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União homoafetiva no ordenamento jurídico brasileiro: uma nova instituição familiar?

União homoafetiva no ordenamento jurídico brasileiro: uma nova instituição familiar?

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Apresenta a união homoafetiva, conceituando a homossexualidade, sua inserção no cenário brasileiro, bem como de suas principais possibilidades no ordenamento, expondo a realidade na sociedade e jurisprudências sobre a efetivação ou não da união estável.

3.1 O que é homossexualidade?

A homossexualidade existe desde muitos séculos atrás, é uma das formas da sexualidade do ser humano que existe desde que o mundo é mundo. Em algumas sociedades são mais repulsadas, em outras menos.

Define-se a homossexualidade por um relacionamento onde há interesse afetivo e sexual entre indivíduos do mesmo sexo. Refere-se a característica, atributo de um ser humano que sente interesse, atração estética, física e emocional por outro ser de sexo igual. Para Croce e Croce Jr apud Flávia Ferreira Pinto (2010, p. 1) a homossexualidade:

Configura a atração erótica por indivíduos do mesmo sexo. É perversão sexual que atinge os dois sexos; pode ser, portanto, masculino – quando praticado por homens entre si - e feminino – quando por mulher com mulher. Homossexual é o que pratica aos libidinosos com indivíduos do mesmo sexo ou então apenas exibe fantasias eróticas a respeito, e, do ponto de vista legal, o que perpetrou um ato homossexual devidamente confirmado.

Resume-se, como já exposto, homossexualidade como sendo atração de um indivíduo por outro do mesmo sexo, podendo ser de homem por homem ou mulher por mulher, a homossexualidade se manifesta nos dois polos.

A homossexualidade é vista sobre quatro concepções, segundo Rios (2010, p. 1), “a homossexualidade como pecado, a homossexualidade como doença, a homossexualidade como critério neutro de diferenciação, e a homossexualidade como construção social”. A homossexualidade tida como pecado é exposta por Frank Worthen (2010, p. 1):

A Bíblia diz em cinco diferentes lugares que a homossexualidade é pecado: Lv 18: 22, Lv 20: 13, Rm 1: 26-27, I Co 6: 9-10 e I Tm 1: 9-10. Apesar das Escrituras ser muito clara sobre a conduta homossexual, algumas pessoas se perguntam: “A Bíblia também diz que os sentimentos homossexuais são incorretos?”

Depois de uma longa exposição sobre a homossexualidade, Rm 1:31 termina com estes versículos: “Ora, conhecendo eles a sentença de Deus, de que são passíveis de morte os que tais cousas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os que assim procedem.” É evidente aqui que o aprovar o estilo de vida homossexual é pecado. Cl 3: 5 diz: “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno, e a avareza, que é idolatria.” De acordo com a palavra de Deus, a luxúria sexual e a fantasia homossexual e heterossexual é pecado. Ao contrário, I Co 10: 13 nos assegura que a tentação não é pecado: “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel, e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar.” Existe uma diferença entre tentação e pecado. Não podemos controlar por completo o que nos serve de tentação, porém está em nosso poder decidir se seguimos ou não esta tentação. Este poder de decisão se fortalece pelo Espírito Santo que vive em nós.

Em consonância Gwercman (1989 apud PINHEIRO, 1996, p. 204) afirma ser a prática homossexual considerada como pecado “moralmente reprovável, e no plano religioso, pecaminosa”. É considerado pecado atos homossexuais, pois vai contra a lei natural da vida, ou seja, relacionamento entre homem e mulher, indivíduos de sexos diferentes e com propósito de procriar e constituir família.

A homossexualidade também foi considerada por muito tempo como doença, pois o homossexual era considerado diferente do normal, que era o indivíduo heterossexual, e antigamente e até mesmo nos dias atuais o que não segue os padrões considerados como normais são anormais e por isso considerado doença.

Nas palavras de Maria Berenice Dias (2010, p. 35), “ainda sob a influência das concepções religiosas, na Idade Média a medicina considerou a homossexualidade uma doença, uma enfermidade que acarretava a diminuição das faculdades mentais, além de um mal contagioso decorrente de um defeito genético”. A autora afirma que o surgimento da concepção de homossexualidade como doença é influência religiosa, que decorreu precipuamente das verdades que a igreja considerava como corretas.

A difícil identificação dos homossexuais na sociedade ocorre pelo fato deles não se diferenciarem em nenhum ponto específico, diferem-se apenas pelo aspecto afetivo. Com essa compreensão abandonou-se a ideia de que ser homossexual é ser doente, e passou-se a considerar a questão de ser homossexual apenas uma forma de diferenciação das demais pessoas, no quesito da opção sexual.

A concepção da diferenciação da homossexualidade decorre da consciência coletiva, das mudanças sociais e econômicas que enquadram os homossexuais em um grupo específico. Rios (2010, p. 1) afirma não haver base de sustentação para a discriminação que decorre de tal diferenciação “a dimensão desta mudança pode ser aquilatada, inclusive, pelo advento do conceito de ‘homofobia’, designando o distúrbio psíquico revelado por aqueles que experimentam medo ou ódio irracionais diante da homossexualidade”.

Completando o quadro, a última concepção de homossexualidade como construção social nos ensinamentos de Rios (2010, p. 1) significa:

[...] postular que a identificação de alguém ou a qualificação de seus atos sob uma ou outra orientação sexual só tem sentido na medida em que, num contexto histórico cultural, houver a institucionalização de papéis e de práticas próprias para cada um dos sexos, onde a atração pelo sexo oposto ou pelo mesmo sexo seja considerada um elemento relevante, capaz inclusive de impor diferenças de tratamento entre os indivíduos.

A construção social parte do ponto que os homossexuais apesar de serem considerados até então diferentes podem constituir família e serem considerados como casais, bastando apenas que se firme características que identifiquem essa situação, tal como a união estável.

3.2 A homossexualidade no Brasil

No Brasil, a homossexualidade não é conduta penal, legalmente não é uma conduta delitiva, suscetível de punição, mas infelizmente a lei não é o bastante para mudar a mentalidade das pessoas. Apesar de não ser contra a lei ser homossexual, a sociedade encarrega-se de torná-la, penalizando esse grupo por meio de discriminação e preconceito, é a chamada homofobia, prática muito habitual contra o indivíduo homossexual. As constantes práticas de homofobia são as responsáveis pela criação de grupos protetores, que visam inibir a prática de abusos e agressões contra os homossexuais e amparar o indivíduo que suportou a violência.

O Brasil está no ranking dos países onde mais se assassinam e violentam homossexuais. Diariamente eles são violentados e suportam a homofobia. Dropa (2010, p. 1) enfatiza essa realidade expondo o seguinte texto:

Em 1997, o sociólogo baiano e fundador do Grupo Gay da Bahia divulgou um triste relatório sobre a situação dos homossexuais no Brasil. Este trabalho, para nossa vergonha, teve repercussão internacional e revelou o Brasil como o país que mais desrespeita os direitos dos homossexuais em todo o mundo.

O mesmo autor para mostrar ainda mais a realidade dos homossexuais dispõe que:

Segundo Luiz Mott, a cada três dias, pelo menos um gay, travesti ou lésbica é brutalmente assassinado no país. Como não existe qualquer estatística oficial, os dados apresentados pelo GGB são a única fonte de informação capaz de nos fazer encarar esta realidade de frente: o Brasil é o campeão mundial de assassinatos de homossexuais. De acordo com as estatísticas do GGB, nos últimos 20 anos foram assassinados 1661 homossexuais, com uma média de 80 homossexuais por cada ano da década de 80, subindo esta estatística para 120 por cada ano da década de 90. Em dados mais recentes, levantados pelo Grupo Gay da Bahia, foram 116 assassinatos de homossexuais, só em 1998, dos quais 73 eram gays, 36 eram travestis e 07 eram lésbicas (DROPA, 2010, p. 1).

No mesmo seguimento Alves (2006, p. 284) tece algumas considerações sobre o relatório de assassinatos de homossexuais no Brasil em 2005, publicado pela ONG Grupo Gay da Bahia- GGB disponibilizado no site da organização:

De acordo com ele entre 1980-2005, foram assassinados no Brasil 2.511 homossexuais, em sua maioria parte vítima de crimes homofóbicos, onde o ódio da homossexualidade de manifesta através da crueldade característica de tais homicídios. Dentre as vítimas, 72% gays, 25% travestis, 3% lésbicas. Para uma população estimada em 20 mil indivíduos, as transgêneros (travestis e transexuais) são proporcionalmente mais agredidas que as lésbicas e gays, que somam mais de 18 milhões de brasileiros, 10% da população. No Brasil registra-se, portanto, um crime de ódio anti-homossexual a cada 3 dias. Uma média de 100 homicídios anuais sendo que vem aumentando para atingir em 2004 a casa dos 158 homicídios.

Analisando o exposto percebe-se que os números comprovam como é grande a discriminação que existe na sociedade brasileira acerca do homossexualismo, os números são preocupantes e não param de crescer com o passar dos anos. O preconceito ainda é muito acentuado com o que não é considerado normal pela sociedade e a homossexualidade é uma realidade discriminatória muito presente. A discriminação ocorre nos mais diversos lugares, como no trabalho, na rua, em casa, enfim não tem lugar próprio para acontecer.

Os homossexuais sofrem constantemente com a homofobia, eles são alvos fáceis principalmente dos considerados bad boys1, que sentem prazer em ridicularizar e maltratá-los. Mas, infelizmente, não são apenas por parte desses indivíduos que acontece a homofobia, ela ocorre por pessoas de diferentes níveis sociais, de diferentes idades e cultura, o preconceito infelizmente está enraizado na sociedade brasileira desde muitos séculos atrás, vindos desde a escravidão.

No Brasil, os homossexuais têm sofrido vários tipos de discriminação e preconceito, apesar da Constituição Federal do Brasil – CFB – de 1988 proibir tal comportamento.

3.3 O que é união homoafetiva?

Estando o mundo em constantes alterações, estabelecer uma família, atualmente, é considerado pela constituição um direito natural. Quando nasce um indivíduo, naturalmente, este já está envolvida no contexto histórico e cultural, sendo seu comportamento e atitudes determinadas pelos papéis sociais.

Diante do exposto Spengler (2003), expõe a possibilidade de sexo sem casamento, assim como procriação sem sexo, sendo esse ato amparado pela Constituição Federal. Dias (1999 apud FERNANDES, 2004, p.68) interpreta o art. 226, § 3º da Constituição Federal:

Passando, duas pessoas ligadas por um vínculo afetivo, a manter uma relação duradoura, pública e contínua, como se casadas fossem, formam um núcleo familiar à semelhança do casamento, independentemente do sexo a que pertencem. A única diferença que essa convivência guarda com a união estável entre um homem e uma mulher é a inexistência da possibilidade de gerar filhos. Tal circunstância, por óbvio, não serve de fundamento para a diferenciação levada a efeito. Como a capacidade procriativa ou a vontade de ter prole não são elementos essenciais para que se empreste proteção legal a um par, é de reconhecer-se a incompatibilidade da regra com o preceito igualitário, que dispõe de maior espectro.

Diante do exposto, Spengler (2003) elucida que a união de duas pessoas pelo casamento deixa de ser o único reduto matrimonial, passando a serem reconhecidas também pelo Direito da Família, as relações extramatrimoniais. Segundo Pamplona (1994), o que une duas pessoas do mesmo sexo, é exclusivamente o afeto, pois não há legislação ou mesmo dependência econômica, para manutenção do vínculo amoroso entre esses casais. Dessa forma, busca-se atualmente a legalidade das uniões homoafetivas, assim como um novo ponto de vista dessas relações.

Atualmente, as uniões homoafetivas são consideradas como sociedades de fato, no entanto Dias (2010, p. 22) percebe que “não são sociedades de fato cujos sócios visam ao lucro, mas sim sociedades de afeto”, explica que até os dias de hoje a determinação da parentalidade na filiação socioafetiva é considerada um referencial.

Sendo a justiça considerada conservadora, Dias (2010) entende ser indispensável à sensibilização dos juízes, para que sejam obtidos os ideais de igualdade e dignidade da pessoa humana. Além disso, a autora complementa expondo que se faz necessário refletir com fundamentos em conceitos jurídicos, mas que para isso se tornar realidade se faz necessário pensar em novos conceitos jurídicos. Em complemento ao tema, Spengler (2003, p. 79) afirma que “evidente, então, que o principal entrave legal (senão único) para o casamento entre homossexuais seja permitido é o fato de que a lei é clara ao impor a diversidade de sexos para que o casamento exista”.

A prática homossexual, atualmente denominada de homoafetividade, não será transformada ou mesmo estimulada, se as uniões homoafetivas forem aceitas como instituições familiares, pois de acordo com a afirmação do Deputado Fernando Gabeira (2001, apud DIAS, 2010, p. 86): “ninguém vira homossexual lendo o Diário Oficial.” A autora ainda completa afirmando que: “o estigma do preconceito não pode permitir que um fato social não se sujeite a efeitos jurídicos” (DIAS, 2010, p.98).

Neste diapasão da possibilidade de a família ser constituída por um casal em união homoafetiva, deve-se considerar como uma estruturação psíquica, onde cada integrante possui um lugar e uma função definida sem que exista a obrigação de um elo biológico entre os eles. As práticas homossexuais mudam segundo o contexto, a cultura e os segmentos sociais, no entanto, nunca deve ser tratada como crime ou doença, pois para aquele que comete um crime merece sofre uma pena e doença exige que exista “cura” e “correção”, o que é inaceitável neste contexto.

Embora muita coisa tenha mudado, há quem considere o homossexualismo um pecado ou até mesmo uma doença. Contudo, Pamplona (2009, p. 96) expõe outro ponto de vista, pontuando os motivos da união desses casais: a inexistência de filhos e a falta de legislação legitimando a relação, a existência de uma independência econômica individual, além ainda da inexistência de uma pressão familiar e social para que continuem casados. Deste modo, o autor considera que o que verdadeiramente une esses casais é o amor existente um pelo outro.

Pamplona (2009) comenta ainda que o amor é a base para qualquer relacionamento, e entre os casais homossexuais, esse sentimento é mais visível, por não existir modelos pré-estabelecidos na sociedade.

É indispensável que cada indivíduo tenha a possibilidade de ter livre-arbítrio de preferências sociais diante da demanda atribuída pela sua própria subjetividade. A psicologia deve auxiliar o homem diante das suas escolhas, amparando-o e desconstruindo junto dele os preconceitos que lhe são atribuídos, fazendo-se necessário um trabalho em conjunto com a família.

Em suas análises, Spengler (2003) acredita na possibilidade de sexo sem casamento, assim como procriação sem sexo, sendo esse ato amparado pela Constituição Federal. Dias (1989 apud FERNANDES, 2004, p.68) interpreta o art. 226, § 3º da atual Carta Magna:

Passando, duas pessoas ligadas por um vínculo afetivo, a manter uma relação duradoura, pública e contínua, como se casadas fossem, formam um núcleo familiar à semelhança do casamento, independentemente do sexo a que pertencem. A única diferença que essa convivência guarda com a união estável entre um homem e uma mulher é a inexistência da possibilidade de gerar filhos. Tal circunstância, por óbvio, não serve de fundamento para a diferenciação levada a efeito. Como a capacidade procriativa ou a vontade de ter prole não são elementos essenciais para que se empreste proteção legal a um par, é de reconhecer-se a incompatibilidade da regra com o preceito igualitário, que dispõe de maior espectro.

Conforme análise de Pereira (2000), é importante saber que a sexualidade integra a própria condição humana, isso porque é um direito que o acompanha desde o seu nascimento, é algo natural, não é opcional. Se alguém não detiver como direito assegurado o respeito mínimo à fruição de sua liberdade sexual, não pode sequer se dizer humano. A liberdade sexual, como se sabe, abriga a então liberdade da livre orientação sexual.

É neste ponto que surge a questão da isonomia, que é justamente o direito ao tratamento igualitário, independente da orientação sexual. A relação forte entre os conceitos de liberdade sexual e isonomia está no fato de que todo ser humano só se realiza como tal, se puder exercer sua liberdade no sentido de se guiar sexualmente da maneira que lhe convir, já que tem autonomia para conduzir suas orientações, desde que não prejudique a terceiros. Assim, assegurado o exercício de tal direito, então automaticamente se torna necessário que haja total igualdade no tratamento destes indivíduos, que possuem uma orientação sexual que não é tida como a tradicional pela sociedade.

Ainda de acordo com Pereira (2000), geralmente muitos tendem a ter uma ideia de que o relacionamento homoafetivo tem sempre uma conotação vinculada ao sexo, ou está ligado a algo pejorativo. Muitas vezes se pensa que o exercício da sexualidade, da conjunção carnal e a identidade sexual são o que distingue os vínculos afetivos. Trata-se de um pensamento errôneo, já que a afetividade é hoje reconhecida como elemento base de uma relação familiar, hoje o conceito de família é outro. A identidade ou mesmo a chamada diversidade do sexo do par gera espécies diversas de relacionamento.

Diante disso é que se preferiu o termo homoafetividade, em substituição à chamada homossexualidade. O certo é que quando um indivíduo se relaciona com outro do mesmo sexo, tal situação não afronta o conceito de justiça, pelo contrário, os ordenamentos jurídicos devem tutelar a liberdade, seja por Regras Constitucionais, seja por legislação infraconstitucional.  

3.3.1 Da possibilidade de união homoafetiva no ordenamento jurídico brasileiro

Sobre a possibilidade de união estável no ordenamento brasileiro, observe-se que atualmente não se diferencia mais o instituto família pela ocorrência do casamento, inclusive, nem mesmo a prole é essencial para que a convivência entre duas pessoas seja digna de proteção constitucional e reconhecimento. Sobre o tema, o Defensor Público Francisco Falconi (2013, on line) publicou em sua página da Internet, o posicionamento a seguir:

Recentemente, foram publicadas no Diário da Justiça da União as ementas da ADPF n. 132-RJ e da ADI n. 4277-DF, relatadas pelo Ministro Ayres Britto. Nesses célebres julgados, a Suprema Corte conferiu interpretação conforme a Constituição ao art. 1.723 do Código Civil para permitir o reconhecimento de uniões estáveis constituídas por pessoas do mesmo sexo.

O Defensor Público Francisco Falconi (2013, on line), em sua página da Internet, mostra-se favorável que a união homoafetiva seja considerada como uma família legítima, prova disso obtém-se com a citação abaixo:

2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos”. Silêncio normativo da Constituição Federal a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana “norma geral negativa”, segundo a qual “o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da “dignidade da pessoa humana”: direito a autoestima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea (grifos originais).

A partir da citação acima, observa-se que o Defensor Público baseia suas análises na impossibilidade de ocorrer dicotomia entre o homem e a mulher no direito constitucional à fraternidade, à pluralidade sexual, no princípio da dignidade da pessoa humana, no direito à liberdade e na busca pela felicidade. Até porque todos possuem autonomia de vontades, não cabendo a discriminação de casais em união homoafetiva não formarem uma família nestes termos.

Todavia, este posicionamento jurisprudencial favorável ao reconhecimento da união homoafetiva como instituição familiar é mais recente, prova disso é que foram identificadas ementas jurisprudenciais mais antigas que se mostram contrárias a este fato, conforme pode ser observado abaixo.

Ementa: COMPETÊNCIA - UNIÕES HOMOAFETIVAS - INEXISTÊNCIA DE INSTITUIÇÃO FAMILIAR - SOCIEDADE DE FATO - JUÍZO CÍVEL. 1. AS UNIÕES HOMOAFETIVAS NÃO SÃO INSTITUIÇÃO FAMILIAR À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO VIGENTE. A REALIDADE DA SOCIEDADE DE FATO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO MERECE TRATAMENTO ISONÔMICO QUANTO AO RECONHECIMENTO, DISSOLUÇÃO E PARTILHA DE BENS ADQUIRIDOS DURANTE A CONVIVÊNCIA, MAS PERANTE O JUÍZO CÍVEL. 2. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA IMPLICA RECONHECER A EXISTÊNCIA DE DIREITOS ADVINDOS DESSAS UNIÕES EQUIPARADAS ÀQUELAS PROVENIENTES DE UNIÕES HETEROSSEXUAIS, A FIM DE SE EVITAR QUALQUER TIPO DE DISCRIMINAÇÃO EM RAZÃO DA OPÇÃO SEXUAL, CONTUDO NÃO TEM CONDÃO, POR ORA, DE ALTERAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE FAMÍLIA.2

2 TJ-DF 2004 DF 2004/0020013132. Ministro Paulo Medina. 20/05/2004. T5 – QUINTA TURMA. DJ 01.06.2004, p. 46.

Com esta ementa supra-apresentada de 2004, contrária à consideração da união homoafetiva como instituição familiar, considerando-a somente como uma sociedade de fato, pode-se perceber que de 2004 a 2013 o posicionamento jurisprudencial vem mudando sua opinião, demonstrando-se mais favorável por considerar a importância da fraternidade, do amor e não somente a distinção de sexos para a consolidação de uma família.

Nesse sentido, mais uma vez não se justifica ou fundamenta o fato de as relações homoafetivas não poderem estar inseridas no conceito de família. Basta que estas duas pessoas, possuam um vínculo afetivo e relação duradoura, pública e contínua, se relacionando como se fossem casados, não importando de maneira alguma o sexo a que pertencem. Ocorrendo isso, não há motivos para que não sejam gerados os mesmos efeitos jurídicos que seriam gerados no caso de uma família tida como tradicional.

Pode-se observar que, conforme Pereira (2010), o artigo 4° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e o artigo 126 do Código de Processo Civil trazem que, diante da omissão do legislador e silêncio do constituinte, o juiz deve cumprir a Lei e atender a esses comandos. Quando há lacuna na Lei, em outras palavras, falta de normatização, o Juiz deve se utilizar da chamada analogia, dos costumes atuais da sociedade e do direito em si para a tomada de decisões de forma justa.

Não há na lei nada que impeça tais uniões de estarem inseridas no instituto família. Conforme Pereira (2010, p. 281): “em nome de uma moral sexual dita civilizatória, muita injustiça têm sido cometida. O Direito, como instrumento ideológico e de poder, em nome da moral e dos bons costumes, já excluiu muitos dos laços sociais”.

Em suma, o fato é que, como bem coloca Suannes (1999, p. 32), pluralizou-se o conceito de família, já que não se associa mais meramente à celebração do matrimônio. Não existe como afirmar que o artigo 226, §3°, da Constituição Federal, quando menciona que a união estável formada entre um homem e uma mulher, reconheceu somente esta convivência como digna e merecedora da proteção do Estado. De acordo com o autor, o que existe é uma simples motivação em transformá-la em casamento, já que em momento algum foi dito não existirem entidades familiares formadas por pessoas do mesmo sexo. De fato, exigir a diferenciação de sexos entre um casal para que seja assegurada a proteção do Estado é fazer uma distinção que contraria o princípio da isonomia, ignorando a vedação de diferenciar pessoas devido à orientação sexual.

A ideia aqui defendida não é a de se impor que alguém concorde com a homoafetividade, já que as pessoas têm o direito de ter sua própria opinião. O que se busca é um mínimo de respeito e que haja um tratamento igual entre todas as pessoas, independentemente de qualquer situação, inclusive da orientação sexual.

É inegável os avanços que as relações homoafetivas ganharam nos últimos anos, uma vez que a maioria das decisões jurisprudenciais são favoráveis a este novo tipo de instituição familiar não baseada na relação homem e mulher, mas sim na consagração do amor e respeito mútuo, conforme citados em páginas anteriores.

Importante ressaltar que o tema aqui tratado possui relação tanto com o Direito Público, com relação a sua análise constitucional, como com o Direito Privado, quando se analisa as consequências da falta de legislação e, principalmente, sobre os casos concretos. A legislação pátria ainda é insuficiente com relação aos casos específicos que envolvem as relações homoafetivas, e é por este motivo que o perfil constitucional dessas relações está ligado diretamente aos princípios da isonomia e da liberdade individual (sexual).

O fato de não haver uma legislação específica para determinado caso não significa que não existe direito à tutela jurídica, pois a ausência de lei não impede que se extraiam efeitos. A falta de previsão específica não pode ser uma justificativa para se negar a existência de direitos.

3.3.2 A realidade brasileira

Apesar de todos os avanços nos últimos anos, como se viu, a falta de uma legislação específica para a união homoafetiva persiste no ordenamento jurídico brasileiro, ainda coroado pelos valores morais, e pela discriminação social reinante em torno do assunto.

Nesse escopo, a lição de Maria Berenice Dias (2000, p. 121) é bastante elucidativa:

O repúdio social de que são alvo as uniões homossexuais inibiu o legislador constituinte de enlaçá-las no conceito de entidade familiar. Ainda que afrontando o Princípio da Igualdade e olvidando a proibição de discriminação que ele mesmo consagra como norma fundamental, a Constituição da República Federativa do Brasil pressupôs, no § 3º de seu artigo 226, a diversidade de sexos para configuração da união estável.

Muito embora, o enunciado acima pela autora, a discriminação e o repúdio social ainda estigmatizam as uniões homoafetivas, relegando à marginalidade aqueles que dela fazem uso como se fosse uma conduta desonrosa e imoral.

Tentando minimizar esses efeitos e proteger os direitos de quem opte por uniões dessa natureza, foi elaborado o Projeto de Lei nº 1.151/95, da Deputada Marta Suplicy  (PT/SP), cujo objeto é a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Ao projeto em comento foi apresentado substitutivo pelo então relator e ex-Deputado Federal, Roberto Jefferson, no caso, Projeto de nº 5.252/01, que aludia a união homoafetiva como um novo modelo familiar. Esse último projeto ainda encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados e conceitua união estável como ‘parceria civil registrada’.

Sobre esse projeto de lei, Dias (2000, p. 123) assim discorre:

A finalidade do projeto é chancelar a vontade manifestada por duas pessoas do mesmo sexo, independente da existência de vínculo afetivo ou homossexual entre elas. Busca autorizar a elaboração de um contrato escrito, passível de ser registrado em livro próprio no Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais.

Como se percebe não se trata da oficialização de um casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas de um contrato que surtirá seus efeitos no âmbito sucessório, previdenciário, nos planos de saúde etc.  

Merece reflexão, o disposto no art. 226 da CF/88, ao determinar expressamente que o Estado brasileiro reconhece a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, sendo, portanto, protegida juridicamente. Essa disposição legal é a base para os críticos da oficialização da união estável entre pessoas do mesmo sexo, posto que não encontre guarida expressa na letra da Constituição.

No entanto, esse entendimento vem mudando ao longo do tempo no mesmo compasso em que a sociedade começa a aceitar e se adequar à nova realidade, onde casais homoafetivos passam a ter os mesmos direitos e tratamento igualitário dos casais heteroafetivos.

3.3.3 Jurisprudência sobre a união homoafetiva

A jurisprudência tem em muito se adiantado quanto ao tratamento dado à união homoafetiva. O julgamento da ADI nº 4.277 pelo STF, cujo relator foi o Ministro Ayres Britto descortinou de forma bastante eficaz os direitos dos casais homoafetivos, que foram equiparados em muitos aspectos aos casais heteroafetivos.

A partir de então, vários julgados passaram seguir o mesmo entendimento, inaugurando um novo tempo onde a discriminação e o repúdio explícito à união homoafetiva foram desmistificados, dando lugar a uma maior aceitação da orientação sexual, como sendo uma opção que cabe à individualidade de cada um. Sobre os efeitos dessa equiparação, o companheiro homoafetivo já pode ser dependente de seu cônjuge em planos de saúde, conforme se pode verificar:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. UNIÃO HOMOAFETIVA. INSCRIÇÃO DE PARCEIRO EM PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DA CORTE. 1.- Reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar, aplicável o entendimento desta Corte no sentido de que "a relação homoafetiva gera direitos e, analogicamente à união estável, permite a inclusão do companheiro dependente em plano de assistência médica" (REsp nº 238.715, RS, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 02.10.06). 2.- Agravo Regimental improvido. 3

3 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Agrg no Resp: 1298129 Sp 2011/0297270-0, Relator Ministro Sidnei Beneti, Julgado em 13. Ago. 2013, Terceira Turma, publicado em: 05 set. 2013.

Já se consegue avançar nessa seara, permitindo que casais homoafetivos tenham o direito de adotar, sendo necessário apenas que se cumpram os trâmites legais, que também são exigidos dos casais heteroafetivos. A viabilidade da adoção na união homoafetiva pode ser vista no julgado a seguir:  

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. UNIÃO HOMOAFETIVA. PEDIDO DE ADOÇÃO UNILATERAL. POSSIBILIDADE. ANÁLISE SOBRE A EXISTÊNCIA DE VANTAGENS PARA A ADOTANDA. I. [...] III. A plena equiparação das uniões estáveis homoafetivas, às uniões estáveis heteroafetivas, afirmada pelo STF (ADI 4277/DF, Rel. Min. Ayres Britto), trouxe como corolário, a extensão automática àquelas, das prerrogativas já outorgadas aos companheiros dentro de uma união estável tradicional, o que torna o pedido de adoção por casal homoafetivo, legalmente viável. IV. Se determinada situação é possível ao extrato heterossexual da população brasileira, também o é à fração homossexual, assexual ou transexual, e todos os demais grupos representativos de minorias de qualquer natureza que são abraçados, em igualdade de condições, pelos mesmos direitos e se submetem, de igual forma, às restrições ou exigências da mesma lei, que deve, em homenagem ao princípio da igualdade, resguardar-se de quaisquer conteúdos discriminatórios. V. [...] VII. [...] VII. A confluência de elementos técnicos e fáticos, tirados da i) óbvia cidadania integral dos adotantes; ii) da ausência de prejuízo comprovado para os adotados e; iii) da evidente necessidade de se aumentar, e não restringir, a base daqueles que desejam adotar, em virtude da existência de milhares de crianças que longe de quererem discutir a orientação sexual de seus pais, anseiam apenas por um lar, reafirmam o posicionamento adotado pelo Tribunal de origem, quanto à possibilidade jurídica e conveniência do deferimento do pleito de adoção unilateral. Recurso especial NÃO PROVIDO. 4

Com base na jurisprudência acima, pode-se afirmar que a adoção, desde que seja vantajosa para a criança, é hoje aceita no meio jurídico. Esse entendimento tem por fundamento o grande número de crianças órfãs, necessitando de um lar onde possam bem desenvolver suas potencialidades no meio social. A jurisprudência em comento abomina a discussão sobre a orientação sexual dos futuros pais do adotante, tendo em vista a necessidade de oferecer um lar digno ao adotando.

Nesse escopo, urge que se mencione o estudo de Farias e Maia (2009, p. 75-75), onde se revela que os filhos adotados por casais homossexuais, sejam homens ou mulheres, não apresentam qualquer comprometimento ou problemas no desenvolvimento psicossocial, quando são comparados às crianças filhas de pais heterossexuais. Posto que o ambiente familiar erguido tanto na relação homoafetiva quanto na relação heterossexual não diferem entre si, sendo propício ao desenvolvimento satisfatório da criança. Da lavra do então Ministro Relator Ayres Britto, tem-se a lição:

(...) Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art.1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.

Pelo exposto acima, depreende-se que a união homoafetiva deve ter tratamento idêntico à união heteroafetiva, e deve produzir também as mesmas consequências, sendo reprovável qualquer tipo de tratamento discriminatório ou desigual. Isso advém do fato de que a orientação sexual está na esfera da vontade, privacidade e autonomia dos indivíduos, não sendo lícito cercear-lhe esse direito e nem colocar-lhe aparas, posto que a intimidade é um direito constitucionalmente protegido, e corresponde ao exercício da cidadania de cada um.

O julgado abaixo é bastante esclarecedor sobre a questão:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CARÁTER INFRINGENTE. POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE. CABIMENTO. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO HOMOAFETIVA POST MORTEM. EQUIPARAÇÃO À UNIÃO ESTÁVEL HETEROAFETIVA. [...] 2. Há possibilidade jurídica de reconhecimento de união estável homoafetiva pelo ordenamento jurídico brasileiro por realizar os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, aplicando-se, por analogia, a legislação atinente às relações estáveis heteroafetivas, tendo em vista a caracterização dessa relação como modelo de entidade familiar (STF, ADI nº 4.277/DF, Relator Ministro AYRES BRITTO, DJe 5/5/2011). 3. Assentando o Tribunal local restar comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do mesmo sexo, é de se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente à meação dos bens adquiridos a título oneroso ao longo do relacionamento, independentemente da prova do esforço comum, que nesses casos, é presumida, conforme remansosa jurisprudência do STJ. [...]. 6

6 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. EDcl no REsp: 633713 RS 2004/0028417-4, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Julgamento 11 fev. 2014, Terceira Turma, publicado em 28 fev. 2014.

7 TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5 REGIÃO. REO 56290620124058100, Relatora Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, julgado em 23 jul. 2011, quarta Turma, Publicado em 26 jul. 2013.

De acordo com o entendimento jurisprudencial retro exposto, tanto casais heterossexuais quanto homossexuais devem ser alcançados pelas normas em igualdade de condições, sem ressalvas ou limitação diferenciadas em virtude de opção sexual, ou outra qualquer, em observância ao princípio da igualdade, esculpido no art. 5º do texto constitucional. A questão sucessória entre casais homoafetivos já recebe o mesmo tratamento em nível dos tribunais brasileiros.

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. MILITAR. COMPANHEIRO. UNIÃO HOMOAFETIVA COMPROVADA. DESIGNAÇÃO COMO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. I. Em face dos julgamentos da ADI 4277 e da ADPF 132, o Supremo Tribunal Federal equiparou a união homoafetiva à união estável, de modo que devem ser estendidos àqueles todos os benefícios concedidos a estes, desde que preenchidos os demais requisitos legais para a sua concessão. II. A Lei nº 6880/80, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares, inclui o companheiro (a) como dependente do militar. III. [...]

É certo que, hodiernamente, tanto os casais homoafetivos como os heteroafetivos são abraçados em igualdade de condições, pelos mesmos direitos e se submetem, de igual forma, às restrições ou exigências da mesma lei, que deve, em homenagem ao princípio da igualdade, resguardar-se de qualquer conteúdo discriminatório. Tanto é assim que o direito à pensão por morte também já encontra respaldo nos tribunais, como se pode ver:

Com efeito, a ADI nº 4.227, do STF, trouxe luzes a questão da união homoafetiva, igualando-a ao mesmo patamar que a união estável entre pessoas do mesmo sexo, muito embora ainda não exista uma legislação específica no ordenamento brasileiro para disciplinar o assunto. Em seu conteúdo, a Corte Suprema deixou patente o seu posicionamento sobre o assunto de forma inquestionável, que a opção sexual, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não pode se tratado como fator de desigualdade jurídica, com base inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por confrontar de forma contundente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos.

É bem verdade que o Estado Democrático de Direito erguido com a ordem constitucional inaugurada coma CF/88, tem por fundamento a promoção do desenvolvimento e do bem-estar geral, não podendo ser afrontado pelo desrespeito à orientação sexual ou estilo de vida de quem quer que seja.

Portanto, a promoção da igualdade social deve estar acima de qualquer preconceito, e qualquer ofensa a esse princípio deve ser veementemente rechaçada. Só assim, os indivíduos poderão ser valorados como seres humanos, e dignamente considerados e aceitos nas suas opções pessoais mais diversas possíveis, tanto pelo ordenamento jurídico quanto pela sociedade.  

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