Fui entrevistado, por alguns veículos de comunicação, sobre a idéia aventada de se criar uma contribuição social sobre movimentação financeira, destinada exclusivamente para a Saúde. Manifestei-me reiterando que, embora seja contra a medida, o Supremo Tribunal Federal abriu caminho para reconhecer a sua constitucionalidade – muito embora pessoalmente divirja do entendimento do Tribunal e que espere seja revertido, em face da sua nova composição.
Como as entrevistas são sempre pontuais, quero esclarecer meu pensamento.
Quando da instituição da contribuição social sobre o lucro, pela MP 22/88, sustentei, perante a Suprema Corte, que: a) não poderia ser cobrada no ano de 1989; b) sua criação dependeria de lei complementar; e c) exação com essa finalidade haveria de ter natureza de "imposto com destinação específica", e não contribuição, por força do disposto nos arts. 146, 149 e 195 § 4º da C.F., sendo, pois, inconstitucional, formal e materialmente, a mencionada contribuição.
A Suprema Corte, por oito votos a zero, deu-me ganho de causa, à luz do princípio da anterioridade. Declarou, porém, que contribuição social poderia ser instituída por lei ordinária (RE 146.733-9, 29/06/92).
Às vésperas da promulgação da lei complementar 70/91, que introduziu a COFINS, consultado por membros do governo, à luz da orientação jurisprudencial da Suprema Corte, manifestei-me no sentido de que, tal contribuição poderia ser instituída por lei ordinária. O governo, entretanto, entendeu mais prudente fazê-lo por lei complementar, pois contava com folgada maioria no Congresso Nacional. Para mim, em virtude da "liturgia das formas", o veículo adotado (lei complementar) imporia que futuras modificações devessem ser realizadas também por lei complementar.
Por outro lado, a Suprema Corte decidiu que, quanto à adoção de "outras formas de financiamento da seguridade social ", de que trata o § 4º do art. 195, deveria ser respeitado o disposto no art. 154, I apenas na parte que exige a lei complementar para sua instituição, não havendo necessidade de tais exações serem "não cumulativas" ou terem "fato gerador e base de cálculo" diversos dos impostos existentes, como parece decorrer da letra esse mesmo dispositivo constitucional (PJ 17-6-2005 PP –00073).
À luz dessas orientações, colhidas na jurisprudência do STF, haveria espaço para discutir se uma contribuição permanente sobre movimentação financeira com destinação específica para saúde (parte da finalidade) poderia ser veiculada por lei complementar. E não se pode negar consistência na tese dos que defendem tal postura.
Pessoalmente, todavia, continuo, entendendo que as "outras formas" a que se refere o § 4º do art. 195, são "impostos com destinação específica" e que novas contribuições só podem ser criadas por lei complementar, matérias estas que, certamente, mereceriam um novo exame por parte da Suprema Corte, em face da fantástica evolução da doutrina a respeito das espécies tributárias.