Heinz Leymann nasceu em 1932 na cidade alemã de Volfembutel. Nos anos 50, Leymann se mudou para a Suécia, onde se formou em Psicologia e aprofundou seus estudos na área da saúde, tendo obtido PhD em Psicologia, pela Universidade de Estocolmo, e doutorado em Psiquiatria, pela Universidade de Umea, onde trabalhou por muitos anos.
Na década de 80, curioso e observador como todo bom pesquisador, o professor Leymann ficou intrigado com a grande quantidade de casos de suicídio – e de tentativas de suicídio – que ocorriam entre as enfermeiras do sistema de saúde sueco. À época, essa era a categoria profissional que apresentava o maior índice de mortalidade devido ao suicídio.
O professor Leymann uniu-se à socióloga Annelie Gustafsson, sua colega na Universidade de Umea, e ambos analisaram os casos de vinte e uma enfermeiras que se suicidaram ou que tentaram cometer suicídio. O projeto tinha dois objetivos: o de estabelecer se as condições no local de trabalho causariam algum risco de suicídio (e em qual extensão), e o de sugerir estratégias para a prevenção desse risco.
Ao investigarem os casos, os pesquisadores identificaram algumas semelhanças entre eles. A principal era que as enfermeiras haviam sido vítimas de comportamentos hostis no ambiente de trabalho, praticados por seus colegas de forma repetitiva e prolongada, o que resultava em transtorno de estresse pós-traumático (TEPT ou PTSD). O TEPT é uma consequência comum a pessoas expostas a acontecimentos traumáticos, como abuso, violência ou acidentes, por exemplo, e pode apresentar, dentre outros sintomas, episódios de pânico, irritabilidade, insônia e pesadelos.
Tais comportamentos hostis eram muito semelhantes ao bullying praticado no ambiente escolar, em que um ou mais estudantes perseguem, humilham e agridem alguns de seus colegas, que acabam isolados do grupo.
Essa série de comportamentos foi batizada por Leymann de “mobbing”, um termo que já existia na ornitologia (o ramo da biologia que estuda as aves). Em algumas espécies de aves, é comum vários indivíduos reunirem-se e cercarem um predador de uma espécie diferente, com a finalidade de afugentá-lo. É uma postura antipredatória agressiva, adotada quando a comunidade é ameaçada. De fato, muitas vezes os atos de violência física ou moral praticados no trabalho têm a finalidade de que o colega assediado acabe pedindo demissão.
É óbvio que o “mobbing” – ou assédio moral, como conhecemos aqui no Brasil – sempre existiu nas relações de trabalho, mas foi apenas pelos estudos de Leymann que o fenômeno foi identificado e estudado.
O resultado dessa extensa pesquisa foi publicado no livro Självmordsfabriken (Editora Norstedts Juridik), palavra que em tradução livre significa “Fábrica de suicídios”. Esse título foi considerado tão provocativo que o Conselho Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional sueco, que inicialmente havia se oferecido para publicar a obra, recusou-se a ter qualquer envolvimento com o projeto.
O livro de Leymann e Gustafsson causou muito incômodo na sociedade sueca, não apenas por expor as péssimas condições de trabalho a que estavam sujeitas as profissionais do sistema de saúde, mas também por mostrar a ineficiência da legislação de prevenção de suicídios, que já existia à época.
Na polêmica obra, os autores descreveram, em detalhes, as histórias de três enfermeiras: Sarah Golgotha, Martha e Marie. Sarah era assediada pelos superiores porque fazia muitas perguntas. Martha sofreu assédio, buscou apoio de seu sindicato e negaram-lhe ajuda. Marie foi vítima de humilhação porque um repórter expôs sua situação de assédio num jornal da pequena comunidade em que morava. Duas dessas enfermeiras tiraram suas vidas; a terceira ficou com um grave caso de transtorno de estresse pós-traumático.
Até sua morte, em 1999, Leymann tratou mais de 1.300 pacientes, 300 dos quais atendidos numa clínica especializada, submetidos a um programa desenhado, por ele, para tratar das vítimas de assédio moral no trabalho.
Mesmo três décadas depois da identificação do assédio moral no trabalho, e de suas terríveis consequências, ainda são muito frequentes as ocorrências dessa prática, especialmente no Brasil, onde as denúncias não param de crescer.
Por aqui existem várias fábricas de doentes, inválidos e suicidas, dentre as quais destacam-se os bancos. Um levantamento feito por Marcelo Augusto Finazzi Santos, da Universidade de Brasília, identificou, no período de 1993 a 2005, a média de um suicídio de bancário a cada vinte dias, e de uma tentativa – não consumada – por dia.