O Supremo Tribunal Federal concluiu, em 30 de outubro de 2014, o julgamento do Tema nº 344 (“Incidência de contribuição previdenciária sobre a participação nos lucros da empresa”) de repercussão geral, em dois recursos extraordinários. No RE 569441 se discutia a retenção de contribuição sobre a participação nos lucros recebida pelos empregados (segurados empregados), enquanto no RE 636899 a controvérsia envolvia os diretores não empregados (contribuintes individuais).
A principal controvérsia sobre o assunto diz respeito aos limites de aplicabilidade do art. 7º, XI, da Constituição, que lista entre os direitos dos trabalhadores a “participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei”.
A ausência de lei regulamentadora levou o INSS a efetuar a cobrança das contribuições previdenciárias sobre a participação nos lucros, sob o argumento de que se tratava de norma de eficácia limitada, motivo pelo qual a verba possuía natureza remuneratória, até a entrada em vigor da Medida Provisória nº 794/94 (posteriormente convertida na Lei nº 10.101/2000), que regulamentou o dispositivo constitucional, O art. 3º da MP nº 794/94 previa que “a participação de que trata o art. 2º não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista ou previdenciário”. A redação final do dispositivo, na Lei nº 10.101/2000, é a seguinte: “A participação de que trata o art. 2o não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista, não se lhe aplicando o princípio da habitualidade”.
De outro lado, os segurados defendem a autoaplicabilidade da norma constitucional em relação à definição da participação nos lucros como verba não remuneratória e, consequentemente, o afastamento do desconto das contribuições previdenciárias sobre ela. Portanto, mesmo antes da vigência da MP nº 794/94 o pagamento não era devido.
Nesse sentido, o art. 28, § 9º, ‘j’, da Lei nº 8.212/91, exclui expressamente a rubrica da incidência de contribuições: “Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: (...) a participação nos lucros ou resultados da empresa, quando paga ou creditada de acordo com lei específica”.
As decisões anteriores sobre o assunto, existentes nas duas Turmas do STF, concluíram pela necessidade de regulamentação infraconstitucional para o reconhecimento da natureza não indenizatória da verba:
“Participação nos lucros. Art. 7°, XI, da Constituição Federal. Necessidade de lei para o exercício desse direito. 1. O exercício do direito assegurado pelo art. 7°, XI, da Constituição Federal começa com a edição da lei prevista no dispositivo para regulamentá-lo, diante da imperativa necessidade de integração. 2. Com isso, possível a cobrança das contribuições previdenciárias até a data em que entrou em vigor a regulamentação do dispositivo. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido” (RE 398284/RJ, 1ª Turma, rel. Min. Menezes Direito, j. 23/09/2008, DJe 18/12/2008).
“DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS. ART. 7º, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MP 794/94. 1. A regulamentação do art. 7º, inciso XI, da Constituição Federal somente ocorreu com a edição da Medida Provisória 794/94. 2. Possibilidade de cobrança da contribuição previdenciária em período anterior à edição da Medida Provisória 794/94” (RE 393764/RS, 2ª Turma, rel. Min. Ellen Gracie, j. 25/11/2008, DJe 18/12/2008).
O Superior Tribunal de Justiça seguia esse entendimento e afastava a incidência da contribuição sobre a participação nos lucros somente a partir da vigência da MP nº 794/94 (nesse sentido: REsp 743971/PR, 1ª Turma, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 03/09/2009, DJe 21/09/2009; AgRg no AREsp 95339/PA, 2ª Turma, rel. Min. Humberto Martins, j. 20/11/2012, DJe 28/11/2012).
No recente julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal, o relator dos RE 569441 e RE 636899, Ministro Dias Toffoli, votou no sentido de que a falta de lei regulamentadora não impedia o reconhecimento da natureza não remuneratória na participação dos lucros e resultados, razão pela qual negou provimento aos recursos interpostos pelo INSS. Contudo, o relator ficou vencido e seu voto não foi seguido pelos demais. De outro lado, o Ministro Teori Zavascki apresentou voto divergente, no sentido de manter a jurisprudência do STF sobre o assunto, considerando que a controvérsia abrange verbas devidas na época (e, consequentemente, fatos ocorridos há mais de 20 anos), ou seja, em momento anterior à entrada em vigor da MP nº 794/94. Foi acompanhado em seu entendimento pelos Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello.
Assim, e observada a eficácia das decisões do STF em recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida, foi reafirmada a jurisprudência da Corte para se definir que: (a) eram devidas as contribuições previdenciárias sobre a participação nos lucros da empresa até a entrada em vigor da MP nº 794/94, publicada em 30 de dezembro de 1994; (b) e, a partir dessa data, diante da regulamentação da norma constitucional, referida verba passou a ser excluída da incidência de contribuição previdenciária.