3 Teoria economicista dos delitos e das penas
A Criminologia, ciência que estuda os vários aspectos do crime, buscou, ao longo da história, encontrar causas para a criminalidade. Neste quadro, desenvolveu-se o paradigma da reação social, formulando a noção de labelling approach. Tal paradigma tem como tese central a idéia de que o desvio e a criminalidade não são qualidades intrínsecas da conduta ou realidades pré-constituídas, mas "etiquetas" atribuídas a determinados sujeitos, por meio de complexos processos de interação social. Desse modo, não há o que se falar em criminalidade ou criminosos, mas sim em criminalização e criminalizados. [34]
Em sentido contrário, observa-se a Teoria Economicista, conhecida também por Teoria Economicista dos delitos e das penas, apresentando como maior idealizador Gary Becker, que demonstra a seguinte idéia:
Uma pessoa comete um delito se a utilidade esperada do mesmo excede a utilidade que poderia obter empregando seu tempo e outros recursos em atividades alternativas. Portanto, algumas pessoas se convertem em delinqüentes, não porque suas motivações básicas difiram das de outras pessoas senão porque seus benefícios e custos diferem [35].
Assim sendo, a teoria economicista de Gary Becker parte do pressuposto de que o Estado não tem interesse e nem oportunidades para acabar com a criminalidade, zerando-a por completo, uma vez que deve manter um nível suportável de criminalidade.
Em sua tese, Cláudio Guimarães trata a respeito da Teoria Economicista de Becker, atribuindo as penas - analogicamente interpretando - como um preço a ser pago pelas atividades ilícitas cometidas por indivíduos que visam afrontar os bens jurídicos defendidos pela sociedade e pelo Direito Penal. Neste sentido, este autor deixa claro, sobre tal teoria que:
[...] por se considerar a pena como equivalente a um preço que se deve pagar pela comissão de uma atividade ilegal deve-se constituir o sistema penal em um conjunto de mecanismos que, de maneira análoga a quaisquer outras atividades de natureza econômica, fixe preços que venham a inibir as atividades economicamente ineficientes (delitos), assim como, em seu revés, deve incentivar as transações que suponham o mínimo custo e a maior utilidade, fazendo o melhor uso possível dos recursos disponíveis para a manutenção da segurança dos cidadãos [36].
Por fim, pode-se estabelecer uma contraposição entre os fundamentos da teoria economicista de Gary Becker com a finalidade proposta pelos Juizados Especiais Criminais, uma vez que estes buscam a redução da utilização de penas de caráter privativo, e aquela (teoria) considera que o sistema penal deve possuir mecanismos que fixem preços -ou penas- para inibir os delitos, sendo, portanto, um confronto à criminologia crítica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Juizados Especiais Criminais, através dos institutos despenalizadores (da transação penal e da suspensão condicional do processo), oferece formidável contribuição ao sistema processual-penal brasileiro, uma vez que garante agilidade da Justiça, fazendo com que o Estado prontamente apresente respostas à criminalidade, no que concerne aos crimes de menor potencial lesivo, sendo, portanto, verdadeiros balizadores e meios de saída para obstar a privação de liberdade, desnecessária em alguns casos. Tais institutos se diferenciam dos encontrados no Direito Comparado uma vez que, nestes, o órgão da persecução tem livre arbítrio para escolher as medidas que pretende adotar, enquanto que no ordenamento pátrio as propostas são feitas em audiência pública pelo MP, que se restringe a delitos considerados "menores".
A respeito da utilização da Delação Premiada para a redução de penas, pode-se afirmar que esta, diferentemente da Teoria dos Jogos, se relaciona com o Processual Penal brasileiro no que tange à aplicação de penas, uma vez que não permite a condenação de alguém com base única e exclusivamente na palavra de co-réu, garantindo ainda ao acusado o direito ao contraditório e ampla defesa. Já a Teoria, e conseqüentemente, o dilema do prisioneiro, atribui a condenação (e imposição de penas) do autor do fato a partir do momento em que outro acusado incriminá-lo, sem que aquele tenha direito a se defender.
Por fim, vale ressaltar que a aplicação da Teoria dos Jogos só seria possível em face dos institutos despenalizadores, como exemplo, a transação, visto que é direito subjetivo do autor do fato aceitar (ou não) a proposta oferecida pelo membro do Parquet. Assim, é possível afirmar que ambos estão em um "jogo", em que cada um desenvolve diferentes estratégias visando à melhor solução, buscando-se assim, o
equilíbrio de Nash, que, como analisado, nem sempre é eficiente.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Notas
-
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso
de Processo Penal. 6ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 576.
- OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. op. cit. p. 577-578.
- NETO, Fernando da Costa Tourinho. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Juizados especiais federais cíveis e criminais: comentários à Lei 10.259, de 10.07.2001. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 515.
- Idem. op. cit. p. 489.
- OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. op. cit. p 576.
- GOMES, Marcus Alan de Melo. Culpabilidade e Transação penal nos Juizados Especiais Criminais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 83.
- CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 6ª ed. Saraiva, 2001, pág. 542 FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 709.
- OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. op. cit. p. 579.
- FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Manual de Processo Penal. op. cit. p. 590.
- GOMES, Olegário Gurgel Ferreira. A transação penal e o poder discricionário do Ministério Público. Dictionary of Criminal Justice Terms da Gould Publications. Disponível em: <http://isbndb.com/d/publisher/gould_publications.html>. Acesso em: 22 out 2010, p. 155.
- GOMES, Luiz Flávio. Suspensão Condicional do Processo. 2.ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 127.
- LIMA, 1999. p. 28
- OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. op. cit. 590.
- Ibidem, p. 29.
- MAIER, Julio B. J. Derecho procesal penal. 2. ed. 3. reimpr. Buenos Aires: Editores del Puerto, 2004, p.836.
- JESUS, Damásio de. Delação Premiada. Revista Justilex. Brasília, ano IV, n. 50, p. 26-27, fevereiro de 2006.
- BOLDT, Raphael. Delação premiada: o dilema ético. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 783, 25 ago. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7196>. Acesso em: 01 jun. 2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Penal. Habeas Corpus. HC nº 7526. Paciente: Noriel José de Freitas. Impetrante: Manoel Cunha Lacerda. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. Relator: Ministro Marco Aurélio, Brasília, DF, 12 de agosto de 1997.
- D. R. De Vasconcelos. Análise de estratégias utilizando verificação formal de modelos. Tese de mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2003. CartaCapital, 18/09/2002, p. 12
- NEUMANN, J; MORGENSTERN, O. Theory of games and economics behaviour. Cambridge: Harvard University Press, 1972.
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- Situação fática elaborada pelos alunos.
- RT, 572/239.
- Súmula 65 das "Mesas de Processo Penal" da USP.
- ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Sistema Penal Máximo X Cidadania Mínima: códigos da violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2003, p. 41-43.
- Tradução encontrada na tese de GUIMARÃES, Cláudio Alberto Gabriel. Análise Crítica ás Teorias Econômicas do Direito Penal. p. 781.
- GUIMARÃES, Cláudio Alberto Gabriel. Análise Crítica ás Teorias Econômicas do Direito Penal. p. 780.