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Evolução normativa e jurisprudencial do carona no sistema de registros de preços e perspectivas práticas da novel legislação (Decreto nº 7.892/2013)

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Agenda 15/05/2013 às 15:24

3 – Evolução Normativa sobre o carona

Prima facie, insta salientar que o Decreto Federal n.°3.931/01 instituiu o chamado carona, que representa a possibilidade de utilização do SRP por qualquer órgão ou entidade da administração que não tenha participado do certame licitatório que deu origem a Ata de Registro de Preços.

A previsão normativa para a adesão se encontrava no art. 8° e seus parágrafos do aludido Decreto, conforme se descreve a seguir:

Art. 8º A Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou entidade da Administração que não tenha participado do certame licitatório, mediante prévia consulta ao órgão gerenciador, desde que devidamente comprovada a vantagem.

 § 1º Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação.

 § 2º Caberá ao fornecedor beneficiário da Ata de Registro de Preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento, independentemente dos quantitativos registrados em Ata, desde que este fornecimento não prejudique as obrigações anteriormente assumidas.

Posteriormente, o Decreto n°. 4342/02 permitiu que os quantitativos referentes a contratações realizadas com outros órgãos administrativos que não participam originalmente do registro de preços não seriam computados para fins de exaurimento do limite previsto na licitação inicial. Contudo, nas aquisições através do sistema de adesão a atas de registro de preços, o quantitativo ficou limitado a 100% do total licitado, in verbis

§ 3º As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços.

Destarte, a única restrição admitida pelo Decreto 4342/02, reside no limite de 100% do quantitativo máximo, objeto do registro por entidade que venha a aderir a ata inicialmente firmada.

Nesse passo, conforme demonstrado no item 2 deste trabalho, a ausência de limites gerou o uso indiscriminado da figura do carona, propiciando a “adesão ilimitada” da ata de registros de preços, ocasionando graves distorções.

Segundo o escólio do eminente jurista Marçal Justen Filho:

A solução desbordou os limites da lei e produziu resultado teratológico, especialmente porque propicia contratações ilimitadas com base em uma mesma e única licitação.

Ante a instauração de tal quadro pernicioso, o TCU restringiu a utlização do carona, conforme demonstrado no item precedente deste artigo.

Contudo, restou demonstrado na prática, diante dos reflexos obtidos nas Consultorias Jurídicas de todo o País, que tal restrição praticamente inviabilizou a possibilidade do uso do carona, o que estimulou ao Governo Federal, finalmente, a editar o Decreto 7892/2013, em 23 de janeiro de 2013, revogando assim o Decreto Federal 3.931/01 e estabelecendo novas regras para o uso do carona.

Eis o novo regramento trazido pelo Decreto Federal 7892/2013:

Art. 22.  Desde que devidamente justificada a vantagem, a ata de registro de preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou entidade da administração pública federal que não tenha participado do certame licitatório, mediante anuência do órgão gerenciador. 

§ 1º  Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da ata de registro de preços, deverão consultar o órgão gerenciador da ata para manifestação sobre a possibilidade de adesão. 

§ 2º  Caberá ao fornecedor beneficiário da ata de registro de preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento decorrente de adesão, desde que não prejudique as obrigações presentes e futuras decorrentes da ata, assumidas com o órgão gerenciador e órgãos participantes.   

§ 3º  As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos dos itens do instrumento convocatório e registrados na ata de registro de preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes

§ 4º  O instrumento convocatório deverá prever que o quantitativo decorrente das adesões à ata de registro de preços não poderá exceder, na totalidade, ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de órgãos não participantes que aderirem. 

§ 5º O órgão gerenciador somente poderá autorizar adesão à ata após a primeira aquisição ou contratação por órgão integrante da ata, exceto quando, justificadamente, não houver previsão no edital para aquisição ou contratação pelo órgão gerenciador. 

§ 6º  Após a autorização do órgão gerenciador, o órgão não participante deverá efetivar a aquisição ou contratação solicitada em até noventa dias, observado o prazo de vigência da ata. 

§ 7º  Compete ao órgão não participante os atos relativos à cobrança do cumprimento pelo fornecedor das obrigações contratualmente assumidas e a aplicação, observada  a ampla defesa e o contraditório,  de eventuais penalidades decorrentes do descumprimento de cláusulas contratuais, em relação às suas próprias contratações, informando as ocorrências ao órgão gerenciador. 

§ 8º  É vedada aos órgãos e entidades da administração pública federal a adesão a ata de registro de preços gerenciada por órgão ou entidade municipal, distrital ou estadual

§ 9º  É facultada aos órgãos ou entidades municipais, distritais ou estaduais a adesão a ata de registro de preços da Administração Pública Federal.  (grifo nosso)

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 O art. 22 supracitado exige anuência por parte do órgão gerenciador para o uso da ata por órgão não participante, sendo que no decreto revogado não havia propriamente uma autorização deste. Quem deveria aceitar ou não o uso da ata de registro de preços era o fornecedor de bens ou serviços.

Trata-se, portanto, de novo requisito que vem sendo verificado nos processos submetidos às Consultorias Jurídicas de todo o País.

Noutro giro, conforme determina o § 3º do art. 22º do Decreto Federal 7892/2013, cada órgão carona, individualmente, poderá adquirir o quantitativo somado dos órgãos gerenciador e participante. Trata-se de inovação importante, tendo em vista que alguns julgados recentes do Tribunal de Contas da União estabeleceram limites em sentido contrário, conforme aventado no item 2 deste trabalho.

Ademais, com espeque no § 4º do art. 22 do aludido Decreto, verifica-se que “O instrumento convocatório deverá prever que o quantitativo decorrente das adesões à ata de registro de preços não poderá exceder, na totalidade, ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de órgãos não participantes que aderirem.

Exemplo: Licitação para a aquisição de 60 itens.

Primeira Adesão a Ata: 60 itens (saldo de 240 itens)

Segunda Adesão a Ata: 60 itens (saldo de 180 itens)

Terceira Adesão a Ata: 60 itens (saldo de 120 itens)

Quarta Adesão a Ata: 60 itens (saldo de 60 itens)

Quinta Adesão a Ata: 60 itens (saldo zero para adesão).

A norma supracitada vai ao encontro do que dispõe o art. 102, §3º do decreto 7.581/2011 que regulamenta o Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC, previsto na Lei nº 12.462/2011, in verbis:

Art. 102.  O órgão ou entidade pública responsável pela execução das obras ou serviços contemplados no art. 2º que não tenha participado do certame licitatório, poderá aderir à ata de registro de preços, respeitado o seu prazo de vigência. 

(...)

§ 3º  A quantidade global de bens ou serviços que poderão ser contratados pelos órgãos aderentes não poderá ser superior a cinco vezes a quantidade prevista para cada item.       

Logo, o quantitativo máximo a ser adquirido por todos os caronas não poderá ser superior a cinco vezes o quantitativo somado de órgãos gerenciador e participante (s). Por conseguinte, ainda que em determinada adesão o pretenso órgão “carona” queira utilizar menos do que os 100 % dos quantitativos registrados na ata de registro de preços, se o quantitativos adquiridos pelos demais órgãos caronas já forem iguais ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na Ata para órgão gerenciador e participante (s), sua adesão não será possível.

Por outro lado, uma relevante inovação que merece destaque é a constante no § 5º do art. 22, uma vez que esta estabelece que “o órgão gerenciador somente poderá autorizar adesão à ata após a primeira aquisição ou contratação por órgão integrante da ata”.

Dessa forma, por exemplo, se determinada ata tiver um prazo de vigência de 12 meses, mas se só houver contratação por parte dos órgãos gerenciador e participante (s) só após o oitavo mês, apenas a partir deste momento poderia ocorrer adesão.

Revela-se, portanto, um novo requisito a ser aferido no processo administrativo de adesão a ata de registro de preços nas Consultorias Jurídicas. O ideal é que na própria manifestação de anuência do órgão gerenciador (também novo requisito a ser verificado), o órgão gerenciador informe se já houve contratação por parte deste (ou pelo órgão participante) dos bens previstos na Ata de registro de preços.

Nesse ponto, cabe tecer uma crítica a esta inovação, já que não permitir o uso da ata de registro pelo carona enquanto o objeto não for efetivamente contratado pelo órgão gerenciador e participante não me parece oportuno, por restringir em demasia a utilização da ata de registro de preços pelos órgãos não participantes.

Por derradeiro, insta salientar a inovação trazida pelo § 6º do art. 22, que estabelece que “após a autorização do órgão gerenciador, o órgão não participante deverá efetivar a aquisição ou contratação solicitada em até noventa dias, observado o prazo de vigência da ata”.

Tal medida se revela salutar, uma vez que diferentemente dos órgãos integrantes da ata de registro de preços, o “carona” só deve aderir a ata se houver necessidade de contratação imediata.

Desta maneira, a novel legislação ilide a adesão de eventuais “caronas” que não tenham a imediata necessidade de contratação dos itens registrados na ata e que acabariam por inviabilizar a adesão por parte de outros órgãos que realmente necessitam com urgência de tal objeto.


4. Conclusão

Percebe-se, de acordo toda a evolução normativa e jurisprudencial demonstrada nos itens 2 e 3 deste artigo jurídico, todo celeuma e impasse decorrentes do uso indevido, abusivo e indiscriminado do instituto do carona pelos órgãos públicos, o que gerou a edição do recentíssimo Decreto Federal 7892/2013.

O novo regramento trazido pelo Decreto Federal 7892/2013 representa, sem embargo, um avanço enorme no que tange a este instituto, que necessitava de uma maior regulamentação. A novel legislação reflete, portanto, anseios já exaustivamente debatidos em sede doutrinária, bem como vem a ratificar diversos posicionamentos do Tribunal de Contas da União e Orientações Normativas da Advocacia Geral da União.

Desta feita, se resguarda a utilização do instituto do carona, de suma importância no âmbito das contratações públicas, pois em diversas ocasiões a adesão a ata de registro de preços passa a ser uma “saída” inteligente para redução de custos, tornando o andamento da máquina pública mais eficiente e, prestigiando, por conseguinte, a celeridade, economia e praticidade.


5. Referências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 05/10/88. Rio de Janeiro:RT. 8º edição. 2008.

BRASIL. Decreto 3931.19/09/2001. Regulamenta o sistema de Registro de Preços no art. 15 da Lei 8666, de 21 de junho de 1993 e dá outras providências. Rio de Janeiro: RT. 2008. 8ª ed. pp. 643-648.

BRASIL. Decreto nº 4.342, de 23 de agosto de 2002. Altera dispositivos do Decreto nº 3.931, de 19 de setembro de 2001, que regulamenta o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 ago 2002. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>.

BRASIL. Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013. Regulamenta o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 jan 2013. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2013

BRASIL. Lei 8666.21/06/1993. Regulamenta o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Rio de Janeiro: RT. 8ª ed. pp. 593-636.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 1487/2012

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 1233/2012.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 2311/2012.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 1737/2012

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 2692/2012

NIEBUHR, JOEL “O novo perfil da adesão à ata de registro de preços conforme Acórdão 1233/2013, do Tribunal de Contas da União, disponível no site http://www.mnadvocacia.com.br/assets/pdf/perfil_adesao.pdf

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen júris. 2009. p. 400.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialítica. 13° Ed. 2009. p.197-199.

JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Sistema de Registro de Preços Pregão Presencial e Eletrônico, 3ª edição, Belo Horizonte: editora Fórum, 2009.

Sobre o autor
Rodrigo Cesar Aguiar Vivas

Advogado da União. Coordenador-Geral da Consultoria Jurídica da União no Estado do Amazonas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIVAS, Rodrigo Cesar Aguiar. Evolução normativa e jurisprudencial do carona no sistema de registros de preços e perspectivas práticas da novel legislação (Decreto nº 7.892/2013). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3605, 15 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24442. Acesso em: 2 nov. 2024.

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