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Os contratos e a responsabilidade civil no Direito Marítimo.

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Agenda 31/03/2011 às 07:13

5. OS DANOS DECORRENTES DO TRÁFEGO MARÍTIMO E A RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJACENTE

5.1. Avarias

As avarias são tanto os danos causados pelos acidentes marítimos aos navios ou às suas cargas, quanto as despesas extraordinárias feitas para prevenir ou reparar esse dano. 294 O Código Comercial as define como:

Art. 761. Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, ou todos os danos acontecidos àquela ou a esta, desde o embarque até a sua volta e desembarque [...]. 295

Nas palavras de Gibertoni:

Considera-se, pois, como avaria os danos, as perdas e as despesas extraordinárias que o navio ou sua carga sofrem durante a expedição marítima, desde o embarque e partida até a sua volta e desembarque. De modo geral, significa todos os danos e todas as perdas que possam ocorrer durante o percurso da viagem e que afetam total ou parcialmente as mercadorias, o navio ou ambos, conjuntamente. Além disso, incluem-se todas as despesas extraordinárias que possam sobrevir durante a viagem e que sejam necessárias para que a expedição chegue ao fim. 296

As avarias podem ser classificadas em: avarias-danos ou avarias-despesas; e, avarias ao navio ou avarias à carga. As avarias-danos, que incluem as perdas, compreendem os prejuízos materiais, tais como estragos, deteriorações, entre outros, ocorridos no navio ou em sua carga. Já as avarias-despesas são as despesas excepcionais ou anormais, motivadas por força maior, que se fizerem necessárias para que o navio possa completar com segurança a viagem. 297

Podem ser classificadas ainda em fortuitas, quando oriundas de casos fortuitos; delituosas ou quase-delituosas, quando derivadas de ato do proprietário do navio, de seu capitão, da tripulação, dos carregadores ou de terceiros; e, necessárias, quando resultantes do estado de necessidade ou da legitima defesa empregada no interesse do navio. 298

Entretanto, a classificação mais importante é aquela feita internacionalmente e seguida pelo direito marítimo brasileiro, no Código Comercial, em seu art. 763, que divide as avarias em: avarias simples ou particulares; e, avarias grossas ou comuns. O valor das primeiras é suportado, ou só pelo proprietário do navio, ou só pelo proprietário das mercadorias afetadas; enquanto que o valor das segundas é repartido proporcionalmente entre o proprietário do navio, o fretador e o proprietário da carga. 299

De acordo com Gibertoni:

Avaria simples ou particular é a que a vontade humana não intervém para resguardar interesses relativos ao navio ou à carga; decorrem de casos fortuitos ou de força maior, de imprudência, imperícia ou negligência, de dolo do comandante, equipagem ou empregados do armador, ou até de terceiros. 300

Quando da ocorrência de avarias simples, o dano será suportado somente por uma das partes, qual seja, aquela que sofreu o dano. Sobre si, portanto, recairão as despesas decorrentes de tal dano. Entretanto, terá sempre direito de regresso contra quem deu causa ao dano ou à perda. 301

As avarias simples estão enumeradas nos incisos do art. 766. do Código Comercial, sendo:

  1. 1. O dano acontecido às fazendas por borrasca, presa, naufrágio, ou encalhe fortuito, durante a viagem, e as despesas feitas para as salvar;

  2. 2. A perda de cabos, amarras, âncoras, velas e mastros, causada por borrasca ou outro acidente do mar;

  3. 3. As despesas de reclamação, sendo o navio e fazendas reclamadas separadamente;

  4. 4. O conserto particular de vasilhas, e as despesas feitas para conservar os efeitos avariados;

  5. 5. O aumento de frete e despesa de carga e descarga; quando declarado o navio inavegável, as fazendas são levadas ao lugar do destino por um ou mais navios (art. 614).

Em geral, as despesas feitas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos. 302

Podem, as avarias simples, derivar de fortuna do mar, o que inclui todo e qualquer evento ocorrido no mar; de vício próprio, tanto do navio, por ter sido mal construído, quanto da carga, por estar mal acondicionada, por exemplo; ou de faltas do capitão, como falta de vigilância, por ser depositário da carga. É necessário, ainda, que o dano comprometa apenas a carga ou o navio, nunca a ambos. 303 São, portanto, requisitos da avaria simples:

De acordo com Anjos e Gomes:

A avaria simples não tem a característica de ser produzida intencionalmente para evitar um mal maior. Ela pode ser oriunda de caso fortuito ou de força maior, e quando é produzida pelo homem o é por culpa ou dolo.

Quando a avaria simples tem como objetivo ou envolve o navio, quase sempre é devida a um acidente de navegação ou sinistro marítimo. 305

As avarias grossas ou comuns, por sua vez, se originam da vontade humana, na busca de evitar a ocorrência de um mal maior. Criam, simultaneamente, um direito e uma obrigação. Criam o direito de todas as partes interessadas serem indenizadas e, de outra banda, criam a obrigação de todas elas arcarem com uma parcela das ditas indenizações. 306

Só poderão elas ocorrer do decorrer da viagem, diferentemente das avarias simples que podem acontecer estando o navio parado, durante o embarque e desembarque e, até mesmo, em terra. 307

O artigo 764 do Código Comercial enumera as avarias grossas e, ao final, as define como:

Em geral, os danos causados deliberadamente em caso de perigo ou desastre imprevisto, se sofridos como conseqüência imediata desses eventos, bem como as despesas feitas em iguais circunstâncias, depois de deliberações motivadas (art. 509), em bem e salvamento comum do navio e mercadorias, desde a sua carga e partida até o seu retorno e descarga. 308

O alijamento é um bom exemplo de avaria comum, bem como as despesas e os danos por ele causados. É o caso do estrago causado às mercadorias pela água que entrar pelas escotilhas que forem abertas para o alijamento de outras mercadorias, quando este é feito para a segurança da navio, da tripulação e da carga embarcada. 309

Para ser considerada grossa, é necessário que a avaria:

5.1.1. Regras de York-Antuérpia

As regras de York-Antuérpia são padrões contratuais privados que as partes concordam em observar e incluem os princípios básicos que definem os fundamentos da avaria, a sua natureza e disciplinam circunstâncias tais como a culpa e as despesas em substituição. 311

Foram criadas em 1897 pela International Law Association com o objetivo de uniformizar a disciplina contratual internacional acerca das avarias 312. Segundo sua Regra A:

Um ato se caracteriza de avaria grossa quando, e somente quando, implicar em um sacrifício ou despesa extraordinária, internacional e razoavelmente feito para a segurança comum e no sentido de preservar de um perigo os bens envolvidos na mesma expedição marítima. 313

Para diferenciar as avarias simples das grossas, podemos utilizar como exemplo um incêndio que se desenvolva nos porões do navio, onde a carga é transportada. Os danos causados diretamente pelo fogo serão avarias simples, porém os danos causados pela água que a tripulação venha a jogar na mercadoria para apagá-lo, por terem sido causados para benefício da segurança geral da viagem e dos viajantes, serão avarias grossas e, portanto, deverão ser rateados por todos. 314

Conforme já dito, os prejuízos advindos da avaria grossa devem ser rateados por todas as partes interessadas, quais sejam: o navio, o frete e a carga, nos termos do art. 763. do CCo e da Regra XVII das Regras de York-Antuérpia. A quantia que cabe a cada uma dessas partes pagar é denominada de valor contribuinte e sua determinação é feita por meio da operação de regulação de avarias, levada a cabo por um técnico conhecido como regulador de avarias. 315 Este técnico será nomeado por ambas as partes, em comum acordo, a instância do capitão. Não havendo acordo, será nomeado por árbitro nomeado pelo Juiz de Direito do porto de entrega da carga. 316

A regulação de avarias objetiva proporcionar aos proprietários dos bens perdidos ou danificados pela avaria grossa a retomada do status quo ante pelo pagamento de uma indenização proporcional ao valor dos bens que perderam. 317

O referido procedimento se subdivide nas seguintes etapas:

Etapa preparatória – Em que se faz a ratificação do Protesto Marítimo; a vistoria do navio e da carga, para verificar as avarias sofridas, e neste momento são estabelecidos o valor do navio e da carga que entrarão nos cálculos da regulação; e o inquérito da Capitania dos Portos, que dirá se o caso foi fortuito, culposo etc...

Além disso, o armador deve entrar em contato com os donos das mercadorias, no porto de destino, exigindo-lhes caução, depósito em dinheiro, ou fiança, para assegurar que no fim da regulação eles paguem as quotas que lhes forem atribuídas.

As mercadorias avariadas devem ser vendidas em leilão judicial, conforme a lei brasileira, e o valor obtido depositado na massa ativa da avaria grossa, enquanto que as mercadorias entram na massa passiva;

Regulação propriamente dita – O regulador pode ser indicado pelo Juiz, mas, normalmente, a regulação é feita extrajudicialmente, por ser mais rápida e barata. Neste último caso, há necessidade de homologação do resultado pela justiça;

Liquidação – Após, o Juiz, ouvidos os interessados, e homologada a regulação, os credores podem cobrar dos devedores as importâncias devidas. 318

Os valores de contribuição serão sempre eqüitativos, visto que provenientes do cálculo de uma regra de três, em que se dividirão pró-rata entre as partes interessadas todos os custos derivados da avaria comum. 319

Podemos perceber, portanto, que a regulação de avarias é uma perícia utilizada para medir a extensão dos danos causados pelas avarias grossas e para distribuir a responsabilidade pela indenização entre as partes envolvidas no contrato de transporte marítimo. 320

A responsabilidade sobre sua execução pertence ao armador ou ao seu representante, que o fará por meio do regulador de avarias antes citado. Havendo culpa na prática do ato considerado avaria grossa, caberá a ele ação de regresso contra o culpado para ver-se reparado nos gastos que teve com a contratação do técnico regulador, nos termos da Regra D das Regras de York-Antuérpia. 321

A decisão relativa à execução ou não de um ato considerado avaria grossa deve ser tomada pelo capitão da embarcação que:

Consultará os principais membros da tripulação – Imediato, Chefe de Máquinas e todos aqueles que tenham real importância no navio. Ao realizar a deliberação, o capitão, segundo o poder que lhe é atribuído pelo Código Comercial, "pode obrar contra o vencido", ou seja, pode ir contra a decisão da maioria, mas deve indicar os motivos na Ata de Deliberação que será lavrada no Diário de Navegação. 322

5.2. Acidentes da navegação

Segundo a Lei 2.180/54 – Lei do Tribunal Marítimo -, são acidentes da navegação:

Art. 14. [...]

a) Naufrágio, encalhe, colisão, abalroação, água aberta, explosão, incêndio, varação, arribada e alijamento;

b) Avaria ou defeito no navio ou suas instalações, que ponham em risco a embarcação, as vidas e fazendas a bordo. 323

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Desses, os mais importantes a serem estudados são a arribada, a borrasca, a presa, o naufrágio, o encalhe, o abalroamento, a colisão, o alijamento e a água aberta.

A arribada é o fato de o navio ter de entrar, por algum motivo, em um porto que não esteja programado para a viagem, isto é, que não seja nenhuma de suas escalas, nem seu porto de destino. Também será considerada arribada o retorno ao porto de partida sem que a viagem tenha sido efetuada integralmente. 324

Será arribada forçada quando independer da vontade do capitão, tendo sido motivada por caso fortuito ou força maior. A arribada forçada pode ser justificada ou injustificada. 325 Será justificada quando for causada por:

  1. 1) Falta de víveres ou aguada;

  2. 2) Qualquer acidente acontecido á equipagem, carga ou navio, que impossibilite este de continuar a navegar; e

  3. 3) Temor fundado de inimigo ou pirata. 326

Sendo justificada a arribada forçada, será considerada avaria grossa pelo nosso Código Comercial. 327

A arribada forçada será injustificada se:

  1. 1) A falta de víveres ou aguada proceder de não haver feito a provisão necessária segundo o costume da navegação, ou de haver-se perdido e estragado por má arrumação ou descuido, ou porque o capitão vendesse alguma parte dos mesmos víveres ou aguada;

  2. 2) Quando a inavegabilidade decorre do mau conserto, da falta de apercebimento ou equipação, ou de má arrumação da carga; e

  3. 3) Quando o temor não for fundado em fatos positivos ou não deixarem dúvida. 328

Nesse caso, trata-se de avaria particular ou simples, devendo ser suportada pelo fretador, pelo afretador, ou por ambos, nos termos do art. 744. do CCo. 329

A borrasca é o evento mais temido dos mares. Trata-se das tempestades marítimas, dos temporais e dos furacões que agitam violentamente as águas, causando sérios danos ao casco do navio, bem como às mercadorias transportadas, e impossibilitando que a tripulação exerça seu domínio sobre ele e o navegue, ficando, assim, completamente nas mãos da natureza. 330

Entretanto, um simples mau tempo não pode ser considerado acidente da navegação. Para que haja borrasca, é necessária a existência de ventos que atinjam o grau 9 (nove) da escala de Beaufort e o estado do mar deve ser tempestuoso. 331 Gibertoni bem nos demonstra o que isto significa:

O grau sete da escala de Beaufort representa um vento forte ("vento forte" – "vaga"), o grau oito o vento é muito forte ("vaga grossa"), mas é só o grau nove que o vento será tempestuoso ("vaga grossa"), capaz de caracterizar uma avaria da mercadoria provocada por borrasca. A borrasca, pois, é a tempestade que atinge ventos de força acima de 9 na escala de Beaufort. 332

A presa é o ato de pilhagem ou pirataria, em que grupos armados percorrem o mar roubando navios de qualquer nacionalidade. 333

O naufrágio é o afundamento do navio nas águas, sem possibilidade de que este emerja por meios próprios. Sempre leva à perda total do navio. Juridicamente, também se incluem na figura do naufrágio os navios destroçados contra rochedos ou icebergs, ou, ainda, em razão de abalroamento ou colisão, bem como os que desapareceram por mais de um ano. 334

Permanecendo inteiro o casco ou se desfazendo em pedaços, o navio naufragado continuará pertencendo ao seu proprietário. Caso seja encontrado, o navio ou seus destroços, passará a ser chamado de "achado". E, se for recolhido, passará a ser denominado de "salvado". 335

As conseqüências do naufrágio são: o abandono do navio por sua tripulação; o socorro à embarcação naufragada ou em perigo de naufragar e o acautelamento dos salvados; e, a apuração das causas do acidente e da responsabilidade dele advinda. 336

A responsabilidade antes falada pode se dar tanto na esfera cível, quanto na esfera criminal, de acordo com os termos do art. 261. do Código Penal. 337

O RTM rege o naufrágio em seus arts. 310. e 311, indicando que deve ser ele matéria de inquérito realizado junto à Capitania dos Portos, para a determinação das causas do sinistro. Terminado este, será encaminhado ao Tribunal Marítimo que decidirá sobre a existência de culpa ou dolo; ou, ainda, se foi caso fortuito ou de força maior. Desta decisão, sobrevirão as decisões judiciais relativas às indenizações e ao cumprimento de eventual sanção na esfera penal. 338

Gibertoni bem leciona que "o naufrágio doloso, quando provocado pelo comandante e/ou algum membro da equipagem, é um ato de barataria" 339 (Grifo da autora).

A barataria pode, portanto, ser descrita como qualquer ato criminoso de rebeldia praticado pelo capitão ou pela tripulação, ou por ambos, no exercício de suas funções, que cause grave dano ao navio ou à mercadoria embarcada, indo diretamente de encontro à vontade do proprietário do navio. 340

Segundo as Regras de Haia, o armador ficaria isento da responsabilidade relativa às avarias ou perdas dadas às cargas quando de um naufrágio provocado por barataria. Todavia, como o Brasil não assinou nem aderiu a esta convenção, a jurisprudência nacional tem entendimento contrário a ela, responsabilizando o armador tanto por atos de barataria como por naufrágio por culpa do capitão ou da tripulação. 341

Estando ciente o capitão da iminência de um naufrágio, pode determinar o abandono do navio. Todavia, este risco deve ser grave a ponto de por em risco a vida dos passageiros e tripulantes, caso estes permaneçam embarcados. Caso contrário, o abandono não se justifica e acabará, por não deixar ninguém no comando do navio, provocando um naufrágio culposo, pelo qual o capitão será responsabilizado. 342

A decisão sobre o abandono do navio deve ser tomada pelo capitão em conjunto com os principais tripulantes da embarcação e lavrada em Ata de Deliberação no Diário de Navegação, bem como em um Protesto Marítimo. Caso isto não possa ser feito no navio, deverá ser feito assim que aqueles que se salvarem chegarem em terra. 343

Quando do efetivo desembarque do navio, no caso de abandono do mesmo, o último a desembarcar deverá ser sempre o capitão, dando preferência ao salvamento das vidas dos demais antes da sua, conforme estabelece o art. 508. do CCo. 344

O navio abandonado permanece, ainda que à deriva em alto-mar, sendo propriedade de seu dono, a quem deve retornar assim que for encontrado. Caso contrário, aquele que o tiver encontrado estará praticando o crime de apropriação indébita e estará sujeito à sua pena, nos termos estabelecidos pelo art. 169. do CP. 345

O encalhe é quando o navio, por estar desavisadamente sendo navegado em área muito rasa, dá no seco, ficando impedido de navegar momentânea ou permanentemente. 346

De acordo com Gibertoni:

As avarias decorrentes diretamente do encalhe, assim como as despesas resultantes, são avarias simples. Mas as despesas para reflutuação e outras de salvamento, se feitas em benefício do navio e carga, são avarias comuns (Código Comercial, art. 764, XV; Regras de York-Antuérpia, Regras VI e VIII). 347

O encalhe pode ser classificado em momentâneo ou permanente. Será momentâneo quando, pela subida da maré, pelo alívio da carga, utilizando-se de meios próprios – a força de suas máquinas - ou com auxílios externos – um rebocador -, o navio conseguir liberar-se do encalhe. E será permanente quando não conseguir liberar-se por recurso algum, perdendo sua condição jurídica de navio. 348

Já de acordo com o que ocasionar no casco do navio o encalhe classifica-se em simples ou com fratura. É simples aquele que não causa danos ao casco do navio. E, com fratura, é aquele em que o navio não desencalha sem se partir ou "fazer água". 349

E, no que tange às suas causas, os encalhes podem ser classificados em fortuitos, dolosos, culposos ou voluntários. 350

As providências a serem tomadas quando de um encalhe são as mesmas de um naufrágio, ou seja, deliberação, Ata e Protesto Marítimo. E suas conseqüências jurídicas são a instauração de um inquérito na Capitania dos Portos, o julgamento no TM, a ratificação do Protesto e a proposição e julgamento das ações cíveis e penais cabíveis. 351

A varação é o encalhe proposital do navio, provocado pelo capitão. Se for feita em razão por dolo do capitão, suas conseqüências em relação à carga serão consideradas avarias simples. Todavia, se esta decisão tiver sido tomada com o fito de evitar um possível naufrágio, será uma avaria grossa, devendo os danos dela decorrentes serem rateados por todos os interessados. 352

O abalroamento é "o choque entre duas ou mais embarcações" 353. Entretanto, estas embarcações não podem ter entre si qualquer vínculo contratual. 354

Estando na superfície d’água um hidroavião e se chocando este com um navio, tal choque será considerado uma abalroação, de acordo com o inciso V, do art. 3º, do RTM. O mesmo ocorrerá no caso de um choque entre uma plataforma autopropulsável e um navio. 355

Quanto à causa, os abalroamentos se dividem em fortuitos, culposos ou duvidosos. Fortuitos são os devidos aos casos fortuitos ou de força maior. Culposos, os que derivam de ato ou fato culposo do capitão, dos tripulantes, do armador ou do proprietário, de um ou de ambos os navios. E duvidosos são aqueles em que não se consegue definir se a causa dentre as duas anteriores. 356

As abalroações ou abalroamentos são regidos pelo nosso Código Comercial, em seus arts. 749. e 752, no caso de se darem entre navio brasileiros. E, caso se dêem entre um navio brasileiro e outro estrangeiro, serão regidos pela Convenção de Bruxelas. 357

Se a abalroação for fortuita, cada navio arcará sozinho com os prejuízos que tiver. Entretanto, se for culposa, o Código Civil, em seu art. 283, prevê que caberá a cada navio indenizar a metade dos danos causados ao outro. Já a Convenção de Bruxelas 358, por sua vez, dispõe que cada um indenizará a parte dos danos a que deu causa, proporcionalmente a sua culpa. Se for duvidosa a abalroação, a regra a ser aplicada é a da abalroação fortuita. 359

A abalroação será complicada caso se dê entre mais de dois navios, sendo um deles apenas o intermediário. Neste caso, o primeiro, que deu causa ao acidente, deverá arcar com os custos derivados dos danos causados aos dois outros navios. Todavia, se a abalroação complicada se der por motivo de força maior, será considerada fortuita e cada um dos envolvidos deverá arcar com seus próprios prejuízos. 360

Para a definição da culpa no caso de abalroamentos que envolvam navios mercantes brasileiros, ainda que em águas territoriais estrangeiras, o Tribunal Marítimo será o órgão competente, o que não exclui, porém, a competência do tribunal do Estado onde o acidente tenha ocorrido. 361

No que tange às indenizações provenientes dos abalroamentos, a competência é determinada pelo Código de Bustamante 362, a qual dispõe:

Art. 289. O abalroamento fortuito, em aguas territoriaes ou no espaço aéreo nacional, submette-se á lei do pavilhão, se este for commum.

Art. 290. No mesmo caso, se os pavilhões differem, applica-se a lei do lugar.

Art. 291. Applica-se essa mesma lei a todo caso de abalroamento culpavel, em aguas territoriaes ou no espaço aereo nacional.

Art. 292. A lei do pavilhão applicar-se-á nos casos de abalroamento fortuito ou culpavel, em alto mar ou no livre espaço, se os navios ou aeronaves tiverem o mesmo pavilhão.

Art. 293. Em caso contrário, regular-se-á pelo pavilhão do navio ou aeronave abalroado, se o abalroamento for culpavel.

Art. 294. Nos casos de abalroamento fortuito, no alto mar ou no espaço aereo livre, entre navios ou aeronaves de differentes pavilhões, cada um supportará a metade da somma total do damno, dividido segundo a lei de um delles, e a metade restante dividida segundo a lei do outro. 363

Os danos ocasionados pelos abalroamentos, como por quaisquer outros acidentes marítimos, devem ser indenizados por inteiro, isto é, compreendem não só os danos emergentes, como também os lucros cessantes que o proprietário do navio deixará de receber pelo tempo que demorem os reparos que se façam necessários à sua embarcação. 364

A colisão é "o choque entre uma embarcação e outro objeto que não seja uma embarcação". 365 É o caso do choque de um navio com uma bóia ou mesmo com o próprio porto.

O alijamento é "o ato de lançar n’água as coisas de bordo, inclusive a carga". 366 Tem por objetivo reequilibrar o navio, com o alívio do peso alijado, para evitar um possível naufrágio.

Pode o alijamento ser ou não uma avaria grossa. Se a carga alijada não for perigosa, não será considerado o alijamento como avaria grossa. Todavia, se o alijamento for feito em benefício de todos os envolvidos na viagem, ou seja, do navio, da carga e da tripulação, será avaria grossa e, por conseguinte, será rateada entre todos os interessados. 367

Encontrando-se o navio em perigo, deve ser seguida a seguinte ordem de alijamento estabelecida pelo Código Comercial: primeiro devem ser lançadas as mercadorias e efeitos que estiverem em cima do convés; depois devem ser alijadas as mais pesadas e as de menor valor; e, por fim, devem ser lançadas as que estiverem na cobertura e mais à mão. 368

Como os anteriores, o alijamento também deve ser decidido pelo capitão com o auxílio dos principais tripulantes do navio, tendo ele sempre o direito de fazer valer sua vontade contra a da maioria. Deverão ser anotadas as marcas e demais características dos objetos alijados na Ata de Deliberação e deverá ser lavrado o competente Protesto Marítimo, o qual deverá ser ratificado judicialmente no primeiro porto aonde atraque a embarcação. 369

E a água aberta é "a entrada de água através do casco abaixo da linha de flutuação. Pode ser devida a diversos fatores, como rebites aluídos ou soltos, má vedação de válvulas do casco, ou por soldas malfeitas, ou por rombos produzidos por abalroamento ou colisão". 370

Ocorrendo um acidente como os supra descritos com uma embarcação em alto-mar, seu capitão deve emitir um sinal de emergência pelo rádio e, caso se trate de situação desesperadora, deve emitir o sinal de SOS. A partir daí, qualquer outro navio que se encontre na área estará obrigado a prestar socorro aquele que se encontra necessitado. Este é o mandamento legal da Lei 7.203/84 (que dispõe sobre a assistência e salvamento de embarcação, coisa ou bem em perigo no mar, nos portos e nas vias navegáveis interiores) e da Convenção Internacional sobre Assistência e Salvamento, assinada em Bruxelas, em 23 de setembro de 1910. A primeira deve ser utilizada para salvamentos realizados no mar territorial brasileiro. Fora desta área, deve ser utilizada a Convenção. 371

Assistência e salvamento é todo e qualquer ato efetuado com o fito de assistir e salvar uma embarcação, coisa ou bem em perigo no mar e nas vias fluviais navegáveis. Nenhum dos diplomas legais antes citados faz distinção entre os termos assistência e salvamento, tendo ambos o mesmo significado. 372

Os serviços de assistência e salvamento, ainda que não sejam prestados por empresas especializadas, devem ser remunerados. Desta feita, um navio só deve pedir socorro quando este se fizer estritamente necessário, de forma a evitar ter de arcar com o custo do salvamento, que é, em geral, muito alto. 373

O valor da remuneração costuma ser objeto de acordo posterior entre as partes, se o navio socorrista for mercante. Todavia, sendo navio especializado na assistência e salvamento, o capitão deste apresentará um contrato de adesão padronizado ao comandante do navio a ser salvo, contrato este chamado de "Lloyd’s Standard Form of Salvage Agreement – No cure, no pay". 374

Para evitar seja o contratante do socorro por navio especializado lesionado pelo uso desse tipo de contrato padronizado, a Convenção, em seu art. 7º, estabelece que tal contrato pode ser modificado ou anulado pelo juiz caso não haja equilíbrio entre as obrigações das partes ou caso esteja eivado de dolo ou omissão. 375

Tanto a Convenção, quanto a lei brasileira estabelecem que, para que não haja enriquecimento ilícito, a remuneração do salvamento não pode ultrapassar o valor real da coisa salvada. 376

Há discordância, entretanto, entre elas no que tange aos salvamentos que não são eficazes. Nestes casos, determina a Convenção que não haverá qualquer pagamento. Já a lei, de outra banda, determina que devem ser pagas as despesas decorrentes dos meios utilizados para evitar danos ao meio ambiente ou a terceiros, caso eles tenham sido realmente evitados. 377

Para que sejam caracterizados a assistência e o salvamento, faz-se necessário que:

  1. 1. O navio esteja em perigo, o qual não precisa ser imediato, mas que seja possível e considerável;

  2. 2. Que o salvador seja outro navio;

  3. 3. Que não haja vínculo contratual anterior determinando o socorro. Por exemplo: um navio rebocador não será considerado como salvador de um navio que estava rebocando e, por ter se partindo o cabo de reboque, ficou em perigo de se perder;

  4. 4. A assistência e salvamento não sejam feitos a um navio abalroado pelo navio abalroador. 378

No que se refere ao item 4 (quatro) anterior, o navio abalroador é obrigado a prestar assistência ao navio abalroado, apenas esta assistência não se enquadra juridicamente na assistência e salvamento objeto de remuneração, não fazendo jus a ela por ter sido o causador dos danos que levaram ao socorro. Esta é a inteligência do art. 8º da Convenção. 379

5.2.1. Protestos Marítimos

O protesto é a prova da ocorrência de um sinistro a bordo, utilizado para a declaração de uma avaria grossa, e consiste em:

Nas palavras de Gibertoni:

O Protesto é um dos meios de que se serve o capitão do navio para comprovar quaisquer ocorrências no curso da viagem, seja em relação à carga, aos passageiros ou ao próprio navio. Representa o registro de qualquer acidente ocorrido em viagem, constando, pois, de uma declaração ou relato feito pelo capitão relativo às circunstâncias da viagem, às tempestades (borrascas) suportadas pelo navio, aos sinistros e acidentes supervenientes que o obrigaram a procurar outro ponto e aí se refugiar (arribada forçada), à própria conduta do capitão a respeito de qualquer medida que julgou seu dever tomar.

É, outrossim, o ato escrito do capitão do navio, tendente a comprovar sinistros, avarias ou quaisquer perdas sofridas pelo navio ou sua carga, ou ambos, e que tem por fim eximir o capitão da responsabilidade pelos casos fortuitos ou de força maior. 381

Antes do protesto, deve ser lavrada a Ata de Deliberação no Diário de Navegação, onde deverá constar o fato em si e suas circunstâncias, a declaração da deliberação e dos votos vencidos, bem como os motivos da decisão do capitão, quando esta for contrária a da maioria. 382

De acordo com os termos constantes do arts. 505. do CCo combinado com os arts. 725. a 729 do Decreto-Lei 1.608/39 (CPC de 1939), o capitão deverá entregar os protestos marítimos à autoridade competente do porto onde atracar, em até 24hs úteis de sua chegada. A referida autoridade deverá interrogá-lo, além de interrogar os oficiais, os integrantes da equipagem e os passageiros da embarcação sobre a veracidade dos fatos e circunstâncias informados no protesto, devendo estar de posse do Diário de Bordo do navio. 383

Para terem validade, os protestos marítimos devem passar, obrigatoriamente, pela ratificação judicial. Uma vez confirmados judicialmente, têm fé pública e fazem presunção judicial juris tantum. 384

As normas materiais relativas ao protesto marítimo são os arts. 504, 505, 509, 743 e 770 do CCo e o seu procedimento judicial está previsto nos arts. 725. a 729 do Decreto-Lei 1.608/39 (CPC de 1939), conforme orientação do art. 1.218, VIII, do CPC de 1973.

5.3. Tribunal Marítimo

O Tribunal Marítimo (TM) é órgão autônomo do Poder Executivo, vinculado ao Ministério da Marinha, auxiliar do Poder Judiciário, e detém a competência anômala 385 para julgar os acidentes e fatos da navegação marítima, fluvial e lacustre em todo o território nacional, não importando a nacionalidade da embarcação envolvida, bem como tem a atribuição de manter o registro da propriedade marítima, nos termos do art. 1º da Lei 2.180/54, abaixo colacionado: 386

Art. 1º. O Tribunal Marítimo, com jurisdição em todo o território nacional, órgão, autônomo, auxiliar do Poder Judiciário, vinculado ao Ministério da Marinha no que se refere ao provimento de pessoal militar e de recursos orçamentários para pessoal e material destinados ao seu funcionamento, tem como atribuições julgar os acidentes e fatos da navegação marítima, fluvial e lacustre e as questões relacionadas com tal atividade, especificadas nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 5.056, de 1966). 387

É de se observar, entretanto, que:

Como órgão auxiliar do Poder Judiciário, o Tribunal Marítimo exerce a atribuição judicante nas matérias de sua competência, sem qualquer vinculação, pois suas decisões não fazem coisa julgada material, podendo, inclusive, serem reformadas – tratam-se, portanto, de decisões administrativas e não judiciais. 388

O Tribunal Marítimo é composto de sete juízes, sendo: um presidente, oficial-general do Corpo da Armada, da ativa ou da reserva remunerada; dois juízes militares, oficiais de Marinha, da reserva remunerada; e quatro juízes civis. 389

Segue ele os mesmos procedimentos adotados por qualquer outro tribunal, quando da apreciação dos fatos e acidentes da navegação, aplicando as normas e técnicas jurídicas implicadas à situação em julgamento. Podendo, portanto, utilizar-se subsidiariamente, inclusive, da analogia, dos usos e costumes, da eqüidade, do direito comparado e dos princípios gerais do direito balizados pela prática internacional no trato das questões pertinentes ao tráfego marítimo. 390

Entretanto, é mister que se compreenda que as decisões dele advindas não geram vínculo obrigacional pleno entre as partes litigantes, vez que solucionam a questão apenas no âmbito técnico e administrativo, tornando necessária uma decisão definitiva do Poder Judiciário para que se ponha fim à questão em debate. 391

Dessa forma, vê-se que o TM detém uma:

[...] jurisdição e competência limitadas e concorrente com outros tribunais, por serem estes últimos detentores do verdadeiro poder jurisdicional, decidindo com eficácia plena e vinculando as partes de forma imutável nos dissídios que versam sobre fatos e acidentes da navegação. 392

Em relação aos aspectos da territorialidade e da extraterritorialidade desses casos, o Tribunal Marítimo tem competência até mais ampla que a da justiça brasileira, exercendo-a sobre:

Art . 10. [...]

a) embarcações mercantes de qualquer nacionalidade, em águas brasileiras;

b) embarcações mercantes brasileiras em alto mar, ou em águas estrangeiras;

c) embarcações mercantes estrangeiras em alto mar, no caso de estarem envolvidas em qualquer acidente marítimo ou incidente de navegação, no qual tenha pessoa física brasileira perdido a vida ou sofrido ferimentos graves, ou que tenham provocado danos graves a navios ou a instalações brasileiras ou ao meio marinho, de acordo com as normas do Direito Internacional; (Redação dada pela Lei nº 9.578, de 1997)

d) o pessoal da Marinha Mercante brasileira;

e) os marítimos estrangeiros, em território ou águas territoriais brasileiras;

f) os proprietários, armadores, locatários, carregadores, agentes e consignatários de embarcações brasileiras e seus prepostos;

g) agentes ou consignatários no Brasil de emprêsa estrangeira de navegação;

h) empreiteiros ou proprietários de estaleiros, carreiras, diques ou oficinas de construção ou reparação naval e seus prepostos.

i) os proprietários, armadores, locatários, carregadores, consignatários, e seus prepostos, no Brasil, de embarcações mercantes estrangeiras; (Incluído pela Lei nº 9.578, de 1997).

j) os empreiteiros e proprietários de construções executadas sob, sobre e às margens das águas interiores e do mar territorial brasileiros, sob e sobre a zona econômica exclusiva e a plataforma continental brasileiras e que, por erro ou inadequação de projeto ou execução ou pela não observância de especificações técnicas de materiais, métodos e processos adequados, ou, ainda, por introduzir modificações estruturais não autorizadas nas obras originais, atentem contra a segurança da navegação; (Incluído pela Lei nº 9.578, de 1997)

l) toda pessoa jurídica ou física envolvida, por qualquer forma ou motivo, em acidente ou fato da navegação, respeitados os demais instrumentos do Direito Interno e as normas do Direito Internacional; (Incluído pela Lei nº 9.578, de 1997)

m) ilhas artificiais, instalações estruturas, bem como embarcações de qualquer nacionalidade empregadas em operações relacionadas com pesquisa científica marinha, prospecção, exploração, produção, armazenamento e beneficiamento dos recursos naturais, nas águas interiores, no mar territorial, na zona econômica exclusiva e na plataforma continental brasileiros, respeitados os acordos bilaterais ou multilaterais firmados pelo País e as normas do Direito Internacional. (Incluído pela Lei nº 9.578, de 1997). 393

Sempre será possível um reexame da decisão do TM pela justiça comum, deve, porém, ser juntada a decisão definitiva do TM ao processo, pois servirá esta de prova técnica indispensável ao julgamento da causa. É possível que esta prova venha a ser desconstituída por uma perícia, mas é muito raro que isto ocorra caso o procedimento no TM tenha sido regularmente conduzido. 394

É competente o TM para o julgamento dos acidentes, bem como de todos os fatos da navegação. Além dos acidentes antes elencados, cabe citar quais são os fatos da navegação, são eles:

Art . 15. [...]

a) o mau aparelhamento ou a impropriedade da embarcação para o serviço em que é utilizada, e a deficiência da equipagem;

b) a alteração da rota;

c) a má estimação da carga, que sujeite a risco a segurança da expedição;

d) a recusa injustificada de socorrro a embarcação em perigo;

e) todos os fatos que prejudiquem ou ponham em risco a incolumidade e segurança da embarcação, as vidas e fazendas de bordo.

f) o emprego da embarcação, no todo ou em parte, na prática de atos ilícitos, previstos em lei como crime ou contravenção penal, ou lesivos à Fazenda Nacional. (Incluído pela Lei nº 5.056, de 1966). 395

De acordo com Gibertoni, "o Tribunal Marítimo exerce a judicatura no âmbito de suas funções administrativas, julgando os acidentes e fatos da navegação; definindo-lhes a natureza e determinando-lhes as causas, circunstâncias e extensão". 396 Após isto, determinará os responsáveis e lhes aplicará as seguintes penalidades:

Art. 121. [...]

I - repreensão, medida educativa concernente à segurança da navegação ou ambas;

II - suspensão de pessoal marítimo;

III - interdição para o exercício de determinada função;

IV - cancelamento da matrícula profissional e da carteira de amador;

V - proibição ou suspensão do tráfego da embarcação;

VI - cancelamento do registro de armador;

VII - multa, cumulativamente ou não, com qualquer das penas anteriores. (Redação dada pela Lei nº 8.969, de 1994). 397

É possível concluir-se, destarte, que o Tribunal Marítimo, juntamente com a justiça comum, tem a competência para o julgamento dos acidentes e fatos da navegação, analisados estes em razão do lugar (ratione loci), em razão da matéria (ratione materiae) e em razão da pessoa (ratione personae), conforme se depreende dos termos do art. 10. da Lei 2.180/54 supra descrito. 398

Ocorrem, ainda, fatos que, em razão da matéria, não podem ser julgados pelo TM, posto que este não dispõe dos meios suficientes para tanto. É o caso de uma indisciplina de um tripulante que tenha culminado num fato criminoso. Sobre este fato, a competência para julgamento será da justiça comum. 399

No que toca às causas cíveis, administrativas, trabalhistas, criminais, etc., a competência no direito marítimo é assim classificada:

Quando do julgamento dos fatos e acidentes da navegação, o TM jamais pode exceder os limites de suas atribuições e competências, sob pena de cometer arbítrio e ilegalidade. De outra banda, os órgãos do judiciário também não podem intervir nos julgamentos do TM, exceto na hipótese prevista no inciso XXXV, do art. 5º, da CF/88 (lesão ou ameaça a direito), posto que, assim agindo, incorreriam nos mesmos arbítrio e ilegalidade antes citados, comprometendo a harmonia e a independência entre os poderes na forma estabelecida pela Constituição. 401

O TM exerce tanto a jurisdição contenciosa como a jurisdição voluntária. Por meio da jurisdição contenciosa, julga os processos 402 administrativos punitivos ou processos administrativos disciplinares. E, pela jurisdição voluntária, o processo administrativo de expediente ou processo de controle administrativo. 403

Nos processos administrativos punitivos ou disciplinares, o TM atua como órgão julgador dos acidentes e fatos da navegação, definindo-lhes a natureza, as causas, circunstâncias e extensão do ilícito administrativo. Ainda, processa e pune os responsáveis de acordo com suas atribuições, podendo, inclusive, propor medidas de segurança e preventivas, visando resguardar as peculiaridades da navegação e do acidente, ou do fato ocorrido, evitando, assim, a ocorrência de novos fatos semelhantes. 404

Nos processos administrativos de expediente, a atuação do TM se restringe à expedição de certidões, autuações, despachos de mero expediente, etc. E, no caso dos processos de controle administrativo, suas atribuições são um pouco mais extensas, abrangendo as diversas atividades relativas ao registro da propriedade naval, bem como o controle administrativo das atividades relacionadas à armação nacional e os registros marítimos, previstos na Lei nº. 9.432/97, regulamentada pelo Decreto nº. 2.256/97. 405

Quanto à análise do Tribunal Marítimo e seu funcionamento, entende-se não serem necessárias maiores dilações sobre o assunto, posto que o mesmo se encontra muito bem pormenorizado em sua lei criadora e em seu regimento interno, sendo o exposto o que interessa para a boa compreensão deste trabalho.

Abaixo se colacionam as ementas alguns interessantes julgados do TM, para fins de curiosidade. A íntegra destes julgados se encontra nos anexos deste trabalho. In verbis:

Aqui se considera encerada a matéria de que trata o presente trabalho. Pelo que, cabe para o momento a partida para as considerações finais sobre o tema do mesmo, que serão feitas no capítulo seguinte concernente à sua conclusão.

Sobre a autora
Vanessa Kiewel Cordeiro

Advogada atuante nas áreas cível, imobiliária e tributária. Pós-graduanda em Direito Tributário pela Universidade Gama Filho - UGF.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORDEIRO, Vanessa Kiewel. Os contratos e a responsabilidade civil no Direito Marítimo.: Estudo sobre características e particularidades desta espécie contratual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2829, 31 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18774. Acesso em: 23 nov. 2024.

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