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Agências reguladoras: mediação de conflitos e recurso hierárquico impróprio

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Agenda 06/06/2014 às 11:25

A uniformidade no trato de questões administrativas não relacionadas à atividade-fim da agência reguladora deve ser provida pelo Chefe do Executivo e por seus auxiliares imediatos. Justifica-se, assim, a possibilidade de se aviar recurso hierárquico impróprio quando a decisão da agência se afasta do entendimento da Administração respectiva.

Resumo: O trabalho ora desenvolvido examina o conteúdo da moderna regulação econômica como atividade exercida, precipuamente pelas agências reguladoras. Analisa a função mediadora de conflito inerente a esses órgãos. Investiga a origem, os limites e contornos do recurso hierárquico impróprio e sua compatibilidade com a independência administrativa das agências reguladoras.

Palavras-chave: regulação econômica. agências reguladoras. Mediação  conciliatória de conflitos. Recurso hierárquico impróprio.


1. Introdução.

A regulação econômica, assim compreendida em seu amplo sentido como toda ação ou omissão estatal voluntária que tenha por objetivo influir na conduta dos atores do mercado – agentes econômicos, consumidores e usuários – sempre existiu. Originou-se da necessidade de corrigir as falhas de mercado capazes de gerar desvios de concorrência, difusão de informações incompletas, concentração de riqueza, restrições à livre iniciativa, e outras mazelas.

Possui cunho regulatório as iniciativas tendentes a desonerar exportações, taxar importações, sobretaxar a produção e a comercialização de produtos potencialmente danosos à saúde (tais como tabaco e bebidas alcoólicas), vetar a importação de produtos danosos ao meio ambiente (como pneus usados), estabelecer a taxa de juros oficial, emitir moeda, desonerar determinados setores produtivos, criar agências de fomento, abrir linhas de crédito destinada à agricultura, a aquisição da casa própria, etc.

Essas iniciativas, gestadas no núcleo estratégico do Estado (i.e., por aqueles que criam políticas públicas), são executadas por órgãos públicos despersonalizados (Ministérios, Secretarias, Departamentos, Comissões, etc.) ou personalizados (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista). Diante da autonomia administrativa (e, em alguns casos, também financeira), da especialidade de funções e de quadro técnico preparado, é frequente a opção porque se faça a regulação por intermédio de órgãos públicos (autarquias e fundações) ou privados (empresas estatais) dotados de personalidade jurídica própria.

Não se trata de fenômeno inovador e outrora desconhecido. Como lembra João Eduardo Lopes Queiroz[1], a regulação não foi iniciada, e nem é decorrente, da desestatização. O processo de alienação de ativos estatais simplesmente gerou o fortalecimento desta atividade pública. Desde o início do século passado foram criadas entidades públicas, em sua maioria dotadas de personalidade jurídica própria, destinadas ao estímulo da atividade produtiva[2].

A mudança de paradigma no quadro econômico – que, diferentemente daquele desenhado na Constituição de 1967, apenas excepcionalmente admite a situação do Estado produtor-prestador direto de bens e serviços –, conjugada à impossibilidade de relegar o mercado à sua própria sorte, levou à redefinição do papel do Poder Público na economia. Sua tarefa, tal como disposto no artigo 174 da Carta vigente, além da tradicional normatização, fiscalização e incentivo, compreende a disciplina e o planejamento, tudo a incidir sobre a ação dos agentes da livre iniciativa, de modo a evitar o surgimento de crises, ou ao menos diligenciar para a sua rápida e menos prejudicial transposição. É a moderna regulação econômica.

No Brasil a moderna regulação desenvolveu-se com a Reforma do Aparelho do Estado e com as desestatizações, que tornaram imprescindível o estímulo à concorrência como uma das formas de alcançar a eficiência e a excelência na prestação-produção de bens e serviços transferidos ao particular.

Historicamente a propriedade pública sempre foi utilizada como forma de regular o mercado[3]. Nos segmentos em que o Estado exercia diretamente a atividade econômica – tais como telefonia, distribuição de água, transporte ferroviário e geração, transmissão e distribuição de energia – operava-se um monopólio natural. Em tais segmentos o direcionamento das atividades ocorria por meio do planejamento econômico estatal.

Induvidoso que o Estado era o fiel do interesse público, não se fazia, portanto, necessário nenhum órgão de planejamento, fiscalização e coordenação dos segmentos explorados. Assim o Estado, investido em suas funções de promover o bem comum, comandava o segmento explorado, definindo preços, criando ou retirando incentivos, e adotando todas as medidas necessárias sem se ater a qualquer estabilidade e previsibilidade de sua atuação.

A transferência dessas atividades ao particular ocasionou a preponderância dos interesses privados. Os operadores econômicos atuam dentro da lógica capitalista de maximização de lucro, o que não se compagina, no mais das vezes, com a valorização do trabalho, com a livre iniciativa, com a dignidade da pessoa humana e com a justiça social. A regulação econômica tornou-se imprescindível, funcionando como instrumento estatal destinado a prevenir e frear os excessos na exploração capitalista, de molde a prevalecer o interesse público quando confrontado ao interesse privado.

Mas, qual o conteúdo desta nova regulação econômica[4]?

No entendimento de Alexandre Santos de Aragão, a nova regulação econômica consiste no

[...] conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientando-os em direções socialmente desejáveis[5].

Esta interpretação é coerente com a trazida por Marçal Justen Filho, para quem a regulação consiste num

[...] conjunto ordenado de políticas públicas, que busca a realização de valores econômicos e não econômicos, reputados como essenciais para determinados grupos ou para a coletividade em seu conjunto. Essas políticas envolvem a adoção de medidas de cunho legislativo e de natureza administrativa, destinadas a incentivar práticas privadas desejáveis e a reprimir tendências individuais e coletivas incompatíveis com a realização dos valores prezados[6].

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Com base na lição de Jacques Chevallier, Sérgio Guerra deduz que

[...] a [moderna] regulação se distingue dos modos clássicos de intervenção do Estado na economia, pois consiste em supervisionar o jogo econômico, estabelecendo certas regras e intervindo de maneira permanente para amortecer as tensões, compor os conflitos e assegurar a manutenção de um equilíbrio conjunto. Ou seja, por meio da regulação o Estado não se põe mais como ator, mas como árbitro do processo econômico, limitando-se a enquadrar a atuação dos operadores e se esforçando para harmonizar suas ações[7].

De fato, no atual estágio do desenvolvimento capitalista, ainda que coerente com o Estado de Direito[8], medidas impositivas aplicadas verticalmente “de cima para baixo” (i.e., do Estado sobre o mercado) não são bem recebidas e eficientemente cumpridas. Práticas desta natureza integram uma concepção ultrapassada de regulação, baseada apenas no poder extroverso e no poder de polícia.

Antes de fixar a norma concreta a ser aplicada[9], a moderna regulação ouve os atores do cenário econômico (produtores-prestadores, consumidores e terceiros), ponderando as sugestões e críticas recebidas; aproxima e concilia os interesses em conflito, seja entre os operadores econômicos, seja entre estes e os consumidores; preserva o mercado e o operador econômico porque sem eles o interesse público restará prejudicado; calca suas ações na transparência e no devido processo legal; confere, ou negocia, estímulos ao prestador-produtor de forma que sua satisfação reflita em ganho de qualidade e eficiência em prol do cidadão[10].

Na lição de Floriano de Azevedo Marques Neto, “a moderna regulação busca o equilíbrio no setor regulado”[11], ou seja, o equilíbrio entre os interesses privados e as metas e objetivos de interesse público (universalização, redução das desigualdades, modicidade de preços e tarifas, valorização do trabalho, maiores investimentos, qualidade na prestação dos serviços e fornecimento de bens, etc.).

Vinícius Marques de Carvalho[12] lembra, por fim, que regulação pode ser entendida de três formas. De modo amplo, é toda forma pela qual o Estado intervém na economia, o que abrange a atuação direta e indireta. Num segundo e menos amplo sentido, consiste na intervenção voltada à normatização, incentivo, fiscalização, e coordenação da atividade privada. E numa interpretação restrita, tem o significado de intervenção normativa, ditando regras para a iniciativa privada.

Foi pelo segundo sentido que a reforma iniciada em meados da década de 1990 optou ao propor a redução da intervenção direta do Estado no domínio econômico, ampliando, de outra mão, sua atuação na atividade regulatória.

Desnecessário tecer esclarecimentos acerca da distinção entre regulação e regulamentação. Este, polissêmico que é, tem o significado vocabular (i) específico de ato privativo do Chefe do Executivo para, esmiuçando a lei, editar norma que facilite sua execução; e (ii) amplo de edição de ato normativo infralegal.

Regulação, a seu turno, tem o significado de disciplina, ordenação e coordenação finalística de um dado setor. Envolve as tarefas de editar normas infralegais ou infrarregulamentares, aclarando termos e conceitos, e definindo parâmetros técnicos, permitindo assim o cumprimento da lei; de fiscalizar o exercício de atividades desenvolvidas no setor específico; de aplicar sanções para, a um lado, conferir efetividade à norma, e de outro, prevenir desvios; de premiar determinadas condutas como forma de estimular a eficiência, a produtividade e a inventividade capazes de gerar resultados positivos à coletividade; e de mediar conflitos, solucionando concretamente dissídios.

Ao tratar do que denomina “direito das pós-privatizações”, João Eduardo Lopes Queiroz lembra que as atividades transferidas ao particular serão controladas pelas agências reguladoras, cujo objetivo principal é “exercer as atividades normativa, fiscalizadora, sancionatória e de composição de litígios” [13]. É, enfim, atribuição dessas agências exercitar a moderna regulação estatal econômica.


2. Mediação de conflitos

A função de pôr termo a controvérsias, dirimindo conflitos, como sabido, não é monopólio do Poder Judiciário. É desempenhada atipicamente pelos Órgãos Legislativo e Executivo, em geral sem o caráter de definitividade plena por força da cláusula da inafastabilidade da jurisdição. É o que ocorre nos Conselhos de Contribuintes e na Câmara de Recursos da Previdência Social e da Previdência Complementar, foros decisórios das controvérsias instauradas entre órgãos estatais e particulares. A inovação reside na possibilidade das agências solverem conflitos dos particulares entre si, e não só entre estes e o Poder Público.

Quando se entende que a edição de ato normativo abstrato visa conferir operacionalidade à lei mediante o preenchimento de conceitos jurídicos carentes de complementação e da definição de procedimentos e rotinas, conclui-se que a aptidão para solucionar conflitos, porque demanda atividade interpretativa, está intimamente ligada ao poder normativo.

O objetivo imediato[14] do órgão regulador é o adequado funcionamento do mercado, produzindo normas de conteúdo técnico, fiscalizando o desempenho dos operadores econômicos, retirando obstáculos materiais e legais (por exemplo, sugerindo ao Chefe do Executivo modificações na legislação), buscando a melhoria na qualidade de bens e serviços.

A agência não toma partido dos atores do cenário econômico. Embora órgão de Estado, sua função deve ser neutra, imparcial. Não deve proteger incondicionalmente o consumidor, ou o prestador ou o Estado[15]. Sua autonomia e independência foram instituídas com essa finalidade.

Uma vez que seu compromisso é com a manutenção da higidez do mercado, a agência deve buscar a situação denominada “Pareto Eficiente” (ou “Ótimo de Pareto”), em que não mais seja possível obter melhorias recíprocas porque o ganho de um representará a perda dos demais, em franco desequilíbrio do sistema[16].

Essa neutralidade, aliada ao conhecimento técnico setorial, permite ao regulador independente intervir “na pesquisa de soluções, no favorecimento de trocas construtivas, estimulando as comunicações e no enquadramento das negociações, determinando e explicando as regras procedimentais”[17] porque goza da confiança dos atores do cenário econômico. Poderá, assim, adotar estratégias de solução de dissídios tendentes a aproximar e conciliar as partes em posição antagônica, segundo o escopo da moderna regulação econômica.

Justifica-se a adoção de iniciativa não adversarial de solução de conflitos por conta dos baixos custos envolvidos (considerados os recursos e o tempo despendidos em ações judiciais) e da adesão à solução alcançada (minimizando impugnações de toda espécie).

De fato, nem sempre o Judiciário se vê possibilitado de dar célere resposta às demandas que lhe são apresentadas. A agência, por outro lado – em face da especialidade de sua atuação – detém cabedal técnico para, em breve espaço de tempo, dar resposta tecnicamente adequada às demandas que lhe são apresentadas.

 A ação das agências na solução de conflitos está ligada diretamente à atuação e formação de seus quadros. Tanto mais definitividade gozarão suas decisões quanto maior for o grau de independência, eficiência e conhecimento técnico de seus agentes. É que a atuação séria, honesta e eficaz da agência será capaz de angariar o reconhecimento da sociedade. E uma vez que a sociedade acredita ser a decisão da agência a mais adequada, reduz-se o número de impugnações[18].

É preciso ter claro que o mister de pacificar controvérsias não implica necessariamente na prolação de decisão pela própria agência. Como lembram alguns autores[19], não há óbice porque se o faça com o auxílio de árbitro. As leis setoriais, de modo geral, e a lei que disciplina os serviços públicos objeto de concessão e permissão[20], de modo específico, exigem foro para a solução amigável de divergências, o que não exclui a possibilidade referida.

O que se busca evidenciar até aqui é a preferência pela solução conciliatória. Evidente que nem sempre ela será alcançada, seja porque os interessados não concordaram em concessões recíprocas a tanto necessário, seja porque a matéria versada não admite esta forma de solução. Em situações que tais, o órgão regulador fará impor sua vontade. É provável, então, que a decisão impositiva seja hostilizada na via recursal, surgindo, em consequência, indagação acerca da viabilidade de discuti-la fora dos limites administrativos da agência reguladora.


3. Impugnação administrativa das decisões das agências reguladoras e recurso hierárquico impróprio

A questão envolve duas considerações prévias.

A primeira diz com a natureza autárquica da agência, o que significa a inexistência de subordinação hierárquica para com a Administração Central. O mandato fixo dos dirigentes das agências, característica peculiar de sua independência administrativa, impedindo a demissão ad nutum, torna mais nítida a ausência de subordinação. O liame havido entre o órgão central e o órgão periférico, em breves linhas, restringe-se a assegurar que a autarquia persiga a missão institucional e política para a qual foi criada[21]. Daí a referência doutrinária a vinculação, e não a subordinação.

A segunda consideração reside no dever-poder do Chefe do Poder Executivo e de seus auxiliares imediatos exercer a direção superior da Administração Pública[22]. Esta competência decorre da estrutura orgânica da máquina pública, interpretada com um todo incindível, cujos diversos órgãos operam, cada um a seu modo, para que todo o Estado funcione e caminhe numa mesma direção. O objetivo fundamental da direção superior é conferir harmonia entre os diversos departamentos, secretarias, empresas, autarquias, etc., prevenindo conflitos e evitando antagonismos.

Como forma de assegurar a uniformidade de entendimentos dentro da Administração, a doutrina contempla o recurso hierárquico impróprio. É assim denominado porque dirigido a autoridade superior não integrante da estrutura hierárquica do órgão prolator da decisão recorrida. É o caso da decisão do dirigente de autarquia, em face da qual é aviado recurso ao Ministro da pasta correspondente. Como já explanado, a autarquia não guarda subordinação para com o Ministro de Estado, mas vinculação tendente a assegurar que não se afaste de seus objetivos institucionais e políticos. O recurso, neste caso, é denominado impróprio porque as autoridades não guardam relação de hierarquia entre si.

A doutrina administrativista adverte que a espécie recursal em exame somente é cabível quando expressamente capitulada em lei[23]. José dos Santos Carvalho Filho, todavia, escorado no fundamento de hierarquia orgânica da Administração e no direito de petição, defende o cabimento do recurso hierárquico impróprio ainda que sem previsão legal expressa[24].

Acerca da compatibilidade desta modalidade recursal com o sistema regulatório das agências independentes, a doutrina se divide em suas correntes.

A primeira defende que para a configuração de um órgão regulador como independente é imprescindível, no âmbito administrativo, que suas decisões gozem de definitividade. Incabível, por consequência, recurso hierárquico para a Administração Central[25].

A segunda advoga que no plano técnico o entendimento das agências é soberano. Cabe, todavia, recurso hierárquico impróprio em face das decisões que invadirem a competência para formular políticas públicas, incumbência essa pertencente ao núcleo estratégico do Estado[26].

Esta última parece-nos mais congruente com os objetivos e finalidades da regulação independente. O relevante, segundo entendemos, é a necessidade da agência funcionar como órgão técnico e independente, neutro, apartado das pressões político-partidárias. Somente assim poderá exercitar com eficiência todo o seu cabedal técnico. E, no desempenho finalístico de atividades técnicas, suas decisões devem ser plenas. A via recursal em tema finalístico deve se exaurir no âmbito do órgão regulador independente.

Não se pode, entretanto, perder de vista que a agência integra um todo maior, uma estrutura cuja missão é concretizar os postulados constitucionais. Enquanto órgão estatal deve respeito às políticas públicas definidas pelo núcleo estratégico do Estado, integrado pelos agentes políticos que compõem os Poderes Legislativo e Executivo. São eles que elegem as prioridades constitucionais (haja vista a impossibilidade de cumpri-las todas de uma só empreitada), bem como as linhas mestras para sua execução. À agência compete detalhar, para fins executórios, os planos e determinações contidos nas políticas públicas.

Uma das formas de assegurar obediência às metas e prioridades definidas pelo núcleo estratégico do Estado é o dever-poder de direção superior da Administração, cujo exercício é minudenciado no Decreto-lei n.o 200/67: a supervisão da Administração Indireta tem por fim garantir que o ente autônomo se mantenha firme na busca de seus objetivos institucionais e políticos. O recurso hierárquico impróprio, neste cenário, constitui modo de exercício desta supervisão na medida em que leva ao conhecimento da autoridade os desvios praticados pelo órgão regulador independente.

Demais disso, as agências exercem manifestação decisória não só em tema finalístico, mas também no exercício de atividades-meio relacionadas a questões administrativas internas. Possui esta natureza as decisões envolvendo servidores (concessão de licenças e férias, processos administrativos disciplinares, etc.), a aquisição de bens e serviços (licitações e contratos) e outras mais. As soluções nesta seara não devem se apartar daquelas adotadas por outros entes, personalizados ou não, que integram a Administração Pública. Não tem sentido que determinada prática ocasione a demissão de servidor de um órgão e, mantida a identidade do quadro fático, não ocorra o mesmo numa agência. Não é admissível que aplicada a pena de suspensão temporária de licitar ou contratar com a Administração[27], não seja ela respeitada por órgão de regulação independente integrante da mesma esfera de Administração. Tais exemplos, aos quais se pode acrescentar dezenas de outros, mostram a necessidade de coerência na interpretação e aplicação do ordenamento jurídico.

A uniformidade no trato de questões administrativas não relacionadas à atividade-fim da agência deve ser provida pelo Chefe do Executivo e por seus auxiliares imediatos. Justifica-se, nestes casos, a possibilidade do interessado aviar recurso hierárquico impróprio quando vislumbrar que a decisão da agência se afasta do entendimento pacificado no âmbito da Administração respectiva.

Em síntese, afigura-nos viável a interposição de recurso hierárquico impróprio diante dos atos e decisões da agência reguladora que (i) desrespeitarem as políticas públicas setoriais, ou que (ii) se relacionarem com as atividades-meio desenvolvidas por esses órgãos. Nos demais temas, sua decisão goza de definitividade no âmbito administrativo[28].

Sobre o autor
Marcelo Rodrigues da Silva

Procurador Federal e professor universitário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marcelo Rodrigues. Agências reguladoras: mediação de conflitos e recurso hierárquico impróprio. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3992, 6 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29189. Acesso em: 24 nov. 2024.

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