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A prisão processual, a fiança, a liberdade provisória e as demais medidas cautelares.

Comentários à Lei nº 12.403/11

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Agenda 18/05/2011 às 09:59

III – DA PRISÃO EM FLAGRANTE

Passemos agora a analisar as alterações feitas no Capítulo II – Da Prisão em Flagrante; aqui apenas foram modificados os arts. 306 e 310. No art. 306 determina-se que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre sejam comunicados imediatamente ao Juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada, em conformidade com o disposto no art. 5º., LXII e LXIII da Constituição.

Determina-se, outrossim, que em até vinte e quatro horas após a realização da prisão, será encaminhado ao Juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. Neste mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.  Entendo que a não observância de qualquer das exigências acima referidas enseja o relaxamento da prisão, por evidente ilegalidade ou abuso de poder; caso o Juiz não o faça, será o caso de cabimento de impetração de habeas corpus, sem prejuízo do disposto no art. 4º., "d", da Lei nº. 4.898/65 (Crimes de Abuso de Autoridade).

No art. 310 estabelece-se que o Juiz de Direito deverá, fundamentadamente, ao receber o auto de prisão em flagrante, tomar uma das três seguintes decisões: a) relaxar a prisão ilegal (aquela cujo auto de prisão em flagrante não observou os requisitos legais acima indicados); b) converter a prisão em flagrante (legalmente lavrado) em prisão preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão [38]; c) conceder liberdade provisória, com ou sem fiança (ver adiante).

Neste momento, se o Juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Código Penal (causas excludentes de ilicitude), poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória (sem fiança), mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. Trata-se, aqui, de liberdade provisória, sem fiança, vinculada, porém ao comparecimento aos atos processuais. Nada impede, igualmente, que a liberdade provisória aqui prevista seja cumulada com outra medida cautelar.


IV – DA PRISÃO PREVENTIVA

No Capítulo III – Da Prisão Preventiva, foram modificados os arts. 311 a 315, restando incólume apenas o art. 316 que continua a estabelecer a cláusula rebus sic stantibus em relação à prisão preventiva.

O primeiro dos artigos deste Capítulo estabelece que em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. Observa-se que a prisão preventiva só poderá ser decretada de ofício pelo Juiz durante a fase processual; antes, ou seja, no curso de uma investigação criminal, apenas quando instado a fazê-lo, seja pelo Ministério Público, seja pela Polícia (como se sabe, na fase inquisitorial não há querelante nem assistente). Como já afirmamos acima a respeito das demais medidas cautelares, ainda que haja esta limitação, parece-nos que no sistema acusatório é absolutamente desaconselhável permitir-se ao Juiz a possibilidade de, ex officio, ainda que em Juízo, decidir acerca de uma medida cautelar de natureza criminal (veja-se o que foi acima escrito sobre o assunto).

Entendemos que caso a prisão preventiva tenha sido determinada ainda na fase investigatória, urge que a peça acusatória seja oferecida em até cinco dias (art. 46 do Código de Processo Penal), pois se há justa causa para a decretação da prisão preventiva (fumus commissi delicti), obviamente que também há para o exercício da ação penal (indícios suficientes da autoria e prova da existência do crime). Caso não haja tempestivamente o oferecimento da peça acusatória, a prisão deverá ser revogada, pois patente o constrangimento ilegal. Se não o for, cabível será a ordem de habeas corpus.

Em relação à possibilidade do assistente da acusação requerer a decretação da prisão preventiva, entendemos como uma possibilidade limitada, apenas quando for por conveniência da instrução criminal ou quando for cabível como substituição de medida cautelar anteriormente decretada, especialmente aquelas indicadas no art. 319, IV e VIII. Este entendimento baseia-se no fato de que "a razão de se permitir a ingerência do ofendido em todos os termos da ação penal pública, ao lado do Ministério Público, repousa na influência decisiva que a sentença da sede penal exerce na sede civil", como explica Tourinho Filho embasado nas lições de Florêncio de Abreu e Canuto Mendes de Almeida [39]. Para nós, acertada é esta posição, pois só entendemos legítima a atuação do ofendido como assistente quando configurado estiver o seu interesse em uma posterior indenização pelo dano sofrido. Logo, sempre que da infração penal advier prejuízo de qualquer ordem para o ofendido, este estaria legitimado a se habilitar como assistente para pleitear depois a ação civil ex delicto, executando a sentença penal condenatória [40]. Logo, não há interesse por parte do assistente em requerer a prisão preventiva invocando outros requisitos que não tenham relação com a sua intervenção no processo penal (para a aplicação da lei penal, por exemplo, ou garantia da ordem pública...).

Observa-se que de há muito a intervenção do ofendido no processo penal vem sendo questionada, muitos a contestando sob o argumento de que caberia ao Estado exclusivamente exercer as funções persecutórias em matéria penal, pois se admitir a intervenção do particular seria aceitar que "su papel en el proceso parece estar teñido de una especie de sentimiento de venganza". [41]

Analisando o Direito português, por exemplo, o mestre lusitano Germano Marques da Silva esclarece que a "intervenção dos particulares no processo penal é por muitos contestada por poder constituir um factor de perturbação, pois não é de esperar deles a objectividade e a imparcialidade que devem dominar o processo penal, mas é também por muitos outros considerada como uma excelente e democrática instituição e assim o entendemos também". [42]

Feitas estas observações, voltemos à análise do texto legal...

Continuam sendo requisitos para a prisão preventiva: a) garantia da ordem pública (desgraçadamente); b) garantia da ordem econômica (idem, mas menos mal); c) por conveniência da instrução criminal; d) para assegurar a aplicação da lei penal.

Além destes, podem ser também indicados como requisitos legais para a decretação da prisão preventiva, nos termos da nova lei, os seguintes: a) o descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (tal como já previsto no art. 282, § 4o.); b) a garantia para a execução de medidas protetivas de urgência estabelecidas em relação a determinadas vítimas (mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência).

Aqui está consubstanciada a necessidade indispensável para a decretação da prisão preventiva, o chamado periculum libertatis.

Lamentavelmente continuamos a ter como um dos requisitos para a decretação da prisão preventiva a "garantia da ordem pública", conceito por demais genérico e, exatamente por isso, impróprio para autorizar uma custódia provisória que, como se sabe, somente se justifica no processo penal como um provimento de natureza cautelar (presentes o fumus commissi delicti e o periculum libertatis). Há mais de dois séculos Beccaria já preconizava que "o réu não deve ficar encarcerado senão na medida em que se considere necessário para o impedir de escapar-se ou de esconder as provas do crime" [43], o que coincide com dois outros requisitos da prisão preventiva em nosso País (conveniência da instrução criminal e asseguração da aplicação da lei penal).

Decreta-se a prisão preventiva no Brasil, muitas vezes, sob o argumento de se estar resguardando a ordem pública, quando, por exemplo, quer-se evitar a prática de novos delitos pelo imputado ou aplacar o clamor público. Não raras vezes vê-se prisão preventiva decretada utilizando-se expressões como "alarma social causado pelo crime" ou para "aplacar a indignação da população", e tantas outras frases (só) de efeito.

A respeito, veja-se a preocupação dos juristas espanhóis Gimeno Sendra, Moreno Catena e Cortés Dominguez:

"Tampoco puede atribuirse a la prisión provisional un fin de prevención especial: evitar la comisión de delitos por la persona a la que se priva de libertad. La propia terminología más frecuentemente empleada para expresar tal idea – probable comisión de ´otros´ o ´ulteriores´ delitos – deja entrever que esta concepción se asienta en una presunción de culpabilidad. (…) Por las mismas razones no es defendible que la prisión provisional deba cumplir la función de calmar la alarma social que haya podido producir el hecho delictivo, cuando aún no se ha determinado quién sea el responsable. Sólo razonando dentro del esquema lógico de la presunción de culpabilidad podría concebirse la privación en un establecimiento penitenciario, el encarcelamiento del imputado, como instrumento apaciguador de las ansias y temores suscitados por el delito. (…) La vía legítima para calmar la alarma social – esa especie de ´sed de venganza´ colectiva que algunos parecen alentar y por desgracia en ciertos casos aflora – no puede ser la prisión provisional, encarcelando sin más y al mayor número posible de los que prima facie aparezcan como autores de hechos delictivos, sino una rápida sentencia sobre el fondo, condenando o absolviendo, porque sólo la resolución judicial dictada en un proceso puede determinar la culpabilidad y la sanción penal."

[44]

Ressaltamos que o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim, deferiu em parte a liminar pedida no Habeas Corpus nº. 84548, pois considerou que o decreto de prisão preventiva do acusado teria se desviado dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, por lhe faltar as indicações do que consiste a periculosidade do paciente e a quais riscos a ordem pública estaria exposta se ele respondesse à ação penal em liberdade, salientando, outrossim, que o entendimento do STF não permite que clamor público sirva como fundamento para a prisão preventiva. Ele observou que o acusado sempre colaborou com a instrução criminal e as investigações. Assim, o Ministro deferiu a liminar para revogar a prisão preventiva, se por outro motivo o acusado não estiver preso.

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Na Itália, o Juiz de Instrução Criminal do Tribunal de Pádua, Palombarini, assim decidiu acerca da prisão preventiva:

"Pena e prisão preventiva têm diversa natureza jurídica, diferentes objectivos, diversa função... Para decidir se uma certa garantia individual deve aplicar-se a um determinado instituto, é necessário atender, em primeiro lugar, à incidência do mesmo instituto sobre a esfera do indivíduo. Ora a prisão preventiva – embora diversa, como se disse, da pena – traduz-se para o indivíduo numa restrição total de sua liberdade. Diferentes os institutos, idênticos os valores em jogo e o perigo de lesão do fundamental direito da liberdade." [45]

Em outra oportunidade, a 1ª. Turma do Supremo Tribunal Federal concedeu habeas corpus (Processo nº. 84778) a um servidor público que responde a processo pela prática de três crimes de concussão (art. 316 do Código Penal). O Ministro Sepúlveda Pertence, relator do processo, concedeu a ordem para revogar o decreto de prisão preventiva e permitir que o réu aguarde o julgamento da apelação em liberdade. Consoante Pertence, não há como falar em conveniência da instrução criminal se esta já terminou, nem invocar a garantia da ordem pública para não comprometer a imagem do Poder Judiciário. "Já repisei minha convicção acerca da ilegitimidade constitucional da prisão preventiva fundada na necessidade de satisfazer a ânsias populares de repressão imediata em nome da credibilidade das instituições públicas, dentre elas o Poder Judiciário", afirmou. Para o Ministro, tais considerações "desvelam o abuso da prisão processual para fins não cautelares, seja o de antecipação da pena, que aborrece a presunção da não-culpabilidade, seja a instrumentalização do encarceramento do acusado para a popularização do Judiciário, que repugna o princípio fundamental da dignidade humana". Por fim, sustentou o relator não ser motivo idôneo para a prisão preventiva a invocação da gravidade do crime ou o prestígio e a credibilidade do Judiciário. O voto do ministro-relator foi acompanhado pelos demais integrantes da Primeira Turma.

Em um outro caso, um advogado acusado de participar da organização que operava fraudes fiscais no ramo do comércio de combustíveis respondeu às acusações em liberdade. A decisão foi tomada pela 1ª. Turma do Supremo Tribunal Federal. Nesta oportunidade, todos os Ministros da Turma seguiram o voto do relator, Ministro Sepúlveda Pertence, salientando "que o Supremo tem negado a manutenção de prisão preventiva quando o motivo é a invocação da gravidade do crime imputado." O Ministro Marco Aurélio sustentou que "há de se aguardar a comprovação do fato criminoso a cargo do Ministério Público para posteriormente ter-se as conseqüências." (HC nº. 85068).

Em outra decisão recente, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, concedeu duas liminares, em habeas corpus, a dois condenados por seqüestro, emasculação e assassinato de menores em Altamira, no Pará, entre 1989 e 1992. Nas decisões monocráticas, o Ministro Marco Aurélio destacou que os condenados são réus primários, têm bons antecedentes e estão presos há mais de um ano. Afirmou que a circunstância de os condenados viverem em unidades da Federação diversas daquela em que foram julgados não é motivo para ensejar, por si só, a custódia, "afigurando-se o recolhimento como execução precoce, açodada, temporã do título judicial, sujeito ainda a modificação, em face da recorribilidade ordinária", observando, ainda, que "o barulho da turba, a repercussão dos acontecimentos na sociedade, na mídia, não podem servir à execução precoce da pena". (HC-85223).

Também a 1ª. Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou liminar do Ministro Eros Grau que concedeu liberdade provisória para um policial acusado de assassinar um Delegado da Polícia Civil em Minas Gerais. O Ministro Eros Grau, ao deferir o pedido de habeas corpus e libertar o acusado, afirmou que os fundamentos no clamor público e na repercussão do caso não são "idôneos" para a manutenção da prisão preventiva. Na decisão, ele relacionou julgamentos do Supremo nesse sentido. (HC-85046).

Ainda sobre este requisito da "ordem pública", anota Bruno César Gonçalves da Silva (no artigo intitulado: "Uma vez mais: da ´Garantia da ordem pública` como fundamento de decretação da prisão preventiva"):

"Entre os juristas brasileiros que se insurgiram contra a prisão preventiva com fundamento na "garantia da ordem pública", destaca-se Gomes Filho (1991), que demonstrou-nos não possuir a idéia de "ordem pública" caráter instrumental relacionado com os meios e fins do processo, veja-se: À ordem pública relacionam-se todas aquelas finalidades do encarceramento provisório que não se enquadram nas exigências de caráter cautelar propriamente ditas, mas constituem formas de privação da liberdade adotadas como medidas de defesa social; fala-se, então, em "exemplaridade", no sentido de imediata reação ao delito, que teria como efeito satisfazer o sentimento de justiça da sociedade; ou, ainda, em prevenção especial, assim entendida a necessidade de se evitar novos crimes; uma primeira infração pode revelar que o acusado é acentuadamente propenso a práticas delituosas ou, ainda, indicar a possível ocorrência de outras, relacionadas à supressão de provas ou dirigidas contra a própria pessoa do acusado. (GOMES FILHO, 1991, p. 67-68). Delmanto Júnior (1998), comentando a decretação da prisão preventiva com base na garantia da ordem pública, considera ser indisfarçável que nesses termos a prisão preventiva se distancia de seu caráter instrumental - de tutela do bom andamento do processo e da eficácia de seu resultado - ínsito a toda e qualquer medida cautelar, servindo de instrumento de justiça sumária, vingança social etc. (DELMANTO JUNIOR, 1998, p.156). sim, dúvida não resta que falta à prisão preventiva decretada com base na "garantia da ordem pública" caráter instrumental inerente a toda medida cautelar, pois, esta visa assegurar os meios e os fins do processo, ao passo que na "ordem pública" não se vislumbra este caráter, não possuindo tal expressão limites rígidos para a sua definição, dando azo ao arbítrio e a casuísmos na restrição da liberdade. O apelo à forma genérica e retórica da "garantia da ordem pública" representa a possibilidade de superação dos limites impostos pelo princípio da legalidade estrita, propiciando um amplo poder discricionário ao juiz com "uma destinação bastante clara: a de fazer prevalecer o interesse da repressão em detrimento dos direitos e garantias individuais". (GOMES FILHO, 1991, p. 66)."

E conclui este autor:

"A garantia da ordem pública não possui caráter cautelar propriamente dito, tendo na verdade finalidades que ora são meta-processuais, ora são exclusivas das penas. As interpretações dadas à expressão "garantia da ordem pública" são violadoras do princípio da presunção de inocência, pois, ou desconsideram a avaliação da necessidade da medida, ou se fundam em presunções e antecipações do juízo de culpabilidade. Devemos na interpretação e aplicação das medidas cautelares, nos libertarmos dos resquícios do autoritarismo e assimilarmos a nova orientação constitucional, lembrando-nos sempre que, dentro deste novo paradigma, os fins nunca podem justificar os meios."

Não esqueçamos, igualmente, que o art. 30 da Lei nº. 7.492/86, que define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, estabelece estupidamente mais uma possibilidade de se decretar a prisão preventiva: a "magnitude da lesão causada", termo que, assim como "ordem pública", é por demais genérico e, por conseguinte, desaconselhável em se tratando de norma privativa da liberdade.

Nada obstante esta observação, o certo é que a jurisprudência vem reiteradamente decretando a prisão preventiva com fulcro neste requisito; assim, por exemplo, o Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, negou pedido de liberdade provisória solicitado por um acusado de participar de uma organização criminosa envolvida com crimes financeiros e lavagem de dinheiro em vários estados brasileiros. Em sua decisão, o relator lembrou que as investigações dão conta de que os presos participariam "de uma sofisticada organização criminosa, de aprimorado modo de atuação". Essa quadrilha contaria inclusive, ressaltou o Desembargador, com o auxílio de servidores públicos, o que dificultaria a fiscalização por parte dos órgãos competentes. Assim, afirmou, a prisão apresenta-se como imprescindível para a garantia da ordem pública. "Em liberdade, tudo leva a concluir que o agente continuará na prática delituosa", salientou o Magistrado. A necessidade de imposição da prisão também se justifica para garantir a coleta de provas "sem a interferência dos integrantes da organização" e a eventual aplicação da lei penal, uma vez que os membros da quadrilha possuem "enorme facilidade" para fugir. O Desembargador ainda lembrou que, de acordo com a decisão da 1ª. Vara Federal Criminal, parte dos valores arrecadados através dos delitos teriam sido enviados para o exterior, destacando, outrossim, o resguardo da ordem econômica e a magnitude dos danos econômicos decorrentes da atuação delituosa como justificativa para a manutenção da prisão. (Processos nºs. 2005.04.01.013110-1; 2005.04.01.015015-6 e 2005.04.01.015066-1).

Em outra decisão, a 7ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou habeas corpus a dois acusados de crime contra o sistema financeiro nacional. No julgamento do mérito do habeas corpus, a Turma, por maioria, negou o pedido de liberdade. Os Desembargadores Federais Tadaaqui Hirose e Maria de Fátima Freitas Labarrère argumentaram que a magnitude da lesão (os réus teriam movimentado cerca de 530 milhões de dólares nas contas no exterior) e o risco à ordem pública justificam a decretação da prisão. (HC 2005.04.01.015120-3/PR).

Em sentido contrário, veja-se:

"TRF 4ª REGIÃO - HABEAS CORPUS Nº. 2004.04.01.017015-1/PR (DJU 09.06.2004, SEÇÃO 2, P. 634, J. 18.05.2004) - RELATOR: Des. Federal JOSÉ LUIZ B. GERMANO DA SILVA - Não obstante o art. 30 da Lei nº 7492/86 determine que a prisão preventiva do acusado da prática de crime contra o sistema financeiro nacional poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada, sua legitimação depende da satisfação dos pressupostos insculpidos no art. 312 do CP.".

"A elevada monta da sonegação fiscal não justifica a decretação da prisão preventiva do agente, tratando-se, sim, de elemento a ser considerado por ocasião da dosimetria da pena, em eventual condenação." (TRF 3ª R. 2ª T. - RSE 2008.61.05.008828-2 – rel. Nelton dos Santos – j. 21.07.2009 – DJU 06.08.2009).

Evidentemente que este requisito não pode ser levado em conta para se decretar uma prisão preventiva, mesmo porque, "nota-se que a magnitude da lesão é conseqüência do crime, fator que deve ser levado em consideração para a aplicação da pena (art. 59, CP)." Logo, "este dispositivo é flagrantemente inconstitucional, sua aplicação virá a macular todos os atos que se lhe seguirem": eis a lição de Roberto Podval. [46] Manoel Pedro Pimentel já perguntava: "Como se há de aferir esse elemento normativo – magnitude da lesão causada – se não for através de critério subjetivo, que pode variar amplamente, já que a lei não define quantitativa ou qualitativamente tal magnitude?" [47]

Neste sentido, por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal concedeu Habeas Corpus (HC 99210). A decisão confirmou liminar concedida pelo relator do processo, Ministro Eros Grau. O juiz levou em conta o poderio econômico do acusado e a magnitude da lesão gerada aos cofres públicos, que alcançaria a cifra de R$ 241 milhões. "O decreto prisional funda-se na magnitude da lesão e na presunção de que os pacientes [os acusados] reiterariam nos crimes a eles imputados, o que, na linha de entendimento consolidado nesta Corte, não se presta à decretação da prisão preventiva", disse o Ministro Eros Grau. O Ministro citou ainda precedentes do STF no sentido de que a magnitude da lesão causada por um suposto crime não justifica de maneira autônoma a prisão cautelar. Todos os ministros presentes à sessão seguiram o voto do relator.

A propósito, vejamos a lição de Robert Dworkin:

"O direito penal poderia ser mais eficiente se desconsiderasse essa distinção problemática e encarcerasse homens ou os forçasse a aceitar tratamento sempre que isso parecesse ter probabilidade de reduzir crimes no futuro. Mas isso, como sugere o princípio de Hart, significaria cruzar a linha que separa tratar alguém como ser humano e como nosso próximo e tratá-lo como um recurso para o benefício dos outros. Para as convenções e práticas de nossa comunidade, não pode haver insulto mais profundo que esse. O insulto é da mesma grandeza quando o processo recebe o nome de punição ou tratamento. É verdade que algumas vezes impomos restrições e submetemos a tratamento um homem apenas porque acreditamos que ele não tem controle sobre sua conduta. Fazemos isso com base em leis que regem a custódia de civis e, de modo geral, após um homem ter sido absolvido de um crime sério com base numa alegação de insanidade. Mas devemos reconhecer o compromisso de princípio que essa política implica. Deveríamos tratar um homem contra a sua vontade apenas quando o perigo que ele representa é real e não sempre que calculamos que o tratamento poderá reduzir a ocorrência de crimes, se for adotado." [48]

Pois bem. Vistos os requisitos, analisemos o pressuposto da prisão preventiva.

Como pressuposto da medida extrema temos o fumus commissi delicti, ou seja, a demonstração cabal e induvidosa de prova da existência de determinados crimes e indício suficiente de autoria (o que coincide com a justa causa para a ação penal, nos termos do art. 395, III do Código de Processo Penal).

Ainda em relação ao fumus commissi delicti, a prisão preventiva, em regra, só poderá ser decretada em relação aos supostos autores de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos, a não ser se o indiciado ou acusado tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado (ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Código Penal), ou se o delito envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência (aqui está um requisito específico para esta última hipótese). Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Observa-se, portanto, que, excepcionalmente (mesmo porque a prisão preventiva só será decretada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, nos termos do art. 282), permite-se a prisão preventiva mesmo em crime culposo e qualquer que seja a pena privativa de liberdade cominada. Não seria mais necessária a demonstração daqueles outros requisitos (garantia da ordem pública ou econômica, conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal).

Obviamente, mais uma vez não se observou o princípio da proporcionalidade [49], perfeitamente exigível quando se trata de estabelecer requisitos e pressupostos para a prisão provisória; aqui, pode-se prender preventivamente quando, muito provavelmente, não haverá aplicação de uma pena privativa de liberdade quando da sentença condenatória.

Como ensina Alberto Bovino, não é possível "que a situação do indivíduo ainda inocente seja pior do que a da pessoa já condenada, é dizer, de proibir que a coerção meramente processual resulte mais gravosa que a própria pena. Em conseqüência, não se autoriza o encarceramento processual, quando, no caso concreto, não se espera a imposição de uma pena privativa de liberdade de cumprimento efetivo. Ademais, nos casos que admitem a privação antecipada da liberdade, esta não pode resultar mais prolongada que a pena eventualmente aplicável. Se não fosse assim, o inocente se acharia, claramente, em pior situação do que o condenado. " [50]

Entendemos, pois, incabível a decretação da prisão preventiva naqueles casos, pois, "não obstante o fato de ocorrer exclusivamente em sede parlamentar a atuação do princípio da proporcionalidade, isso não significa que as disposições normativas penais não possam ser submetidas a um eventual controle constitucional acerca da proporção nelas contidas. Não apenas isto é permitido, mas, acima de tudo, é recomendável quando alguma dúvida houver neste sentido." [51]

Com o mesmo entendimento, Gimeno Sendra, Moreno Catena e Cortés Domínguez, advertem que "las medidas cautelares son homogéneas, aunque no idénticas, con las medidas ejecutivas a las que tienden a preordenar." [52]

Segundo Humberto Ávila, "um meio é proporcional quando o valor da promoção do fim não for proporcional ao desvalor da restrição dos direitos fundamentais. Para analisá-lo é preciso comparar o grau de intensidade da promoção do fim com o grau de intensidade da restrição dos direitos fundamentais. O meio será desproporcional se a importância do fim não justificar a intensidade da restrição dos direitos fundamentais." [53]

Antonio Scarance Fernandes:

"(...) Se o réu apenas pode ser considerado culpado após sentença condenatória transitada em julgado, a prisão, antes disso, não pode configurar simples antecipação de pena, somente se justificando quando tiver natureza cautelar. Em suma, qualquer prisão durante o processo, para não haver ofensa ao princípio da presunção de inocência, deve ter natureza cautelar e não pode significar antecipação de pena, pois esta, necessariamente, deve ocorrer de sentença condenatória transitada em julgado." [54]

O entendimento esposado decorre da incidência doprincípio da homogeneidade, tratado com bastante propriedade por Paulo Rangel [55]:

"A homogeneidade da medida é exatamente a proporcionalidade que deve existir entre o que está sendo dado e o que será concedido. Exemplo: admite-se prisão preventiva em um crime de furto simples? A resposta é negativa. Tal crime, primeiro, permite a suspensão condicional do processo. Segundo, se houver condenação, não haverá pena privativa de liberdade face à possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos. Nesse caso, não haveria homogeneidade entre a prisão preventiva a ser decretada e eventual condenação a ser proferida. O mal causado durante o curso do processo é bem maior do que aquele que, possivelmente, poderia ser infligido ao acusado quando do seu término. Entendemos, em uma visão sistemática do sistema penal como um todo, que, nos crimes de médio potencial ofensivo, ou seja, aqueles que admitem a suspensão condicional do processo (cf. art. 89 da Lei 9.099/95,) não mais se admite prisão cautelar."

Em sentido convergente, é o escólio de Roberto Delmanto Júnior [56]: "Aliás, a garantia constitucional de que o acusado não pode ser considerado culpado antes de passada em julgado a condenação jamais poderia admitir interpretação que acabasse por impor-lhe encarceramento com intensidade mais grave daquele que lhe seria infligido caso ele fosse realmente considerado culpado".

Vejamos a doutrina estrangeira, a começar por Julian Lopez Masle e Maria Inês Horvitz: "(...) el principio de inocência no excluye, de plano, la posibilidad de decretar medidas cautelares de carácter personal durante el procedimiento. En este sentido, instituiciones como la detención o la prisión preventiva resultan legitimadas, en principio, siempre que no tengan por consecuencia anticipar los efectos de la sentencia condenatória sino asegurar fines del procedimiento" [56]

Também Alberto M. Binder: "Já vimos que todas as medidas de coerção penal são, em princípio, excepcionais. Dentro dessa excepcionalidade, a utilização da prisão preventiva deve ser muito mais restringida e, para assegurar essa restrição devem ser considerados dois tipos de suposição. Em primeiro lugar, não se pode aplicar a prisão preventiva se não existe um mínimo de informação que fundamente uma suspeita sobre limite essencial e absoluto: se não existe sequer uma suspeita racional e com fundamento de que uma pessoa possa ser autora de um fato punível, de maneira nenhuma é admissível uma prisão preventiva. Porém, este requisito não é suficiente. Por mais que se tenha uma suspeita com fundamentos, tampouco seria admitida constitucionalmente a prisão preventiva se não houverem outros requisitos, os chamados ‘requisitos processuais’. Estes se fundamentam em que a prisão preventiva seja direta e claramente necessária para assegurar a realização do julgamento ou assegurar a imposição da pena." [57]

No Brasil, Eugênio Pacelli de Oliveira afirma que "se o efeito de prevenção positiva diz respeito ao estímulo e renovação da confiança no Direito (Roxin), bem como na preservação da identidade normativa da comunidade juridicamente organizada (Jakobs) – abstraído o respectivo conteúdo do Direito, mas pressuposta a sua legitimação -, a idéia da evitação urgente e acautelatória da permanência de atividades criminosas pode ser um referencial para a compreensão de semelhante modalidade de prisão.Obviamente, para impedir a prática de delitos, em tese, já existe a proibição da Lei penal. Mas, isso, como é óbvio, apenas no plano abstrato. Não evitada, porém, concretamente, há um lapso temporal absolutamente indispensável para a aplicação da sanção correspondente, até por exigência do citado devido processo penal, por meio do qual se buscará a comprovação da existência material do crime e de sua autoria. Nesse passo, empiricamente demonstrada e, por isso, considerada a possibilidade de reincidência delituosa, presente em todo o mundo ocidental e pelas mais variadas razões – aliás, a questionar todo o universo punitivo (eficácia preventiva da pena, a privação da liberdade e tudo o mais) -, a previsão de uma prisão anterior à condenação poderá se instituir como válida, para fins de garantia da ordem pública, desde que delimitada rigorosamente a sua extensão." [58]

Vejamos a jurisprudência:

"Imperioso observar a possível desproporcionalidade de se atingir a liberdade pessoal do acusado, como custódia cautelar ante a bastante provável aplicação de condenação final apenas restritiva de direitos. Ordem de habeas corpus concedida" (TRF 3ª R. - 5ª T. HC 2008.03.00.050617-2 – rel. Erik Gramstrup – j. 02.02.2009 – DJU 20.02.2009).

"Mesmo em caso de condenação, ao paciente, será aplicado regime menos severo do que aquele em que se encontra, sendo, portanto, a manutenção de sua segregação cautelar afronta ao princípio da homogeneidade. Diante do deferimento de medidas protetivas em favor da vítima e da inexistência de qualquer dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não há como manter a prisão preventiva do paciente que, todavia, poderá ser novamente decretada, nos termos do art. 316 do mesmo diploma legal, se sobrevierem motivos ensejadores da espécie. Constrangimento ilegal configurado. Ordem concedida" (TJMT – 2ª C. – HC 115068/08 – rel. Paulo da Cunha – j. 26.11.2008 – DOE 10.11.2008).

"TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO - PRIMEIRA TURMA - 2006.03.00.073226-6 25097 HC-SP - RELATOR: DES. FED. LUIZ STEFANINI –Uma vez fixado o regime aberto é o caso de se aplicar o princípio da proporcionalidade quanto à prisão cautelar no caso dos autos. As pacientes foram condenadas a penas privativas de liberdade inferiores a 4 anos a serem cumpridas em regime inicial aberto, tendo, ainda, a nobre juíza a quo as substituído por penas restritivas de direitos, nos termos do artigo 44 do CP. 2- A sentença transitou em julgado para o Ministério Público conforme informação contida nos autos. Considerando-se a proibição da reformatio in pejus, constante do artigo 617 do CPP e o trânsito em julgado da citada sentença para o Ministério Público, a pena máxima prevista para o crime das pacientes não poderá ser maior do que o já estipulado, nem o regime inicial de cumprimento outro que não o aberto, não sendo nem mesmo possível a revogação da substituição da penas por outras restritivas de direitos. 3- É de se aplicar na hipótese o princípio da proporcionalidade, não havendo que se falar em decretação da prisão preventiva."

Vejamos este trecho do voto:

"(...) A Constituição Federal vigente, ao consagrar o princípio da presunção de inocência no inciso LVII de seu artigo 5º, determinou grande restrição interpretativa à chamada prisão cautelar, na medida em que tornou exceção a segregação de um acusado antes do trânsito em julgado de sentença condenatória. Este princípio deve também ser aplicado ao instituto da prisão preventiva, que só será admitida para fins processuais, jamais como forma de antecipação de pena, pelo que, para sua ocorrência, devem estar preenchidos os requisitos do artigo 312 do CPP. Na consagração do princípio da presunção de inocência, vemos a preocupação do legislador constituinte no resguardo de um direito dos mais importantes, fundamental a cada cidadão: a liberdade. Com efeito, deve o aplicador do direito ter em mente sempre o supremo valor dado pelo constituinte ao direito de liberdade do indivíduo ao interpretar as normas legais, só consentindo em restringi-la quando profundamente necessário. Ora. Em decorrência deste raciocínio, surge o princípio da proporcionalidade na aplicação da segregação cautelar. De acordo com este princípio, a prisão cautelar (como são a prisão preventiva, a prisão em flagrante, etc.), que é expediente lesivo à esfera jurídica do acusado ou investigado, na medida em que lhe restringe a liberdade, não deve ser aplicada quando impossível a privação da liberdade no caso de eventual condenação, ainda que presentes os requisitos autorizadores. É o que leciona, entre outros, Maurício Zanoide de Moraes (in Código de Processo Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, v. 3, ed. Revista dos Tribunais, São Pulo, 2004, pg. 208), a respeito da prisão em flagrante:"Em outras situações, caberá ao julgador fazer essa análise de necessidade e oportunidade em cada caso concreto: por exemplo, quando verificar que à infração imputada àquele agente haverá, mesmo em caso de condenação, a substituição da pena privativa de liberdade eventualmente aplicável por outra pena restritiva de direito e/ou multa.(...) Não poderá o juiz manter a prisão em flagrante (neste caso), sob pena de tornar o processo mais punitivo que a sanção penal abstratamente prevista para o crime. Em termos ilustrativos: tornará os efeitos colaterais do remédio (a prisão em flagrante) pior do que os efeitos da própria doença (pena a ser imposta em eventual condenação futura)." Este entendimento, não há dúvida, deve ser aplicado à prisão preventiva, não obstante a ausência de disposição expressa neste sentido quanto a esta modalidade de prisão cautelar, como a que existe quanto ao flagrante em delitos de menor potencial ofensivo (parágrafo único do artigo 69 da Lei 9.099/95). É o caso de se aplicar o princípio da proporcionalidade quanto à prisão cautelar nestes autos. As pacientes foram condenadas a penas privativas de liberdade inferiores a 4 anos a serem cumpridas em regime inicial aberto, tendo, ainda, a nobre juíza a quo as substituído por penas restritivas de direitos, nos termos do artigo 44 do CP (sentença às fls. 16/40). Além disso, transitou a sentença em julgado para o Ministério Público em 31 de julho de 2006, conforme informação de fl. 69. Pois bem. Considerando-se a proibição da reformatio in pejus, constante do artigo 617 do CPP e o trânsito em julgado da citada sentença para o Ministério Público, a pena máxima prevista para o crime das pacientes não poderá ser maior do que o já estipulado, nem o regime inicial de cumprimento outro que não o aberto, não sendo nem mesmo possível a revogação da substituição da penas por outras restritivas de direitos. Assim, pelo princípio da proporcionalidade, impossível de faz a decretação de prisão preventiva no caso em questão. Ante o exposto, meu voto é pela CONCESSÃO DA ORDEM."

A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região concedeu habeas corpus aos presos na Operação Big Brother da Polícia Federal. A defesa argumentou ainda que a pena para esses crimes seria provavelmente inferior a quatro anos, ou seja, os réus, ainda que condenados, teriam o benefício de prestarem pena alternativa, em regime aberto, sendo desproporcional a manutenção da prisão preventiva. Após analisar o recurso, o Desembargador Néfi Cordeiro decidiu submeter o pedido à 7ª. turma, que entendeu não haver mais necessidade da medida cautelar, decidindo, por unanimidade, conceder a ordem. (HC 2005.04.01.0011606-9/PR).

Destarte, será preciso muito cuidado dos Juízes ao decretarem a prisão preventiva em crimes punidos com prisão (reclusão ou detenção) com pena máxima inferior ou igual a quatro anos, pois é preciso que se faça uma interpretação sistemática com o art. 282 do Código, sendo preferível optar-se por outra medida cautelar menos gravosa.

Por fim, tomou a lei o cuidado de lembrar aos Juízes que a decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada, advertência, aliás, absolutamente desnecessária, à luz da exigência já constante no art. 93, IX da Constituição

Igualmente, a prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Código Penal (excludentes de ilicitude). 

Sobre o autor
Rômulo de Andrade Moreira

Procurador-Geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos do Ministério Público do Estado da Bahia. Foi Assessor Especial da Procuradoria Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador - UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e Membro fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente exercendo a função de Secretário). Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação dos Cursos JusPodivm (BA), Praetorium (MG) e IELF (SP). Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados no Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA, Rômulo Andrade. A prisão processual, a fiança, a liberdade provisória e as demais medidas cautelares.: Comentários à Lei nº 12.403/11. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2877, 18 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19131. Acesso em: 5 nov. 2024.

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