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O dano moral transindividual no contexto da implementação do Estado Democrático de Direito

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Agenda 05/04/2014 às 09:28

7 – ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA FIXAÇÃO DO DANO MORAL COLETIVO

A implementação material do Estado Democrático de Direito é medida imposta pela Constituição, conforme dito anteriormente. E tal situação será concretizada quando o Poder Judiciário, com uma postura racional e consciente, proteger os direitos e garantias constitucionais já consagrados formalmente, e mais, efetivá-los de fato.

Entretanto, outros atores sociais têm papel fundamental neste processo, como é o caso do Ministério Público, instituição vocacionada para a defesa dos princípios democráticos.

O sistema jurídico brasileiro foi amplamente modificado ante a percepção dos conflitos de massa. Consagrou-se a tutela coletiva como forma de conferir efetividade aos direitos metaindividuais, adotando-se novos mecanismos, tanto judiciais quanto extrajudiciais, de solução dessas disputas. O fundamento dos direitos coletivos estrutura-se nos direitos humanos fundamentais que, indiscutivelmente, por sua própria natureza, são de ampla relevância social.

A Constituição da República, em seu artigo 127, caput, conferiu ao parquet a atribuição de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, na qualidade de órgão agente, dissociando-o da função eminentemente parecerista até então prevalecente. A instituição tornou-se, portanto, uma das protagonistas nas questões afetas às demandas de massa.

O Ministério Público, em sua atuação, notadamente por meio de um perfil resolutivo, busca solucionar os conflitos com repercussão social fora do Judiciário, quando existe tal possibilidade. Para tanto, um dos principais instrumentos de que dispõe é o termo de ajustamento de conduta, no qual devem ser estipuladas cláusulas mínimas como forma de proteção contras as lesões ou ameaças de lesões aos interesses transindividuais.

O Professor José dos Santos Carvalho Filho[28] define o termo de compromisso de ajustamento de conduta como:

o ato jurídico pelo qual a pessoa, reconhecendo implicitamente que sua conduta ofende interesse difuso ou coletivo, assume o compromisso de eliminar a ofensa através da adequação de seu comportamento às exigências legais.

O termo de compromisso surgiu no sistema jurídico brasileiro como aperfeiçoamento da tutela transindividual, visando reduzir as lides individuais com a solução, ainda no âmbito administrativo, das lesões difusas e coletivas.

Divergem os estudiosos da matéria quanto a sua natureza jurídica. Segundo Cristiane Aneolito Ferreira[29], as principais correntes doutrinárias a respeito do tema defendem ser o termo: transação, ato ou negócio jurídico diverso ou, título executivo extrajudicial.

A corrente que sustenta ser transação estipula que, na verdade, trata-se de avença com características próprias, não correspondendo, exatamente, aos acordos de direito privado. O Professor Hugo Nigro Mazzili, citado pela autora[30], argumenta que:

embora tenha o caráter necessariamente consensual, o compromisso de ajustamento não tem a mesma natureza contratual típica do Direito Privado, nem chega a ser propriamente uma transação de Direito Público. Trata-se, antes, de concessão unilateral do causador do dano, que acede em ajustar sua conduta às exigências legais, sem que o órgão público que toma seu compromisso esteja a transigir em qualquer questão ligada ao direito material, até porque não o poderia fazer, já que, em matéria de interesse transindividuais, o órgão público legitimado e o Estado não são titulares do direito lesado.

Nesta senda, prevalece o entendimento que conjuga as duas últimas posições. O termo de ajuste de conduta é negócio jurídico diverso, pois é ato jurídico unilateral quanto à manifestação volitiva e espontânea do compromitente em adequar-se a lei, e bilateral quanto à formalização, a que a lei atribui eficácia de título executivo extrajudicial (artigos 5, § 6º da Lei 7.347/85).

Importante destacar que o termo de ajustamento de conduta constitui importante instrumento à disposição do Ministério Público para consecução de seus objetivos constitucionais, especialmente a tutela dos interesses metaindividuais.

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Neste ponto surge questão relativa à possibilidade de ser fixada no instrumento de ajuste a previsão de indenização por dano moral coletivo.

Em vistas de sua finalidade, qual seja, solução dos conflitos transindividuais, a indenização arbitrada a título de dano moral coletivo poderá fazer parte tanto do termo de compromisso de ajustamento de conduta quanto da condenação imposta por meio de ação civil pública.

Contudo, como ressaltado, a indenização por dano moral coletivo, como os demais institutos de tutela coletiva, insere-se no contexto maior de transformação positiva da realidade e implantação do Estado Democrático de Direito. Assim, com o fito de desafogar o tão assoberbado Poder Judiciário, e homenagear as relevantes prerrogativas dos demais atores sociais, especialmente o Ministério Público, prerrogativas estas fixadas em sede constitucional, é de se concluir pela possibilidade de fixação da indenização no instrumento extrajudicial, tudo a contribuir com a materialização daquele modelo de estado fixado no artigo 1º da Carta Magna.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 5 de out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>, acesso em: 28 de fev. 2013.

[2] ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Processual Coletivo Brasileiro – Um Novo Ramo do Direito Processual. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 152.

[3] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, vol. 2 – Obrigações – Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 690,6 (formato epub).

[4] Verbete Dano. Dicionário de Português on line Michaelis-UOL. Disponível em < http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=dano>, acesso em: 28 fev. 2014.

[5] CARDIN, Valéria Silva Galdino. Dano Moral no Direito de Família. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 22,0 (formato epub).

[6] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol. 4 – Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

[7] CARDIN, Op. Cit, p. 24,3 (formato epub).

[8] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. DOU DE 11/02/02, P. 1, Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>, acesso em: 28 de fev. 2014.

[9] GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, vol. 3 – Responsabilidade Civil. 10ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 189,1 (formato epub).

[10] CARDIN, Op. Cit, p. 26,8 (formato epub).

[11] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, vol. 2 – Série Concursos Públicos – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Editora Método, 2008.

[12] CARDIN, Idem, p. 33,4 (formato epub).

[13] BRASIL. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Coleção de Leis do Brasil. Situação: Revogada. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l3071.htm>, acesso em: 28 de FEV. 2014.

[14] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 37. Brasília, DF, 12 mar. 1992 – DJ 17 mar. 1992. Disponível em: <http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0037.htm>, acesso em: 28 de fev. 2014.

[15] BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa e Proteção do Consumidor. D.O. DE 12/09/1990, P. 1 (SUPLEMENTO), Brasília, DF, 11 de set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078compilado.htm>, acesso em: 28 de fev. 2014.

[16] BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. D.O. DE 16/07/1990, P. 13563, Brasília, DF, 13 de jul. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>, acesso em: 28 de fev. 2014.

[17] TARTUCE, Op. Cit., p. 217.

[18] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 788459/BA 4ª Turma. Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Brasília, DF, 8 nov. 2005, DJ 13/03/2006 p. 334. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&processo=788459&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO>, acesso em: 5 de mar. 2014.

[19] TARTUCE, Idem, p. 221.

[20] TARTUCE, Ibidem.

[21] PEREIRA, Ricardo Diego Nunes. Os Novos Danos: Danos Morais Coletivos, Danos Sociais e Danos por Perda de uma Chance. Ambitojuridico. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11307&revista_caderno=7>, acesso em: 05 mar. 2014.

[22] PEREIRA, Op. Cit.

[23] GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, Idem, p. 247,8 (formato epub).

[24] BRASIL. Lei nº 7.347, de 24  de julho de 1985. Lei de Ação Civil Pública. DOFC DE 25/07/1985, P. 10649, Brasília, DF, 24 de jul. 1985. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm>, acesso em: 5 de mar. 2014.

[25] LISBOA, Roberto Senesi. Manual de Direito Civil, vol. 2 – Obrigações e Responsabilidade Civil. 6ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

[26] COELHO, Op. Cit., p. 701,2 (formato epub).

[27] Dano Moral Coletivo Avança e Inova na Jurisprudência do STJ. Assessoria de Comunicação do Superior Tribunal de Justiça. Brasília, jun. 2012. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=106083>, acesso em: 08 mar. 2014.

[28] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação Civil Pública: Comentários por Artigo (Lei nº 7.347, de 24/7/85). 7ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009, p. 222.

[29] FERREIRA, Cristiane Aneolito. Termo de Ajuste de Conduta Celebrado Perante o Ministério Público do Trabalho. 2011. Dissertação de Mestrado – Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2011, p. 61.

[30] FERREIRA, Op. Cit., p. 63.

Sobre o autor
Eduardo Xavier de Souza

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro;<br>Pós-Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Cândido Mendes;<br>Pós-Graduando em Direito Aplicado ao Ministério Público pela Escola Superior do Ministério Público da União - ESMPU;<br>Analista Processual do Ministério Público da União;<br>Tutor Presencial das Disciplinas Jurídicas do Curso de Administração do Consórcio CEDERJ - Polo de Itaperuna;<br>Ex-servidor do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Eduardo Xavier. O dano moral transindividual no contexto da implementação do Estado Democrático de Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3930, 5 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27262. Acesso em: 23 dez. 2024.

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