5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todo o exposto, mas sem que esta discussão esgote o tema, ainda é possível relacionar algumas questões para reflexão e debates:
Como educar nossos jovens em respeito e compromisso com a ética e com a verdade?
Como reagir, sem hipocrisia, quando a falta dos filhos e alunos é grave?
O que fazer para inibir a falsidade ideológica?
Devemos ser complacentes com a falsidade dolosa?
O que fazer com os falsários?
Como salientar que o interesse público deve prevalecer sobre os interesses individuais e o mundo privado?
Como reagir, contrariamente à falta de interesse e de responsabilidade social, sem soçobrar na ação corrosiva do cinismo?
Por fim, é de se ressaltar, indubitavelmente, que:
Toda forma de plágio, cópia intencional e dolosa, assemelhando-se à desonestidade intelectual, falsidade ideológica, crime de falsificação, adulteração ou simples remoção da fonte ou da identificação do seu criador, com a subseqüente nomeação do falsário, deve ser coibida, inibida, reprimida, punida, para que não se estimule o dolo e a corrupção.
Independentemente das alegadas razões do sistema ou do capital, se devemos ou não dar razão à proteção dos direitos autorais, por ser direito de propriedade — isto não está em jogo na análise deste parecer —, nada substituiu a necessária honestidade de quem se depara com o fato ou com os dados, porque o processamento dos dados supõe haver uma fonte legítima para esses dados. Neste parecer, não se trata de uma crítica ao sistema, mas sim de um alerta claro e inequívoco da necessidade de mais ética e compromisso com a verdade no meio acadêmico.
Precisamos fornecer bons sinais de conduta aos jovens, indicando-lhes que é fundamental/essencial crer e praticar a honestidade.
Se esta educação pela busca da verdade (combatendo as ideologias e as mentiras) é uma questão de lógica e exigência moral, ao conjunto dos professores e alunos envolvidos no processo didático-pedagógico, em si, já seria desnecessário reafirmar sua necessidade ao acadêmico do direito. Por dever de ofício, este bacharel tem de saber diferenciar o crime do lícito, o engodo do engano, a culpa do dolo.
Mas, então, por que é preciso dizer (com tanta informação disponível, inclusive na rede) ao acadêmico de direito (em fim de curso) que é ilícito copiar trabalhos e monografias da Internet? É desnecessário dizer-se isto a um aluno responsável, da mesma forma como é preciso punir aquele que praticou uma longa seqüência de colas, levando-as para dentro do curso.
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Assim, não se pode esperar lógica ou coerência do jovem que na faculdade plagiou trabalhos ou copiou monografias, e que depois se viu representando contra alguém por plágio ou falsificação. Desta forma, como confiar no falsificador? O falsificador poderá nos presentear com algo que não a falsificação?
O bacharel em direito que falsifica sua monografia de final de curso jamais poderá agir contra outros falsificadores. Por uma questão de lógica, defender outros falsificadores até que seria razoável, não teria novidades, mas agir contra qualquer falsificação seria inconseqüência demais. É fácil ver como aquele que só viveu a mentira, não possui a verdade ou sequer consegue vê-la.
O plágio da monografia de anatomia, pelo jovem médico, pode explicar porque operou a perna esquerda se a doente era a direita; a prova de aritmética colada pelo engenheiro pode explicar porque caiu o prédio; a aula perdida de monografia e de metodologia da pesquisa científica (ou de ética profissional) pode explicar porque o bacharel em direito é capaz do plágio com tamanha desfaçatez.
O direito ao acesso irrestrito ao conhecimento implica no dever ético/moral da honestidade intelectual.
Por mais natural/usual que se tenha tornado a cópia não-autorizada (plágio), por jovens e alunos, é dever dos mais velhos e dos professores a sua repreensão. Caso contrário, seremos apenas cínicos e coniventes.
Neste sentido, o consumo da informação não está acima da proteção/respeito do trabalho do produtor. No caso específico, o autor da monografia, este produtor de idéias, de pensamentos, de saberes que exigiram trabalho de reflexão, tempo de amadurecimento, é um trabalhador como outro qualquer.
Em referência à obra de arte e criação literária ou acadêmica, precisamos saber que se trata de um trabalhador intelectual que sobrevive do seu trabalho de pensar, criar, projetar, de sua capacidade teleológica e que merece nosso maior respeito por sua engenhosidade e inteligência refinadas.
Em conseqüência ao trabalho intelectual, nosso próprio modo de vida acaba retratado por suas teses e publicações — porque nestes trabalhos está sua verdadeira alma, no que pensa e idealiza com mais fervor, efeito, vigor e valor. Retirar do trabalhador intelectual a referência à sua obra é como desconsiderar a filiação, é como divorciar o pai do filho. Negar a autoria é desumano demais, é realmente crueldade para com aquele que tem na criação a razão do seu viver; desautorizar, subestimar sua inteligência é indizível.
Trabalhasse este jovem em uma empresa e ainda responderia por crime de "espionagem industrial", ou fosse funcionário de um Estado e poderia responder por crime de lesa-pátria.
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Não podemos ser insensatos diante disso, insensíveis em relação à falsidade que se esconde hipocritamente, covardemente. É preciso ter muito claro, especialmente neste mundo do lusco-fusco, que aquele que só vê a cópia, não pode conhecer a originalidade da criação.
Precisamos desesperadamente dizer aos jovens que copiar é negar a si mesmo. Um educador que respeite sua função não pode tolerar que jovens aprendizes aprendam negando a si mesmos. Ninguém vive plenamente se só convive com a mentira.
6. BIBLIOGRAFIA ESPECIALIZADA
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