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Responsabilidade dos bancos no pagamento de cheques sem fundos

Agenda 12/10/2014 às 23:29

A responsabilidade dos bancos quanto ao pagamento de cheques sem a devida provisão de fundos com base no Código de Defesa do Consumidor, no Código Civil e as resoluções do Banco Central do Brasil

RESUMO

A responsabilidade dos bancos quanto ao pagamento de cheques sem a devida provisão de fundos é a base da pesquisa frente a aplicação das diretrizes do Código de Defesa do Consumidor perante as instituições financeiras; a devida reparação de danos, através do instituto da responsabilidade civil previsto no Código Civil Brasileiro; as decisões do Superior Tribunal de Justiça quanto as relações de consumo que envolvem os bancos, e as normas do Banco Central do Brasil.

Para responsabilizar os bancos há que se procurar erros na prestação do serviço ou fornecimento do produto “cheque” ao consumidor que ao usar o cheque de forma incorreta, ou pouco responsável, causa danos a terceiros. Desse modo, há de ser específico, pontual, quanto ao problema, mas abrangente quanto à interdisciplinaridade das fontes, a fim de, chegar-se a uma visão ampliada do que se pretende atingir, que é a responsabilidade civil dos bancos quanto ao pagamento dos cheques sem fundos aos terceiros de boa fé.

 Fazem parte da abordagem os julgados do Tribunal de Justiça de SC que, de forma pioneira, responsabilizam os bancos pelo pagamento de cheques sem fundos, classificando tal prática como defeito e vício de produto e serviço prestado pelas instituições financeiras.

Palavras-chave: Cheque sem fundo. Responsabilidade Civil Bancária. Código de Defesa do Consumidor.

1- INTRODUÇÃO

A responsabilidade dos bancos no pagamento de cheques sem fundos tem como base a aplicação integral do Código de Defesa do Consumidor aos produtos e serviços prestados. Há, no entanto, alguma divergência doutrinária, pois ainda trata-se da questão a partir da Lei dos Cheques, porém, com recentes decisões dos tribunais em favor dos consumidores o assunto ganha maior repercussão.

Assim, ao aplicar o Código de Defesa e Proteção do Consumidor, os princípios constitucionais e o Código Civil Brasileiro, relacionando-os à questão da responsabilidade civil quanto aos danos provocados a terceiros, em face de, o produto, serviço bancário, ter sido prestado com desfeito ou vício, abre-se uma importante frente para a responsabilização das instituições financeiras quanto aos cheques sem provisão de fundos.

Não há aqui afronta a lei do cheque, pois o que se busca é a visão da responsabilidade civil objetiva como base para a ação de reparação de danos contra a instituição financeira pelos defeitos e vícios relacionados às cártulas em questão.

É uma aventura jurídica que tem como fundamento as decisões do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a Constituição Federal e as mudanças que ocorrem no mundo globalizado. Algo histórico, que afronta a escravidão financeira e leva esperança para os que se achavam desprotegidos, pois, há julgados onde prevalece o entendimento da responsabilidade dos bancos frente aos cheques sem provisão de fundo.

Não cobrar dos bancos a responsabilidade pelo manuseio das contas correntes é um erro, uma vez que usam o dinheiro do correntista para suas operações diversas e é de onde obtêm o lucro. (NORTH e MILLER, 1976, p.57)

Se prohibe a los bancos comerciales el pago de intereses sobre los depósitos a la vista (cuentas de cheques) que manejan. ¿ Cuál es el efecto de esta restricción? Debe estar claro que los bancos se benefician al manejar el dinero que usted depositó em su cuenta de cheques. La cantidade que usted deposita puede ser utilizada para inversiones, ya sea bajo la forma de prestamos a otros consumidores e em acciones, bonos y bienes raíces; todas estas operaciones proporcionan ingresos al banco. Por lo tanto, los bancos están perfectamente dispuestos a competir por El manejo de SUS apreciables dólares.

O texto acima mostra o quanto os operadores do Direito precisam se preparar para discutir a efetiva responsabilidade dos bancos, pois há no setor vantagens e desvantagens econômicas que atingem aqueles que abrem uma conta corrente e, a partir dali, movimentam seus rendimentos. Talvez, no futuro os correntistas tenham direito, inclusive, a participação nos lucros, afinal, é com o dinheiro destes que se multiplicam as riquezas bancárias.

Para a questão,  vale analisar  alguns números, entre os quais, a taxa de inadimplência com relação aos cheques, onde, até o mês de setembro de 2009 foram devolvidos 20 milhões, 503 mil, 156 cheques sem fundo. SERASA EXPERIAN (2009)

Agora, comparando os números, fornecidos pela SERASA e FEBRABAN – Federação Brasileira dos Bancos, e multiplicando a taxa média cobrada do correntista quando da emissão do cheque sem provisão de fundos, pelo número de cheques emitidos no ano de 2009, tem-se:

O calculo acima, por mais simples que seja, mostra que para o sistema bancário há uma grande vantagem quando ocorre a emissão de cheques sem provisão de fundos. Levando-se em conta que a inadimplência fica abaixo dos 6% o valor que recebem é considerável.

Verdade é que, os cheques sem fundo fazem parte de planilha de taxas de serviços dos bancos. E, além da cobrança pela devolução dos cheques, as instituições lucram com os juros gerados no crédito do cheque especial, um dos mais caros do mundo.

Nesse sentido, com o melhor amparo no Código de Defesa do Consumidor, juntamente com o estudo de outras fontes, igualmente importantes, dentre as quais: o Código Civil Brasileiro, o Código Penal Brasileiro, o Direito Internacional, as Resoluções do Banco Central do Brasil e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, busca-se a implementação da justiça social e econômica, com base nos princípios da boa-fé, função social dos contratos e do crédito, e a solidariedade para garantir a efetiva proteção do consumidor quanto aos danos que venha a sofrer pelo tema em questão.

Assim, discutir a responsabilidade civil bancária é uma viagem oportuna sobre a história das relações de consumo, a intervenção do Estado sobre a economia, à problemática da responsabilidade civil na esfera contratual e extracontratual, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor a estas instituições, entre outros temas relacionados principalmente com solidariedade e a proteção da dignidade econômica.

Ao final do apresentar das idéias, que se quebrem os velhos paradigmas da impunidade bancária, e com base nessa pesquisa, com fundamentos e argumentos consistentes se aplique a defesa do consumidor e se garanta a justa reparação quanto aos danos provocados pelas cártulas descobertas de seus fundos.

2- HISTÓRIA, INTERVENÇÃO E PUBLICIDADE

Fator importante é o aspecto de como aplicar, e qual a amplitude do CDC – Código de Proteção do Consumidor ao monopólio bancário brasileiro. Para tanto, cabe um breve histórico das intervenções do Estado sobre a economia, a fim de, buscar o equilíbrio e inibir os abusos do mercado.

A intervenção do estado é um processo que vem de séculos, pois já nos textos bíblicos encontram-se recomendações quanto à atitude de agir com honestidade nas relações comerciais. É o que se encontra nos livros do Levítico 19, 36 e no Deuterômio, 23, 19 e 25, 13, 15 onde se impõe a lisura e a honestidade no comércio. (SAYEG, 1995, p. 21)

Assim, a história da humanidade se reflete em surtos de desenvolvimento, onde o apogeu das civilizações estava ligado a um volume maior do seu comércio exterior. Então, nos primórdios da economia, as riquezas se davam em virtude de comerciantes e navegadores. (BATISTI, 1999)

[...] mesmo que a agricultura gerasse excedente, somente o comércio poderia tornar palpáveis os lucros da atividade. Daí se concluir que nas eras, antiga, medieval e mesmo na contemporânea, o grande impulsionador da produção de riqueza para esses povos e nações era o comércio.

[...] as relações comerciais é que permitiram que se destacassem há seu tempo, visto que, nenhum outro fator isoladamente justificou essa pujança e esse destaque.

Passar do comércio, para o surgimento da Responsabilidade Civil, é entender que nos primórdios da humanidade, não se cogitava do fator culpa, pois o dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não imperava, ainda, o direito, nem regras, ou limitações de vingança: “forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação contra o mal sofrido”; solução comum de vários povos que nas suas origens, tinham a reparação do mal pelo mal. (GONÇALVES, 2005)

Já no período da revolução industrial, do progresso científico e da explosão demográfica deu-se uma nova concepção para a responsabilidade civil. Foi no campo dos acidentes de trabalho que a noção de culpa, como fundamento da responsabilidade, revelou-se insuficiente. Na media em que a produção passou a ser mecanizada, aumentou vertiginosamente o número de acidentes. O operário ficava desamparado diante da dificuldade – não raro, impossibilidade – de provar a culpa do patrão. (CAVALIERI FILHO, 2005)

Assim também, com relação ao consumidor há que se apontar como momento inaugural para a proteção das relações de consumo a declaração do Presidente Kennedy em março de 1962. (Rosa, 1995):

“Os bens e serviços colocados no mercado devem ser sadios e seguros para o uso; promovidos e apresentados de maneira que permita ao consumidor fazer uma escolha satisfatória; que a voz do consumidor seja ouvida no processo de tomada de decisão governamental que determinou o tipo, a qualidade e o preço de bens e serviços colocados no mercado; tenha o consumidor o direito de ser informado sobre as condições de bens e serviços e ainda o direito a preços justos.”

Desse modo, o mercado mudou de gerente, “passou das mãos do Estado para ser subordinado às grandes forças empresariais”, ou seja, os fornecedores em situação monopolista. (SAYEG, 1995)

E, devido a essa guerra de forças, em que, a concretização de uma justiça dialética passa pela necessária mudança social, transformando a economia em favor da sociedade. (AGUIAR 1987)

Oportuno então, que se mostre a importância do comércio para o desenvolvimento econômico, bem como, a atuação benéfica e necessária do Estado sobre a economia regulando as relações de consumo. Motivo pelo qual, no tópico seguinte o consumidor, e sua vulnerabilidade será o enfoque de estudo, mostrando que atualmente está prejudicada sua autonomia de escolha, e desse modo, ganha maior preocupação a necessidade de ampliar os mecanismos de proteção.

3- O HOMEM DE NECESSIDADES: CONSUMIDOR

O atual modelo socioeconômico leva todos a serem consumidores. Consumir é uma imposição para inserir o indivíduo, o cidadão ao mundo moderno. Chega-se a ser mais ou menos importante para o mercado, conforme o poder financeiro para adquirir produtos e serviços, (SAYEG, 1995):

“A pessoa integrada na sociedade tem necessidades de tudo o mais que esta mesma sociedade pode lhe prover, na proporção de sua própria integração, como, e.g., a corriqueira necessidade de se trajar vestimentas compatíveis coma a situação social em que se encontram.”

Necessária uma lógica ponderação sobre o papel do homem e por conseqüente sua posição social ou mercadológica, pois, suas necessidades de consumo, definem a classe onde se encontra, (LÔBO, 1996):

[...] na atualidade a economia é dominada pela macroempresa ou pelos monopólios e oligopólios, que criam as necessidades de consumo, mediante os engenhosos mecanismos de publicidade, e na qual o consumidor não desempenha qualquer papel ativo. O produto ou serviço não são postos em circulação apenas para responder as necessidades sentidas de consumo, mas para provocar a necessidade de consumo.

Quanto ao aspecto da criação das necessidades de consumo o sistema econômico exerce sobre as pessoas uma pressão, pois este é o objetivo de toda propaganda e publicidade. As pessoas são levadas a consumir ou deixar de consumir por indução. (JACOBINA 2002 apud KOTLER 1980, p. 15):

O que o homem realmente precisa? É a pergunta que faz Philip Kotler. E ele responde: “Algumas centenas de gramas de comida todos os dias, aquecimento e abrigo, dois metros para se deitar e alguma forma de trabalho que lhe proporcionará uma sensação de realização. E isso é tudo, sob o aspecto material. Todos sabem disso. Mas recebemos uma lavagem cerebral de nosso sistema econômico, até que terminemos numa tumba, debaixo de uma pirâmide de prestações, hipotecas, utensílios absurdos, brinquedos que desviam nossa atenção de tudo isso”.

Outra ponderação é o fato de, o consumidor, persuadido através de múltipla exposição publicitária, para levá-lo ao consumo, deixa de ser um sujeito de necessidades para virar cliente, publico alvo. E, desse modo, acaba como cobaia do mercado, onde nas agências de propaganda, tem seus hábitos rigorosamente estudados, para que se descubram as melhores e mais baratas formas de induzir. É o que se coloca (JACOBINA 2002):

É descabido tratar de publicidade simplesmente como informação. O objetivo primordial da publicidade não é informar, mas induzir a compra. Em suma, publicidade não é informação, é persuasão. Quem patrocina um anúncio publicitário não visa, simplesmente, a informar ao público sobre seu produto. Visa, isso sim, a vendê-lo. Publicidade, assim é a arte de criar, no público, a necessidade de consumir.

Fica então a pergunta, qual direito é devido à pessoa, consumidor ou terceiro equiparado, que recebe um cheque sem provisão de fundos, e que na boa-fé acreditou na solidez da instituição financeira que imprimiu sua marca – imagem de garantia e qualidade de serviço – no talonário? Vale lembrar, Menna Barreto (JACOBINA, 2002 apud RIBEIRO e outros, 1995):

A propaganda diz que você será aceito, amado, respeitado, vitorioso, contanto apenas que tenha... esse ou aquele produto. É uma vergonha você não ter. Mas tendo, não importa como, as portas do paraíso se abrirão para você. Aliás, elas já estão lá, abertas, esperando-o; basta ter, hoje mesmo...”.

Visto o efeito da publicidade e da informação como elemento de persuasão à próxima abordagem diz respeito à disciplina da responsabilidade civil e sua aplicação na defesa do consumidor, buscando efetivar a reparação dos danos sofridos pelo mesmo no mercado de consumo.

4- RESPONSABILIDADE CIVIL

A tendência hoje é de não se deixar desamparada a vítima de atos ilícitos ou lícitos que venham a causar algum dano, pois, é necessário agir para reparar o prejuízo sofrido. “A responsabilidade civil se assenta, segundo a teoria clássica, em três pressupostos: um dano, a culpa do autor do dano e a relação de causalidade entre o fato culposo e o mesmo dano”. (Gonçalves, 2005)

Desse modo, é necessário enquadrar à teoria das modalidades de risco na responsabilidade civil, e que pode tomar como base o ensinamento de Cavalieri Filho (2005, p. 156 - 157):

Assim, a potencialidade do dano está no exercício da própria atividade, com força para dispensar outras indagações quanto à obrigação de reparar. Pois, o que exerce a ocupação assume os riscos decorrentes. (STOCO, 2004)

Abordadas as teorias do risco, as possíveis frentes de responsabilidade, o objetivo protetor que acompanha o interesse da Justiça, segue o próximo tópico, adentrando ainda mais nas relações de consumo e de como se posicionam as teorias sobre o assunto.

5- RESPONSABILIDADE NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

Abordar a responsabilidade civil nas questões de consumo consoante aos postulados da teoria da responsabilidade objetiva, mesmo sem culpa, tem o fornecedor de indenizar os danos que, eventualmente, seu produto ou serviço venha a provocar. Lembre-se, aqui, dos termos do art. 931 do CC de 2002, vesbis: “Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem, independentemente de culpa, pelos danos causados pelos produtos postos em circulação”. (SAAD, 2006)

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A Lei 10.406 de 2002, Código Civil Brasileiro, tem previsão para a responsabilidade civil e a reparação dos danos causados em alguns dos seus artigos, especificamente no artigo 927, parágrafo único, que estabelece a responsabilidade civil objetiva, abrangendo a relação extracontratual.

Falar do “risco” como entendimento exaurido no perigo, é entender que a atividade perigosa não é suficiente para indenizar o dano que essa ação cause a terceiro, mas sim, o ato de causar dano pelo exercício defeituoso da atividade desenvolvida sem atrelamento a segurança nela exigida. (ALVES, 2005):

Bem por isso, se a sociedade empresária “por sua conta e risco” desenvolve determinada atividade financeira, ficam as operações que nela pratica “sob sua inteira responsabilidade”, ainda que não seja ela atividade perigosa, mas atividade que possa haver potencial dano ao alter, cliente ou não da instituição financeira, ou não.

Ao abordar algumas questões do Código Civilista entende-se que a responsabilidade do fornecedor não obedece, estritamente, ao que se contem no art. 186 do Código Civil de 2002; [...] a responsabilidade se define pelo prejuízo sofrido; [...] se ela concorreu para o dano por culpa ou negligência de sua parte. (SAAD, 2006)

O Código Civil deixa claro que a prática de ação ou omissão que causar dano é um ato ilícito, portanto, deve ser reparado (art. 186, CC 2002). E, mesmo quando tal prática for amparada pela titularidade de um direito, se este exceder aos limites do seu fim econômico e social, também há de ser reparado (art. 187, CC. 2002).

Lógico que o abuso de direito, não deve ser tolerado, e tampouco no domínio do contrato ou das relações comerciais. A liberdade de contratar, não pode redundar em prejuízos injustos para terceiros e para a sociedade em geral (THEODORO JÚNIOR, 2004).

Assim, a responsabilidade fundada na teoria do risco da atividade, segunda parte do parágrafo único do art. 927 do CC, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida causar, a pessoa determinada, um ônus maior do que aos demais membros da coletividade. (PASQUALOTTO, 1991)

Desse modo, vínculo gera obrigação, como expressa a clássica definição das Institutas de Justiniano: obligatio est juris vinculum, quo necessitate adstringimur alicujus solvendae rei, secundum nostrae civitatis jura (Liv. 3º, Tit. XIII) (a obrigação é um vínculo jurídico que nos obriga a pagar alguma coisa, ou seja, a fazer ou deixar de fazer alguma coisa). (VENOZA, 2002).

Para distinguir “obrigação” de “responsabilidade” ensina Sérgio Cavalieri Filho (2005, p.24): “Obrigação é sempre um dever jurídico originário e Responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, conseqüente à violação do primeiro”.

Quanto à reparação do dano, a legislação civil pátria, lembrando novamente o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil que prevê a condicionante obrigação de indenizar, independente de culpa, bastando que terceiro seja prejudicado por ato praticado em função da mera atividade desenvolvida. Desse modo, entre as obrigações existentes (dar, fazer, não fazer), o Código agora inclui a obrigação de indenizar. (CAVALIEI FILHO, 2006):

É aqui que entra a noção de responsabilidade civil. Em seu sentido etimológico, responsabilidade exprime a idéia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge dessa idéia. Designa o dever de alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um outro dever jurídico.

Então, se antes a regra era a irresponsabilidade, e a responsabilidade, a exceção, pois os atos danosos estavam protegidos pelo manto da culpa, agora, a regra será a responsabilidade por exigência da solidariedade social e da proteção ao cidadão, consumidor e usuário de serviços públicos e privados. (CAVALIERE FILHO, 2006)

            A vida em comunidade leva a uma pressão social para que os riscos sejam distribuídos para aqueles com maior capacidade de reparar os danos, assim, a vítima passa a ocupar o lugar central na questão da responsabilidade, e não mais o autor da ação ou omissão danosa.

6- RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE CHEQUES SEM FUNDOS

O tópico em questão adentra na responsabilidade dos bancos pelos danos causados a terceiros que recebem cheques sem a devida provisão de fundos. Afinal, o que se busca é a efetiva reparação do dano causado ao terceiro de boa-fé.

Nesse contexto faz-se necessário saber o que é o Cheque, onde segundo o Banco Central do Brasil (2009),


A operação com cheque envolve três agentes:

A FEBRABAN (2009) define cheque como “uma ordem de pagamento à vista. Pode ser recebido diretamente na agência em que o emitente mantém conta ou depositado em outra agência, para ser compensado e creditado na conta do correntista”.

A utilidade do cheque é permitir a circulação de riqueza. Sua origem remonta a idade média, durante a exploração do ouro, onde, após este ser depositado em instalação com a segurança adequada – as oficinas de ourives – tinha sua circulação feita pela emissão de papéis que representavam o valor das partidas de ouro ali depositadas, que por sinal, era mais seguro do que circular com metal precioso. (WIKIPÉDIA, 2009)

Segundo a empresa CMP Assessoria Contábil Ltda. (2009),

A grande utilidade prática do cheque é a de servir como instrumento de pagamento. Permite, portanto, a retirada dos fundos em poder do banqueiro, pelo próprio depositante ou por terceiros; permite o pagamento à distância e também permite ajustes por compensação, substituindo-se a moeda, pelos cheques, podendo-se falar de uma verdadeira moeda escritural, existindo ao lado da moeda fiduciária. Outra vantagem, sob esse aspecto, é a de reduzir a circulação da moeda pelo pagamento mediante cheques.

Ao entender que o cheque é uma ordem de pagamento à vista, que sua utilidade social é permitir a circulação da riqueza, será abordada a responsabilidade civil relacionada aos bancos, onde se argumenta: “esta sofreu modificações em razão do notável desenvolvimento, modernização e diversificação dessa atividade no país” (STOCO, 2007). Portanto, atualmente, nas questões relacionadas ao consumidor, a responsabilidade civil assume a forma objetiva.

Vilson Rodrigues Alves (2005, p. 87):

Os estabelecimentos bancários, ao dedicarem-se a atividades financeiras em seu funcionamento, hão de responder civilmente pelos eventos danosos que o exercício de tais atividades gerarem para clientes e não-clientes, independentemente de serem eles irradiados de conduta positiva ou negativa culposa, ou não, de seus agentes.

A afirmação generalizada é de que a responsabilidade civil dos bancos, sem culpa, justifica-se pelo risco criado no exercício das atividades inerentes às suas operações. (ALVES, 2005):

Esse risco criado pelas atividades bancárias, principais e secundárias, sobretudo na intermediação na circulação do dinheiro, está in re ipsa, pela probabilidade de dano.

Nessa atuação por sua conta e risco, mutatis mutandis, sob sua responsabilidade exclusiva e excludente de culpa ou dolo à caracterização dela, os bancos dedicam-se principalmente a operações financeiras e, secundariamente, prestam serviços ipso facto bancários.

A responsabilidade das instituições na forma objetiva, surge do próprio risco da atividade bancária, e basta um pequeno descuido para se materializar algum dano. É a simples causação (causalidade extrínseca), sem cogitar-se da intenção do preposto bancário. (FRIGERI, 1998).

O Desembargador Eládio Torret Rocha (2008), do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, coloca que “o beneficiário de cheque devolvido por falta de provisão de fundos qualifica-se, de sua vez como consumidor”. Isso se dá pela equiparação do artigo 14 da Lei 8.078 de 1990. Portanto, passível de ter reparado civilmente, com base na teoria objetiva, o prejuízo que teve ao receber o título sem saldo. E, mais:

Assim, exurge do próprio delineamento de um sistema jurídico calcado na responsabilidade social e na efetiva reparação de danos — sobretudo face ao fenômeno da constitucionalização e repersonalização do direito privado, o qual implica a revisita dos institutos jurídicos, dentre eles, o da responsabilidade civil — a possibilidade de os sacados virem a responder, assegurado o manejo da ação de regresso, pela emissão de cheques sem provisão de fundos realizada pelos sacadores dos títulos, especialmente porque a esse fato incide, a toda evidência, o art. 14 do CDC, o qual dispõe acerca do defeito na prestação dos serviços.

Ao entender que o banco representa uma empresa especializada, que se dedica à prestação de serviços mediante remuneração adequada, e que, o poder destes os distância dos clientes, que são leigos quanto às práticas financeiras é fácil constatar que a responsabilidade civil tem como uma das bases a teoria do risco profissional, conhecida por culpa de serviço. (FRIGERI, 1998)

            Carlos Prudêncio, Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (2008), ao analisar Apelação Civil, quanto à emissão de cheque, afirma que ocorre dano ao consumidor quando este recebe o título sem a devida provisão de fundos, e:

Então, se o banco é remunerado pela atividade de manutenção de conta corrente com fornecimento de cheques, produzindo lucro com a devolução destes cheques, tanto de quem os emite, quanto de quem suporta o infortúnio, deve ser ele responsabilizado como um verdadeiro risco da atividade, na medida em que é o próprio banco quem autoriza a emissão de tais títulos ao entregar o talão ao correntista.

Não se mostra justo – aliás, é um contrassenso – que os bancos lucrem com a devolução de cheques e se eximam de indenizar os indigitados beneficiários dos títulos, vez que são aqueles que detêm todos os instrumentos para vedar o locupletamento ilícito do emitente, devendo melhora analisar as condições patrimoniais deste antes do fornecimento de talões.

Então, ao inserir a idéia de que as pessoas passaram a lutar contra abusos intermináveis e incontidos, vê-se que se passou a enxergar que o banco não te direito de aproveitar da necessidade de dinheiro que todos têm em maior ou menor intensidade. Não há legitimidade para o direito de agravar a situação financeira de ninguém e ficar impune. O limite está traçado na Lei Maior, cujo anseio é a dignidade da pessoa humana e absoluta contrariedade ao aumento arbitrário do lucro. (RODRIGUES, 2008)

E, mesmo que sejam muito organizados, os bancos, em suas atividades que são de grande infinidade, estão sujeitos a cometer alguns erros, por falhas que qualquer sistema acarreta, gerando prejuízos a clientes ou a terceiros. (CAVALIERI FILHO, 2005)

Sabe-se que há uma falta de legislação específica quanto à problemática das questões bancárias, motivo pelo qual as lides que envolvem o setor são geralmente resolvidas à luz da doutrina e jurisprudência. Ficando nesse ponto a aplicação da responsabilidade contratual, quando afeta aos clientes e extracontratual quando afeta a terceiros. (GONÇALVES, 2005)

Quanto à posição dos Tribunais, os mesmos tem se manifestado, com a seguinte orientação, (GONÇALVES, 2005):

Assim, ao tratar do nexo de causa entre a lesão e a conduta do estabelecimento bancário, por ação ou omissão, nos danos causados a terceiro, tem a seguinte manifestação, (ALVES, 2005):

Basta o nexo objetivo entre a conduta do banco comercial e a lesão à esfera jurídica daquele que, ipso facto, já se legitima ativamente ao exercício extrajudicial da pretensão de direito material a indenização.

Havendo ou não culpa de serviço, esteja ela provada ou não, se existe dano e se ele foi causado nas atividades dos bancos comerciais a clientes ou a não-clientes, há indenizabilidade, salvo se falta um dos requisitos, como se, e.g., na relação jurídica intersubjetiva não se verificou desigualdade que lhe é pressuposta, tal a relação jurídica interfinanceira banco/banco.

O texto acima é enfático em colocar que o fornecedor é o novo garantidor de todos os serviços e produtos por ele colocados no mercado de consumo. Portanto, responde o banco perante terceiros, quanto aos danos oriundos dos cheques.

E, entendendo ser obrigação o ato de reparar os danos causados pela emissão de cheques sem fundos, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, vem decidindo pela responsabilidade civil objetiva dos bancos em função da ação de seus correntistas.

No mesmo Tribunal têm-se outros julgados, que ganham respaldo por parte dos operadores jurídicos, para dinamizar uma nova justiça econômica, que ponha fim a impunidade dos bancos no gerenciamento inadequado das contas correntes.

Desse modo, percebe-se que a tese de Fábio Ulhoa Coelho (COELHO, 2004, p. 272), baseada na lei do cheque, de que os bancos não respondem em hipótese alguma por qualquer obrigação quanto ao controle dos cheques sem fundo emitidos pelos correntistas, começa a dar espaço a uma nova interpretação, onde estes passam a ser responsáveis pelos atos praticados por seus clientes.

Em contraponto, a previsão da Lei 10.406 de 2002, intitulada Código Civil Brasileiro, vem resgatar valores mais fortes para a concretização de uma sociedade mais justa. Veja-se a determinação legal:

Oportuno então, que os bancos respondam de forma objetiva pelos cheques sem provisão de fundos emitidos por seus clientes, pois, conforme o acórdão do RE nº 3.876-SP, de 3 de dezembro de 1942, que resultou na súmula nº 28 do STF, se reconhece a obrigação de o banqueiro responder pelos danos que causar, em virtude do risco que assume profissionalmente.

Quanto ao pagamento de cheques, já se previa que “recai sempre sobre o banco sacado a responsabilidade de indenização, pouco importando se este seja falso, falsificado ou alterado”. (BRAGA, 2004)

Oportuno resgatar o pensamento do Desembargador Carlos Prudêncio (AI nº 1999.017295-3, DJ de 25-5-2000), quanto à concepção inovadora para o direito, que deve evoluir conforme as necessidades:

[...] considerando o direito do consumidor como norma fundamental e princípio informador do ordenamento jurídico, é perfeitamente admissível..., considerar o recebedor de cheque sem FUNDO como consumidor vítima de serviço mal prestado por instituição financeira;

Uma vez acolhido o risco profissional, o banqueiro, que retira proveito dos riscos criados, deve arcar com as conseqüências de sua ilicitude. Com isso, a vítima libera-se da prova da subjetividade, pois, já não se questiona o dolo ou a culpa do banco. (FRIGERI, 1998)

Por sua vez, a vulnerabilidade do consumidor significa que ele é o elo mais fraco, desamparado, quando considerado que os proprietários dos meios produtivos detêm todo o controle de mercado, ou seja, o controle sobre o que produzir, como produzir e para quem produzir, além da fixação das margens de lucro. (SEGAL, 2004)

Nesse ínterim, defende o Advogado Nehemias Domingos de Melo (2006, p. 3), que responsabilizar os bancos pelo pagamento dos cheques de seus clientes, emitidos sem suficiente provisão de fundos, poderá ser a maneira pela qual se possa exigir melhoria na qualidade dos serviços prestados pelos mesmos, de tal sorte a prevenir e evitar os incalculáveis prejuízos que são impostos à população.

Importante destacar, que apesar de toda proteção dada ao consumidor o banco não fica desamparado, pois para evitar injusta obrigação, há o artigo 934 do Código Civil Brasileiro, que trata do direito de regresso para aquele que ressarcir o dano causado por outro:

Assim, amparado pelo Código Civil pode o banco reaver seu prejuízo junto ao cliente inadimplente, mas não está este imune de qualquer responsabilidade, pois ao exercer atividade profissional com intuito de lucro, assume também os prejuízos que podem dela advir. Como se diz “ubi commoda, ibi sunt incommoda” ou “ubi est emolumentum, ibi est ônus esse debet”; o que colhe as vantagens deve arcar também com as desvantagens, pois este é o risco inerente ao seu exercício. (ALVEZ, 2005)

7- PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Ao analisar as bases constitucionais no que tange a proteção do consumidor brasileiro, já no artigo 48 da ADCT – Ato das Disposições Transitórias tem-se a determinação para que o Congresso Nacional elaborasse o Código de Defesa do Consumidor, desse modo Ada Pellegrini Grinover e Antônio Herman de Vascolcellos e Benjamin (CONSUMIDOR, 2007, p. 8) fazem a explicação da base constitucional:

A proteção das necessidades do consumidor, do respeito a sua dignidade, segurança, proteção dos interesses econômicos e melhora na qualidade de vida justificam-se para a aplicação de um tratamento diferenciado, pois isso é tutelar o desenvolvimento econômico, social e tecnológico, conforme já previsto no art. 170 da CF/88. (FILOMENO, 2007)

Alguns artigos da Constituição Federal de 1988, merecem maior importância para o estudo do Direito do Consumidor, em função da relevância e abrangência protetiva, entre os quais o artigo, 5º, inciso XXXII; o artigo 129, III; artigo 170, V; artigo 220 e por fim o artigo 221; (LUCCA, 2000)

Importante o inciso IX do artigo 170 da CF, pois há expressa proteção às empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras, e que não na verdade as grandes vítimas dos danos causados pelos cheques sem fundo.

O Ministro Ilmar Galvão diz caber ao Estado o poder de estabelecer restrição a certa atividade, quando esta exorbitar os lindes do poder de fiscalização, devendo reprimir o abuso do poder econômico e punição dos atos contrários à ordem econômica e financeira e a economia popular. (RE 242.550, julgado, 28-9-99, DJ de 10-12-99)

Isso posto, tem-se que a própria Constituição Federal, nos artigos acima citados, abre ampla margem de defesa contra os danos auferidos pela emissão de cheques sem fundos, que geram um lucro extraordinário aos bancos e, porque não dizer o enriquecimento ilícito dos emitentes, pois adquirem bens sem que façam a devida quitação dos mesmos.

8- ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ

Pacificado pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça, através da súmula 297 (Segunda Seção, julgado em 12/5/2004, DJ 9/9/2004, p. 149), redigida após duro embate constitucional sobre a aplicação do Código de Defesa do Consumidor as relações onde se prestam os serviços bancários/financeiros, dispondo: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”.

Eminente a observação de Mauro Sérgio Rodrigues (2008, p. 20) coloca que o julgamento da ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade que ganhou repercussão a nível nacional, chegando o BACEN – Banco Central a emitir nota técnica contrária à posição adotada pela Corte Suprema:

Há de se entender que não adianta o debate à exaustão inútil de um conceito jurídico, preciso e limitado, que permita visualizar sempre a figura que se pretende definir. “Tais definições correm o risco de pecar pela falta ou pelo excesso. Afinal, o que importa é a efetiva proteção”. Desse modo, o Código De Defesa Do Consumidor foi amplo para a figura daquele que busca proteger. (LUCCA, 2000)                

Por fim, tomando o ensinamento do Magistrado Catarinense, Desembargador Eládio Torret Rocha (2008), ao relatar a Apelação Civil, que trata sobre os cheques sem fundo, lembra que é cabida à teoria do risco profissional ao segmento bancário. Desse modo, “[...] respondem pelo risco assumido pela exploração lucrativa de suas atividades, vez que, recolhendo as vantagens econômicas do seu comércio, deve sofrer, também, sua desvantagem...”, conclui o magistrado.

Aqui se busca mostrar o posicionamento do STJ – Superior Tribunal de Justiça quanto à questão dos cheques, e o que se percebe é um avanço no sentido de ampliar a responsabilidade daqueles que ferem o Direito do Consumidor. E, quanto aos bancos pacificada a aplicação da responsabilidade objetiva.

No próximo capítulo vai-se abordar uma rápida visão do Direito Internacional, quanto à questão protetiva, e a necessária reparação dos danos causados aos consumidores. O objetivo é buscar solução quanto à procura dos responsáveis, para se chegar à efetiva reparabilidade do sofrimento daqueles que são atingidos pela lesão.

9- O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E OS CHEQUES

“Código de Defesa do consumidor é a legislação que estabelece direitos e obrigações nas relações de consumo e que, por ser uma lei de ordem pública e de interesse social, não pode ser contrariada, nem por acordo entre as partes”, isto significa, nem por convenção entre fornecedor de produto ou serviço e o consumidor. (CARVALHO, 1997)

A norma de proteção e defesa do consumidor é de ordem pública e interesse social. E, esta disposto no artigo 1º do Código de Proteção (SEGAL, 2004):

O interesse social do art. 1º significa resgatar a imensa coletividade de consumidores da marginalização, na apenas em face do poder econômico, com também dotá-la de instrumentos adequados de acesso à justiça do ponto de vista individual e coletivo. Assim, o CDC tenta estabelecer igualdade de forças nas relações de consumo.

Desembargador Eládio Torret Rocha (2008) lembra que o beneficiário de cheque devolvido por falta de fundos qualifica-se como consumidor — “mediante a conhecida técnica de equiparação conceitual presente no art. 17 da lei 8.078/90 — pois vítima das intercorrências defluentes do fato de produto ou serviço”.

O Código de Defesa do Consumidor incluiu de forma expressa sua abrangência a todas as atividades bancárias, financeiras e de crédito oferecidas ao consumidor (GONÇALVES, 2005):

O Código de Defesa do Consumidor incluiu expressamente as atividades bancárias, financeiras, de crédito e securitárias no conceito de serviço (art. 3º, § 2º). Malgrado a resistência das referidas instituições em se sujeitarem às suas normas, sustentando que nem toda atividade que exercem (empréstimos, financiamentos, poupança etc.) encontra-se sob sua égide, o Superior Tribunal de Justiça não vem admitindo qualquer interpretação restritiva ao aludido § 2º do art. 3º, afirmando que a expressão “natureza bancária e financeira e de crédito” nele contida não comporta que se afirme referir-se apena a determinadas operações de crédito ao consumidor. Os bancos, “como prestadores de serviços especialmente contemplados no mencionado dispositivo, estão submetidos às disposições do Código do Consumidor”.

É o que pensa o Desembargador Eládio Torret Rocha (2008),

Assim, deve-se partir da inafastável premissa normativa segundo a qual, em tema de relações estabelecidas entre consumidores e bancos, incidem, na integralidade, as disposições da Lei 8.078/90, as quais operacionalizam, entre outros, os conteúdos dos arts. 5º, XXXII e 170, V, da CF, segundo os quais, por um lado, incumbe ao Estado promover, na formada lei, a defesa do consumidor, e, por outro, determina que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado o princípio da defesa do consumidor.

Todos os que sofrerem dano em razão do defeito, pelo fato de produto ou serviço, tem direito ao pedido de indenização, à vista de que, todas as vítimas do evento equiparam-se aos consumidores (art. 17 CDC). “Em conseqüência, mesmo aqueles que não tenham adquirido o bem, caso sejam vítimas de evento causado pelo bem, tornam-se equiparados a consumidores e assim titulares do direito de indenização”. (BATISTI, 1999)

Como visto, há ampla base no Direito do Consumidor para pleitear junto aos bancos sua responsabilização referente à prestação dos danos sofridos. Questão que deve ser ligada aos cheques sem a devida provisão de fundos, pois, é o entendimento que se ele não atende a sua função precípua, no caso, promover a circulação da riqueza, não atendido tal fim há um defeito ou vício.

10- DEFEITOS E VÍCIOS DE PRODUTOS E SERVIÇOS

O artigo 12, § 1º do Código de Defesa do Consumidor trás as condicionantes para que o produto se apresente como defeituoso. Art. 12 CDC § 1º – O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – sua apresentação; II – o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi colocado em circulação.

Quanto ao problema dos vícios e defeitos que atingem o consumidor a responsabilidade dos bancos frente às imposições do Código de Defesa do Consumidor assume a forma objetiva. (GONÇALVES 2005):

Em face do novo Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade dos bancos, como prestadores de serviços, é objetiva. Dispõe, com efeito, o art. 14 do aludido diploma que o “fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

No artigo 14 do Código está à determinação legal para a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços e no § 1º do CDC estão às condicionantes que colocam o serviço como defeituoso. Já no § 3º tem-se as excludentes de responsabilidade:

Para o Desembargador Carlos Prudêncio (2008), o consumidor que recebe um cheque sem a devida provisão de fundos foi vítima de um dano que precisa ser reparado, e o que em melhor condição se encontra para compensar a lesão é a instituição financeira:

Ocorre dano ao consumidor, que recebe cheque sem provisão de fundos e fica privado do valor nele constante, e evidente o nexo etiológico entre este e a conduta do fornecedor de serviço, instituição financeira, que presta serviço defeituoso por seu modo de fornecimento e os riscos da fruição, quando os bancos em qualquer cuidado pela atividade que desenvolve, até para que não se eleve o risco do mercado financeiro, admite sem qualquer controle interno a liberação de vários talonários de cheques exigindo para tanto tão-somente documento de identificação (RG e CPF) e comprovante de residência, a teor do art.14, §1º, I e II, do Código de Defesa do Consumidor.

Eládio Torret Rocha (2008), quanto à segurança dos serviços prestados pela instituição financeira:

Destarte, por intermédio dessa verdadeira cláusula geral de responsabilidade objetiva — reflexo direto dos princípios da eticidade e da socialidade — deve o sacado indenizar o tomador pelos danos sofridos em face da devolução de cheques por ausência de fundos, já que a concessão de talonário a quem não possui capacidade econômica (ou a sua manutenção em posse de quem haja perdido lastro financeiro para honrá-lo), mal fere, frontalmente, um dever especial de segurança do serviço, legitimamente esperada.

Conforme os ensinamentos do Desembargador Carlos Prudêncio (2008),

Revendo o conceito da legitimação, considerando o direito do consumidor como norma fundamental e princípio informador do ordenamento jurídico, é perfeitamente admissível, por meio de interpretação lógico-sistemática, considerar o recebedor de cheque sem FUNDO como consumidor vítima de serviço mal prestado por instituição financeira;

O Desembargador Eládio Torret Rocha (2008), bem coloca em seu julgado:

De outro norte, e com a mesma razão, igualmente se configura ilícita a prática omissiva da instituição financeira que permite que os aludidos cheques permaneçam na posse daqueles que, por um motivo ou outro, deixam de deter lastro financeiro capaz de suportar eventual emissão das aludidas cártulas.

Vale lembrar, que antes de chegar ao judiciário, o consumidor pode tentar a reparação pela via administrativa acionando o Banco com base no § 1º, do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor, onde tem o fornecedor 30 dias para reparar os defeitos ou vícios dos produtos e serviços.

Como abordagem no tópico, viu-se, principalmente pelo entendimento do Tribunal Catarinense que o recebedor de cheque sem a devida provisão de fundos é consumidor equiparado, portanto com direito a ter seu prejuízo ressarcido.

No próximo item, se estudará as excludentes da responsabilidade do banco frente ao problema e de quais os caminhos para ser ressarcido caso venha a indenizar o terceiro de boa-fé quanto aos prejuízos provocados pelo cheque sem fundos emitido pelo seu correntista.

11- CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR BANCÁRIO (BC Res. 2.878/01)

A classificação da operação de crédito no nível de risco correspondente, de responsabilidade das instituições financeiras, há de ser efetuada segundo critérios consistentes e verificáveis, objetivamente por informações internas e externas, contemplando: Situação econômico-financeira; Grade de endividamento; Capacidade de geração de resultados; Fluxo de caixa; Administração e qualidade de controles; Pontualidade e atrasos nos pagamentos; Contingências; Setor de atividade econômica; Limite de crédito. (ALVES 2005)

            O Conselho Monetário Nacional através da resolução 2.878 de 2001 estabelece os procedimentos que devem seguir as instituições financeiras para a efetiva prestação de serviços.

No artigo 1º, I e II chama-se a atenção de que, as instituições financeiras devem “previamente” dar conhecimento aos seus clientes de todas as clausulas dos contratos de prestação de serviço que pretendem dispor. Essa comunicação deve ser de forma integral e evidenciar os dispositivos que impliquem em responsabilidades e penalidades.

A responsabilidade pelo dano, no dizer do CDC, “pode resultar da omissão de informações ou da sua insuficiência sobre o uso regular do produto”. E, os produtos e serviços devem estar acompanhados de instruções bem claras sobre os fins a que se destinam e o seu correto uso. (SAAD, 2006)

O item IV determina o fornecimento de uma cópia do contrato no momento da celebração deste e, no item V há previsão quanto à necessidade de informar quanto a reparação de danos patrimoniais e morais, que podem ser suscitados.

Mais um artigo dando ênfase na necessidade da plena informação, porém no item “I”, dá-se atenção a recusa de documentos, entre os quais os cheques.

O artigo abaixo, principalmente o item “I”, tem importância para o estudo em questão, pois evidencia a obrigatoriedade dos bancos em “evidenciar” as condições contratuais que se refiram a responsabilidade sobre a emissão de cheques sem provisão de fundos.

O artigo 6º do CDC exige que o consumidor seja informado corretamente sobre todos os detalhes do produto, entre os quais “características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”, sendo esta uma obrigação específica dos fornecedores de produtos e serviços. (CONSUMIDOR, 2007)  

No intem “IV” artigo 2º, resolução 2.878/01, há referência a tarifa, que as instituições cobram, por cada cheque sem fundo emitido, onde segundo a FEBRABAN – Federação Brasileira dos Bancos (2009), o valor médio cobrado é de R$ 30,00.

O item “V” novamente trata das taxas, remuneração bancária, quanto ao serviço de compensação de cheques e outros papéis. O item “VII” faz referência as “taxas e tarifas” cobradas, entre as quais as de uso do “cheque especial”.

No parágrafo único do artigo 3º, exige que os contratos de cheque especial, devem prever, entre outras coisas, o limite de crédito, as tarifas e as providências adotadas pelos contratantes:

Estando as instituições financeiras obrigadas a dar plena ciência sobre seus produtos e serviços, quando não o fazem, podem ser responsabilizadas por “vícios de informação” ou “defeitos de informação ou de comercialização”, sendo aqui a informação insuficiente ou inadequada, inclusive quanto à publicidade. (CONSUMIDOR 2007)

Como visto no Código de Defesa do Consumidor Bancário, elaborado pela instituição que representa os interesses bancários, há várias obrigações a serem seguidas, que quando descumpridas levam a prestação de serviços ou fornecimento de produtos com defeitos ou vícios, abrindo margem para que o consumidor, ou o terceiro equiparado, quando vítima de algum dano ou lesão, venha a acionar a instituição, que por ação ou omissão tenha provocado o mesmo. Cabe para tanto, tentativa de reparação pela esfera administrativa com base no §1º do artigo 18 do CDC, Lei, 8.078, aqui podendo solicitar o amparo da Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor – PROCON, ou judicialmente.

No item que se adianta será analisada a Lei 7.357, conhecida como Lei do Cheque, que o sistema bancário usa como base de defesa para não se responsabilizar pelo pagamento dos cheques sem a devida provisão de fundos. O que se perceberá é que não há nenhum dispositivo que desobrigue tacitamente o banco sacado frente a esse pagamento.

12- COMENTÁRIOS À LEI DO CHEQUE

Quanto à lei do cheque, norma na qual se abraça a teoria defendida pelo setor bancário, de que nenhuma responsabilidade tem sobre os cheques emitidos por seus clientes, assim, ensina o Desembargador Carlos Prudêncio (2008):

Vale lembrar que, muito embora possam existir normas infraconstitucionais cujos enunciados textuais autorizem as instituições bancárias a utilizarem-se de seus recursos deforma livre e objetivando a desenfreada produção de riquezas, tais normas só serão legitimamente interpretadas e aplicadas se de conformidade com os preceitos emanados da Constituição da República, técnica esta denominada de "hermenêutica de interpretação conforme à Constituição". 

Veja o que diz a Lei 7.357, DE 2 DE SETEMBRO DE 1985.

A própria Lei do Cheque vincula a instituição financeira de forma obrigacional, sob pena de invalidade do cheque, quando diz que o mesmo é emitido contra o banco, ver artigo 3º da norma:

O artigo 4º da diz que o emitente tem que possuir fundos disponíveis e, ser o titular destes, para fazer a emissão do cheque em virtude do contrato que celebra, de forma expressa ou tácita, com a instituição financeira.

O mesmo artigo, na segunda parte, diz que: a infração quanto a não ter fundos disponíveis, não estar autorizado a emitir cheque e, não haver relação contratual, não invalida o título como cheque. Ao que parece um erro, pois como pode ser válido um cheque emitido por pessoa não autorizada, que não disponha de fundos e não tenha relação contratual com o banco sacado? Ver o disposto no artigo 3º da Lei.

O Desembargador Eládio Torret Rocha (2008) em seu julgado enfatiza o caput do artigo 4º quanto à obrigatoriedade de o emitente ter fundos disponíveis, para utilizar o título do cheque:

Como exemplo dessa salutar abordagem interpretativa — a qual possui grande valia à resolução desse caso — importante rememorar o que dispõe o art. 4º, caput, da lei 7.357/85 (lei uniforme do cheque): o emitente deve ter fundos disponíveis em poder do sacado e estar autorizado a sobre ele emitir cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito. Em complemento, o §1º do aludido dispositivo fixa que a existência de fundos disponíveis é verificada no momento da apresentação do cheque para pagamento.

Outro problema, o § 1º do art. 4º, admite que aquele que recebe o cheque só poderá saber se o mesmo possui fundos ou não, no momento de sua apresentação ao banco sacado. Se o cheque foi criado para facilitar a circulação da riqueza, o não funcionamento seria uma total insegurança jurídica.

Com relação às obrigações autônomas e independentes bem coloca o Desembargador Manassés de Albuquerque do Tribunal de Justiça do Paraná, são aquelas que vinculam todos solidariamente à obrigação decorrente do título:

Art.  13 As obrigações contraídas no cheque são autônomas e independentes.

A garantia cambial do aval, é autônoma, obrigando o avalista do mesmo modo que o avalizado. São obrigações autônomas e independentes, vinculando todos solidariamente à obrigação decorrente do título. A situação pessoal do avalizado, como a superveniência de sua falência, não pode ser utilizada pelo avalista para se eximir de obrigação legalmente imposta. A superveniência da falência da avalizada, por ser regime jurídico próprio, não implica na suspensão da execução movida contra os seus avalistas, tendo em vista que a obrigação destes é autônoma. Recurso não provido. (TJPR - Agravo de Instrumento: AI 1384736 PR - Relator(a): Manassés de Albuquerque - Julgamento: 12/08/2003 - Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível)

O Banco Central do Brasil (2009) diz que “Para recebimento de cheque o cliente não pode estar com o nome incluído no CCF e tem que atender às condições estipuladas na ficha-proposta de abertura da conta”.

O artigo 15 diz ser o emitente que garante o pagamento do cheque, mas não diz que este não deve ser pago pelo banco sacado ao portador de boa-fé. Então, a instituição pode pagar o cheque e de forma regressiva cobrar de seu correntista, com a qual mantém relação contratual onerosa, sendo remunerada pela prestação do serviço de gerenciamento da conta corrente, bem como, pelo de emissão de cheques, inclusive sem provisão de fundos.

O artigo 15 não especifica a quem o emitente garante o pagamento, garante ao banco sacado, com o qual tem contrato de prestação de serviço, ou ao portador do cheque?

Obrigados são os que fazem parte da obrigação, que carregam alguma relação jurídica entre si, por exemplo, o banco e seu correntista por meio do contrato de prestação de serviços.

Havendo solidariedade, a causa desta reside no próprio título, no vínculo jurídico; Assim sendo, na solidariedade, o credor pode exigir de qualquer devedor solidário o pagamento integral da prestação. (VENOSA, 2002)

Veja-se o que diz o Código Civil de 2002:

Os dispositivos da “lei maior do direito privado autorizam o credor (ou o consumidor) a exigir e receber de um dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum”. (SAAD, 2005)

                Quanto às normas expressas na presente lei, bem coloca o Desembargador Eládio Torret Rocha (2008), para sua correta interpretação:

Frente a essas, e quaisquer outras regras específicas, cabe uma indagação pertinente: há alguma norma que obrigue, expressamente, o sacado (banco), a providenciar o pagamento de cheque apenas se houver provisão de fundo bastante na conta do sacador (correntista)?

A resposta, de sabença geral, é negativa. E o intérprete do direito não está autorizado, diante da falta de norma excluidora de responsabilidade — mormente após a vigência do intransponível anteparo jurídico veiculado pelo CDC — incluir na leitura da lei, mentalmente, uma disposição normativa em evidente prejuízo dos consumidores e do restante da sociedade que dependem, justamente, da higidez e da credibilidade do instituto do cheque, para manter o necessário dinamismo das relações comerciais.

Abaixo temos a resolução 1.559 do Banco Central do Brasil que trata das observações necessárias quanto à liberação de operações de crédito. Citando, inclusive, impedimentos quanto ao fornecimento de cheques. E, fazendo jus ao fato de que obrigação não cumprida ou ignorada é abertura para a produção de produtos e serviços com defeito ou vício.

13- COMENTÁRIOS À RESOLUÇÃO 1.559/88 DO BANCO CENTRAL DO BRASIL

Fixa limite de diversificação de risco por cliente a ser observados pelas instituições financeiras especificadas.

Quanto à resolução acima exposta importante destacar o artigo 26, XI, “a” que proíbe as instituições financeiras a realizarem operações, prestarem serviços, que não atendam aos princípios da seletividade, garantia, liquidez. Bem como, “a” é vedado liberar serviços para clientes com restrições; ou “e” emitentes de cheques sem fundo; Assim, quando o fazem, descumprem a norma legal assumindo o risco e o dever de reparar perante toda a coletividade.

A próxima resolução estudada, nº 2.025, traz os procedimentos obrigatórios quanto à manutenção das contas de depósito. Tratando com ênfase da qualificação e identificação do cliente (correntista), sua capacidade financeira, possibilidade de tomar crédito e fazer uso os serviços e produtos bancários.

14- COMENTÁRIOS À RESOLUÇÃO 2.025/93 DO BANCO CENTRAL DO BRASIL

A presente resolução altera e consolida as normas relativas à abertura, manutenção e movimentação de contas de depósitos.

No artigo acima é exigida a completa qualificação do cliente, seja pessoa física ou jurídica, e estas informações devem ser conferidas quanto a sua veracidade. O art. 2º, item “I”, obriga a instituição a determinar que mantenha saldo mínimo na conta

A obrigação de tomar providências para impedir a circulação de cheques, quando o correntista estiver impedido de utilizar, é do banco, conforme o parágrafo único do artigo 7º, que diz “a instituição financeira deverá adotar providências imediatas com vistas a retomar os cheques em poder do depositante”, isto é com urgência.

Lembrando, é a instituição financeira obrigada a tomar medias imediatas para retomar os cheques em poder do depositante quando este emite cheques sem fundo.

Se for facultada, é por escolha, quem escolhe assume o risco. Sabendo que o cliente não tem lastro financeiro, a instituição ainda assim lhe concede o serviço; portanto põe em risco todos os terceiros que possam vir a ser atingidos pelo negócio.

Outra norma que obriga a instituição bancária a recolher os cheques em poder do correntista. Obrigação não cumprida, por sinal assume a responsabilidade pelos danos que posam ser causados.

As resoluções deixam clara a necessidade de serem cumpridos vários dispositivos quanto à segurança na concessão do crédito. Portanto, quando o banco assume o risco, deve responder civilmente perante a sociedade atingida com os possíveis danos.

15- CONCUSÃO

Em que se configurem as apreciações colocadas nesse trabalho, o fato de avançar na busca da efetiva proteção e reparação social, respeitar princípios e promover a responsabilidade civil na sua forma objetiva perante os serviços e produtos das instituições financeiras, parece ser o posicionamento mais correto dos Tribunais.

Como apresentado, o poder interventor do Estado não age contra a economia, mas a seu favor. Então, responsabilizar os bancos pelo pagamento dos cheques sem provisão de fundos é aprimorar o processo de análise de crédito e promover a educação financeira entre os clientes.

Temos atualmente no mundo o exemplo dos problemas que a falta de controle do Estado sobre o setor bancário pode provocar. Milhares de pessoas perderam seus empregos, famílias foram desestruturadas, empresas foram à falência. E o motivo, liberação de crédito acima do que as pessoas e a sociedade poderiam suportar.

Sobre os cheques, caberia uma pesquisa mais apurada dos reflexos econômicos, para se constatar o problema que causam as empresas, pessoas, e comunidades que, perdem seus negócios em função da liberação indiscriminada desses serviços pelos bancos.

Em 2008 foram vinte milhões de cheques sem fundos, em 2009 a mesma história. E para os bancos esse é um grande negócio. Cada cheque sem fundos rende em média R$ 30,00 ao sistema e leva o cliente a usar o crédito do cheque especial, que rende as instituições juros absurdos de mais de 100% ao ano.

Importante destacar os dados do SEBRAE em que mais de 95% das empresas do País são micro e pequenas empresas. Na verdade a grande maioria desses negócios, instituições familiares, é formada por pessoas que não conseguiram se colocar nas grandes empresas, ou não foram para o setor público. E juntando economias, fizeram do pequeno negócio sua forma de sobrevivência.

Aplicar a responsabilidade objetiva pelo risco criado pela liberação das cártulas de cheque aos bancos é a forma de socializar os danos; é promover a segurança econômica; é fazer com que a micro-economia impulsione à macro.

Destaque ao posicionamento tomado pelos Desembargadores Catarinenses, Carlos Prudêncio (Apelação Cível nº. 2005.005907-7) e Eládio Torret Rocha (Apelação Cível nº. 2005.038361-7), onde em seus julgados obrigam os bancos a cobrir os cheques emitidos, sem a devida provisão de fundos, pelos seus clientes. Afinal, são as instituições que fazem a análise da capacidade de crédito, portanto são co-responsáveis pela aptidão financeira dessas pessoas.

Os magistrados, talvez não tenham a devida noção de como os cheques impactam a vida em sociedade, mas os bancos sabem que a inadimplência é para eles um grande negócio. A intervenção do Estado nesse ponto é definitivamente promover os princípios constitucionais da boa-fé, função social do crédito e dos contratos, da solidariedade e da justiça.

E que fiquem as palavras do Desembargador Carlos Prudêncio:

Penso estar na hora de enfrentarmos uma realidade atual, qual seja a da supremacia das teses das instituições financeiras em detrimento da interpretação as leis. Acredito que devemos repensar as decisões que interfiram no setor econômico, até mesmo para darmos uma resposta aos empresários e à população em geral no sentido de que o Poder judiciário não permitirá abusos contra quem quer que seja e que somente a lei, aliada ao seu fim social, prevalecerá.

Por fim, constatou-se que o posicionamento da grande maioria dos doutrinadores é pela aplicação da responsabilidade civil objetiva sobre os bancos, até em função da determinação do Código de Defesa do Consumidor, alguns, porém, usam a Lei do Cheque para tentar libertar os bancos quanto a sua responsabilidade social. O que nos parece um erro, que certamente será mais uma vez superado pela história.

Fábio Joao Turnes - OAB/SC 30.657 - www.fabioturnes.com.br 

REFERÊNCIAS

Sobre o autor
Fabio Turnes

Advogado, Empreendedor, Coach e Professor. Profissional qualificado atuante na área empresarial.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O presente artigo foi elaborado com base na monografia de final do curso de Direito da Faculdade Estácio de Sá. Trata da responsabilidade solidária dos bancos na indenização de terceiros que recebem os cheques sem fundos, visto como um serviço prestado de forma defeituosa.

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