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A morosidade no Judiciário em confronto com a função social do processo.

O clamor público pela efetividade da tutela jurisdicional

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Agenda 06/09/2011 às 16:16

2. A FUNÇÃO SOCIAL DO PROCESSO EM CONFRONTO COM A MOROSIDADE DO PROCESSO JUDICIAL

Por fim, é interessante tecer algumas considerações a respeito da função social do processo, por ser este tema intimamente ligado à questão da morosidade judicial, uma vez que um processo moroso não alcança satisfatoriamente à funcionalidade exigida socialmente ao processo judicial.

Para J. J. Calmon de Passos, função é "um atuar a serviço de algo que nos ultrapassa", completando seu argumento dizendo que a função social, via de consequência, "pode ser entendida como o resultado que se pretende obter com determinada atividade do homem ou de suas organizações, tendo em vista interesses que ultrapassam os do agente" (PASSOS, 1997, p. 01).

Resumindo, o que é relevante para que determinado indivíduo ou instituição humana cumpra sua função social são as conseqüências que ela acarreta para o convívio social. E, neste caso, o processo cumpre sua função social na medida em que ajuda a construir o Direito, dando aplicabilidade ao que está previsto abstratamente nas normas jurídicas e construindo precedentes jurisprudenciais, influindo, por conseguinte, na vida e no cotidiano de todos integrantes da sociedade, até mesmo àqueles que não têm interesse direto na demanda.

Função do processo jurisdicional, portanto, sempre foi e será, a aplicação, ao caso concreto, da decisão política previamente posta pelo poder político institucionalizado como expectativa compartilhada. Num Estado de Direito Democrático, porque soberano o povo, o processo jurisdicional tem a função de implementar, no caso concreto, a sua vontade, formalizada, na lei, em termos de expectativas compartilhadas, previamente postas para determinar segurança e previsibilidade ao conviver dos homens. Sem prejuízo de que, na sua aplicação, tenham os operadores a liberdade criadora que os cânones da racionalidade e cientificidade do Direito possam proporcionar, contida pela efetiva possibilidade de responsabilização externa corporis dos que faltarem àquele dever constitucional, submetidos aos controles que todo exercício de poder reclama numa verdadeira democracia (PASSOS, 1997, p. 13).

Ocorre que a demora da prestação jurisdicional acaba por prejudicar essa função primordial do processo judicial, que, além de suprir uma necessidade individual, consiste na realização do direito e na garantia da paz jurídica (MALAQUIAS, 2008, p. 152).

Distorção não menos grave, outrossim, foi a de se ter colocado como objetivo a alcançar com as reformas preconizadas apenas uma solução, fosse qual fosse, para o problema do sufoco em que vive o Poder Judiciário, dado o inadequado, antidemocrático e burocratizante modelo de sua institucionalïzação constitucional,. A pergunta que cumpria fosse feita - quais as causas reais dessa crise - jamais foi formulada. Apenas se indagava - o que fazer para nos libertarmos da pletora de feitos e de recursos que nos sufoca? E a resposta foi dada pela palavra mágica "instrumentalidade," a que se casaram outras palavras mágicas - "celeridade," "efetividade," "deformalização" etc. E assim, de palavra mágica em palavra mágica, ingressamos num processo de produção do direito que corre o risco de se tornar pura prestidigitação. Não nos esqueçamos, entretanto, que todo espetáculo de mágica tem um tempo de duração e de desencantamento (PASSOS, 2002).

A morosidade do processo acaba, portanto, por retirar-lhe sua instrumentalidade – sua razão de ser – constituindo uma ferramenta a trabalho de quem efetivamente não tem razão. Por esta maneira, o seu combate tornou-se um clamor público, onde a sociedade reivindica justiça, necessária à preservação de sua existência. A prestação jurisdicional, mais que uma tutela satisfativa de um direito individual, é uma fonte do Direito, gerando, reflexamente, consequências à toda ordem social, de modo que a morosidade deve ser combatida, acima de tudo, para possibilitar o alcance da função social do processo.


CONCLUSÃO

Neste artigo abordou-se pontualmente a questão da morosidade do processo judicial e da atrofia do Poder Judiciário, delineando as suas principais causas e apontando algumas possíveis soluções, não se olvidando de ressalvar, contudo, que tal problemática é de extrema complexidade e apenas será solucionada de forma paulatina, com a participação de toda a sociedade e a franca atuação do poder público.

Cuidou-se, também, de discutir, mesmo que sucintamente, o papel do processo eletrônico e do projeto do novo código de processo civil na erradicação da morosidade da Justiça, a fim de atender os reclamos e anseios sociais. A inserção, cada vez mais intensa, da informatização na prática forense e a edição de um novo código de processo, constituem poderosa arma para organizar e remodelar o atual modelo processual.

Com efeito, um sistema processual falho, além de gerar insatisfação social, macula todo o ordenamento jurídico, uma vez que o processo judicial é a principal via buscada pelos cidadãos para terem concretizados os seus direitos. Sendo assim, o processo judicial possui o dever de suprir as necessidades sociais e acompanhar o desenvolvimento da sociedade, a fim de atender sua função social, notadamente no que se refere à atenuação das diferenças entres os cidadãos, em seu aspecto financeiro, social e cultural, bem como, à otimização e racionalização do sistema jurídico, assegurando a primazia dos interesses da coletividade e à concretização dos direitos dos cidadãos, mediante a efetividade da função jurisdicional.

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Abstract: This article aims at a timely approach to the issue of procedural delays and atrophy in the Brazilian Judiciary, outlining its main causes and pointing out some possible solutions, indicating also the role of the electronic process and project of the New Code of Civil Procedure in the search for reasonable duration of process. Moreover, because the conduct counterpoint to the theme of the social function of the process with the aim to ascertain how and why the fight against procedural delays are so closely connected with this subject, demonstrating the crucial importance of providing the protection of legal rights and social citizens by providing a speedy judicial review, effective and adequate in order to democratize the Judiciary, which so far is shown to redoubt of the wealthy.

Keywords: Judicial Slowness. Social function of the process. Reasonable duration of process. Electronic process. Project of the New Code of Civil Procedure.

Sobre o autor
Johannes Fermino

bacharel em Direito, pela Faculdade Campo Real - Guarapuava/ PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERMINO, Johannes. A morosidade no Judiciário em confronto com a função social do processo.: O clamor público pela efetividade da tutela jurisdicional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2988, 6 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19936. Acesso em: 22 nov. 2024.

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