RESUMO: O tema tem como finalidade estudar os avanços doutrinários e jurisprudenciais acerca da entidade familiar, da adoção e da homossexualidade, chegando, por fim, à questão da adoção homoafetiva. Este estudo esclarece que, apesar do silêncio legal, existe a possibilidade jurídica de casais do mesmo sexo adotarem, desde que preencham os requisitos legais previstos no Código Civil/2002 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Visa, igualmente, desmistificar teses preconceituosas que até recentemente impediam ou dificultavam a concessão da adoção de menores aos casais homossexuais, mas, sobretudo, analisa caso concreto e os fundamentos jurídicos, lançados pelo Promotor de Justiça e pela Defensora Pública que atuaram no processo judicial, que levaram à concessão da adoção de duas crianças a um casal homoafetivo nesta Comarca, decisão judicial de suma importância no Estado e no país, que gerou esperanças e incentivou casais homoafetivos que desejavam ter filhos e já haviam sido reconhecidos juridicamente como entidade familiar. Em razão da sua relevância jurídica, a ação transformou-se no pioneiro e mais importante precedente jurisprudencial sobre o assunto, motivando a escolha do tema deste trabalho científico, o qual foi elaborado com a metodologia qualitativa, sendo utilizada a técnica da entrevista semiestruturada, da pesquisa doutrinária e da análise jurisprudencial, que tornaram possível concluir que a adoção homoafetiva não só é possível diante do ordenamento jurídico, como se trata de assegurar aos homossexuais e à criança e ao adolescente o direito constitucional a uma família.
Palavras-Chave: Família - Adoção - Homoafetividade.
RÉSUMÉ: Le thème vise à étudier l'évolution de la jurisprudence et de la doctrine à propos de l'entité familiale, l'adoption et l'homosexualité, pour éteindre, enfin, la questión de l’adoption par des couples homosexuels. Cette étude clarifie que malgré le silence légale, il y a la possibilité juridique de couples de même sexe adopter depuis qu'ils remplissent les conditions légales énoncées dans le Code Civil/2002 et dans le Statut des Enfants et des Adolescents. Cet article especifique à le fin de démystifier des thèses préjudicent qui jusqu'à récemment, empêchaient ou entravaient l'octroi de l'adoption d'enfants pour les couples homosexuels, mais analyse, principalement, le cas et les fondements juridiques lancée par le promoteur de justice et de la adovcat de la défense qui a agi dans le procès, qui ont conduit à l'octroi de l'adoption de deux enfants par un couple homosexuel dans cette ville. Il s’agit d’un jugement très important dans l’État e dans le pays qui a suscité des espoirs et encouragé les couples homosexuels qui souhaitent avoir des enfants et a été légalement reconnue comme une unité familiale. En raison de sa signification juridique, l'action est devenu le pionnier et le plus important précédent sur la question, en motivant le choix du thème de ce travail scientifique, qui a été préparé avec la méthodologie qualitative, em utilisant la technique du entrevue semi-structurée, la recherche doctrinale et la analyse jurisprudentielle, ce qui a permis de conclure que l'adoption est non seulement possible devant la loi, comme il s’agit de garantir à l’enfant et à l’adolescent le droit constitutionnel à une famille.
Mots-clés: Famille – adotion - homosexualité
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo científico tem por escopo observar a evolução da família, o conceito de adoção e a sua previsão legal, os conceitos percebidos, no decorrer da história, referentes à homossexualidade e, principalmente, a possibilidade de uma criança ou adolescente ser inserido no seio de uma família homoafetiva. No primeiro item, analisou-se a entidade familiar, desde seu conceito primitivo, quando a família, além de patriarcal e hierarquizada, constituía-se mediante a união do homem e da mulher, que deviam celebrar o casamento, até à sua visão contemporânea, quando a sociedade passou a contar com famílias chamadas não convencionais, não formadas estritamente pelo parentesco consanguíneo. No segundo item, conceituou-se o instituto da adoção e verificaram-se os dispositivos legais pertinentes, bem como foi lançada a problemática da possibilidade da adoção homoafetiva. No item seguinte, analisou-se a evolução conceitual da homossexualidade e registraram-se as principais conquistas jurisprudenciais dos casais homoafetivos. Por fim, no quarto item, adentrou-se no tema núcleo do presente trabalho, a adoção homoafetiva de crianças e adolescentes, momento em que foram apresentadas não só inovações dentro do ordenamento jurídico que integraram casais homoafetivos nos requisitos autorizadores da adoção, como também restou demonstrado que o preconceito, que impedia ou dificultava a concessão da adoção aos casais do mesmo sexo, pode ser considerado mito. Além disso, abordou-se o primeiro precedente jurisprudencial no país a respeito da possibilidade da adoção homoafetiva conjunta.
A relevância jurídica do tema revela-se na inovação jurisprudencial, pois a ação processual pioneira, que ensejou na concessão da adoção de duas crianças a um casal homoafetivo, além de ter tramitado no Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Bagé, desafiou a legislação brasileira para dar prioridade ao princípio da dignidade humana e da proteção integral à criança e ao adolescente.
Todavia, apesar de ter sido consolidada jurisprudencialmente, tanto pelo Supremo Tribunal Federal, quanto pelo Superior Tribunal de Justiça, a adoção homoafetiva, hodiernamente, sofre a carência de legislação pertinente no Brasil, problemática envolvida ao tema.
Em razão disso, o trabalho em tela objetiva levantar o questionamento acerca da possibilidade da adoção homoafetiva conjunta, o confronto entre a ausência de disposição legal e a pacificação jurisprudencial no tocante ao tema, somente possível diante do estudo específico da evolução do modelo familiar, da legislação pertinente à adoção e do conceito da homossexualidade.
A metodologia utilizada para realização deste artigo científico foi a qualitativa. A técnica da entrevista semiestruturada, a pesquisa bibliográfica e a análise jurisprudencial deram suporte ao desenvolvimento do conteúdo. Mas, sobretudo, as entrevistas realizadas com o Promotor de Justiça, a Defensora Pública e o casal homoafetivo que fizeram parte da consolidação do mais importante precedente jurisprudencial sobre o tema deste trabalho foram indispensáveis à sua conclusão.
2 Evolução Histórica e Atual Modelo de Família
Historicamente, a origem da palavra “família” emana do termo em latim “famulus”, que significa “escravo doméstico”. Isso porque, segundo Dias (2007, p. 28), a família primitiva dispunha de um perfil hierarquizado e patriarcal, que foi modificado após a revolução industrial, em decorrência da necessidade de aumentar a mão de obra em atividades terciárias, momento em que a mulher ingressou no mercado de trabalho e o homem deixou de ser o núcleo da família e a única fonte de sobrevivência familiar.
Nesse contexto, no que diz respeito à evolução histórica da família, e, conforme o entendimento de Dias (2007, p. 29), “o formato hierárquico da família cedeu lugar à sua democratização”.
Ainda, quanto à evolução legislativa da entidade familiar, Louzada (2011, p. 268) descreveu que, até o Código Civil de 1916, regulava-se o modelo familiar do início do século passado, que somente poderia ser formado a partir do matrimônio, apesar de a doutrina e a jurisprudência já admitirem o reconhecimento da união estável, enquanto a Constituição Federal de 1934 foi a primeira a delinear a entidade família em seu contexto, determinando a indissolubilidade do matrimônio. Mais tarde, a Emenda Constitucional 9/1977 e, posteriormente, a promulgação da Lei Complementar 6.515/1977, instituíam o divórcio, revogando a indissolubilidade do matrimônio e extinguindo a sacralização da entidade familiar.
Todavia, Louzada (2011, p. 268) ressalvou que somente após a Constituição Federal de 1988 passou-se a admitir a formação de famílias distintas, no momento em que houve o reconhecimento da união estável e da família composta por qualquer dos pais e seus descendentes, ou seja, o matrimônio deixava de ser a forma originária de constituição da entidade familiar.
Por outro lado, destacou Louzada (2011, p. 269) que a união de pessoas do mesmo sexo só poderia ser regulada pelo direito obrigacional, uma vez que a união homoafetiva era concebida como uma sociedade de fato, tendo em vista que as pessoas que desta faziam parte eram consideradas sócias, e não companheiras, pois visavam ao lucro e não à comunhão de vida.
Outrossim, muito embora hodiernamente inexista vedação constitucional ou legislativa quanto ao reconhecimento da união homoafetiva, o silêncio legal não pode ser interpretado como ausência de direitos, porquanto atualmente o modelo familiar agregado pela doutrina e pela jurisprudência abrange ao seu conceito casais que, apesar de possuírem o mesmo sexo, são considerados uma entidade familiar, pois são unidos por um elo de afeto.
Como visto, o conceito da entidade familiar vem sendo modificado periodicamente diante da construção social e dos modelos atuais de comportamento. No entanto, vale descrever que, de acordo com Dias (2007, p. 28-29), a família constitui a base da sociedade e é o primeiro agente socializador do indivíduo. Reforçando esse conceito, Louzada (2011, p. 264) destacou que a família constitui um alicerce formado em razão da necessidade do ser humano de viver em comunidade e do seu instinto de perpetuação da espécie.
Assim, ante as frequentes modificações no tradicional modelo familiar, Rossato, Lépore e Cunha classificaram a família em:
a) natural: formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes;
b) extensa: formada também pelos parentes próximos com os quais a criança convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. Poderá evoluir para a família substituta com algumas ressalvas;
c) substituta: formada em razão da guarda, da tutela e da adoção. Pode ser concebida à família extensa, com algumas ressalvas, bem como a terceiros não parentes (2009, p. 27).
Diante do exposto, importante ressaltar o entendimento de Dias (2006, p. 45) acerca do atual modelo de família, o eudemonista[1], segundo o qual os indivíduos são importantes em sua singularidade, possuindo o direito à felicidade, independentemente da sua orientação sexual.
3 Adoção de Crianças e Adolescentes
O instituto jurídico da adoção foi primeiramente regularizado no Brasil, no sistema legal clássico, a partir da promulgação do Código Civil de 1916, o qual regulava tanto a adoção de adultos quanto à de crianças e adolescentes e possuía, por escopo, conceder filhos àquelas pessoas que biologicamente não os poderiam ter, sendo que uma de suas principais características era a possibilidade de dissolução do vínculo adotivo pela simples conveniência das partes ou nos casos de deserdação. Entretanto, Girardi (2005, p. 117) ensina que a adoção somente poderia ser conferida aos que, além de serem impossibilitados de gerar filhos, contassem com idade superior a conseqüência anos, tendo em vista a garantia de que o adotante, após o ato jurídico, não geraria prole natural. O adotante também deveria ser dezoito anos mais velho que o adotado e este somente poderia ser adotado por duas pessoas que fossem unidas maritalmente.
Ademais, Dias (2007, p. 425) esclarece que o vínculo de parentesco regulado pela antiga lei civil não se estendia aos demais membros da família, limitava-se ao adotante e ao adotado, efetivando-se mediante escritura pública. Além disso, o filho adotivo não gozava dos mesmos direitos e qualificações conferidos aos filhos biológicos.
Nesse diapasão, a Constituição Federal de 1988 inovou ao proibir quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação (art. 227, § 6º), da mesma forma que, com o advento do Novo Código Civil, o instituto da adoção sofreu alterações e, posteriormente, como afirma Dias (2007, p. 425), “buscando dar efetividade ao comando consagrador do princípio da proteção integral, o ECA deu prevalente atenção aos interesses de crianças e adolescentes”.
Isto é, surgiu a duplicidade normativa acerca da possibilidade da adoção, como elucidam Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 657), razão pela qual existiam duas espécies de adoção, a civil, para maiores de dezoito anos, e a estatutária, para crianças e adolescentes.
Entretanto, com a promulgação da Lei n.º 12.010/99, a adoção passou a ser regulada exclusivamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), instituído pela Lei n.º 8.069/90, que, inclusive, de acordo com Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 657), passou a ter aplicação subsidiária à adoção de maiores de dezoito anos de idade. Não obstante, Dias (2007, p. 428) acrescenta que são aplicados, supletivamente, os requisitos elencados no Código Civil, quando incompatíveis com a norma especial.
Deste modo, atualmente regida pelo ECA, a adoção de crianças e adolescentes no Brasil consiste em ato personalíssimo, excepcional, irrevogável, incaducável, pleno e constituído por sentença judicial, que somente será deferida quando presentes os requisitos subjetivos (idoneidade do adotante, motivos legítimos/desejo de filiação e reais vantagens para o adotante), e objetivos à adoção (requisitos de idade, consentimento dos pais e do adolescente ou destituição do poder familiar, precedência de estágio de convivência e prévio cadastramento), comentados pelos autores Rossato, Lépore e Cunha (2012, p. 212-213, 217 e 218).
A sentença judicial que decreta a adoção bilateral desliga completamente o adotado da sua família de origem, ou seja, ainda que os adotantes venham a falecer, o poder familiar dos pais naturais não é restabelecido, uma vez que a decisão judicial que confere a adoção é inscrita no registro civil e o vínculo de parentesco do adotado estende-se à família do adotante, pois, segundo Rossato, Lépore e Cunha (2012, p. 208-209) “os genitores não mais exercerão o poder familiar e, tampouco, ostentarão a qualidade de pais da criança ou adolescente adotado por outra família”. Os juristas descrevem (2012, p. 206), também, a adoção unilateral, “que pressupõe o rompimento do vínculo de filiação com apenas um dos pais biológicos, mantendo-se, por lógica, o vínculo com o outro pai biológico (pai ou mãe)”.
Insta salientar os critérios da idade e do estado civil do adotante, os quais constituem primordiais preceitos autorizadores da adoção numerados por Spengler (2011, p. 355), tendo em vista que, apesar de o adotante dever contar com, no mínimo, dezoito anos de idade (salvo se o adotado já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes), independentemente de seu estado civil, o artigo 42 do ECA prevê outros requisitos imprescindíveis à adoção, tais como a exigência de o adotante contar com, pelo menos, dezesseis anos a mais do que o adotando, e, em caso de adoção conjunta, os adotantes serem casados civilmente ou manterem união estável, comprovada a estabilidade da família.
Por outro lado, o artigo 45 do ECA refere-se ao consentimento dos pais ou do representante legal do adotante à adoção. No entanto, tais condições são dispensáveis, ao ver de Dias (2007, p. 431), no caso de os pais biológicos serem desconhecidos ou terem sido destituídos do poder familiar. A jurista também compreende ser desnecessária a prévia destituição do poder familiar quando a criança ou o adolescente estiverem em situação de risco ou forem abandonados. Todavia, em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, é imprescindível o seu consentimento. Além disso, Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 666) advertem que, sendo possível, o juiz deverá ouvir o incapaz, ainda que sua manifestação não seja vinculativa do juízo decisório do julgador.
Afora isso, Rossato, Lépore e Cunha (2012, p. 219) destacam a precedência de estágio de convivência, requisito que possui a função de verificar a compatibilidade entre o adotado e o adotante, cujo acompanhamento é realizado mediante estudo psicossocial, que determinará a presença das condições subjetivas à adoção.
Pois bem, ao conceituar a adoção, Pereira (2000, p. 213) afirmou que se trata da forma de constituição familiar, onde o adotante, mediante ato jurídico, traz à sua família, na condição de filho, pessoa que lhe é estranha, independentemente de com ela possuir laço de afinidade ou de parentesco consanguíneo. Reforçando este conceito, Gagliona e Pamplona Filho (2011, p. 666) referem que o ato da adoção atribui ao adotado todos os efeitos de direito, pessoais, patrimoniais e sucessórios.
Contudo, ao que consta, a lei especial reguladora da adoção de crianças e adolescentes silencia acerca da possibilidade da adoção homoafetiva, fato gerador de polêmicas entre os operadores do Direito e aplicadores da lei. No que diz respeito a esta controvérsia, Spengler (2011, p. 353) questiona: “A orientação sexual dos adotantes realmente será fator de risco para o seu desenvolvimento?”.
Sendo assim, basta concluir que o Estatuto de Criança e do Adolescente prioriza a convivência familiar como o ambiente para o desenvolvimento adequado dos infantes, onde, na ponderação dos princípios de proteção integral da criança e do adolescente e da manutenção da convivência familiar, não haveria prevalência do primeiro em detrimento do segundo.
4 Evolução Histórica e Construções Jurisprudenciais acerca da homossexualidade
De acordo com as autoras Farias e Maia (2009, p. 43), a homossexualidade, até o ano de 1700, era compreendida como um pecado contra Deus e, a partir do século XVIII, “passou a ser considerada como um crime social, um pecado contra a natureza, que o Estado tinha de combater”.
Mais tarde, no ano de 1869, como consta na obra de Girardi (2005, p. 66-67), criava-se o termo “homossexualismo” após a primeira importante discussão acerca da homossexualidade, ocasião em que o médico húngaro Karoly Benkert manifestou-se em defesa dos homossexuais, entendendo tratar-se de desvio heterossexual merecedor de tratamento médico. Com esse novo conceito, evitavam-se atrocidades contra os homossexuais, que eram, até então, maltratados e condenados à morte, severamente punidos pela prática de crime social.
Posteriormente, a homossexualidade também foi vista na sociedade como uma anomalia hereditária, merecendo, igualmente, tratamento médico. Porém, conforme descrevem Farias e Maia (2009, p. 45), esse novo conceito recebeu diversas críticas, frente ao “fato de que os pais de homossexuais raramente são homo ou bissexuais”. Mesmo assim, homossexuais passaram a ser esterilizados para que não transmitissem seus genes aos descendentes.
Em seguida, Girardi (2005, p. 67) aponta novo conceito, percebido por Sigmund Freud no ano de 1935, segundo o qual a homossexualidade era compreendida como o estágio não evoluído da heterossexualidade e, por conseqüência, não se apresentava como uma patologia.
Devido aos diversos estudos realizados por historiadores acerca da origem da homossexualidade, esta foi eliminada, no ano de 1973, pela Associação Americana de Psiquiatria, da categoria dos distúrbios mentais. Todavia, como afirmam Farias e Maia (2009, p. 49), somente no ano de 1985, “o Brasil eliminou o item que descrevia a homossexualidade como doença psiquiátrica no Código Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde”.
Nessa senda, insta salientar que a homoafetividade, de acordo com Dias,
[...] acompanha a história do homem, Não é crime nem pecado; não é uma doença nem um vício. [...] A origem não se conhece. Aliás, nem interessa, pois quando se buscam causas, parece que se está atrás de um remédio, de um tratamento para encontrar cura para algum mal. Mas tanto a orientação homossexual não é uma doença que, na Classificação Internacional de Doenças – CID, está inserida no capítulo Dos Sintomas Decorrentes de Circunstâncias Psicossociais. O termo “homossexualismo” foi substituído por homossexualidade, pois o sufixo “ismo” significa doença, enquanto o sufixo “dade” quer dizer modo de ser (2007, p. 182).
Dessarte, procurando dar efetividade à busca de direitos e igualdade entre os heterossexuais e homossexuais, a partir do ano de 1999 passaram a surgir construções jurisprudenciais. Com propriedade, Dias (2007, p. 189) lembra que a primeira delas sobreveio na justiça gaúcha, definindo a competência das varas de família para apreciar as uniões homoafetivas (TJRS, 8.ª C. Cív., AI 599 075 496, rel. Des. Breno Moreira Mussi, j. 17.06.1999). Posteriormente, no ano de 2001, a justiça gaúcha outra vez inovava ao reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar (TJRS, 7.ª C. Cív., AC 70001388982, rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. 14.03.2001).
Ainda, recente jurisprudência do Estado admitiu a possibilidade jurídica da conversão de união estável homoafetiva em casamento (TJRS, 8.ª C. Cív., AC 70048452643, rel. Des. Ricardo Moreira Lins Pastl, j. 27.09.2012).
Nesse sentir, e por fim, relevante destacar o pensamento de Dias acerca dos avanços jurisprudenciais no que tange aos direitos dos homoafetivos:
Merece ser louvada a coragem de ousar, quando se ultrapassam tabus que rondam o tema da sexualidade e rompe-se o preconceito que persegue as entidades familiares homoafetivas. Ainda bem que está havendo verdadeiro enfrentamento a toda uma cultura conservadora e firme oposição à jurisprudência ainda apegada a um conceito sacralizado de família. Essa nova orientação mostra que o Judiciário tomou consciência de sua missão de criar o direito. Não pode a justiça seguir dando respostas mortas a perguntas vivas, ignorando a realidade social subjacente, encastelando-se no conformismo, para deixar de dizer o direito (2007, p. 190).