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Aplicação e execução de medidas socioeducativas e a Lei nº 12.594/2012

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Agenda 30/05/2016 às 13:04

4. CUMULAÇÃO E UNIFICAÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

As medidas socioeducativas podem ser aplicadas de forma isolada ou podem ser cumuladas com outras medidas (inclusive com medidas de proteção), em uma mesma ação socioeducativa ou em várias dessas ações, conforme se extrai da conjugação do art. 99 com o art. 113 do ECA.

Para que se admita a cumulação é necessário que as medidas possam ser cumpridas de forma concomitante, como ocorre, por exemplo, no cumprimento das medidas socioeducativas de prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida e medida protetiva consistente em obrigação de matrícula e frequência escolar.

Observa-se pelo exemplo apresentado que a cumulação diz respeito ao cumprimento simultâneo de mais de uma medida socioeducativa e/ou protetiva, quando isto for possível, sendo elas, todavia, de naturezas diferentes. Tratando-se de medidas de mesma natureza, pode ser o caso de unificação de medidas, instituto que será tratado mais adiante.

Quando as medidas legais forem aplicadas de forma cumulada na mesma sentença, como resultado da mesma conduta infracional, o cumprimento de ambas ocorrerá também em um único procedimento de execução, embora cada medida deva ser executada e acompanhada de acordo com a sua natureza, prazo e demais especificidades, visto que cada medida legal dirige-se a propósitos de cunho social, pedagógico e retributivo próprios.

Pode ocorrer, no entanto, que as medidas tenham sido aplicadas em processos distintos, situação em que o adolescente já cumpre ou está em vias de cumprir uma medida socioeducativa e é sentenciado a outra medida, de natureza diferente, mas que admite cumprimento concomitante.

Ainda assim, de acordo com a nova sistemática implementada pela Lei do SINASE e as orientações trazidas pela Resolução nº 165/2012-CNJ, as medidas socioeducativas serão reunidas, para execução e acompanhamento em um único procedimento judicial, expedindo-se guia unificadora e trasladando-se para os autos onde serão praticados os atos de execução os documentos necessários, atentando-se, em todo caso, para a natureza e as peculiaridades próprias de cada uma das medidas aplicadas.

Ao invés de apensar os autos de execução das medidas, como antes vinha sendo feito, com a unificação, a orientação trazida pela Resolução nº 165/2012-CNJ é mesmo no sentido de levar o cumprimento e acompanhamento das medidas socioeducativas, ainda que distintas, mas compatíveis entre si, para um único procedimento de execução, expedindo-se guia unificadora e arquivando-se os demais autos de execução de medida.

O que se observa concretamente em tal situação, que envolve medidas diferentes, mas passíveis de cumprimento concomitante, é a unificação dos procedimentos de execução, que são reduzidos a um único procedimento, visto que as medidas, por serem distintas, deverão ser cumpridas individualmente, ainda que de forma concomitante.

Diante da necessidade de se analisar melhor alguns pontos sobre a questão, o tema ora abordado será retomado no próximo subitem.

O acompanhamento das medidas aplicadas de forma cumulada será feito pelo juízo da execução, mas poderá sê-lo também pelo juízo do processo de conhecimento, quando neste estiver sediada a unidade de cumprimento da medida socioeducativa e não houver na comarca juizado da infância e da juventude com competência específica ou exclusiva para a execução de medidas socioeducativas.

Não custa relembrar que as medidas de proteção, de advertência e de reparação do dano, quando aplicadas de forma isolada, serão executadas nos próprios autos do processo de conhecimento, conforme estabelece o art. 38 da Lei nº 12.594/2012.

Ainda que se verifique a cumulação entre uma das duas medidas socioeducativas supracitadas e uma ou mais medidas de proteção, caso a medida socioeducativa seja implementada de plano, em audiência (o que comumente ocorre quando se trata de medida socioeducativa de advertência), afigura-se razoável que o cumprimento da medida protetiva aplicada cumulativamente opere-se também nos próprios autos do processo de conhecimento, pois não haverá qualquer dilação ou nova formalidade para o cumprimento da medida socioeducativa aplicada. Além disso, desde que não sejam cumuladas com outras medidas socioeducativas, as medidas de advertência e reparação do dano serão executadas nos próprios autos do processo de conhecimento e perante o juízo do conhecimento. É possível, no entanto, que o juízo responsável opte por autuar procedimento específico para o acompanhamento da medida protetiva, visto que ela não possui natureza socioeducativa.

4.1. Unificação de penas e de medidas socioeducativas

Embora apresentando feições próprias e recebendo tratamento diferenciado daquele conferido às sanções previstas na legislação penal, com o advento da Lei do SINASE, a unificação passou a ser legalmente admitida para as medidas socioeducativas.

Instituto previsto no Código Penal - CP (art. 75, §§ 1º e 2º) e na Lei nº 7.210/1984 – Lei de Execução Penal – LEP (art. 111), a unificação foi introduzida expressamente no contexto das medidas socioeducativas pela Lei nº 12.594/2012 (art. 45, caput e §§ 1º e 2º). Contudo, a Lei do SINASE não tratou com profundidade sobre a aplicação do instituto em questão, se considerarmos as peculiaridades de cada uma das medidas socioeducativas previstas no ECA.

É certo, todavia, que o regramento estabelecido para a unificação de medidas socioeducativas não se confunde com aquele já concebido legalmente para a unificação de penas criminais, dadas as peculiaridades próprias do Direito Infantojuvenil, embora haja alguns pontos de tangenciamento entre a aplicação do instituto em questão nos âmbitos penal e socioeducativo.

Na esfera penal unificação significa a reunião das penas aplicadas ao réu, no mesmo processo ou em processos distintos, para fins de sua adequação ao limite legal máximo de 30 anos, previsto no art. 75, caput, do Código Penal, bem assim para a concessão de benefícios legais ao condenado (arts. 75, § 1º, do CP e 111, da LEP).

Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena (no curso da execução), faz-se nova unificação. Isto significa que se, somado ao restante da pena que já foi cumprida pelo agente o quantum de pena relativa à condenação mais recente, for obtido como resultado uma pena superior a 30 anos, terá lugar a unificação, para que haja a adequação da reprimenda ao prazo legal máximo, desprezando-se o período de pena já cumprido. De acordo com o texto legal, a nova pena (obtida com a soma ou com a unificação), será levada em conta também para determinação do regime de cumprimento (art. 75, § 2º, do CP e art. 111, parágrafo único, da LEP).

A posição jurisprudencial predominante no país (que tem amparo inclusive na Súmula 715 do Supremo Tribunal Federal), é no sentido de que a pena unificada, para atender ao limite legal de 30 anos de cumprimento, não deve servir de base para o cálculo de benefícios legais em favor do condenado, como progressão de regime, livramento condicional, remição, detração etc.

Esse posicionamento é compartilhado por farta doutrina, apesar de também não ser pequena a corrente doutrinária em sentido contrário, para a qual a unificação de penas no limite legal serve de base para todos os cálculos de execução da pena, ou seja, é levada em conta também para a concessão de benefícios legais.

A unificação de pena pode resultar também do reconhecimento da ocorrência do concurso formal próprio ou perfeito (art. 70, caput, primeira parte, do Código Penal) e do crime continuado (art. 71 do Código Penal), situações nas quais há a aplicação da pena de um só dos dois ou mais crimes praticados, aumentada (exasperada), em qualquer caso, até os limites legais estabelecidos nos dois artigos do Código Penal mencionados. Tratam-se, no entanto, de unificações diversas daquelas relacionadas com a duração da execução das penas, previstas no art. 75, § 1º, do Código Penal.

Dispõe o art. 75, § 1º, do Código Penal que: “Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo” (grifo nosso).

Já o art. 111, caput, da LEP (Lei nº 7.210/1984) traz a seguinte redação:

Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou da unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição (grifo nosso).

Observa-se pelos textos dos dois artigos destacados que houve o cuidado pelo legislador ao separar soma de unificação de penas, embora a soma também resulte em unidade, no que se refere ao quantum final de pena obtido. Todavia, esse tempo de pena pode ser superior a 30 anos, hipótese em que não será o montante final obtido com as adições das penas que valerá para efeito de cumprimento e determinação do seu regime, mas o resultado da unificação, que reduzirá a pena para o limite legal de 30 anos.

Em termos penais, de acordo com o que foi exposto, a unificação é adotada para as hipóteses em que o resultado da soma das penas, aplicadas em um mesmo processo ou em processos distintos, for superior a 30 anos (prazo legal máximo) e precise ser reduzida a esse patamar máximo. Já a simples soma a que se refere o texto da lei, na reunião das penas aplicadas a um mesmo condenado, refere-se às adições feitas à pena, que podem ou não levá-la a ultrapassar o limite máximo de 30 anos, previsto no art. 75, caput, do Código Penal, sendo certo que, ultrapassado esse limite, deverá ser feita a unificação.

Portanto, pela leitura que se faz do texto legal, em sede de pena, pode haver tanto soma quanto unificação, o que, em termos práticos, significa que a obtenção da unidade de pena (para efeito de cumprimento e determinação do seu regime), pode ser obtida tanto por meio da adição das penas aplicadas, quanto mediante a redução do montante de pena superior a 30 anos. Além disso, como já frisamos, a unificação pode resultar da aplicação da pena de um dos dois ou mais crimes praticados, aumentada, em qualquer caso, situação verificada no concurso formal perfeito e no crime continuado.

Relativamente à unificação de medida socioeducativa, não há, exatamente como ocorre no âmbito da legislação penal, um cálculo matemático consistente no somatório ou na redução das penas impostas, para definição do regime de cumprimento ou para adequação da pena final ao prazo máximo legal.

Apesar das poucas informações que a Lei do SINASE trouxe sobre a unificação de medidas socioeducativas, não há dúvida que o instituto em questão deve ser analisado de forma sistemática com as demais disposições legais contidas no ECA, no texto constitucional e na própria Lei nº 12.594/2102, assim como à luz dos objetivos e princípios orientadores das medidas socioeducativas.

A Lei do SINASE não discorre sobre situações peculiares (todavia, recorrentes nos juizados da infância e da juventude), como o tratamento a ser conferido em caso de unificação envolvendo medidas socioeducativas de naturezas diferentes.

É verdade que no âmbito penal o legislador ordinário também não chamou para si a responsabilidade de explicitar de que forma a unificação da pena (considerada em suas modalidades de pena privativa de liberdade, pena restritiva de direitos, além do sursis) deve ser implementada. O que se observa é a conversão, nos casos em que isto é possível, da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade, a fim de que se possa concretamente fazer a soma ou a unificação.

Como na seara infracional a questão não se apresenta de maneira tão simplista, a solução prática, em muitos casos, dependerá do exame individualizado de cada situação que vier a ser enfrentada, na vivência do direito aplicado aos adolescentes em conflito com a lei, mediante a análise sistemática e principiológica das disposições correlatas, com a contribuição importante da doutrina e da jurisprudência que vem sendo formada sobre o assunto.

Ao tratar da unificação de medidas, o art. 45, caput, da Lei do SINASE não se reporta especificamente a medidas socioeducativas idênticas ou de mesma natureza. O texto do artigo prescreve: “Se, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida, a autoridade judiciária procederá à unificação [...]” (grifo nosso), o que leva a presumir que mesmo que se trate de medidas socioeducativas com regime de cumprimento e natureza distintos, como Liberdade Assistida (medida em meio aberto) e Internação (medida em regime de privação de liberdade), será cabível a unificação. Percebe-se também que, diferentemente do que ocorre com a legislação penal, a Lei do SINASE não fez referência à soma, mas apenas à unificação.

É preciso, então, que se analise o conceito de unificação, que não é dado pela lei e sim pela doutrina, além de ter sido concebido originalmente para a unificação de penas.

Segundo Mirabete (1997), unificar “quer dizer transformar várias penas em uma só.”

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Nucci (2013, p. 554) afirma que “unificar significa transformar várias coisas em uma. Portanto, unificar penas produz a consequência de converter inúmeras penas em uma única.”

Vê-se que a conceituação doutrinária anteriormente exposta não se preocupou em distinguir a obtenção da unidade de pena a ser cumprida pela soma de penas ou por sua redução ao limite legal máximo, contentando-se em apresentar um conceito para unificação, instituto que denominou de transformação de várias penas em uma só.

No âmbito das medidas socioeducativas, que podem ser cumuladas com medidas protetivas, encontramos também alguns conceitos para unificação.

De acordo com Ramidoff (2012, p. 98) a unificação deve ser entendida como a “reunião de procedimentos judiciais destinados ao acompanhamento jurisdicional do cumprimento das medidas legais – protetivas e/ou socioeducativas – judicialmente propostas ao adolescente a quem se atribui a autoria de ação conflitante com a lei.”

Sem adentrar profundamente no tema, ao tratar da unificação de medidas socioeducativas, Nucci (2014, p. 813) sustenta que se trata “de providência similar à execução penal, quando se unificam penas, para que o condenado cumpra um único montante – e não várias penas esparsas, o que somente dificultaria a progressão de regime e a percepção de outros benefícios”. Assim, de acordo com o citado autor, tratando-se de unificação de medida socioeducativa, “o sentido jurídico é o mesmo.”

Ainda para o autor em questão, a unificação independe da natureza das medidas socioeducativas, de sorte que “Durante a execução de qualquer medida socioeducativa, é possível que outro juízo aplique medida diversa, em processo relativo a outro ato infracional.”

Ferreira e Doi (s.d., p. 4), utilizando como parâmetro a conceituação trazida pela doutrina penal, segundo a qual pela unificação “se reduz a duração das penas aplicadas nas várias sentenças”, sustentam que “Isso, mutatis mutandis, é que deve ser considerado para as medidas socioeducativas.” Saliente-se que Ferreira e Doi não admitem a unificação de medidas de naturezas diferentes, para as quais sustentam ser cabível a cumulação, e não a unificação.

Por fim, para Digiácomo (2012, p. 22), unificação

Significa que todas as medidas socioeducativas eventualmente aplicadas ao mesmo adolescente, em procedimentos diversos, deverão ser reunidas num único processo de execução, ficando cada modalidade de medida sujeita aos prazos máximos de duração previstos em lei (cf. art. 45, §1º, da Lei nº 12.594/2012).

Eis as disposições da Lei do SINASE que tratam da unificação de medidas socioeducativas:

Art. 45. Se, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida, a autoridade judiciária procederá à unificação, ouvidos, previamente, o Ministério Público e o defensor, no prazo de 3 (três) dias sucessivos, decidindo-se em igual prazo.

§ 1º É vedado à autoridade judiciária determinar reinício de cumprimento de medida socioeducativa, ou deixar de considerar os prazos máximos, e de liberação compulsória previstos na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), excetuada a hipótese de medida aplicada por ato infracional praticado durante a execução.

§ 2º É vedado à autoridade judiciária aplicar nova medida de internação, por atos infracionais praticados anteriormente, a adolescente que já tenha concluído cumprimento de medida socioeducativa dessa natureza, ou que tenha sido transferido para cumprimento de medida menos rigorosa, sendo tais atos absorvidos por aqueles aos quais se impôs a medida socioeducativa extrema.

Apesar das considerações já feitas sobre a conceituação de unificação, ao que nos parece, a unidade, no tocante à medida socioeducativa, que a Lei do SINASE apregoa no art. 45, caput, e que deve ser buscada na prática do processo socioeducativo, nem sempre será naturalmente obtida. Para algumas situações, ela é artificial, a exemplo do que se dá no caso de medidas de natureza e regime diferentes, hipótese em que não é possível transformar a medida já em execução na nova medida aplicada, ou mesmo cumular esta com aquela medida, salvo nas hipóteses em que for possível o cumprimento concomitante, como ocorre, por exemplo, na cumulação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade com a medida socioeducativa de liberdade assistida.

Cuidando-se de medidas socioeducativas distintas e não cumuláveis entre si, a rigor, não haverá unificação de medidas, dada a impossibilidade do cumprimento concomitante. Apesar de ser feita a reunião de procedimentos de execução, como isto não equivalerá, na prática, à inclusão do adolescente em nova medida socioeducativa ou em modificação da medida já em cumprimento, ocorrendo a reunião mais por questão de política socioeducativa, ou, nas palavras de Nucci (2014, p. 815), “de política estatal no campo infantojuvenil”, não será o caso de unificação de medida, mas de unificação de procedimentos judiciais de execução.

No exemplo citado, que apresenta a hipótese de cumprimento simultâneo das medidas de prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida, observa-se que com a reunião dos procedimentos de execução não há sequer o estabelecimento de uma unidade na medida socioeducativa a ser efetivamente cumprida (pois isto não é possível quando as medidas aplicadas são de naturezas diferentes), mas apenas uma unidade de procedimentos de execução.

Por isso, chamamos novamente a atenção do leitor para as observações feitas no subitem 3.2, que trata das necessidades pedagógicas da medida, especialmente sobre a importância de uma avaliação criteriosa da situação geral do adolescente, inclusive sobre as medidas legais que ele já está a cumprir, antes de levar à instrução o procedimento de apuração de ato infracional anterior ao início de cumprimento de medida (s), assim como no momento de decidir sobre a aplicação da medida socioeducativa, cumulada ou não com outra medida dessa natureza ou de natureza protetiva.

Essa análise cuidadosa pode, inclusive, evitar problemas ou dificuldades para a boa operacionalidade e gerenciamento dos procedimentos em curso no juízo da execução das medidas socioeducativas, que, em alguns casos, pode ser o mesmo juízo do processo de conhecimento.

Diante da complexidade do tema, surgem então argumentos como: se for aplicada nova medida socioeducativa (em meio aberto) ao adolescente que já está a cumprir medida socioeducativa privativa de liberdade, os autos da execução da medida em meio aberto ficarão suspensos, aguardando o desenrolar da medida de segregação da liberdade.

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Em termos práticos, por não ser possível o cumprimento concomitante das medidas socioeducativas em meio aberto e daquelas em regime de privação da liberdade, além de não se vislumbrar o alcance de qualquer utilidade pedagógica com a sujeição tardia do adolescente à medida socioeducativa em meio aberto, conforme já foi explanado neste estudo, o bom senso indica que a suspensão processual apontada contraria os fins pedagógicos da medida, além de afrontar o princípio da intervenção precoce, previsto no art. 100, parágrafo único, inc. VI, do ECA, que se aplica às medidas socioeducativas, conforme o art. 113 do Estatuto. Segundo o princípio em questão, “a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida.”

Referindo-se especificamente à medida socioeducativa de internação, o legislador afirma que quando já houver ocorrido a conclusão do cumprimento dessa medida, ou o adolescente nela inserido tiver sido transferido para cumprimento de medida menos rigorosa, os atos infracionais praticados anteriormente ficam absorvidos por aqueles que ensejaram a medida extrema (art. 45, § 2º, da Lei do SINASE). Em tal situação, não será cabível sequer a aplicação de nova medida socioeducativa de internação, por ato infracional praticado anteriormente, ainda que se trate de vários atos infracionais.

Tratando-se de medida socioeducativa de semiliberdade, o raciocínio a ser feito pouco difere do que foi pontuado sobre a medida socioeducativa de internação, devendo, todavia, ser buscada fundamentação nos arts. 120, § 2º, do ECA e 45, § 1º, da Lei do SINASE.

O propósito da norma é impedir que a medida socioeducativa de internação (ou a de semiliberdade) tenha aspecto meramente retributivo e em descompasso com a evolução alcançada pelo adolescente ao longo do cumprimento de medida socioeducativa que importe em privação da liberdade.

Caso uma nova medida socioeducativa de internação tenha sido aplicada em tais circunstâncias, ou seja, sem observar o comando legal trazido pelo art. 45, § 2º, da Lei do SINASE, caberá ao juízo da execução (ou ao tribunal, em sede recursal) adotar as providências necessárias para que não haja prejuízo processual ou violação dos direitos e garantias legais do adolescente, inclusive extinguindo a nova medida socioeducativa aplicada, dada a vedação legal quanto à sua aplicação e, consequentemente, quanto à efetiva implementação.

No entanto, se o adolescente estiver imerso em medida socioeducativa de meio aberto e for verificada a necessidade de sua inserção em nova medida socioeducativa (de natureza diversa), que contemple outras estratégias de intervenção sociopedagógica, é possível a aplicação de nova medida socioeducativa, ainda que em decorrência de ato infracional anterior ao início da execução da medida já em andamento. Neste caso, a nova medida poderá vir a ser cumprida cumulativamente com a medida já em execução, como, por exemplo, prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida. Poderá ainda a nova medida socioeducativa substituir (diante da impossibilidade de cumprimento concomitante) a medida em meio aberto ou de semiliberdade que se mostraram pedagogicamente ineficazes.

Exemplos da situação derradeiramente apresentada são as hipóteses de aplicação da medida socioeducativa de semiliberdade, quando o adolescente já está a cumprir a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade ou a liberdade assistida, ou da aplicação da medida socioeducativa de internação, quando ele já se encontra vinculado à medida de semiliberdade, aplicada como medida inicial.

Para Nucci (2014, p. 814), se o jovem cumpre medida de semiliberdade, por prazo indeterminado, e recebe a medida de internação (também por prazo indeterminado), com a unificação das medidas para internação, deve ser respeitado o período já cumprido quanto à medida de semiliberdade, pois, de acordo com o citado autor, “medida cumprida deve ser respeitada; medida mais grave absorve a mais leve com ela incompatível; medidas mais leves, em meio aberto, coexistem.”

Pelo que se extrai da redação do art. 45, § 1º, da Lei do SINASE, se o adolescente está a cumprir ou já cumpriu a medida socioeducativa de semiliberdade, ele não poderá ser novamente imerso nessa medida, por ato infracional praticado anteriormente. No entanto, o anteriormente aqui mencionado refere-se a ato infracional anterior ao início da execução da medida de semiliberdade, e não ao seu término, como ocorre com a medida socioeducativa de internação, na situação apontada no art. 45, § 2º, da Lei do SINASE.

Diante disso, apesar de não haver vedação legal expressa para a aplicação de nova medida socioeducativa de semiliberdade, por ato infracional anterior, a adolescente que já houver concluído o cumprimento dessa medida, há vedação para o reinício do cumprimento da medida em questão, ressalvada a hipótese de ato infracional praticado durante a execução.

A omissão legislativa na Lei do SINASE, apontada no parágrafo anterior, pode trazer um problema de ordem prática, que é a aplicação da medida socioeducativa de semiliberdade, por ato infracional anterior, a adolescente que já se encontra imerso em tal medida, situação que, no caso concreto, precisará ser resolvida pelo juízo da execução.

Diante da situação apontada, o juízo da execução, à vista da guia de execução da nova medida de semiliberdade, amparado pelo art. 45, § 1º, da Lei do SINASE, que veda o reinício de cumprimento de medida socioeducativa, aplicada em decorrência de ato infracional anterior, não dará reinício à medida, mas extinguirá o novo procedimento de execução. Mesmo que faça a unificação das medidas, na prática, manterá incólume a medida já em andamento. O mesmo procedimento ele adotará no caso da aplicação de nova medida socioeducativa de liberdade assistida, em condições semelhantes.

Uma alternativa para que se evite esse trabalho aparentemente prescindível por mais de um juízo (respeitado o entendimento em sentido contrário), está ao alcance do próprio juízo do processo de conhecimento, que, para poupar de transtornos desnecessários o juízo da execução, deve estar atento à situação processual do adolescente no momento de decidir sobre a aplicação da medida, abstendo-se de aplicar nova medida socioeducativa de semiliberdade ou de liberdade assistida, em razão de ato anterior, optando, se for o caso, pela aplicação de outras medidas legais.

Portanto, caso o ato infracional sob julgamento for anterior ao início da execução da medida socioeducativa já em andamento, deve ser observado pelo juízo do processo de conhecimento o que estabelece o art. 45, § 1º, da Lei do SINASE, a fim de evitar uma nova aplicação de medida socioeducativa de liberdade assistida ou de semiliberdade, quando não for cabível o seu reinício.

Para Nucci (2014, p. 815), “todos os atos infracionais cometidos pelo menor, antes do início do cumprimento de medida socioeducativa, precisam ser visualizados como um conjunto único – e não como fatos isolados, gerando punições igualmente isoladas.”

Digiácomo (2012, p. 22) adverte que

[...] a previsão legal da unificação de medidas visa evitar, dentre outras, que o adolescente acumule procedimentos sem solução e receba a destempo, e de forma cumulativa, medidas que, a rigor, já perderam seu objetivo pedagógico. Apenas fatos posteriores ao início do cumprimento da medida original/unificada poderão resultar na aplicação de novas medidas, retomando a partir daí a contagem do prazo máximo de sua duração.

Cabe pontuar que apesar de o artigo 45, § 2º, da Lei do SINASE tratar apenas da medida socioeducativa de internação, não se deve perder de vista que em relação à medida socioeducativa de semiliberdade são aplicáveis, no que couber, as disposições relativas à medida de internação, conforme estabelece o art. 120, § 2º, do ECA.

No que se refere à medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, que pode ser aplicada para cumprimento por prazo determinado, embora variável, não superior a seis meses, também há vedação quanto ao reinício, em caso de ato infracional anterior à implementação da medida já em execução. No entanto, há algumas peculiaridades que precisam ser pontuadas a respeito da unificação dessa medida socioeducativa, o que será objeto de análise nos subitens seguintes.

Diante do que até agora foi exposto sobre unificação de medidas socioeducativas, extrai-se que de acordo com a Lei do SINASE, a unificação vai além da simples reunião de medidas de mesma natureza, dado o teor da redação trazida pelo art. 45, caput, da referida Lei, que ordena a unificação quando, no curso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida, sem especificar a sua modalidade.

Por isso, em sede de medida socioeducativa, o conceito de unificação talvez necessite ser mais elástico, conforme suscitou Ramidoff (2012, p. 98), ao defini-la como a “reunião de procedimentos judiciais destinados ao acompanhamento jurisdicional do cumprimento das medidas legais.”

Como já destacamos, quando a reunião de procedimentos nos quais houve a aplicação de medidas socioeducativas diferentes não resultar em alteração efetiva na medida socioeducativa já em execução ou em vias de ser iniciada, nem em unidade de medida, em razão da impossibilidade de tornar una as medidas distintas, o que na prática haverá em decorrência da reunião será a cumulação de medidas, quando cabível, e a unificação de procedimentos judiciais, mas não a unificação de medidas socioeducativas.

A unificação dos procedimentos pode ser justificada como política estatal para facilitar a individualização, além do melhor acompanhamento e controle das medidas socioeducativas aplicadas a um mesmo adolescente, mesmo que elas provenham de processos diferentes. No entanto, tratando-se de medidas distintas e que não admitem cumprimento simultâneo, a reunião de procedimentos enseja uma unificação de medidas apenas artificial, situação que preferimos chamar de unificação de procedimentos judiciais.

Conforme foi destacado, adotamos como argumento para o raciocínio apresentado no parágrafo anterior o fato de que, na hipótese de medidas diferentes e não cumuláveis, não ocorre concretamente a transformação das diversas medidas aplicadas em uma só, tampouco alteração efetiva na medida socioeducativa já em fase ou em vias de execução (embora seja expedida uma guia unificadora, pelo juízo da execução, e ocorra o arquivamento dos processos unificados – art. 2º, inc. VII e art. 11, § 3º, da Res. nº 165/2012-CNJ, com redação dada pela Res. nº 191/2014-CNJ).

As questões levantadas, ao lado de outras que ainda serão pontuadas sobre o tema, realçam a necessidade de se direcionar o pensamento dos atores envolvidos no processo socioeducativo para os vários desdobramentos que a unificação de medidas socioeducativas pode trazer, tanto para a aplicação quanto para a execução dessas medidas.

4.2. Natureza jurídica da unificação de medida socioeducativa

De acordo com Ramidoff (2012, p. 98), no âmbito socioeducativo a unificação constitui um “incidente processual no procedimento especial designado ao acompanhamento jurisdicional do cumprimento de medida socioeducativa por adolescente.”

Considerada um incidente da execução, a unificação pode ser analisada como um direito do socioeducando, na medida em que, por ela, tratando-se de ato infracional anterior ao início de uma medida em andamento, não poderá haver reinício de cumprimento da mesma medida, assim como, na hipótese de medida socioeducativa de internação, é vedado aplicar novamente a medida, em decorrência de ato infracional anterior ao cumprimento da primeira reprimenda.

A unificação pode também ser encarada como um poder-dever do magistrado, que a implementará quando estiverem presentes os requisitos para a sua efetivação, após ouvir o Ministério Público e o defensor do socioeducando (art. 45, caput, da Lei do SINASE).

A unificação visa ajustar, em um único procedimento de execução, as medidas socioeducativas (cumuladas ou não com medidas protetivas), aplicadas a um mesmo adolescente, em mais de um procedimento judicial, aos seus prazos máximos de cumprimento e condições legais para liberação do socioeducando. Visa ainda impedir que as medidas sejam reiniciadas em descompasso com as suas finalidades sociopedagógica e retributiva. É feita pelo juízo responsável pela execução da medida socioeducativa, que pode, eventualmente, ser o mesmo do processo de conhecimento, nos casos em que a medida deva ser cumprida em programa de atendimento ou unidade localizada na mesma comarca e fiscalizada pelo juízo que a aplicou.

Para que se compreenda melhor o que ocorre no processo de unificação de medidas socioeducativas, à luz das diretrizes preconizadas pela Lei do SINASE, é necessário que se estabeleçam dois parâmetros de orientação baseados no tempo (momento) da prática do ato infracional, considerados em relação a uma medida socioeducativa em andamento: o ato infracional praticado antes e o ato infracional praticado durante o cumprimento de medida socioeducativa.

4.2.1. Ato infracional praticado antes do início do cumprimento de medida socioeducativa

Tanto no que se refere às medidas socioeducativas que demandam cumprimento em meio aberto, quanto em relação àquelas que são cumpridas em regime de privação da liberdade, há vedação legal para o reinício do cumprimento de medida socioeducativa da mesma natureza, quando o adolescente houver praticado o ato infracional antes do início da execução de medida socioeducativa que contempla a mesma estratégia sociopedagógica. A regra é aplicável ainda que a medida socioeducativa já iniciada tenha sido encerrada (em razão do seu cumprimento pelo prazo máximo legal, por exemplo) por ocasião da aplicação da nova medida de mesma natureza.

Tratando-se, portanto, de medida aplicada em decorrência de ato infracional anterior ao início da execução de determinada medida socioeducativa, com a unificação, a autoridade judiciária (juízo responsável pela execução, ou tribunal, em sede recursal) não poderá determinar o reinício do cumprimento da medida socioeducativa de mesma natureza, vale dizer, a nova medida socioeducativa não será implementada na prática (apesar da expedição de guia unificadora), pois há uma presunção legal de que a abordagem e o alcance sociopedagógicos que ela traria para o adolescente vêm sendo, serão ou foram alcançados por meio da medida já iniciada, substituída ou cumprida.

Quando se tratar de medidas de naturezas distintas, mas conciliáveis, como, por exemplo, estando o adolescente a cumprir uma das medidas em meio aberto ou medida em regime de privação de sua liberdade, vem a ocorrer a aplicação da medida socioeducativa de obrigação de reparar o dano ou de advertência, a situação é diferente. Em tais hipóteses, não há vedação para a efetivação da nova medida aplicada, avaliadas as peculiaridades do caso concreto. O mesmo raciocínio pode ser feito quando se tratar de uma medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade e outra de liberdade assistida, pois o cumprimento delas pode ocorrer de forma concomitante.

Como salientamos no subitem anterior, a unificação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade apresenta algumas peculiaridades que lhe são próprias, visto que é uma medida legal que pode ser aplicada por prazos diferenciados e determinados, embora sujeitos ao limite legal de seis meses, conforme estabelece o art. 117, caput, do ECA.

Pela leitura que se faz do texto do art. 45, § 1º, da Lei do SINASE, extrai-se que mesmo na hipótese de a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade ter sido aplicada por prazo inferior ao máximo legal, há vedação a que a medida de mesma natureza em andamento seja reiniciada, quando a nova aplicação dessa medida decorrer de ato infracional praticado anteriormente ao início do cumprimento da prestação de serviços à comunidade já em fase de implementação ou mesmo já cumprida.

Na avaliação de Ferreira e Doi (s.d., p. 6), quando a medida não diz respeito a ato infracional praticado durante a execução, mas a fato anterior, “[...] não há o reinício do cumprimento. Deve-se considerar o prazo da medida que está sendo executada, que também terá pertinência em relação a esta nova medida aplicada.”

Apresentando ligeira variação em relação ao posicionamento dos dois autores supracitados, Nucci (2014, p. 813), sustenta que

[...] o juiz deve respeitar o tempo de cumprimento da medida socioeducativa em andamento, quando recebe outra para unificar. Logo, é vedado determinar o reinício do cumprimento, como se a anterior não existisse. A segunda medida incorpora-se à primeira, respeitando o tempo já cumprido.

Ao tratar da unificação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, Digiácomo (2012, p. 22), pontua que

[...] um adolescente sentenciado à medida de prestação de serviços à comunidade em diversos procedimentos, deverá ter todas as decisões reunidas num único processo de execução, sendo que, somadas, as medidas aplicadas não poderão ter uma duração superior a 06 (seis) meses previstos como prazo máximo de duração para esta modalidade de medida, ex vi do disposto no art. 117, caput, do ECA. [...] Pela lógica do Sistema Socioeducativo, no exemplo supra, cumpridos 06 (seis) meses de serviço comunitário, o adolescente não poderá ser vinculado a esta modalidade de medida em outros processos relativos a atos infracionais anteriormente praticados que porventura estejam em trâmite (grifo nosso).

Apesar da ligeira impressão de que com a unificação é possível agregar (adicionar) à medida socioeducativa em andamento a nova medida aplicada ao adolescente, esta última, decorrente de ato infracional praticado anteriormente à medida já em execução, na prática isso não ocorre.

Para que tenhamos uma compreensão melhor sobre o instituto da unificação na seara das medidas socioeducativas, notadamente da prestação de serviços à comunidade, que, como salientamos, possui certas peculiaridades, faz-se necessário pontuar algumas questões importantes.

Diferentemente do que ocorreu com a legislação penal, a Lei do SINASE não previu a soma, mas apenas a unificação de medidas socioeducativas.

Analisando a literalidade do texto do art. 45, caput, da Lei nº 12.595/2012, vemos que ele não faz referência à soma, mas apenas à unificação, quando, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida. Situação diversa daquela verificada nos arts. 75, §§ 1º e 2º, do Código Penal e 111, caput, da Lei nº 7.2010/1984 (Lei de Execução Penal), que fazem alusão, respectivamente, à unificação e à soma de penas.

Portanto, com a unificação não há a soma dos prazos estipulados nas sentenças para o cumprimento das medidas socioeducativas aplicadas, ou dos prazos ainda restantes, estes relativos às medidas já em andamento, que foram cumpridas parcialmente.

Tratando-se da mesma medida socioeducativa, estando o adolescente a cumprir a medida aplicada e, sobrevindo nova medida, por fato anterior, com a unificação, deverá ser levado em consideração o período de medida já cumprido, ou seja, a medida em andamento não será retomada do seu termo inicial, pois há vedação legal quanto ao reinício de cumprimento de medida (art. 45, § 1º, primeira parte, da Lei do SINASE), embora seja expedida uma guia unificadora, que conterá informações sobre as medidas aplicadas e unificadas.

Porém, trazendo a discussão em exame para a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, a vedação legal quanto ao reinício de cumprimento da medida em execução não significa que, feita a unificação, o adolescente terá necessariamente que cumprir a medida já em andamento, pelo seu prazo remanescente.

Quando a Lei do SINASE reporta-se à impossibilidade de reinício de cumprimento de medida, está se referindo à medida já em execução, pois, havendo esse reinício (admissível somente em caso de medida socioeducativa por ato infracional praticado durante a execução), no final das contas o adolescente poderá ficar vinculado à medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade por até seis meses (prazo legal máximo), independentemente de ter cumprido, parcial ou integralmente, a medida anterior de mesma natureza, conforme veremos mais adiante.

Cuidando-se da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, uma questão que se revela importante e de análise obrigatória é a técnica a ser utilizada para estabelecer o prazo de medida a ser cumprido pelo adolescente, em caso de unificação de medidas.

Como anotamos, tratando-se de medida socioeducativa oriunda de ato infracional anterior à execução de medida já em andamento, não cabe reinício de cumprimento de medida.

Porém, como a lei não esclarece a respeito, surge então a indagação sobre qual seria o prazo a ser observado para o cumprimento da medida, após ser feita a unificação. O da medida já em andamento ou o da nova medida aplicada?

Como não há soma de prazos na unificação de medidas socioeducativas, tratando-se de medida de prestação de serviços à comunidade decorrente de ato infracional anterior à medida em execução, a rigor, o prazo a ser observado para o cumprimento das medidas unificadas será o da nova medida aplicada, respeitando-se (não desprezando) o período de medida já cumprido e observando-se o limite legal de seis meses.

Contudo, pode ocorrer que o período a cumprir da medida em andamento, original ou já unificada anteriormente, seja superior ao prazo estabelecido para a nova medida de prestação de serviços à comunidade que será objeto de unificação. Nesse caso, mesmo com a nova unificação, mostra-se razoável o cumprimento da medida socioeducativa pelo prazo mais extenso, a saber, o da medida em execução. Apesar de se tratar de prazo remanescente da medida já em andamento, a opção por esse prazo não constituirá reinício de cumprimento de medida socioeducativa; respeitará o período de medida já cumprido, além de não levar o cumprimento da medida para um prazo superior ao máximo legal de seis meses.

4.2.2. Ato infracional praticado durante o cumprimento de medida socioeducativa

Cuidando-se de medida socioeducativa aplicada em decorrência de ato infracional praticado durante o cumprimento de outra medida de mesma natureza, o adolescente poderá ser submetido novamente a essa medida socioeducativa, ainda que já tenha cumprido, parcial ou integralmente medida semelhante, resultante de prática infracional anterior (art. 45, § 1º, parte final, da Lei do SINASE).

Sob essa visão, tratando-se, por exemplo, de medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, sobrevindo aplicação de nova medida de mesma natureza, por fato praticado durante a execução da medida já em andamento, com a unificação, poderá haver reinício de cumprimento de medida (art. 45, § 1º, parte final, da Lei do SINASE).

Quanto ao prazo para o cumprimento da medida unificada, não haverá soma, devendo ser aplicado o prazo da medida que for mais extenso, seja ele o da medida em andamento ou já unificada, seja o da nova medida aplicada.

Caso os prazos para cumprimento das medidas sejam iguais, a probabilidade maior é que o prazo a ser adotado seja o da medida mais recente, pois ele poderá ser cumprido integralmente, desprezando-se o período já cumprido da medida anterior.

Ainda que a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento já tenha sido cumprida parcialmente, caso a nova medida seja aplicada pelo prazo legal máximo (seis meses), com a unificação, o adolescente passará a cumpri-la integralmente, ou seja, por seis meses, desprezando-se o período já cumprido, da primeira medida ou das medidas já unificadas.

Na hipótese em que a medida anterior, de mesma natureza, já tiver sido integralmente cumprida, não haverá unificação, pois a nova medida será cumprida de forma independente, pelo prazo estipulado na sentença, que não poderá ser superior a seis meses.

Em resumo, caso a nova medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade tenha sido aplicada por prazo inferior a seis meses, com a unificação, o cumprimento observará o maior prazo (da medida em andamento ou da nova medida aplicada), pois não há soma de prazos.

Porém, se for utilizado o prazo da nova medida, não haverá decréscimo por conta do período de medida já cumprido (despreza-se esse período), de sorte que o adolescente cumprirá a medida pelo prazo integral estabelecido na nova sentença, visto que se trata de medida decorrente de ato infracional praticado durante a execução de medida anterior.

Por outro lado, se a nova medida de mesma natureza foi aplicada pelo prazo de seis meses, ela e o seu prazo serão a nova referência para a medida a ser cumprida, desprezando-se o período já cumprido ou o prazo estipulado na medida anterior, o que, na prática, significa que o adolescente poderá ficar vinculado à medida por mais de seis meses.

Obviamente, as metas estabelecidas no plano individual que já foram alcançadas antes da unificação (a exemplo da inserção ou reinserção educacional do adolescente) serão levadas em consideração para efeito de cumprimento da medida unificada, pois, mesmo com a unificação de medida e readequação do plano individual de atendimento, a intervenção estatal deverá ter como foco os déficits sociais e pedagógicos apresentados pelo adolescente que ainda não foram supridos.

Tratando-se de medidas socioeducativas de liberdade assistida, semiliberdade e internação, adota-se raciocínio não muito diferente. Para elas, em caso de aplicação de nova medida socioeducativa de mesma natureza, por ato infracional praticado durante o cumprimento da medida em execução, com a unificação, o reinício do cumprimento da medida também não enseja soma de restante de período relativo à medida anterior (despreza-se o período da medida anterior já cumprido).

O que ocorre é o reinício de cumprimento da medida, que fica sujeita ao prazo máximo de três anos, a não ser que, no caso específico da liberdade assistida, a medida tenha sido aplicada por prazo máximo menor, ou, tratando-se de quaisquer das três medidas, sobrevenha condição que importe em liberação do socioeducando antes do prazo máximo previsto para a medida socioeducativa, como, por exemplo, o desempenho adequado do adolescente, com base no seu plano de atendimento individual, ou o alcance dos 21 anos de idade pelo jovem, condição que enseja a sua liberação compulsória.

O cabimento do reinício de cumprimento de medida, na hipótese de nova medida aplicada durante a execução, em breves palavras, significa que se despreza o período de medida socioeducativa de mesma natureza já cumprido, encarando-se a nova medida aplicada sob a perspectiva de que o período já implementado da medida anterior não existiu, o que, como frisamos, em termos práticos, pode levar o adolescente a ficar vinculado a uma mesma medida socioeducativa por prazo superior ao máximo legal. Não porque houve soma de prazos das medidas unificadas, mas porque a medida foi reiniciada.

Apresentando um exemplo que ilustra a situação derradeiramente apontada, envolvendo ato infracional praticado durante a execução, Nucci (2014, p. 814), assevera que

[...] se o jovem está internado e vem a matar alguém, recebendo, por isso, outra medida socioeducativa de internação, faz-se a unificação, mas desprezando-se o tempo já cumprido. Ilustrando: o menor cumpre medida socioeducativa por prazo indeterminado, já tendo atingido um ano, faltando-lhe dois para a liberação; comete ato infracional equivalente a homicídio durante a execução; recebe outra medida de internação; o juiz despreza o tempo já cumprido (um ano) e ele principia novo período indeterminado, condicionado a três anos à frente.

É importante deixar claro que o fato de o socioeducando reiniciar o cumprimento da medida socioeducativa não significa que ele necessariamente irá cumpri-la pelo seu prazo máximo, sobretudo quando se tratar de medida socioeducativa por prazo indeterminado, pois a reavaliação da manutenção, da substituição ou da suspensão das medidas pode ser solicitada a qualquer tempo, conforme estabelece o art. 43 da Lei do SINASE.

4.3. Unificação de medidas e unidade de procedimentos

A Lei do SINASE informa que haverá unificação quando, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida (art. 45, caput), o que pressupõe a existência de pelos menos duas medidas aplicadas a um mesmo adolescente.

Como já frisamos, em alguns casos, quando as medidas são de naturezas distintas e não admitem cumprimento concomitante, a unificação de medida é meramente artificial, ocorrendo, na verdade, a unidade apenas do procedimento judicial de execução, pois as medidas não se incorporam efetivamente, apesar de serem registradas em uma única guia (unificadora), que será levada para um só procedimento de execução, onde será feito o acompanhamento.

Embora a Lei do SINASE refira-se à unificação de medidas socioeducativas (e não de procedimentos), percebe-se que em termos práticos ocorre também a unificação (transformação de dois ou mais em apenas um) em relação aos procedimentos de execução, na medida em que, com a unificação, as diversas medidas aplicadas a um mesmo adolescente são reunidas e os seus prazos adequados aos limites legais, levando-se o cumprimento para um só procedimento de execução, que pode ser o mais antigo ou o mais recente, conforme a avaliação feita pelo juízo da execução, arquivando-se os processos unificados.

Conforme o Enunciado 17 do Fórum Nacional da Justiça Juvenil:

Deve haver pronunciamento judicial específico sobre a unificação de medida socioeducativa, definindo em qual das execuções serão praticados os atos, se na execução mais antiga ou na medida mais gravosa, extinguindo-se as demais, trasladando-se tal decisão e expedindo-se guia de execução unificada.

Dispõe a Resolução nº 165/2012-CNJ, com alteração dada pela Resolução nº 191/2014-CNJ:

Art. 11. A execução da medida socioeducativa deverá ser processada em autos próprios, formados pela guia de execução e documentos que a acompanham, obrigatoriamente, ainda que o juízo da execução seja o mesmo do processo de conhecimento.

[...]

§ 2º Cada adolescente, independentemente do número e do tipo das medidas a serem executadas, deverá ter reunidas as guias de execução definitivas, em autos únicos, observado o disposto no art. 45 da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012.

§ 3º Unificados os processos de execução pelo juiz da execução, deverá ser expedida obrigatoriamente por meio do CNACL, nova Guia unificadora das medidas, devendo ser arquivados definitivamente os autos unificados (NR).

Observa-se que ao disciplinar, por meio de Resolução, algumas questões envolvendo a execução das medidas socioeducativas, o CNJ não apenas reconheceu a unificação de medidas de naturezas diferentes, como também reportou-se à unificação de processos de execução.

Obviamente, não cabe a unificação de procedimentos judiciais nos quais ainda não houve o julgamento do ato infracional, pois a unificação dirige-se originalmente às medidas aplicadas (e não ao procedimento judicial), além de ser uma providência que ocorre no processo de execução, feita pelo juízo responsável pela execução, à vista de duas ou mais medidas socioeducativas aplicadas a um mesmo adolescente.

Vale ainda lembrar que a medida a ser alvo de unificação, a rigor, deve ter sido aplicada por sentença ou acórdão já transitados em julgado, não podendo estar em execução ainda provisória, suscetível, portanto, de revisão, em sede recursal, pelos órgãos do Poder Judiciário.

O art. 2º, incs. IV e V, da Resolução nº 165-2012-CNJ, traz a definição de guia de execução definitiva de medidas socioeducativas de internação, semiliberdade, prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida. Para as quatro medidas socioeducativas destaca o texto da Resolução que a guia de execução definitiva é aquela decorrente de sentença ou de acórdão transitados em julgado.

Dispõe a Resolução nº 165-2012-CNJ:

Art. 10. Transitada em julgado a decisão de que tratam os arts. 7º e 8º, deverá o juízo do processo de conhecimento expedir guia de execução definitiva, que conterá os documentos arrolados no artigo anterior, acrescidos da certidão do trânsito em julgado e, se houver, de cópia do acórdão (grifo nosso).

Os arts. 7º e 8º da Resolução nº 165-2012-CNJ tratam, respectivamente, de guia de execução de internação provisória e de sentença que mantém a medida privativa de liberdade.

Da leitura das disposições normativas citadas e do disposto no art. 11, § 2º, da Resolução nº 165/2012-CNJ, pode-se verificar que as guias de execução de medida que são reunidas em autos únicos, para fins de unificação, são as definitivas, ou seja, aquelas guias relativas a medidas aplicadas por sentenças das quais não cabe mais recurso.

Por isso, é conveniente que se aguarde o trânsito em julgado da sentença ou do acórdão e a expedição da guia de execução definitiva (ou conversão da guia provisória em definitiva – art. 10, § 1º, Res. 165/2012-CNJ) para somente após isso fazer a unificação das medidas, ficando o adolescente nesse ínterim sujeito à medida socioeducativa que já estava a cumprir.

Com base na análise anterior, depreende-se que as medidas socioeducativas aplicadas em sede de remissão, como forma de suspensão do processo (arts. 126 a 128, 186, § 1º, e 188 do ECA), a rigor, também não devem ser levadas à unificação, pois elas estão sujeitas à revisão a qualquer tempo, pelo próprio juízo do conhecimento, inclusive com a possibilidade de retomada do procedimento de apuração de ato infracional (em caso de descumprimento, ineficácia ou inadequação da medida aplicada).

Sob essa análise, em caso de medida socioeducativa resultante de remissão suspensiva, ainda que haja mais de uma medida aplicada e tenham sido expedidas guias de execução específicas para cada uma delas, as medidas deverão ser acompanhadas individualmente, no seu respectivo procedimento de execução, observando-se os prazos máximos de cumprimento, assim como as restrições quanto ao reinício de cumprimento de medida, quando se tratar de ato infracional praticado antes da medida em execução.

Porém, apesar de instrumentalmente não ser feita a unificação, na prática a metodologia que a envolve deverá ser implementada, pelo menos no que diz respeito aos prazos a serem observados para o cumprimento das medidas socioeducativas em meio aberto, aplicadas em sede de remissão suspensiva, pois a situação do adolescente em cumprimento de medida aplicada em sede de remissão não poderá ser mais gravosa do que seria caso a unificação fosse realizada por resultar de sentença definitiva.

Semelhantemente ao que ocorre quando é feita a unificação, tratando-se de medidas socioeducativas aplicadas em remissão, como forma de suspensão do processo, o adolescente não poderá ter os prazos das medidas de mesma natureza somados, ainda que se trate de medida socioeducativa aplicada durante a execução de medida anterior, esta aplicada ou não em sede de remissão.

O tratamento a ser conferido no tocante aos prazos de medida a cumprir e ao reinício ou não de cumprimento da medida observará a mesma sistemática que é adotada para o caso de unificação de medidas, inclusive, quando se tratar da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, o cumprimento será pelo prazo que for mais extenso.

Encarar de outra forma a situação do adolescente imerso em medida socioeducativa que resultou de remissão suspensiva representaria tratamento mais gravoso para o socioeducando do que aquele utilizado para a unificação de medidas resultantes de sentença definitiva, o que não pode ser concebido.

Na forma do art. 186, § 1º, do ECA, após iniciado o procedimento de apuração de ato infracional, caso o juiz entenda cabível a remissão, poderá concedê-la após ouvir o Ministério Público.

Sabe-se que na prática a concessão de remissão é precedida da análise da situação geral do adolescente, o que envolve, por exemplo, aspectos da sua vida pessoal, social, familiar, educacional, processual etc. O art. 126, caput, do ECA estipula que para a concessão da remissão devem ser verificados fatores como circunstâncias e consequências do fato, contexto social, personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional.

Conforme o art. 127 do ECA, em sede de remissão pode ser aplicada ao adolescente qualquer medida de natureza protetiva ou de caráter socioeducativo, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação. Assim, são cabíveis no contexto da remissão apenas as medidas socioeducativas de liberdade assistida, prestação de serviços à comunidade, obrigação de reparar o dano e advertência, além de medidas de proteção específica.

Apesar de não ser possível a regressão da medida socioeducativa aplicada em sede de remissão (nem mesmo para a internação-sanção), deve ser avaliado se realmente é necessário retomar o curso do procedimento de apuração de ato infracional.

Dependendo da medida legal aplicada e da situação geral do socioeducando, no caso de descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente aplicada, ou de outra circunstância que esteja inviabilizando o seu cumprimento, pode ser mais viável e prático o juízo da execução substituir (adequar) a medida aplicada em sede de remissão por outra em meio aberto.

O juízo da execução poderá então agendar audiência de reavaliação de medida, com a presença do adolescente, dos seus pais ou responsável, dos técnicos da entidade de atendimento, do defensor e do Ministério Público, ato no qual decidirá sobre a substituição da medida socioeducativa que não vem sendo cumprida, por outra medida em meio aberto, na forma do art. 43, inc. II, da Lei do SINASE.

Como a remissão cumulada com aplicação de medida socioeducativa pressupõe ato infracional não considerado grave, tampouco praticado mediante grave ameaça ou violência à pessoa, mesmo com a retomada do procedimento de apuração de ato infracional, não poderão ser aplicadas medidas outras que não a liberdade assistida, a prestação de serviços à comunidade, a advertência ou a reparação do dano, além de medidas protetivas. Assim, a retomada do procedimento precisa ser analisada de forma criteriosa e com bom senso, pois, em última análise, estará apenas postergando a inserção do adolescente em uma medida socioeducativa que poderia ser desde logo aplicada, mediante simples substituição, como forma de adequação de medida.

Diante do que foi exposto, avalia-se que apesar das orientações em sentido contrário, quando se tratar de cumprimento de medidas socioeducativas aplicadas em sede de remissão suspensiva, não deve ser integralmente descartada a possibilidade da unificação das medidas, sobretudo quando o socioeducando já vem cumprindo adequadamente a medida em andamento.

Salvo no tocante ao afastamento do reconhecimento ou comprovação de responsabilidade e prevalência para efeito de antecedentes, circunstância que ocorre na remissão (art. 127, primeira parte, do ECA) e que não se verifica quando a medida socioeducativa é aplicada por sentença de mérito, não há justificativa para a retomada do procedimento de apuração de ato infracional pelo juízo do conhecimento, mesmo porque não poderão ser aplicadas ao adolescente medidas que importem em privação da liberdade, nem mesmo a internação-sanção.

Ademais, conforme foi destacado, mesmo após a unificação, ainda é possível a reavaliação e eventual substituição (adequação) da medida, pelo juízo da execução, além de não estar de todo afastada a possibilidade da retomada do procedimento de apuração de ato infracional, pelo juízo do conhecimento (onde estão os autos do processo de conhecimento), a pedido do Ministério Público.

Caso o procedimento de apuração de ato infracional seja efetivamente retomado, serão arquivados os autos do processo de execução da medida socioeducativa aplicada em sede de remissão, original ou unificada com outra medida aplicada em remissão suspensiva.

Dada a peculiaridade do tema abordado por derradeiro, é importante que ele seja analisado também à luz do que dispõem as normas regulamentadoras elaboradas pelos tribunais de justiça dos estados e do Distrito Federal, sobre controle, prazos e outros mecanismos de execução de medidas socioeducativas.

4.4. Situações hipotéticas de unificação de medidas socioeducativas

Antes de apresentar as situações hipotéticas a seguir, enfatizamos que os exemplos mostrados trazem somente medidas socioeducativas de mesma natureza.

Sobre a unificação de medidas de naturezas diferentes, remetemos o leitor para os comentários expostos no final do subitem 4.4.3.

Apresentaremos nos dois próximos subitens vários exemplos ilustrativos de unificação envolvendo a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, medida que traz algumas peculiaridades quanto à técnica de unificação, devido ao fato de poder ser aplicada por prazos diferenciados, conforme já salientado.

4.4.1. Medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade aplicada antes do início da execução de medida anterior

a) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de cinco meses, em decorrência de ato infracional praticado antes do início da execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta última aplicada pelo prazo de quatro meses, dos quais dois já foram cumpridos: como não cabe o reinício de cumprimento de medida e deve ser considerado o período já cumprido da medida em andamento, não sendo admitida a soma de prazos e respeitando-se o limite legal de seis meses, com a unificação, o adolescente cumprirá três meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem aos cinco meses da nova medida, descontados os dois meses já cumpridos da medida anterior;

b) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de seis meses, em razão de ato infracional praticado antes do início da execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade anteriormente aplicada, esta última pelo prazo de quatro meses, dos quais nada foi cumprido: como não cabe o reinício de cumprimento de medida, tampouco a soma de prazos, com a unificação, o adolescente cumprirá a medida por seis meses, que é o prazo da última medida, não sendo descontado nenhum dia em relação à medida anterior, visto que dela nada chegou a ser cumprido;

c) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de três meses, em decorrência de ato infracional praticado antes do início da execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta aplicada pelo prazo seis meses, dos quais um já foi cumprido: como a medida em andamento é mais extensa, mesmo levando em consideração o período de um mês já cumprido, além de não ser admitida a soma de prazos, com a unificação, o adolescente cumprirá cinco meses de prestação de serviços à comunidade, ou seja, o restante a ser cumprido da medida em andamento. Observa-se que apesar de o adolescente cumprir o período de medida socioeducativa mais extenso, não há reinício de cumprimento de medida;

d) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em decorrência de ato infracional praticado antes do início da execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta também aplicada pelo prazo de quatro meses, dos quais o adolescente não chegou a cumprir nenhum dia: como não haverá alteração no prazo da medida a cumprir, visto que ainda não foi cumprido nenhum dia do prazo da primeira medida, com a unificação, o adolescente cumprirá os quatro meses da medida ainda pendente;

e) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em decorrência de ato infracional praticado antes do início da execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta também aplicada pelo prazo de quatro meses, dos quais um mês já foi cumprido: embora as medidas tenham sido aplicadas pelo mesmo prazo, como deve ser levado em consideração o período de medida já cumprido, com a unificação, o adolescente cumprirá três meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem ao prazo da nova medida, descontado o período de um mês que já foi cumprido da medida anterior;

f) medida de prestação de serviços à comunidade X medidas unificadas de prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em virtude de ato infracional praticado antes do início da execução de outras medidas socioeducativas de prestação de serviços à comunidade que foram unificadas e resultaram no prazo de cinco meses, dos quais ainda não foi cumprido nenhum dia: como do quantum de medida resultante da primeira unificação nenhum dia foi efetivamente cumprido, o adolescente cumprirá a medida pelo prazo de cinco meses, que é o período mais extenso.

Como pode ser observado, tratando-se de medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade aplicada em razão de ato infracional praticado anteriormente ao início da execução de medida já em andamento, a unificação jamais levará o adolescente a cumprir a medida socioeducativa por prazo superior a seis meses, diversamente do que pode ocorrer quando se cuidar de ato infracional praticado durante a execução, conforme veremos no próximo subitem.

4.4.2. Medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade aplicada durante a execução de medida anterior

a) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de seis meses, em função de ato infracional praticado durante a execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta última aplicada pelo prazo de quatro meses, dos quais dois já foram cumpridos: tratando-se de ato infracional praticado durante a execução de medida de mesma natureza, é cabível o reinício de cumprimento de medida, desprezando-se o período já cumprido da medida em andamento. Assim, com a unificação, o adolescente cumprirá seis meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem ao prazo da nova medida aplicada, sem descontar os dois meses já cumpridos da medida que estava em andamento;

b) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em razão de ato infracional praticado durante a execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta aplicada pelo prazo de seis meses, dos quais um já foi cumprido: como a medida em andamento é mais extensa, mesmo se for considerado o período de um mês já cumprido, por não ser possível a soma de prazos e o prazo menor da última medida aplicada não ensejar reinício de cumprimento de medida, não havendo período a ser desprezado, visto que o prazo da nova medida é menor que o da anterior, com a unificação, o adolescente cumprirá cinco meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem ao restante da medida que se encontrava em andamento;

c) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de cinco meses, em razão de ato infracional praticado durante a execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta última aplicada pelo prazo de quatro meses, dos quais dois já foram cumpridos: tratando-se de ato infracional praticado durante a execução de medida de mesma natureza em andamento, embora não haja soma de prazos, é cabível o reinício de cumprimento de medida, desprezando-se o período já cumprido da medida em andamento. Assim, com a unificação, o adolescente cumprirá cinco meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem ao prazo da nova medida aplicada, sem descontar os dois meses já cumpridos da medida que estava em andamento;

d) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em razão de ato infracional praticado durante a execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, aplicada por igual prazo, do qual já foram cumpridos três meses: tratando-se de ato infracional praticado durante a execução de medida de mesma natureza em andamento, é cabível o reinício de cumprimento de medida, desprezando-se o período já cumprido da medida em andamento. Assim, com a unificação, o adolescente cumprirá quatro meses de prestação de serviços à comunidade, que é o prazo da nova medida aplicada, sem descontar os três meses já cumpridos da medida que estava em andamento. Observa-se que no final das contas o adolescente permanecerá vinculado à medida socioeducativa de prestação de serviços por sete meses (mais do que o limite legal de seis meses), o que somente é possível quando se tratar de ato infracional praticado durante a execução de medida em andamento;

e) prestação de serviços à comunidade X prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de dois meses, em função de ato infracional praticado durante a execução de outra medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade em andamento, esta aplicada pelo prazo de seis meses, dos quais dois já foram cumpridos: como a medida em andamento é mais extensa, mesmo se for considerado o período de dois meses já cumprido, por não ser possível a soma de prazos e o prazo menor da última medida aplicada não ensejar reinício de cumprimento de medida, não havendo período a ser desprezado, visto que o prazo da nova medida é menor que o da anterior, com a unificação, o adolescente cumprirá quatro meses de prestação de serviços à comunidade, que equivalem ao restante da medida que se encontrava em andamento;

f) medida de prestação de serviços à comunidade X medidas unificadas de prestação de serviços à comunidade. Medida aplicada pelo prazo de quatro meses, em virtude de ato infracional praticado durante a execução de outras medidas socioeducativas de prestação de serviços à comunidade que foram unificadas e resultaram no prazo de seis meses, dos quais três já foram cumpridos: tratando-se de ato infracional praticado durante a execução de medida de mesma natureza em andamento, é cabível o reinício de cumprimento de medida, desprezando-se o período já cumprido da medida unificada em andamento. Assim, com a unificação, o adolescente cumprirá quatro meses de prestação de serviços à comunidade, que é o prazo da nova medida aplicada, sem descontar os três meses já cumpridos, relativos à primeira unificação de medidas.

Como pode ser observado, tratando-se de medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade aplicada em razão de ato infracional praticado durante a execução de outra medida aplicada ou resultante da unificação de outras medidas de prestação de serviços à comunidade, é possível o reinício de cumprimento de medida, o que pode levar o socioeducando a ficar vinculado à medida por prazo superior ao limite legal de seis meses. Todavia, quando se dá essa vinculação à medida por prazo superior ao limite legal, isto não ocorre porque houve a soma dos prazos das medidas aplicadas, mas porque foi desprezado o prazo já cumprido da medida anterior, original ou resultante de unificação de medidas.

Após receber as guias de execução de medida socioeducativa e fazer a autuação dos processos de execução, o juízo responsável pela execução, após ouvir o Ministério Público e o defensor do socioeducando, decidirá pela unificação das novas medidas aplicadas ou delas com aquelas já em andamento. Feita a unificação, ele determinará o cumprimento da medida pelo prazo que ficar estipulado; escolherá o processo no qual a medida unificada será acompanhada (tratando-se de mesma medida, será geralmente a execução mais antiga) e ordenará o arquivamento definitivo dos autos unificados, de onde serão trasladadas as peças necessárias para os autos do processo onde serão praticados os atos de execução, expedindo-se a guia unificadora (art. 2º, inc. VII e art. 11, § 3º, da Res. 165/2012-CNJ, com redação dada pela Res. 191/2014-CNJ).

4.4.3. Medidas socioeducativas de liberdade assistida, semiliberdade e internação, aplicadas durante a execução de medida anterior

Como já foi salientado, tratando-se de medida socioeducativa aplicada em razão de ato infracional praticado anteriormente ao início da execução de medida de mesma natureza, não cabe o reinício do cumprimento da medida, de sorte que, a rigor, a unificação não trará repercussão de ordem prática para a medida já em execução.

Por isso, neste subitem os exemplos hipotéticos envolvendo a unificação das medidas socioeducativas de liberdade assistida, semiliberdade e internação serão restritos a medidas aplicadas durante a execução de medida de mesma natureza.

a) liberdade assistida X liberdade assistida: O adolescente cumpre a medida socioeducativa de liberdade assistida. No curso da execução da medida pratica novo ato infracional e é sentenciado novamente a essa medida. Recebida a nova guia de execução de medida socioeducativa e autuado o novo processo de execução, o juízo responsável pela execução, após ouvir o Ministério Público e o defensor do socioeducando, decide pela unificação. Assim, ele determina o reinício do cumprimento da medida e o arquivamento definitivo dos autos unificados, de onde são trasladadas as peças necessárias para os autos do processo onde serão praticados os atos de execução (geralmente o processo mais antigo), expedindo-se a guia unificadora (art. 2º, inc. VII e art. 11, § 3º, da Res. 165/2012-CNJ, com redação dada pela Res. 191/2014-CNJ).

A medida socioeducativa ficará sujeita ao novo prazo determinado na sentença ou, caso ele não tenha sido fixado, ao prazo máximo de três anos (prazo limite para as medidas de internação e semiliberdade) ou, ainda, a outra condição que resulte na liberação do socioeducando do cumprimento da medida, o que pode ocorrer, por exemplo, durante a reavaliação sobre a manutenção ou substituição da medida em execução, na forma do art. 43 da Lei do SINASE;

b) semiliberdade X semiliberdade: O adolescente cumpre a medida socioeducativa de semiliberdade. No curso da execução da medida pratica novo ato infracional e é sentenciado à idêntica medida. Recebida a guia de execução de medida socioeducativa e autuado o processo de execução, o juízo responsável pela execução, após ouvir o Ministério Público e o defensor do socioeducando, decide pela unificação. Assim, ele determina o reinício do cumprimento da medida e o arquivamento definitivo dos autos unificados, de onde são trasladadas as peças necessárias para os autos do processo onde serão praticados os atos de execução (geralmente o processo mais antigo), expedindo-se a guia unificadora (art. 2º, inc. VII e art. 11, § 3º, da Res. 165/2012-CNJ, com redação dada pela Res. 191/2014-CNJ).

A medida socioeducativa ficará sujeita ao novo prazo máximo de três anos ou, ainda, a outra condição que enseje a liberação do socioeducando do seu cumprimento;

c) internação X internação: O adolescente cumpre a medida socioeducativa de internação. No curso da execução da medida pratica novo ato infracional e é sentenciado à idêntica medida. Recebida a guia de execução de medida socioeducativa e autuado o processo de execução, o juízo responsável pela execução, após ouvir o Ministério Público e o defensor do socioeducando, decide pela unificação. Assim, ele determina o reinício do cumprimento da medida e o arquivamento definitivo dos autos unificados, de onde são trasladadas as peças necessárias para os autos do processo onde serão praticados os atos de execução (geralmente o mais antigo), expedindo-se a guia unificadora (art. 2º, inc. VII e art. 11, § 3º, da Res. 165/2012-CNJ, com redação dada pela Res. 191/2014-CNJ).

A medida socioeducativa ficará sujeita ao novo prazo máximo de três anos ou, ainda, a outra condição que enseje a liberação do socioeducando do seu cumprimento.

Ainda que a medida socioeducativa em andamento seja o resultado de unificação já implementada, quando a nova medida de mesma natureza aplicada for resultante de ato infracional praticado durante a execução, haverá nova unificação, observando-se as orientações anteriormente citadas.

Conforme já salientamos, as reavaliações periódicas, para fins de manutenção, substituição ou suspensão da medida socioeducativa (arts. 43 e 44 da Lei do SINASE), podem ensejar a liberação do socioeducando do seu cumprimento, inclusive antes do prazo da reavaliação obrigatória ou do prazo máximo previsto para a medida.

Tratando-se de medidas socioeducativas de naturezas diferentes, observado o que já foi comentado anteriormente sobre o tema (medidas suscetíveis ou não de cumprimento concomitante), a unificação (dos procedimentos judiciais de execução) terá como consequência o acompanhamento das medidas em um único procedimento de cunho executivo, expedindo-se a guia unificadora e arquivando-se os autos unificados.

A nova medida somente será levada à execução se for compatível com a medida cujo cumprimento já foi iniciado, ou seja, desde que elas possam ser cumpridas de forma concomitante. Caso sejam inconciliáveis, a unificação, inclusive dos procedimentos de execução, será meramente artificial, feita por questão de política socioeducativa estatal, conforme já se expôs no presente estudo.

Por fim, é importante lembrar que a unificação de medida precisa ser comunicada à entidade de atendimento socioeducativo, para que seja feita a readequação do plano individual de atendimento do socioeducando. A propósito, de acordo com o que estabelece o art. 10, § 2º, da Resolução nº 165/2012-CNJ, é da competência do juízo da execução comunicar ao órgão gestor da medida socioeducativa toda e qualquer alteração processual envolvendo o adolescente.

Sobre o autor
Rosinei da Silva Facundes

Mestre em Direito Ambiental e Políticas Públicas, Analista Judiciário e Assessor de Juiz

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FACUNDES, Rosinei Silva. Aplicação e execução de medidas socioeducativas e a Lei nº 12.594/2012. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4716, 30 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34903. Acesso em: 22 dez. 2024.

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