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSOS DA COMPETÊNCIA DE OUTROS TRIBUNAIS. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

A questão alusiva ao cabimento de recursos da competência de outros Tribunais se restringe ao âmbito infraconstitucional. Precedentes. Não havendo, em rigor, questão constitucional a ser apreciada por esta nossa Corte, falta ao caso `elemento de configuração da própria repercussão geral´, conforme salientou a ministra Ellen Gracie, no julgamento da Repercussão Geral no RE 584.608'  (RE-RG n. 598365, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 26.3.2010, grifos nossos).

7. No julgamento da Questão de Ordem no Agravo de Instrumento n. 760358/SE, DJe 19.2.2010, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a possibilidade de aplicação dos arts. 543-A e 543-B pelos Tribunais a quo para a inadmissão de recurso extraordinário que trate de matéria cuja repercussão geral não tenha sido reconhecida.

8. Pelo exposto, inadmito o recurso extraordinário.

Publique-se.

Brasília, 21 de janeiro de 2013.

Ministra CÁRMEN LÚCIA

Presidente”

(Recurso Especial Eleitoral nº 430424, Decisão Monocrática de 21/01/2013, Relator(a) Min. CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 23, Data 01/02/2013, Página 97-98 – grifou-se)

Note-se, ademais, que, caso seja intento da parte se insurgir contra uma negativa de seguimento a recurso extraordinário que houver aplicado os arts. 543-A e 543-B, caber-lhe-á interpor o recurso de agravo regimental (se adotada a nomenclatura trazida pelo Novo Código de Processo Civil, agravo interno). Veja-se a seguinte ementa do Tribunal Superior Eleitoral, que exemplifica tal situação na prática forense:

“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. VIOLAÇÃO. PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA, DOS LIMITES DA COISA JULGADA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA. PRECEDENTES. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência voltada contra decisão que negou trânsito ao apelo extremo, por versar matéria que a Suprema Corte já assentou ser desprovida de repercussão geral. Recebimento do agravo de instrumento como agravo regimental, em cumprimento à decisão proferida por Ministro do Supremo Tribunal Federal.

2. A questão alusiva ao cabimento de recursos da competência de outros Tribunais se restringe ao âmbito infraconstitucional. Assim, não havendo questão constitucional a ser apreciada por esta nossa Corte, falta ao caso “elemento de configuração da própria repercussão geral”. Precedentes. Fundamento não atacado. Aplicação da Súmula nº 283/STF.

3. A matéria relativa à afronta aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal é insuficiente para amparar o apelo extremo, por não ser dotada de repercussão geral.

4. Agravo regimental desprovido.”

(Agravo Regimental em Recurso Extraordinário em Recurso em Mandado de Segurança nº 50452, Acórdão de 07/10/2014, Relator(a) Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 28/10/2014 – grifou-se)

É importante destacar que esse encargo processual, conferido às partes eventualmente recorrentes, foi emanado pelo Pretório Excelso em questão de ordem que fixou a jurisprudência pátria, cuja ementa assevera:

“Questão de Ordem. Repercussão Geral. Inadmissibilidade de agravo de instrumento ou reclamação da decisão que aplica entendimento desta Corte aos processos múltiplos. Competência do Tribunal de origem. Conversão do agravo de instrumento em agravo regimental.

1. Não é cabível agravo de instrumento da decisão do tribunal de origem que, em cumprimento do disposto no § 3º do art. 543-B, do CPC, aplica decisão de mérito do STF em questão de repercussão geral.

2. Ao decretar o prejuízo de recurso ou exercer o juízo de retratação no processo em que interposto o recurso extraordinário, o tribunal de origem não está exercendo competência do STF, mas atribuição própria, de forma que a remessa dos autos individualmente ao STF apenas se justificará, nos termos da lei, na hipótese em que houver expressa negativa de retratação.

3. A maior ou menor aplicabilidade aos processos múltiplos do quanto assentado pela Suprema Corte ao julgar o mérito das matérias com repercussão geral dependerá da abrangência da questão constitucional decidida.

4. Agravo de instrumento que se converte em agravo regimental, a ser decidido pelo tribunal de origem.

(AI 760358 QO, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 19/11/2009, DJe-027 DIVULG 11-02-2010 PUBLIC 12-02-2010 REPUBLICAÇÃO: DJe-030 DIVULG 18-02-2010 PUBLIC 19-02-2010 EMENT VOL-02390-09 PP-01720 – grifou-se)

Por fim, é interessante destacar que o prazo para interposição do recurso extraordinário, perante a Justiça Eleitoral, não é o de 15 (quinze) dias, previsto no Código de Processo Civil de 1973 (com redação da Lei n.º 8.950/1994) e reproduzido no diploma de 2015, mas sim de 03 (três) dias, aplicando-se a previsão da Lei n.º 6.055/74 (que regulou as Eleições de 1974):

Art 12. O prazo para interposição de recurso extraordinário contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral para o Supremo Tribunal Federal, será de 3 (três) dias.

Parágrafo único. O recurso extraordinário será processado na forma prevista nos artigos 278 e 279 do Código Eleitoral.

Por óbvio, tal questão suscitou controvérsia junto aos operadores do Direito, tendo restado consolidada com a edição de súmula da Corte Suprema:

Súmula n.º 728/STF: É de três dias o prazo para a interposição de recurso extraordinário contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral, contado, quando for o caso, a partir da publicação do acórdão, na própria sessão de julgamento, nos termos do art. 12 da Lei 6055/1974, que não foi revogado pela Lei 8950/1994.

Portanto, assim como já ocorre hodiernamente, o instituto da repercussão geral, de índole constitucional, seguirá sendo aplicado pelo Tribunal Superior Eleitoral na admissibilidade recursal sob a égide do Novo Código de Processo Civil, sempre observando-se o tríduo legal para a sua interposição.


6. A Justiça Eleitoral e o Agravo em Recurso Especial

Assim como previsto no Direito Processual Civil, também as decisões de inadmissão de recurso especial eleitoral, prolatadas pelas Presidências dos Tribunais Regionais Eleitorais, tinham como remédio processual para o seu “destrancamento”, na origem, com a inevitável remessa dos autos ao Tribunal Superior Eleitoral, o recurso de agravo de instrumento.

Assim dispõe, até hoje, o Código Eleitoral:

Art. 279. Denegado o recurso especial, o recorrente poderá interpor, dentro em 3 (três) dias, agravo de instrumento.

§ 1.º O agravo de instrumento será interposto por petição que conterá:

I - a exposição do fato e do direito;

II - as razões do pedido de reforma da decisão;

III - a indicação das peças do processo que devem ser trasladadas.

§ 2.º Serão obrigatoriamente trasladadas a decisão recorrida e a certidão da intimação.

§ 3.º Deferida a formação do agravo, será intimado o recorrido para, no prazo de 3 (três) dias, apresentar as suas razões e indicar as peças dos autos que serão também trasladadas.

§ 4.º Concluída a formação do instrumento o presidente do Tribunal determinará a remessa dos autos ao Tribunal Superior, podendo, ainda, ordenar a extração e a juntada de peças não indicadas pelas partes.

§ 5.º O presidente do Tribunal não poderá negar seguimento ao agravo, ainda que interposto fora do prazo legal.

§ 6.º Se o agravo de instrumento não fôr conhecido, porque interposto fora do prazo legal, o Tribunal Superior imporá ao recorrente multa correspondente a valor do maior salário-mínimo vigente no país, multa essa que será inscrita e cobrada na forma prevista no art. 367.

§ 7.º Se o Tribunal Regional dispuser de aparelhamento próprio, o instrumento deverá ser formado com fotocópias ou processos semelhantes, pagas as despesas, pelo preço do custo, pelas partes, em relação às peças que indicarem. (destaquei)

Note-se, a título de curiosidade, que o cinquentenário diploma eleitoral já previa a impossibilidade de retenção, no Tribunal local, da insurgência, ainda que desprovida de requisito essencial como a tempestividade. Ocorre que, na processualística civil, a ausência de semelhante disposição gerou certa controvérsia, que ensejou a edição de súmula da Suprema Corte:

Súmula n.º 727/STF: Não pode o magistrado deixar de encaminhar ao Supremo Tribunal Federal o agravo de instrumento interposto da decisão que não admite recurso extraordinário, ainda que referente a causa instaurada no âmbito dos Juizados Especiais.

Com a Lei n.º 12.322/2010, restou alterada a sistemática do até então agravo de instrumento, que, justamente por dispensar a formação de autos suplementares para a sua interposição, foi rebatizado como agravo em recurso especial e/ou agravo em recurso extraordinário, nos seguintes termos:

Art. 544. Não admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo nos próprios autos, no prazo de 10 (dez) dias.

§ 1.º O agravante deverá interpor um agravo para cada recurso não admitido.

§ 2.º A petição de agravo será dirigida à presidência do tribunal de origem, não dependendo do pagamento de custas e despesas postais. O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta, podendo instruí-la com cópias das peças que entender conveniente. Em seguida, subirá o agravo ao tribunal superior, onde será processado na forma regimental.

§ 3.º O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta. Em seguida, os autos serão remetidos à superior instância, observando-se o disposto no art. 543 deste Código e, no que couber, na Lei n. 11.672, de 8 de maio de 2008.

§ 4.º No Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, o julgamento do agravo obedecerá ao disposto no respectivo regimento interno, podendo o relator.

I - não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada;

II - conhecer do agravo para:

a) negar-lhe provimento, se correta a decisão que não admitiu o recurso;

b) negar seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal;

c) dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal.

Inicialmente, essa modificação da sistemática recursal gerou certa discussão no âmbito do próprio Tribunal Superior Eleitoral acerca de sua aplicabilidade, ou não, à Justiça especializada. Após certa resistência, o Plenário da Corte pacificou entendimento em sentido positivo:

“PROCESSO ADMINISTRATIVO. LEI Nº 12.322/2010. ALTERAÇÃO DO ART. 544 DO CPC. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO NOS PRÓPRIOS AUTOS DO PROCESSO PRINCIPAL. APLICAÇÃO NA JUSTIÇA ELEITORAL. CRIAÇÃO DO NÚCLEO DE ANÁLISE PROCESSUAL. PREJUDICIALIDADE.

1.  Considerando os benefícios trazidos pela Lei nº 12.322/2010 ao agravo, bem como a ausência de incompatibilidade entre o procedimento trazido pela recente modificação legislativa e a natureza dos feitos eleitorais, cuja apreciação demanda rápida resposta do Poder Judiciário, é de se aplicar, no âmbito da Justiça Eleitoral, a nova redação conferida ao art. 544 do CPC, apenas no que concerne à interposição do agravo de decisão obstativa de recurso especial nos próprios autos do processo principal, mantendo-se, todavia, o prazo recursal de três dias, previsto no Código Eleitoral.

2.  A regra para interposição do agravo de instrumento, na sistemática prevista pelo Código Eleitoral, não configura norma especial criada pelo legislador em atenção às peculiaridades do interesse tutelado pela Justiça Eleitoral, não incidindo, portanto, o princípio de que a regra geral posterior não derroga a especial anterior.

3.  Tendo em vista a adoção das modificações introduzidas no art. 544 do CPC, resta prejudicada a criação do Núcleo de Análise Processual, proposto pela Secretaria Judicial deste Tribunal.”

(Processo Administrativo nº 144683, Acórdão de 20/10/2011, Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 093, Data 18/05/2012, Página 379-380 – grifou-se)

O novel legislador processual, ao dispor sobre as regras do agravo, efetivou diversas alterações, a maioria em consequência das inovações reservadas ao recursos excepcionais direcionados ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, mas manteve a disciplina que eliminou a necessidade de formação do instrumento:

Art. 1.042.  Cabe agravo contra decisão de presidente ou de vice-presidente do tribunal que:

I - indeferir pedido formulado com base no art. 1.035, § 6.º, ou no art. 1.036, § 2.º, de inadmissão de recurso especial ou extraordinário intempestivo;

II - inadmitir, com base no art. 1.040, inciso I, recurso especial ou extraordinário sob o fundamento de que o acórdão recorrido coincide com a orientação do tribunal superior;

III - inadmitir recurso extraordinário, com base no art. 1.035, § 8o, ou no art. 1.039, parágrafo único, sob o fundamento de que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão constitucional discutida.

§ 1.º Sob pena de não conhecimento do agravo, incumbirá ao agravante demonstrar, de forma expressa:

I - a intempestividade do recurso especial ou extraordinário sobrestado, quando o recurso fundar-se na hipótese do inciso I do caput deste artigo;

II - a existência de distinção entre o caso em análise e o precedente invocado, quando a inadmissão do recurso:

a) especial ou extraordinário fundar-se em entendimento firmado em julgamento de recurso repetitivo por tribunal superior;

b) extraordinário fundar-se em decisão anterior do Supremo Tribunal Federal de inexistência de repercussão geral da questão constitucional discutida.

§ 2.º A petição de agravo será dirigida ao presidente ou vice-presidente do tribunal de origem e independe do pagamento de custas e despesas postais.

§ 3.º O agravado será intimado, de imediato, para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.

§ 4.º Após o prazo de resposta, não havendo retratação, o agravo será remetido ao tribunal superior competente.

§ 5.º O agravo poderá ser julgado, conforme o caso, conjuntamente com o recurso especial ou extraordinário, assegurada, neste caso, sustentação oral, observando-se, ainda, o disposto no regimento interno do tribunal respectivo.

§ 6.º Na hipótese de interposição conjunta de recursos extraordinário e especial, o agravante deverá interpor um agravo para cada recurso não admitido.

§ 7.º Havendo apenas um agravo, o recurso será remetido ao tribunal competente, e, havendo interposição conjunta, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.

§ 8.º Concluído o julgamento do agravo pelo Superior Tribunal de Justiça e, se for o caso, do recurso especial, independentemente de pedido, os autos serão remetidos ao Supremo Tribunal Federal para apreciação do agravo a ele dirigido, salvo se estiver prejudicado. (grifou-se)

No entanto, a maior novidade decorre de algo já analisada anteriormente: a ausência de juízo de admissibilidade dúplice ou bipartido (art. 1030, parágrafo único) encerra o cabimento do agravo em recurso especial e do agravo em recurso extraordinário nas causas em que, respectivamente, não houver afetação de tema ao rito dos recursos repetitivos perante o Tribunal Superior e/ou que a repercussão geral junto ao Pretório Excelso permita (ou seja, o tema do recurso verse sobre matéria já reconhecida como transcendente ou, então, cuja matéria não tiver sido apreciada sob tal aspecto).

Assim, somente nas hipóteses supradestacadas, as quais ensejam o sobrestamento dos autos nos Tribunais de origem, existe a possibilidade de interposição do recurso de agravo. É, pois, sobretudo em relação ao recurso especial, praticamente um “novo” (no sentido de diferenciar-se do que era) recurso.

Portanto, pode-se concluir que, s.m.j., perante a Justiça Eleitoral:

- o recurso de agravo em recurso especial, baseado na legislação especial, segue sendo perfeitamente cabível como meio de insurgência em relação ao juízo de admissibilidade dos recursos especiais eleitorais inadmitidos na origem, pois inteiramente regulado pelos arts. 278, § 1.º, e 279 do Código Eleitoral;

- o recurso de agravo em recurso especial do Código Eleitoral segue, à míngua de fundamento idôneo para o retorno à antiga sistemática da formação do instrumento, a sistemática inicialmente adotada pela Lei n.º 12.322/2010 e que foi mantida pelo Novo Código de Processo Civil, visto que os fundamentos para a adoção supletiva do rito simplificado permanecem hígidos;

- o “novo” recurso de agravo em recurso extraordinário será integralmente adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral, como consequência inafastável da universalidade do instituto da repercussão geral aos recursos extraordinários.


7. Conclusões

Ao final deste breve apanhado acerca do processo eleitoral, algumas de suas peculiaridades e, principalmente, seus entrelaçamentos com os recursos extraordinários lato sensu no Código de Processo Civil de 1973 e no Código de Processo Civil de 2015, pode-se chegar às primeiras conclusões, as quais, sem embargo de dúvida, deverão passar pelo crivo da doutrina e da jurisprudência eleitorais, sobre a análise do recurso especial eleitoral à luz do novo diploma processual:

1. Existe uma forte tendência, na Justiça Eleitoral e no Supremo Tribunal Federal, à prevalência das normas do Código Eleitoral (lei especial) em detrimento do Código de Processo Civil (lei geral), o que encontra eco na própria redação do art. 15 do Novo Código de Processo Civil;

2. O recurso especial eleitoral não deverá sofrer alterações significativas, em razão de seu regramento próprio, estando sujeito, no entanto, a influências incidentes do tratamento unificado da teoria geral dos recursos excepcionais;

3. O juízo de admissibilidade do recurso especial eleitoral deverá permanecer intacto no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que, mesmo partilhando da teoria geral dos apelos inseridos no diploma processual civil, encontra regramento específico no Código Eleitoral;

4. Da mesma forma como não foi aplicado desde sua instituição no Direito  brasileiro, o rito dos recursos repetitivos não deverá ser adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral após o advento do Novo Código de Processo Civil, uma vez que sua sistemática é direcionada somente ao Superior Tribunal de Justiça;

5. Ao contrário do rito dos recursos repetitivos, o instituto da repercussão geral deverá permanecer integralmente em vigor na rotina do Tribunal Superior Eleitoral, pois haverá uma simples sucessão de normas, ambas embasadas na própria Constituição (art. 102, § 3.º);

6. Em relação ao agravo, têm-se que:

- o recurso de agravo em recurso especial deverá seguir na condição de meio de insurgência contra a negativa de seguimento prolatada, na origem, em sede juízo de admissibilidade dos recursos especiais eleitorais, pois inteiramente regulado pelo  Código Eleitoral, diante da ausência de maiores modificações no regime do próprio recurso especial eleitoral;

- o recurso de agravo em recurso especial deverá seguir a sistemática inicialmente adotada pela Lei n.º 12.322/2010 e que foi mantida pelo Novo Código de Processo Civil, visto que os fundamentos para a adoção supletiva do rito simplificado permanecem hígidos, sendo verdadeiro retrocesso qualquer possibilidade de retorno da necessidade de formação de instrumentos;

- o “novo” recurso de agravo em recurso extraordinário deverá permanecer sendo integralmente adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral, como consequência inafastável da universalidade do instituto da repercussão geral aos recursos extraordinários, inclusive os oriundos da Justiça Eleitoral.


Autor

  • Angelo Soares Castilhos

    Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS (2004). Especialista em Direito Constitucional pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul - FMP (2007) e em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI (2017). Analista Judiciário - Área Judiciária do TRE-SC, atualmente removido para o TRE-RS. Chefe da Seção de Jurisprudência e Legislação do TRE-RS. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP) e do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (IGADE). Editor do site www.DireitoEleitoral.info.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTILHOS, Angelo Soares. Breves notas sobre o recurso especial eleitoral e o novo Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4400, 19 jul. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/40996. Acesso em: 24 abr. 2024.