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Acordo de não-persecução penal: Inconformidade jurídico constitucional da Resolução nº 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público

Acordo de não-persecução penal: Inconformidade jurídico constitucional da Resolução nº 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público

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A Resolução nº 181/2017 do CNMP propôs agressiva ampliação das margens de consenso no Processo Penal Brasileiro, admitindo o acordo de não persecução penal. O presente estudo se presta a analisar a conformidade jurídico constitucional da medida.

Se olharmos para a evolução do modelo de persecução penal brasileiro constatamos que 1995 foi um ano marcante (edificação da Lei 9.099/1995, que regulamentou os Juizados Especiais Criminais). Ali trilhávamos o caminho de uma justiça penal voltada ao consenso, especificamente na persecução dos delitos de pequeno potencial ofensivo. Surge a possibilidade de compressão do rito, racionalizando a intervenção processual, motivada pela necessidade de se repaginar os custos econômicos, sociais e individuais envolvidos na persecução dos delitos de pequeno potencial ofensivo.

A Lei 9.099/1995 representa uma vontade do constituinte originário, implementando uma intervenção jurisdicional mais limitada, consolidando um modelo transacional, passando a uma maior interação entre os sujeitos para a realização da justiça ao caso[1]. Neste modelo, o contraditório exaustivo não é pressuposto para uma prestação jurisdicional penal.

Uma peculiaridade da Lei 9.099/1995 é a postura de um nolo contendere; isto é, o acusado não assume a culpa, tampouco é obrigado a discuti-la; submete-se à aplicação de uma medida restritiva de direito sem correr o risco do litígio processual penal. Esquiva-se de uma sentença condenatória, uma vez que as medidas despenalizantes contempladas nessa Lei têm natureza diversa de sentença condenatória. Diluíram-se estigmas (reincidente, condenado etc.) ao ponto em que foram demolidas cerimônias degradantes e desnecessárias na persecução dos delitos de pequena lesividade.

Alguns delitos de alta lesividade também se submetem à atividade negocial[2]. Nas delações premiadas, verba gratia, aplica-se técnicas recompensatórias ao arguido que auxilia a atividade de persecução criminal[3]. O delator é, via de regra, aquele que denuncia o fato criminoso ou que, ao admitir a própria responsabilidade por um ou mais delitos, presta auxílio útil aos investigadores.

Interessante notar que, nas hipóteses de diversão aplicadas aos crimes de pequeno potencial ofensivo, as medidas despenalizantes se sustentam na perspectiva de que a baixa lesividade do ilícito praticado indica que a suspensão do processo, ou as sanções alternativas são suficientes. Já nos crimes de alta lesividade, como os praticados por organizações criminosas, temos realidade diversa, pois o caráter valioso do bem jurídico é evidente, sobretudo, acredita-se que, com a colaboração, possa-se outorgar efetividade no desbaratamento da organização criminosa, identificando lideranças e recuperando o produto do crime.

Há um nítido movimento tendente a ampliar as margens de consenso no Processo Penal brasileiro. Nosso sistema de contencioso penal, inábil para estabilizar as expectativas sociais, busca alternativas no ‘negócio penal’. Celeridade e eficiência, mas sem perder a coerência jus-processual, é o desafio que se impõe à ampliação das hipóteses de consenso no processo penal.

Neste contexto, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), com o objetivo de aprimorar a investigação, publicou aos 08 de setembro de 2017 a resolução Nº 181 que dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público. A normativa visa tornar as investigações mais céleres, eficientes e desburocratizadas com o escopo de agilização e efetividade das investigações. Um nítido desejo de modernização, visando superar os paradigmas de investigação cartorial, burocratizada e centralizada.

O Conselho Nacional do Ministério Público observou a carga desumana de processos que se acumulam nas Varas Criminais do país, concebendo que a Justiça Penal ‘tradicional’ levanta desperdício de tempo e preciosos recursos. Considerou, por fim, a exigência de soluções alternativas no Processo Penal que proporcionem celeridade na resolução dos casos menos graves, possibilitando a priorização dos recursos financeiros e humanos do Ministério Público e do Poder Judiciário para processamento e julgamento dos casos mais graves.

Compreende o CNMP que, com a prática negocial penal poderá reduzir os efeitos sociais prejudiciais da pena e desafogar os estabelecimentos prisionais, minorando os efeitos deletérios de uma sentença penal condenatória aos acusados em geral, que teriam mais uma chance de evitar uma condenação. Propõe assim, de forma inovadora, o “ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL”, cabível nos delitos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.

A experiência internacional demonstra que uma atividade premial desenhada dentro do Direito, delimitada com regras precisas, nas quais o eficientismo colabore para a obtenção de funcionalidade, poderá revelar um modelo de negócio penal que conspire a favor dos interesses do aspirante ao prêmio (arguido) e, sobretudo, no interesse superior da coletividade[4].

Há um desejo coletivo de vencer a burocracia e morosidade de nosso sistema processual penal, sobretudo, novas propostas devem ser edificadas com respeito a ordem legal e à dignidade do ser humano, preservando as garantias constitucionais existentes.

A introdução de um mecanismo de abreviação de rito ou nolo contendere com imposição de medidas de coerção deve guardar conformidade jurídico-constitucional.

Poderia o Processo Penal brasileiro passar por uma importante reforma através do instrumento da Resolução de um Conselho Nacional do Ministério Público? A edição de norma processual não dependeria de reserva de lei?

Haveria compatibilidade entre os princípios do devido processo legal, legalidade, ampla defesa, presunção de inocência (nemo tenetur) e culpabilidade com a proposta de “NÃO-PERSECUÇÃO PENAL” contida na resolução?

Atentos ao fundamento da Dignidade da Pessoa Humana, contemplaremos a conformidade jurídica constitucional da proposta de “NÃO-PERSECUÇÃO PENAL” sugerida pelo Conselho Nacional do Ministério Público.


O ‘ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL’

Nos termos do artigo 18 da Resolução Nº 181 do CNMP, o acordo de não-persecução se prestaria a evitar a instrução judicial do feito, impondo medidas despenalizantes. Essa modalidade de acordo dispensaria o uso da ação penal para vergastar crimes cometidos sem violência ou grave ameaça a pessoa. Exige a normativa que o valor do dano causado pela conduta delituosa seja inferior ou igual a vinte salários-mínimos. Em síntese, o Ministério Público deixaria de propor a denúncia, firmando negócio processual penal com o réu, desde que o este confesse formal e detalhadamente a prática do delito, indicando eventuais provas de seu cometimento. O indiciado deverá confessar formal e detalhadamente a prática do delito e indicar eventuais provas de seu cometimento, além de cumprir os seguintes requisitos, de forma cumulativa ou não:

“I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima;

II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, de modo a gerar resultados práticos equivalentes aos efeitos genéricos da condenação, nos termos e condições estabelecidos pelos artigos 91 e 92 do Código Penal;

III – comunicar ao Ministério Público eventual mudança de endereço, número de telefone ou e-mail;

IV – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo Ministério Público.

V – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Código Penal, a entidade pública ou de interesse social a ser indicada pelo Ministério Público, devendo a prestação ser destinada preferencialmente àquelas entidades que tenham como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito.

VI – cumprir outra condição estipulada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal aparentemente praticada.

§ 1º Não se admitirá a proposta nos casos em que:

I – for cabível a transação penal, nos termos da lei;

II – o dano causado for superior a vinte salários-mínimos ou a parâmetro diverso definido pelo respectivo órgão de coordenação;

III – o investigado incorra em alguma das hipóteses previstas no art. 76, § 2º, da Lei n. 9.099/95;

IV – o aguardo para o cumprimento do acordo possa acarretar a prescrição da pretensão punitiva estatal.” (extraído do artigo 18 da resolução 181 do CNMP)

Nos termos da Resolução, o acordo deverá ser formalizado nos autos, com a qualificação completa do investigado e estipulando de modo claro as suas condições, eventuais valores a serem restituídos e as datas para cumprimento. Tudo será firmado pelo Membro do Ministério Público, pelo investigado e seu advogado. A confissão detalhada dos fatos e as tratativas do acordo deverão ser registrados pelos meios ou recursos de gravação audiovisual. O  “acordo de não-persecução” poderá ser celebrado na mesma oportunidade da audiência de custódia, sendo que, descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo ou não comprovando o investigado o seu  cumprimento, no prazo e condições estabelecidas, o Membro do Ministério Público deverá, se for o caso, imediatamente oferecer denúncia.

O descumprimento do “acordo de não-persecução” pelo investigado poderá ser utilizado pelo Membro do Ministério Público como justificativa para o eventual não-oferecimento de suspensão condicional do processo. Sobretudo, cumprido integralmente o acordo, o Ministério Público promoverá o arquivamento da investigação, sendo que esse pronunciamento, desde que esteja em conformidade com as leis e com esta resolução, vinculará toda a Instituição.

A promoção de arquivamento será apresentada ao juízo competente, nos moldes do art. 28 do Código de Processo Penal, ou ao órgão superior interno responsável por sua apreciação, nos termos da legislação vigente. Percebe-se que a resolução outorga ao acordo cumprido a natureza jurídica de causa de extinção de punibilidade.


‘Acordo de não-persecução’, um paralelo com a experiência estrangeira

A revolução industrial e econômica fez borbulhar os conflitos penais na América do Norte, com aumento significativo dos números de casos. A sociedade americana não tolerava mais o aumento astronômico de gastos pelo Poder Judiciário e demais órgãos de persecução. Assim, foi edificada uma justiça penal mais otimizada e individualizada, impingindo políticas premiais em um julgamento calcado num speedy criminal trial fomentado pela barganha. Lá, a criação do plea bargaining não se deu de forma legislativa, foram os próprios agentes processuais que passaram a atuar de maneira negocial[5], com o fim de conseguirem melhores resultados e facilidades nos trabalhos.

Em Portugal, o “acordo sobre sentença em processo penal”, ao arrepio de expressa previsão legislativa, foi cotejado por Figueiredo Dias.[6] Em 2010, o nobre doutrinador lançou proposta baseada no modelo germânico, corretiva do formato tradicional de persecução português. Em síntese, as partes celebrariam um acordo que teria como pressuposto essencial o arguido confirmar os fatos que lhe são imputados pela acusação.

Percebam que há nítida semelhança entre a proposta do CNMP brasileiro (Resolução Nº 181/2017) e a experiência Portuguesa, sobretudo no que diz respeito ao fundamento para prática negocial penal (confissão). Figueiredo Dias alicerçou-se na crise estrutural do judiciário português e na sobrecarga de serviços, levantando razões de celeridade e eficiência para propor a possibilidade de aplicação imediata de pena no Processo Penal.

Nos acordos sobre sentença português a colaboração do réu implicaria em menor medida de pena. Naturalmente, houve insurgências contra a proposta, pois uns identificavam uma heterodeterminação da pena, que violaria o princípio da culpa; outros levantavam a crise do Estado de Direito, especialmente frente à indisponibilidade do Processo Penal. A obra de Figueiredo Dias (Acordo sobre sentença em processo penal) sofreu ferrenhas críticas provenientes da doutrina alemã. Nesse contexto, Schünemann[7] chega a se referir à proposta como “eufemismo”, “camuflagem”, procedimento “contra legem”, “provincianismo”.

A doutrina portuguesa demonstrou preocupação com a preservação do devido processo legal. Os críticos argumentavam que o “acordo sobre sentença” redundaria na supressão do dever de esclarecimento judicial dos fatos; que a admissão da confissão como razão determinante para condenação outorgaria a ela exacerbado valor probatório. Nesse viés, ocorreria patente violação do princípio da investigação ao ponto em que a postura do Estado persecutor aniquilaria com o princípio do nemo tenetur se accusare[8].

Ignorando as críticas da doutrina, a proposta de Figueiredo Dias foi festejada, inicialmente, pela jurisprudência portuguesa. Em janeiro de 2012, a Procuradoria-Geral Distrital (PGD) de Lisboa emite a Orientação nº 1/12, em seguida, a PGD de Coimbra (fevereiro de 2012), ambas sugerindo a exploração do caminho da via consensual, tendo como pano de fundo a proposta de Dias. As mencionadas Procuradorias (Ministério Público Português) reconheciam a plena compatibilidade entre o Código de Processo Penal Português e os acordos sobre sentença, exigindo, para sua eficiência, a confissão do arguido; permitiam, em orientação, a deliberação pelas partes do limite máximo da pena, conservado ao tribunal o poder de avaliar a credibilidade da confissão.

Interessante notar que a ordem processual penal portuguesa, em seu artigo 334[9], outorga determinante valor probatório à confissão, preceituando que, no caso de o arguido declarar que pretende confessar os fatos que lhe são imputados, o presidente, sob pena de nulidade, pergunta-lhe se o faz de livre vontade e fora de qualquer coação, bem como propõe-se fazer uma confissão integral e sem reservas, que implica na renúncia à produção da prova relativa aos fatos imputados e consequente consideração desses como provados.

A vanguardismo da proposta era flagrante, mas a ausência de legislação contemplando as diretrizes do instituto trouxe inquietação. Como era de se esperar, a análise da constitucionalidade do tema chegou a Suprema Corte Portuguesa em 2013.

O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão[10] proferido no dia 10 de abril de 2013, sacramentou não haver suporte normativo que legitime os “acordos sobre sentença em processo penal. Identificou que: a falta de previsão legal geraria insegurança jurídica; subentendeu que a promessa ministerial, de vantagem legalmente inadmissível, constitui uma proibição de prova. Identificou, por fim, insuportável violação à integridade moral dos arguidos, encerrando a possibilidade de aplicação dos acordos sobre sentença no processo penal português[11]. Falecia, em Portugal, a aplicação supra normativa de um acordo sobre sentença.

No sistema processual penal alemão, os acordos sobre sentença foram corriqueiros, desde o fim dos anos 1970. Antes de positivar o instituto, a Alemanha, habituada à civil law, admitiu o negócio penal sem a prévia regulamentação normativa. Edificou-se uma jurisprudência dos interesses (acusação e defesa), com a substituição de um método de uma subsunção lógico-formal processual, nos rígidos conceitos legislativos, pelo de um juízo consensual.

Em 1987, a Corte Federal Constitucional Alemã declarou a constitucionalidade dos acordos sobre sentença. Apenas em 2009 adveio norma regulamentadora, introduzindo, formalmente, o julgamento antecipado da lide penal, com a edificação da norma processual regulamentadora.

Mesmo havendo uma simetria entre Brasil e Alemanha[12] quanto à adoção da civil law, o sistema processual penal brasileiro não comporta um ‘acordo de não-persecução’ regulamento por instrumento diverso de lei, em estrito senso. Vejamos as razões.


A conformidade constitucional do ‘Acordo de não-persecução’

A edição de norma processual penal se faz por reserva de lei. Como se sabe, o que distingue o conceito de lei do de outros atos é a sua estrutura e a sua função. Uma resolução não pode estar na mesma hierarquia de uma lei, pela simples razão de que a lei emana do poder legislativo, essência da democracia representativa, enquanto os atos regulamentares ficam restritos à matérias com menor amplitude normativa. O Conselho Nacional do Ministério Público não é órgão dotado de poder equiparado aos do legislador.

É um equívoco admitir que o CNMP possa, mediante a expedição de atos regulamentares (resoluções), substituir-se à vontade geral (Poder Legislativo).

No Estado Democrático de Direito brasileiro é inconcebível permitir-se a um órgão administrativo expedir atos (resoluções, decretos, portarias, etc) com força de lei, cujos reflexos possam avançar sobre direitos fundamentais, criando norma processual penal. Ao fazê-lo, nos moldes em que fez no artigo 18 da resolução Nº 181/2017 o CNMP rompe com o princípio da legalidade atentando, inclusive, contra a reserva de jurisdição.

Ao regulamentar “acordo de não-persecução” o CNMP flagela direitos e garantias fundamentais dos cidadãos que se sustentam na reserva de lei. Em outras palavras, não se concebe - e é nesse viés a lição do direito alemão - regulamentos de substituição de leis (gesetzvertretende Rechtsverordnungen) e nem regulamentos de alteração das leis (gesetzändernde Rechtsverordnungen). Devemos observar a evolução do princípio da reserva legal para o de reserva parlamentar.[13]

Uma resolução expedida pelo CNMP não pode criar norma processual penal, pois o “poder regulamentar” não pode ser transformado em “poder de legislar”. Por melhor que seja a mencionada resolução, por mais evidente que seja o seu potencial de vivificar a discricionariedade Ministerial, por maior que seja a economicidade e celeridade alcançada, admitir uma reforma processual penal por Resolução atentaria contra a constituição e o Estado Democrático de Direito.

Há regras contemplando a justiça negocial na ordem processual penal brasileira: transação, colaboração premiada, suspensão condicionada do processo e composições cíveis. Não incumbe ao Conselho Nacional do Ministério Público ampliar o espaço de consenso no processo penal, elevando a atividade negocial a um patamar que não foi desejado, ainda, pelo legislador. Um “acordo de não-persecução”, ao arrepio de previsão normativa, viola os primados básicos do devido processo legal[14] ao tempo em que atenta contra o princípio ampla defesa[15] e contraditório.


Confissão como requisito para ‘não-persecução’

Não podemos deixar de observar o limitado valor probatório outorgado à confissão no Código de Processo Penal brasileiro vigente.

O artigo 197 do Código de Processo Penal brasileiro [16] relata que o juiz deve confrontar a confissão com as demais provas do autos, verificando se existe compatibilidade. Assim, quando a confissão for a única prova judicializada, tarifa-se o seu valor a zero. No Brasil, se na fase judicial sobrevive, como prova, apenas a confissão, o processo está fadado ao decreto absolutório.

Peca a Resolução do CNMP quando admite a aplicação de medidas coercitivas, como, prestação de serviço e prestação pecuniária, alicerçados na mera confissão do investigado. O sistema processual penal brasileiro não comporta um nolo contendere, regulamentado por Resolução, bem como não permite dotar a confissão de valor supremo. A confissão do réu deve ser alicerçada por outros elementos de convicção, para que se reconheça, processualmente, a existência da atividade delitiva. O requisito maior para sobrevivência do ato negocial é a identificação da efetiva ocorrência do delito, sem delimitá-lo, não poderemos falar em acordo


Proposta de ‘ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO’ nas audiências de custódia

Reza o artigo 18 § 5º  da Resolução Nº 181/2017 do CNMP que “o ‘acordo de não-persecução’ poderá ser celebrado na mesma oportunidade da audiência de custódia”.

O Conselho Nacional do Ministério Público parece ter se esquecido que, nas “audiência de custódia” – iniciativa que garante ao preso em flagrante o direito de ser ouvido por um juiz em até 24 horas – não se discute o mérito do crime. O Conselho Nacional de Justiça entende que a audiência de custódia é uma oportunidade para discutir medidas cautelares e eventuais agressões policiais, e não a inculpação do réu. Assim, não poderíamos discutir medidas negociais, uma vez que seria impossível falar em confissão do réu sem abordar o mérito do delito praticado.

De outra baila, observamos que a atividade negocial reivindica que a defesa saiba, integralmente, sob o que negocia. É impossível levar a efeito o acordo, num momento em que o substrato probatório, fruto da investigação, não restaria delineado.

É preciso a existência de uma acusação formalizada, sobre a qual se deseja aplicar o negócio penal. Considerando as peculiaridades de nossa investigação, não acredito que, na data da audiência de custódia, tenhamos este panorama firmado.

O Juiz é o fiscal do fiscal, ou seja, ele é quem fiscaliza a atividade negocial do Ministério Público. A magistratura é guardiã dos direitos e garantias individuais, isenta das paixões persecutórias naturais ao órgão acusador. Assim, para analisar a legalidade da prática negocial, deve o magistrado apreciar, preambularmente, a admissibilidade da própria peça acusatória. Se o Juiz de Direito entender que inexistem indícios suficientes da prática do crime, não deve ele rejeitar o acordo, mas sim a própria denúncia que sustenta o acordo.

A Resolução adverte que o Juiz não admitirá a proposta de acordo quando o aguardo para o cumprimento possa acarretar a prescrição da pretensão punitiva estatal; quando vislumbrar a ocorrência de crime de pequeno potencial ofensivo; quando constatar que o delito fora praticado com violência ou grave ameaça e/ou que tenha causado prejuízos superiores a 20 (vinte) salários mínimos. Nítida a necessidade de se outorgar poderes de fiscalização ao magistrado, afinal, é preciso haver controle rigoroso da atividade negocial, sob pena de prostituição do instituto.

É necessário que haja uma denúncia válida, que se submeterá ao crivo judicial, atento a todos os requisitos da legislação processual (artigo 395 do CPP).[17]

O controle judicial evitará que excessos negociais possam degenerar o sistema para formas intoleráveis de ‘sobre-imputação’ e/ou ‘infra-imputação’[18]. O modelo brasileiro, aqui, se aproxima do patteggiamento italiano. Na Itália, não pode haver acordo sobre “o que aconteceu”, mas sim, sobre “o fato delituoso praticado”. Promotoria e Defesa não podem acordar sobre a natureza do ato ilícito praticado. Veja que o modelo norte-americano, com o charge bargaining ou com a guilty plea permite ao Ministério Público esta manobra. No Brasil, não poderemos, em troca, por exemplo, da confissão do arguido, não exercer a ação penal para crimes cometidos com violência ou grave ameaça, bem como, para aqueles em que o prejuízo superior a 20 (vinte) salários mínimos. Tão pouco podemos, por vontade das partes, mudar a taxinomia do crime para permitir a atividade negocial.

Assim, vejo por equivocada a sugestão da prática do ‘acordo de não persecução’ em audiência de custódia, afinal, o réu, ao optar pelo acordo deve conhecer da denúncia e das provas indiciárias aptas a ensejar a sua admissibilidade. A confissão deve ser elemento suplementar para o acordo, e não, mononuclear[19].

A proposta de consenso deve ser efetivada em observância aos fatos descritos na denúncia. O princípio da congruência exige que a atividade negocial subsuma-se ao fato descrito na peça acusatória. A peça acusatória não só delimitará a responsabilidade de réu, como poderá contextualizar a defesa sobre os exatos limites da imputação que recairá sobre seu cliente. Essa conduta evitará o overcharging[20], ou seja, o blefe, como instrumento de indução a uma negociação viciada.

A denúncia conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possam identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. Como acordar se a defesa mal sabe quais testemunhas deporão em juízo?

A doutrina deve se inquietar sobre a natureza jurídica da ‘intervenção judicial’ na homologação dos ‘acordos de não-persecução’. Sabemos que, no patteggiamento italiano, o juiz não se encontra vinculado ao acordo, podendo perquirir a ocorrência do crime, as hipóteses de absolvição, e ponderar sobre a medida de pena adequada ao acordo[21]. Já no plea bargaining, o magistrado não interfere no negócio penal celebrado, limitando-se a homologar o resultado decorrente do consenso a que chegaram as partes. O sistema americano dá super valia à disponibilidade dos interesses, configurando um verdadeiro “processo de partes”. Assim, enquanto no sistema italiano vige a natureza jurisdicional, no regime norte-americano vige a natureza homologatória. No Brasil, o julgador não interferirá no mérito da acordo, tampouco se restringirá a homologar puramente o consenso entre as partes. A natureza da intervenção judicial, nos acordos, será garantística[22], uma vez que será reservado ao magistrado a missão de verificar a autonomia da manifestação de vontade das partes, zelando pela defesa das garantias individuais, contemplando a congruência entre acordo e exordial acusatória.

Por fim, cabe observar que a legislação não contempla o ‘acordo de não-persecução’ como sentença penal condenatória. A natureza jurídica outorgada ao acordo cumprido é de causa de extinção de punibilidade.


ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO e os Limites da renúncia aos direitos e garantias fundamentais na relação processual penal consensual

Para inferir a conformidade jurídico-constitucional do ‘ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO’, seremos convidados a contrastá-lo com os princípios da culpa, devido processo legal, ampla defesa e não autoincriminação.

Brevemente a doutrina fará contraposição entre os princípios da celeridade e economicidade com os princípios constitucionais violados (culpa, devido processo legal, ampla defesa, legalidade, não autoincriminação e outros). Advertimos, de ante mão, que a invocação ideológica do princípio da proporcionalidade tem constituído a válvula de escape das agências judiciais para atender os reclames “da lei e da ordem”, acolhidos pelo senso comum com a aparência de que atuam de acordo com a sua finalidade constitucional, fulminando, dia a dia, a eficácia dos direitos e garantias tão duramente conquistados ao longo da história. O argumento ideológico da economia processual, celeridade e racionalização do processo não justifica o aniquilamento da ‘forma’ por Resolução.

Canotilho[23] adverte que a norma constitucional é, simultaneamente: (1) uma norma de garantia, porque reconhece e garante determinado âmbito de proteção ao direito fundamental; (2) uma norma de autorização de restrições, porque autoriza o legislador a estabelecer limites ao âmbito de proteção constitucionalmente garantido. É na formalidade do rito que o réu desempenha seu direito de defesa. Assim, há de existir estrito parâmetro legislativo para a aplicação do acordo de não-persecução.

Em uma prática consensual, na perspectiva do ‘acordo de não-persecução’, a pessoa que renuncia a dilação processual o fará porque espera obter um benefício com o ato de renúncia, benefício esse que considera ser mais valioso do que a preservação do direito fundamental em si mesmo (devido processo legal alargado e todo seu contraditório).

A busca pelo benefício contemplado na atividade negocial, se efetiva por uma nítida limitação da ampla defesa. Para gozar do prêmio, o arguido se submete a um nítido enfraquecimento das posições individuais de direitos[24]. Resta saber se essa afetação, em enfraquecimento, é constitucional na ordem brasileira.

A doutrina[25], em desforço, distingue renúncia, perda e não exercício de direitos fundamentais. Em síntese, na renúncia teríamos um compromisso jurídico de não recorrer ao seu direito fundamental, ou seja, há uma vinculação deste em não exercitar algumas faculdades que integram seu direito. A perda não se trata de uma decisão voluntária, mas sim de uma imposição externa e uma consequência imposta pela ordem jurídica. Preceitua Crorie que, “enquanto o enfraquecimento do direito é desejado na renúncia, nos casos de perda já não o será, ou, pelo menos, já não depende da vontade do sujeitos”.[26]

Quanto às hipóteses de não exercício, trata-se de um posição adotada sem vinculação do titular do direito, ou seja, a ordem jurídica lhe permite exercer ou não uma faculdade. Ao não exercer, cria-se uma situação de fato, sem que exista uma manifestação abdicativa do direito. Na prática, isso implica na possibilidade de exercitar o gozo positivo do direito a qualquer momento, desde que não tenha havido uma preclusão consumativa.

Na renúncia, inexiste a possibilidade futura de se reivindicar o exercício do direito, uma vez que há uma preclusão lógica. Não há como se exercitar um direito ao qual você tenha abdicado expressamente.

A bem da verdade, a adesão ao consenso, estipulada no “acordo de não-persecução”, corresponde, em um primeiro plano, ao não exercício do contraditório amplo. Sobretudo, fico com a incômoda sensação de que, ao não exercer o direito, o réu acaba por renunciar a algumas prerrogativas constitucionais, como a do direito de permanecer calado. Observe que a confissão é requisito indispensável para alcançar o benefício premial. Não longe, podemos ver que haverá a perda de direito, como, por exemplo, o de produzir prova judicial apta a abalizar tese defensiva. O réu se compromete, na verdade, a indicar eventuais provas do cometimento do crime.

Na prática, o consenso quanto ao “acordo de não-persecução” demonstra um inquestionável não exercício da ampla defesa, que leva, subsequentemente, a renúncias[27] e perdas de direitos. Essa renúncia ao contraditório e amplo defesa seria constitucionalmente válida, desde que respeitada a legalidade. É a ‘lei’, em sentido estrito, perpassando por todo o processo legislativo, que poderia ter auferido os benefícios sociais da prática negocial, compreendendo as consequências sociais da técnica de diversão. Permitir que a Resolução Nº 181 do CNMP possa imprimir tamanha reforma ao Processo Penal brasileiro, redundaria a Constituição a uma simples folha de papel[28], que comprime direitos e garantias individuais ao ponto de torná-los verdadeiras conchas vazias[29].

“ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO” e a violação a legalidade,  devido processo legal, contraditório  e ampla defesa

Em termos processuais, o princípio do due process of law consiste no conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição. O princípio do devido processo legal é uma conquista supralegal da sociedade sobre o Estado, cuja implementação é confiada ao Judiciário e ao Ministério Público, depositários fiéis das liberdades públicas[30].

A garantia do devido processo legal não serve apenas aos interesses do réu como direitos públicos subjetivos (poderes e escudos processuais), mas configura, antes de tudo, instrumento de salvaguarda do próprio processo. Toda ofensa a um direito fundamental corresponde, via reflexa, a própria ofensa ao devido processo legal, razão pela qual a cláusula corresponde a verdadeiro estandarte da democracia (Calder v. Bull, ocorrido em 1798)[31].

Poderia uma resolução do CNMP propor um acordo de não-persecução,  suprimindo a audiência de instrução e julgamento? Não haveria violação ao próprio exercício da jurisdição[32]?

De fato, somente a lei poderia contemplar a possibilidade de uma acordo de não-persecução. Tivesse a reforma vindo implementada por lei, essa passaria a ser a nova configuração do processo penal, e portanto, representativa do devido processo. Na transação, no sursis processual ou nas colaborações premiadas temos o devido processo legal, mesmo sem a tradicional audiência de instrução e julgamento[33]. Sobretudo, vindo a alteração por Resolução, houve nítida violação a legalidade e, por consequência, ao devido processo legal.

A magistratura detém tradicionalmente a prerrogativa de estabelecer a medida de pena. Viola-se nitidamente o princípio da jurisdição quando se permite, fora da reserva de lei, que o órgão ministerial estabeleça a pena a ser aplicada ao caso concreto.

O princípio do contraditório e ampla defesa é verdadeiro apanágio do sistema acusatório[34], uma expressão peculiar do devido processo legal. No ‘acordo de não-persecução’ há inequívoca restrição do contraditório, que subtrai da Resolução Nº 181/2017 conformidade para com a ordem constitucional.

Os direitos processuais relativos ao contraditório tem por objetivo estabelecer a igualdade das partes e o exercício efetivo da defesa. A ordem constitucional norte-americana, por exemplo, contempla o direito de confrontação (right of confrontation), ou seja, o acusado pode contraditar, questionar e examinar (cross-examine) as testemunhas que forem apresentadas contra si. No Brasil, o contraditório pressupõe a possibilidade de conhecimento, por uma das partes, de opiniões, argumentos e conclusões formuladas pela parte adversa, a fim de que haja a possibilidade de externar as próprias manifestações, contrastando testemunhas e levantando as provas que deverão ser apreciadas pelo judiciário. De fato, para o alcance da efetiva igualdade processual entre acusação e defesa é necessário estabelecer paridade de armas[35].

O consenso exige da defesa acirrada perspectiva crítica, apta a identificar as consequências inerentes à política premial, afinal, há uma abdicação ao direito de buscar a inocência do acusado frente ao Judiciário.

No ‘acordo de não-persecução’, deveria estar claro o dever do Ministério Público em expor, ao investigado, a prova indiciária existente, propiciando ao réu o conhecimento dos limites da acusação e das provas que sustentam a pretensão. Sem conhecimento dessa base fática que sustenta a acusação o julgador não poderá formar convicção legítima sobre a credibilidade da confissão, tão pouco a defesa poderá formar convicção sobre a conveniência do acordo.

Se, por um lado, o Ministério Público tem a faculdade de sugerir a prática premial, de outro, será a defesa quem consolidará o negócio. Aqui, há um contraditório concentrado, no qual a defesa poderia refutar a prática consensual penal, mas, é preciso que o defensor técnico conheça a peça de acusação e as provas existente contra seu cliente. Sem estas informações, como poderia o defensor saber se não seria melhor optar pelo full trial, buscando a absolvição do réu. Inexistindo este panorama  prévio, optar pelo consenso ou litígio será ato de sorte e não de técnica.

Observando as diretrizes iniciais da Resolução Nº 181 do CNMP, é possível observar, em abstrato, violações à ampla defesa, contraditório, devido processo legal, princípio da culpa e à reserva de jurisdição.

A confissão no “acordo de não-persecução” e sua compatibilidade com o primado da ‘presunção de inocência’ (nemo tenetur)

Mesmo formalmente imputado o acusado é presumivelmente não culpado e, como tal, deve ser tratado pelos órgãos de persecução. Incumbe ao Estado demonstrar a culpabilidade durante o trâmite processual.

É improvável, ou mesmo inadmissível, que um meio de prova isolado possa permitir uma conclusão segura sobre a culpabilidade do acusado. Todas as provas, isoladamente, são relativas, e só o exame crítico do seu conjunto pode levar a uma razoável certeza, que jamais será a certeza ideal e absoluta.

Haverão vozes que preceituaram a “certeza sabida” de que o “acordo de não-persecução” não impõe pena, mas sim, medidas paliativas dispostas como requisitos para gozo do benefício.

A resolução Nº 181 do CNMP inova a ordem processual penal, ao tempo em que outorga à confissão do réu relevante valor. Enquanto na “colaboração premiada” há uma natural desconfiança acerca das informações prestadas pelo delator - ainda mais quando os motivos que orientam a colaboração podem vir acompanhados de circunstâncias sintomáticas de sua hipocrisia -, na aplicação do “acordo de não-persecução” a confissão é suficiente para imprimir medidas constritivas. As partes expressamente dispensam a etapa processual de produção das provas e se submetem a verdadeira pena, muito embora seja lhe dado o nome de: “requisito para gozo do benefício”. As medidas impostas, muito embora desvestidas da sentença penal condenatória, detém equivalência igual aos das penas alternativas substitutivas das privativas de liberdade.

O “acordo de não-persecução” visa outorgar celeridade e efetividade à prestação jurisdicional, com a concessão de políticas premiais que evitam o persecutio criminis in judicio, mas, não podemos admitir que a confissão seja o único elemento exigido para gozo do benefício.

Nem a lei processual, muito menos a Constituição Federal brasileira[36], consagram, diretamente, o direito ao nemo tenetur. Para Fernandes[37], foi sensível a evolução da doutrina brasileira no sentido de extrair da cláusula da ampla defesa e de outros preceitos constitucionais, como o da presunção de inocência e o direito ao silêncio[38], o princípio de que ninguém é obrigado a se autoincriminar, não podendo o suspeito ser forçado a produzir prova contra si mesmo.

O fundamento do nemo tenetur está enraizado na perspectiva de respeito à dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988), o que outorga ao acusado a condição de sujeito de direito no processo, e não a de objeto de investigação[39].

Na persecução penal, sempre que for imposta uma obrigação ao investigado que o exponha ao risco de inculpação deve ser-lhe assegurado o direito ao silêncio e à não autoincriminação.

O nemo tenetur não tem vigência absoluta, sendo passível de limitação. A lei processual, prévia e expressa[40], é instrumento apto a excepcionar o princípio do nemo tenetur, viabilizando sua aplicação racional.

Enfrentemos, pois, um problema prático. Se no “acordo de não-persecução” a confissão do réu é instrumento probatório apto a ensejar reprimendas estatais, não haveria violação ao nemo tenetur?

O respeito à condição de sujeito processual apenas impede que o Estado obrigue o investigado a produzir prova contra si mesmo. A legislação nunca proibiu que o réu produzisse, voluntariamente, prova contra si mesmo, mas sim que ele fosse coartado a produzi-la. Assim, se o investigado produzir, espontânea e publicamente, prova apta a colaborar com sua inculpação, ela deverá ser valorada no processo, ante a sua inquestionável validade e previsibilidade pela norma processual substantiva.

Não existe violação aos primados do nemo tenetur durante a confissão externada na prática do “acordo de não persecução” pois, a defesa abdica do silêncio, na busca pela atividade premial. Sobretudo, a manobra processual penal precisa ser sido contemplada pela Lei e não por Resolução.


Conclusão

Bernd Schünemann[41] observa que a busca obcecada por eficiência e celeridade, naquilo que Robert Bohm[42] ousa chamar de “fast food jurisdicional” ou “McJustice”, podem levar a confusão entre efetividade e produtividade. A rentabilidade da justiça penal está ligada à concretização dos seus fins, que é a tutela dos bens jurídicos.

Para além das discussões sobre obrigatoriedade ou discricionariedade da ação penal, para além da inequívoca necessidade de edificação de mecanismos de controle sobre a atividade negocial, para além da ausência de discussão institucional, de âmbito nacional, entre membros do Ministério Público, Advocacia e Judiciário sobre o tema “acordo de não persecução”, é patente a inconstitucionalidade da Resolução Nº 181/2017 do CNMP por violação da reserva legal.

Prudente o Ministério Público de Minas Gerais que exarou recomendação conjunta da Procuradoria Geral de Justiça e Corregedoria Geral do Ministério Público (Nº 2 de 13 setembro de 2017) determinando aos órgão de execução que se abstenham de celebrar acordos de não-persecução penal, até que, em oportuna revisão da Resolução 181/2017 haja competente regulamentação das inovações previstas.

O negócio penal é um instituto que se expande a partir do poder daqueles que são beneficiados por suas consequências. Entretanto, o sistema deve conjugar eficiência e funcionalidade sem se descurar do vetor constitucionalidade.

O projeto de ampliação das margens de consenso no Processo Penal brasileiro enfrenta o desafio de simplificar rito e racionalizar o uso dos instrumentos de persecução sem se descurar de preservar as garantias constitucionais.

Não incumbe ao Conselho Nacional do Ministério Público ampliar o espaço de consenso no processo penal, elevando a atividade negocial a um patamar que não foi desejado, ainda, pelo legislador. Um “acordo de não-persecução”, ao arrepio de previsão normativa, viola os primados básicos do devido processo legal[43] ao tempo em que atenta contra o princípio da legalidade, ampla defesa[44], contraditório, princípio da culpa e da reserva de jurisdição.

Peca a Resolução do CNMP quando admite a aplicação de medidas coercitivas, como: prestação de serviço e prestação pecuniária, alicerçados na mera confissão do investigado. O sistema processual penal brasileiro não comporta um nolo contendere, regulamentado por Resolução, que outorgue santificado valor a confissão.

É inadequada a proposta de ‘acordo de não-persecução’ nas audiências de custódia.

O “acordo de não-persecução” demonstra um inquestionável não exercício da ampla defesa, que leva, subsequentemente, a renúncias ao contraditório e à ampla defesa. Tal renúncia, apenas pode ser constitucionalmente admitida se regulamentada por lei. É a Lei, em sentido estrito, perpassando por todo o processo legislativo, que poderia ter auferido os benefícios sociais da prática negocial, compreendendo as consequências sociais da técnica de diversão. A proposta do CNMP implica em patente efeito impeditivo da punibilidade, aniquilando, no mérito, a pretensão punitiva estatal, o que, não só exige mecanismos de controle interna corporis do Ministério Público, como também, via função judicial anômala, a teor do art. 28 do Código de Processo Penal.

Não existe violação aos primados do nemo tenetur durante a confissão externada na prática do “acordo de não persecução” pois, a defesa abdica do silêncio, na busca pela atividade premial. Sobretudo, a manobra processual penal deve ser regulamentada pela Lei e não por Resolução.


Referências Bibliográficas:

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Notas

[1]    MESQUITA, Paulo Dá. Processo penal, prova e sistema judiciário. Coimbra: Coimbra, 2010. p. 19.

[2]    No Brasil, a ‘colaboração premiada’ aparece em legislações esparsas. 1) Lei nº 8.137/1990 (crimes contra a ordem tributária, econômica e as relações de consumo), artigo 16, parágrafo único; 2) Lei nº 9.034/1995 (crime organizado), artigo 6º; 3) Lei nº 9.080/1995, artigo 1º, acrescentando dispositivos à Lei nº 7.492/1986 (crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e a já mencionada Lei nº 8.137/1990); 4) Código Penal, artigo 159, § 4º (crime de extorsão mediante sequestro); 5) Lei nº 9.613/1998 (crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores), artigo 1º, § 5º; 6) Lei nº 9.807/1999 (proteção às testemunhas e vítimas), artigo 13; e 7) Lei nº 10.409/2002, artigo 32, §§ 2º e 3º, e Lei nº 11.343/2006, artigo 41 (crime de drogas); 8) Lei nº 12.850/2013 (Organização Criminosa). ALMEIDA, Paulo Roberto Barreto de. Delação premiada e crime organizado. Revista do Ministério Público do Estado do Ceará, ano 2, nº 2, p. 137, jan. 2007.

[3]    LIMA, Márcio Barra. A colaboração premiada como instrumento constitucionalmente legítimo de auxílio à atividade estatal de persecução criminal. In: CALABRICH, Bruno; FISCHER, Douglas; PELELLA, Eduardo (Org.). Garantismo penal integral: questões penais e processuais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. Salvador: Editora JusPodivm, 2010. p. 272.

[4]    IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 73.

[5]    BRANDALISE, Rodrigo da Silva. A negociação de sentença criminal e os princípios processuais penais relevantes. 2015. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais) - Faculdade de Direito, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2015. p. 66.

[6]    DIAS, Jorge Figueiredo. Acordos sobre a sentença penal: o “fim” do Estado de Direito ou um novo “princípio”?. Porto: Conselho Distrital do Porto, 2010.

[7]    SCHÜNEMANN, Bernd. Temas actuales y permanentes del derecho penal después del milenio. Madrid: Tecnos Copy, 2002. p. 297. Schünemann traça severas críticas ao modelo de justiça negocial, seja o procedimento norte-americano ou continental europeu que, segundo ele, usurpa o dever legal de esclarecimento dos fatos. Em sua opinião, deveria ocorrer uma “confesión cualificada” que pressupõe um dever legal de esclarecimento dos fatos.

[8]    DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. v. I. Coimbra: Coimbra Editora, 1974. p. 46.

[9]    Art. 334, do Código de Processo Penal Português: 1- No caso de o arguido declarar que pretende confessar os factos que lhe são imputados, o presidente, sob pena de nulidade, pergunta-lhe se o faz de livre vontade e fora de qualquer coacção, bem como se se propõe fazer uma confissão integral e sem reservas. 2- A confissão integral e sem reservas implica: a) Renúncia à produção da prova relativa aos factos imputados e consequente consideração destes como provados; b) Passagem de imediato às alegações orais e, se o arguido não deve ser absolvido por outros motivos, à determinação da sanção aplicável; e c) Redução da taxa de justiça em metade.

[10]   Acórdão do STJ de 10 de  abril de 2013 (SANTOS CABRAL), processo nº 224/06.7GAVZL. C1.S1 WWW.DGSI.PT;

[11]   Acórdão do STJ de 10 de  abril de 2013 (SANTOS CABRAL), processo nº 224/06.7GAVZL. C1.S1 WWW.DGSI.PT; “Tal insegurança transparece na ausência de uma definição legal dos contornos que devem nortear o acordo e que vão desde a decantada avaliação de credibilidade da confissão pelo juiz que, ou é reduzido a uma figura de mero tabelião, [...] e ainda que só ao serviço da credibilidade da confissão. Estaremos perante uma violação do princípio da acusação?”.

[12]   O Tribunal Alemão, ao contrário das Cortes Americanas, tem amplo compromisso com a busca da verdade, tendo poderes para investigar a validade da confissão. O Juiz Alemão pode requisitar diligências para saber se a prova é válida; se há compatibilidade com as circunstâncias de fato que se evidenciam, visando evitar formalgestands ou schlankes gestandns.

[13] PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte – Staatsrecht II, 20 ed., Heildelberg: C.F. Müller, 2004, p. 62 e segs.

[14]   Rangel, Paulo. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iures, 2002. p. 33.

[15]   SANTOS, Pedro Sergio dos. Direito Processual Penal & a insuficiência metodológica: a alternativa da mecânica quântica. 1. ed., 2. reimpr. Curitiba: Editora Juruá, 2007. p. 72.

[16]   Artigo 197, CPP: “o valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância”.

[17]   Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

[18]   LATAS, António João (Coord.). Mudar a justiça penal: linhas de reforma do processo penal português. Coimbra: Almedina, 2012. p. 92.

[19]   O acusado deverá ser ouvido (interrogatório) pela autoridade judicial. Essa postura reflete um posicionamento consolido na Suprema Corte americana, na qual o interrogatório do acusado surge como sua garantia para a efetivação do acordo livre de pressões (Estados Unidos. Supreme Court. Santobello v. New York, 404 U.S 91971, documento não paginado). Nos Estados Unidos, seja no caso de guilty plea, seja no caso de nolo contendere, deve o juiz realizar todas as investigações e inquirições que se mostrarem necessárias para confirmar a base fática dos acordos, conforme o Standard 14-1.6 (American Bar Association, 1999, p. 4).

[20]   RODRIGUES GARCÍA, Nicolás. La justicia penal negociada -experiencias de derecho comparado. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, 1997. p. 67-70.

[21]   CORDERO, Franco. Procedura penale. Milano: Giuffrè, 1991. p. 835.

[22]   FERNANDES, Fernando. O processo penal como instrumento de política criminal. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 227.

[23]   CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2007. p. 788.

[24]   MAC CRORIE, Benedita. Os limites da renúncia a direitos fundamentais nas relações entre particulares. Coimbra: Almedina, 2013. p. 27.

[25] NOVAIS, Jorge Reis. Renúncia a direitos fundamentais. In: MIRANDA, Jorge (Org.). Perspectivas constitucionais – nos 20 anos da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1996. p. 273, 274, 291 e 333.

[26]   MAC CRORIE, Benedita. Os limites da renúncia a direitos fundamentais nas relações entre particulares. Coimbra: Almedina, 2013. p. 32-33.

[27]   A doutrina remete à distinção entre renúncia à titularidade e renúncia ao exercício de um direito fundamental. A primeira forma de renúncia tem um viés definitivo, por isso é proibida pela ordem constitucional vigente; a segunda forma, ao contrário, tem um caráter eminentemente provisório, a qualquer momento o renunciante pode reverter sua decisão (VALE, André Rufino do. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004).

[28]   Cf. PRADO, Fabiana Lemes Zamalloa do. Limites à prova no processo penal: relação de poder e ponderação de interesses no Estado Democrático de Direito. 2006. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Direito, Universidade Federal de Goiás, Goiânia-Goiás, 2006. p. 28.

[29]   Como adverte o professor Dimitri Dimoulis, “é proibido proibir o exercício do direito além do necessário” (apud TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 530).

[30]   Cf. CASTRO, Carlos Roberto de Siqueira. O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 26.

[31]   Cf. Em Carlos Roberto de Siqueira Castro a manifestação é reproduzida (CASTRO, Carlos Roberto de Siqueira. O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1989).

[32]   Na Alemanha, a situação evoluiu na segunda metade da década de oitenta do século passado. Registrou-se a primeira afirmação peremptória do Bundesverfassungsgericht de que a negociação penal não põe em causa o princípio do devido processo legal se forem estabelecidos certos limites à disposição dos sujeitos processuais (ALBUQUEQUE, Paulo Sergio Pinto de. Comentário do Código de Processo Penal: à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 4. ed. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2011. p. 886).

[33]   “A funcionalidade do processo penal não exige apenas a melhor organização possível da fase preparatória do processo e a simplificação da audiência de julgamento. Ela exige mesmo que se prescinda da audiência de julgamento em certos casos. O programa de “desjudiciarização” corresponde a uma estratégia para contrariar a diminuição da “função de advertência de uma audiência de julgamento” (Warnfunktion einer Hauptverhandlung). Assim, quanto maior o número de factos criminosos de pequena gravidade resolvidos fora da audiência de julgamento, maior é a disponibilidade de capacidade do aparelho judiciário para combater a criminalidade grave. Por outro lado, quanto maior o número de factos criminosos resolvidos fora da audiência de julgamento, mais importante se torna para comunidade e para os sujeitos processuais a audiência de julgamento em relação aos factos que lhe são submetidos”, ALBUQUEQUE, Paulo Sergio Pinto de. Comentário do Código de Processo Penal: à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 4. ed. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2011. p. 757.

[34]   FERNANDES, Fernando. O processo penal como instrumento de política criminal. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 280.

[35]   O direito de ação não se justifica pela mera solenidade do rito em si, mas sim como princípio que se ergue na perspectiva de garantir a paridade de armas entre as partes litigantes. SOUZA, Motauri Ciocchetti de. Ministério Público e o princípio da obrigatoriedade: ação civil pública. São Paulo: Método, 2007. p. 67.

[36]   A constituição brasileira acolhe com carga normativa os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos. O Decreto 678, de 6 de novembro de 1992, firma a adesão do Brasil ao Pacto de São José da Costa Rica, o qual, no artigo 8°, II, alínea g, disciplina como garantia judicial a prerrogativa de investigado “não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado”.

[37]   FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 303-304.

[38]   Cf. artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal: “O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado [...]” (Brasil, 2009).

[39]   DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa; PINTO, Frederico de Lacerda da Costa. Supervisão, direito ao silêncio e legalidade da prova. Coimbra: Almedina, 2009. p. 40-41.

[40]   DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa; PINTO, Frederico de Lacerda da Costa. Supervisão, direito ao silêncio e legalidade da prova. Coimbra: Almedina, 2009. p. 45.

[41]   SCHÜNEMANN, Bernd. Do templo ao mercado? Como a justiça penal aparentemente transforma a teoria econômica do direito em prática, governo em governança e soberania em cooperação. In: SCHÜNEMANN, Bernd; Greco, Luíz (Coord.). Estudos de direito penal, direito processual penal e filosofia do direito. São Paulo: Marcial Pons, 2013. p. 309.

[42]  BOHM, Robert M. “Mc Justice”: on the McDonaldization of criminal justice. Justice Quarterly, v.  23, n. 1, p. 127-146, mar. 2006.

[43]   Rangel, Paulo. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iures, 2002. p. 33.

[44]   SANTOS, Pedro Sergio dos. Direito Processual Penal & a insuficiência metodológica: a alternativa da mecânica quântica. 1. ed., 2. reimpr. Curitiba: Editora Juruá, 2007. p. 72.


Autor

  • Danni Sales Silva

    Promotor de Justiça no Estado de Goiás Ex. Promotor de Justiça no Estado do Tocantins. Pós Graduado em Direito Penal. Especialista em Ciências Criminias pela UL (Universidade Lisboa). Especialista em Direito Processual Penal. Mestrando em Ciências Criminias pela Faculdade de Direito de Lisboa. Bacharelando em Filosofia pela PUC-GO. Professor de Direito Penal e Processo Penal. Professor de Pós Graduação em Direito Processual Penal na Rede Juris de Ensino e PUC/GO. Pesquisador pelo Max Planck Institute for Foreign and International Criminal Law in Freiburg i. Br., Germany. Membro do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais). Membro da Confraria do Júri

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Danni Sales. Acordo de não-persecução penal: Inconformidade jurídico constitucional da Resolução nº 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5192, 18 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60570. Acesso em: 18 abr. 2024.