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A inconstitucionalidade da pena de cassação de aposentadoria dos servidores públicos

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Agenda 28/06/2016 às 10:42

3 O DIREITO À APOSENTADORIA

3.1 CONCEITO

Segundo o entendimento do professor Hely Lopes Meirelles (2010, p. 485), a aposentadoria representa “a garantia da inatividade remunerada, reconhecida aos servidores que já prestaram longos anos de serviço, ou se tornaram incapacitados para as suas funções”.

A aposentadoria é, portanto, um direito concedido ao trabalhador, mediante a ocorrência de determinados requisitos, propiciando a garantia da inatividade remunerada. O valor percebido pelo trabalhador a título de aposentadoria poderá ser o mesmo que recebia quando em atividade, ou proporcional ao tempo de serviço prestado, ou ainda, proporcional ao número de contribuições previdenciárias efetuadas pelo trabalhador.

A aposentadoria é o seguro público que abrange todas as pessoas que realizam suas contribuições previdenciárias, tendo por objetivo suprir a renda do trabalhador, quando este perde sua aptidão para o exercício de suas atividades laborais.

Assim, com o cumprimento dos requisitos legais exigidos para a concessão de aposentadoria, o Estado deverá amparar o trabalhador inativo, concedendo-lhe o benefício da aposentadoria, para que este tenha condições de sustentar a si e a sua família.

A Constituição Federal em seu art. 40, I a III, traz três modalidades de aposentadoria: por invalidez permanente, compulsória ou voluntária.

De acordo com o art. 40, § 1º, I, da CF os servidores que receberem atestado de invalidez permanente deverão ser aposentados com proventos proporcionais ao tempo de contribuição. Perceberão, no entanto, proventos integrais, independentemente da idade ou do número de contribuições prestadas, quando a invalidez resultar de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, conforme previsão definida em lei.

A Lei nº 8.112/90 traz em seu § 1º do artigo 186 o rol das doenças consideradas incapacitantes que determinam a concessão do benefício da aposentadoria por invalidez. O texto legal traz a seguinte redação

1o  Consideram-se doenças graves, contagiosas ou incuráveis, a que se refere o inciso I deste artigo, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, cardiopatia grave, doença de Parkinson, paralisia irreversível e incapacitante, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados do mal de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e outras que a lei indicar, com base na medicina especializada.

A referida lei ainda informa o que é considerado acidente em serviço:                                            

Art. 212.  Configura acidente em serviço o dano físico ou mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições do cargo exercido.

Parágrafo único.  Equipara-se ao acidente em serviço o dano:

I - decorrente de agressão sofrida e não provocada pelo servidor no exercício do cargo;

II - sofrido no percurso da residência para o trabalho e vice-versa.

 O acidente em serviço que ocasionar a incapacidade para o exercício das atividades normais do servidor será qualificada como incapacitante, tornando o servidor apto ao percebimento da aposentadoria decorrente da invalidez permanente.

A aposentadoria compulsória, independe da vontade das partes, pois tem sua previsão definida em lei, será concedida ao servidor que completar setenta anos de idade, percebendo proventos proporcionais relativos ao tempo de contribuição, de acordo com o art. 40, § 1º, I, da Constituição Federal.

Diferente da compulsória, a aposentadoria voluntária decorre do requerimento a ser realizado pelo servidor. Poderá ser concedida com proventos integrais, desde que sejam cumpridos os requisitos presentes no art. 40, § 1º, III, "a" da CF, que prevê idade mínima de 60 anos de idade e trinta e cinco de contribuição, se homem, ou 55 anos de idade e trinta de contribuição, se mulher.

O art. 40, § 1º, III, "b" da CF traz ainda a possibilidade de concessão do benefício com proventos proporcionais ao tempo de contribuição quando o servidor atingir determinada idade, para homens 65 anos e para mulheres 60 anos de idade.

Os magistrados, membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas possuíam um regime diferenciado, que assegurava a aquisição do benefício sempre com proventos integrais. Entretanto, a EC nº 20/98 alterou tal dispositivo, incluindo-os no regime previdenciário dos demais servidores públicos.

3.2 NATUREZA JURÍDICA

 Inicialmente a aposentadoria dos servidores públicos era custeada integralmente pelo Poder Público, sem que houvesse exigência da prestação de contribuições previdenciárias por responsabilidade dos servidores estatutários.

A aposentadoria era considerada uma benesse da Administração Pública, que não exigia nenhuma contrapartida do servidor para que lhe fosse assegurado o direito à aposentadoria. Para o servidor estatutário o benefício da aposentadoria estava desvinculado da exigência de qualquer contribuição.

De acordo com o entendimento de Maria Sylvia Zanella de Pietro (2010, p.555), a aposentadoria poderia ter natureza previdenciária, como também, poderia ser um direito derivado do exercício de atividades públicas. Teria, portanto, natureza previdenciária as aposentadorias relativas aos trabalhadores da iniciativa privada, que estavam vinculados à legislação trabalhista. Enquanto que, aos servidores públicos o benefício era consequência da função pública, em que não havia a exigência do recolhimento de prestações previdenciárias.

O benefício da aposentadoria tinha natureza jurídica de prêmio, pois era concedida pelo Estado em virtude da decorrência de um determinado lapso temporal, dispensando o recolhimento de qualquer contribuição previdenciária por parte do servidor estatutário.

Com as alterações realizadas no art. 40 da Constituição Federal após a edição da Emenda Constitucional nº 03/93, ficou estabelecido que as aposentadorias e pensões dos servidores públicos deveriam ser custeadas com recursos da União, bem como pelo recolhimento de contribuições previdenciárias pelos servidores federais, de acordo com a forma prescrita em lei.

A Emenda Constitucional nº 20/98, que estruturou o sistema previdenciário dos servidores estatutários, instituiu o regime contributivo para os servidores públicos de todos os entes federativos, e de suas autarquias e fundações.

Diante da imposição do regime contributivo, a aposentadoria dos servidores públicos perdeu seu caráter de gratificação, passando a exigir o pagamento de prestações previdenciárias. Assim, para o servidor ter direito ao benefício é necessário realizar o recolhimento das contribuições previdenciárias, já que a aposentadoria não é mais considerada uma benesse do Estado.

Com a instituição do regime contributivo tornando obrigatório a prestação das contribuições previdenciárias, a aposentadoria, segundo Maria Sylvia Zanella de Pietro, (2010, p. 555) passou a ter caráter previdenciário, o que antes, era exclusivo dos trabalhadores da iniciativa privada. De acordo com a autora, a aposentadoria dos servidores estatutários pode ter duas naturezas:                              

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Dependendo do regime adotado, a aposentadoria do servidor público, pode, em tese, apresentar-se como direito de natureza previdenciária, dependente de contribuição, ou como direito vinculado ao exercício do cargo público, financiado inteiramente pelo Poder Público, sem contribuição do servidor.

O Supremo Tribunal Federal, na ADI 2.010-2 DF, caracterizou o regime contributivo de previdência como essencialmente retributivo, em virtude, da interdependência entre o custeio e o benefício, assegurando, dessa forma, o equilíbrio atuarial. Sendo assim, diante do vínculo existente entre contribuição e benefício, não haverá contribuição sem benefício, tampouco benefício sem contribuição. Portanto, o servidor que é obrigado a contribuir deverá ter assegurado o direito aos benefícios.

Aliás, as contribuições previdenciárias, segundo Hugo de Brito Machado (2008, p. 66), recolhidas pelos servidores públicos tem por finalidade garantir a prestação dos benefícios previdenciários por parte do Estado. Nota-se, portanto, que as contribuições previdenciárias têm uma destinação específica: a de custear e financiar o regime próprio dos servidores públicos. Dessa forma, as contribuições previdenciárias classificam-se com espécies de tributo vinculado, razão pela qual, é atribuído ao Poder Público a prestação dos benefícios que o segurado tem direito.

Hugo de Brito Machado (2008, p.64) traz o seguinte ensinamento acerca das contribuições da seguridade social: "As contribuições de seguridade social caracterizam também pela vinculação à finalidade dos recursos que geram. Por isto mesmo integram a receita da entidade paraestatal responsável pelas ações relativas à seguridade social."

Diante desta destinação específica atribuída as contribuições previdenciárias, observa-se que a relação jurídico-tributária é totalmente independente da relação funcional que o servidor tem com a Administração Pública. Ao realizar o recolhimento das contribuições previdenciárias o servidor fica vinculado apenas aos órgãos responsáveis pela concessão do benefício, da mesma forma que ocorre com os trabalhadores da iniciativa privada, que estão vinculados ao INSS.  Assim sendo, esta relação jurídico-tributária não pode ser invalidada através de processo administrativo, até porque, em razão do regime contributivo, o que ocorre no ambiente do trabalho não pode gerar qualquer efeito no sistema previdenciário.


4 A PENALIDADE DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS

4.1 CONCEITO

A cassação de aposentadoria é modalidade de sanção imposta ao servidor aposentado que cometeu durante o exercício de suas atribuições falta punível com demissão. Assim, será penalizado com a pena de cassação de aposentadoria o servidor que, na execução de suas atividades, tiver praticado ato ilícito, que tenha como medida disciplinar a decretação da pena de demissão.

No entendimento do professor José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 687) a cassação de aposentadoria:                                     

Cuida-se de penalidade por falta gravíssima praticada pelo servidor quando ainda em atividade. Se essa falta fosse suscetível, por exemplo, de pena de demissão, o servidor não faria jus à aposentadoria, de modo que, tendo cometido a falta e obtido a aposentadoria, deve esta ser cassada. Trata-se, por conseguinte, de penalidade funcional, ainda que aplicada a servidor inativo.

Desta forma, ao ser analisada falta disciplinar do servidor inativo praticada durante o exercício de suas atribuições, que enseje a aplicação da pena de demissão, o inativo perderá o direito ao benefício da aposentadoria. 

Para Hely Lopes Meirelles (2010, p. 485), a pena de cassação de aposentadoria é sanção disciplinar semelhante à pena de demissão, tendo em vista, que o servidor não mais integrará o quadro dos aposentados, razão pela qual, haverá, após a realização do procedimento administrativo disciplinar, em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, a imediata interrupção do recebimento do benefício da aposentadoria pelo servidor inativo.

A penalidade de cassação de aposentadoria do servidor estatutário está prevista nos arts. 127, IV, e 134 da Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, nos seguintes termos.

Art. 127.  São penalidades disciplinares:

IV - cassação de aposentadoria ou disponibilidade.

Art. 134.  Será cassada a aposentadoria ou a disponibilidade do inativo que houver praticado, na atividade, falta punível com a demissão.

Segundo esses dispositivos, a Administração Pública ao constatar a prática de falta punível com demissão deverá aplicar a penalidade de cassação da aposentadoria. Trata-se de ato vinculado, que não comporta análise de conveniência ou oportunidade.

As faltas que geram a aplicação da pena de demissão estão elencadas, em rol taxativo, no art. 132 da Lei nº 8.112/90, que traz a seguinte redação:

Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:

I - crime contra a administração pública;

II - abandono de cargo;

III - inassiduidade habitual;

IV - improbidade administrativa;

V - incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição;

VI - insubordinação grave em serviço;

VII - ofensa física, em serviço, a servidor ou a particular, salvo em legítima defesa própria ou de outrem;

VIII - aplicação irregular de dinheiros públicos;

IX - revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo;

X - lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional;

XI - corrupção;

XII - acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas;

XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117.                                        

A pena de cassação de aposentadoria foi instituída pela nº 8.112/90, e, portanto, antes da edição das emendas constitucionais nº 03/93 e nº 20/98, ou seja, quando o benefício previdenciário da aposentadoria dos servidores estatutários ainda tinha natureza de gratificação. Entretanto, com as mudanças ocasionadas pelas referidas emendas, a previdência social dos servidores públicos passou a ter natureza contributiva, estabelecendo que não haverá benefício sem contribuição, e, da mesma forma, não haverá contribuição sem benefício.               

4.2 PROCEDIMENTO DE CASSAÇÃO DA APOSENTADORIA DOS SERVIDORES COMUNS

Tendo em vista que a imposição da penalidade implicará no desfazimento de um ato administrativo que acarretará lesão aos interesses do servidor, é necessário a realização de um procedimento administrativo, em que sejam observados os princípios do contraditório e da ampla defesa. E ao final, se restarem comprovadas a prática de infrações que determinam a aplicação da penalidade de demissão, o servidor inativo terá a sua aposentadoria cassada.

O procedimento administrativo disciplinar é o mecanismo legal, apto a investigar as faltas cometidas pelo servidor público praticadas no exercício de suas funções públicas, ou que tenham algum vínculo com as atribuições de seu cargo.

O procedimento, no âmbito da União, será o mesmo realizado para a aplicação da penalidade de demissão ao servidor público, tendo em vista que são sanções disciplinares equivalentes, se destingindo apenas pelo fato de que a pena de cassação de aposentadoria será aplicada ao servidor inativo, enquanto que a demissão será aplicada ao servidor que está no exercício de suas funções.

Permanece ainda com a Administração Pública o poder de analisar a responsabilidade do servidor que tenha sido removido, redistribuído, que esteja ocupando outro cargo, que esteja aposentado ou posto em disponibilidade. Tal motivo tem como justificativa a manutenção do poder-dever que a Administração tem de investigar as infrações cometidas por seus servidores.

A respeito do assunto, consta na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o seguinte julgado:

Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO, MINISTRO DOS TRANSPORTES. EX-SERVIDORES DO DNER. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. APURAÇÃO DAS IRREGULARIDADES POSSIVELMENTE COMETIDAS QUANDO NO EXERCÍCIO DAS RESPECTIVAS FUNÇÕES. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DO ALEGADO DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Não se vislumbra o alegado direito líquido e certo, considerando que a Administração está, no exercício de seu direito, apurando as possíveis irregularidades dos impetrantes, quando no exercício de suas funções. Ordem Denegada (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. MS nº 9.497. Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca, Data do Julgamento: 10.03.2004, 3ª seção, Data da Publicação: 18.10.2004).

Dessa forma, mesmo que se trate de ex-servidor, ainda é possível a instauração de procedimento administrativo disciplinar que tenha por finalidade apurar infrações praticadas durante o exercício das funções públicas. A Lei nº 8.112/90, traz essa previsão no art. 134, quando dispõe sobre a penalidade de cassação de aposentadoria do servidor estatutário.

Em razão do princípio da autotutela administrativa, a Administração Pública pode efetuar a cassação da aposentadoria sem ter necessidade de obter aquiescência do Poder Judiciário. Este princípio encontra fundamento no poder-dever que tem a Administração Pública de efetuar o controle de seus próprios atos. A autotutela está diretamente relacionada ao princípio da legalidade administrativa, que estabelece que a atuação da Administração deve estar prevista em lei, e que os atos administrativos ilegais devem ser expurgados do ordenamento jurídico.

É neste sentido o entendimento de José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 31):

A Administração Pública comete equívocos no exercício de sua atividade, o que não é nenhum pouco estranhável em vista das múltiplas tarefas ao seu cargo. Defrontando-se com esses erros, no entanto, pode ela mesmo revê-los para restaurar a situação de regularidade. Não se trata apenas de uma faculdade, mas também de um dever, pois que não se pode admitir que, diante de situações irregulares, permaneça inerte e desinteressada. Na verdade só restaurando a situação de regularidade é que a Administração observa o princípio da legalidade, do qual a autotutela é um dos mais importantes corolários. (grifo do autor)                                            

 Este princípio confere, portanto, à Administração Pública o poder-dever de controlar seus próprios atos, revendo-os ou anulando-os quando estes apresentem erros ou vícios. Além de estar previsto de forma expressa no art. 53 da Lei nº 9.784/99, o princípio da autotutela também foi sumulado pelo Supremo Tribunal Federal e está consagrado na Súmula nº 473:  

A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.                                                                   

Entretanto, em virtude do princípio da segurança jurídica, a Administração não irá desfrutar do poder da autotutela para sempre. O princípio da segurança jurídica tem por finalidade garantir o progresso das relações sociais, trazendo a segurança e a estabilidade que os atos jurídicos exigem.

Assim, essa prerrogativa da Administração de desconstituir o ato que concedeu a aposentadoria do servidor, deverá ser efetuada dentro do prazo prescricional de cinco anos, que serão contados a partir da data em que o fato chegou ao conhecimento da Administração Pública. Caso contrário, de acordo com o art. 142 da Lei nº 8.112/90, o direito de aplicar a punição estará prescrito.                           

4.3 PROCEDIMENTO DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA DOS SERVIDORES OCUPANTES DE CARGOS VITALÍCIOS

Os cargos de provimento vitalícios são aqueles que proporcionam aos seus titulares a maior segurança de manter-se no cargo. O vínculo estabelecido com o Poder Público só se extingue, em regra, através de processo judicial. Assim, não será permitido que seja aplicada a penalidade de demissão através de um procedimento administrativo a um detentor de cargo vitalício, salvo no caso de o servidor ainda não ter cumprido o prazo de dois anos determinantes para a aquisição da vitaliciedade no caso do início da carreira da magistratura e do ministério público.

De acordo com os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 138):                                                    

Os cargos de provimento vitalício são, tal como os efetivos, predispostos à retenção dos ocupantes, mais sua vocação para retê-los é ainda maior. Os que neles hajam sido prepostos, uma vez vitaliciados, só podem ser desligados mediante processo judicial.                  

A Constituição Federal consagra como cargos vitalícios os dos magistrados, em seu art. 95, I, os membros do Ministério Público, no art. 128, § 5º, I, "a", e dos Ministros dos Tribunais de Contas, em seu art. 73, § 3º.

Tais garantias têm por objetivo assegurar a independência da atuação desses servidores, para que possam exercer suas atividades de forma imparcial, não se sujeitando à vontade dos outros poderes, muito menos de um grupo de pessoas.

Nesses termos é o posicionamento de Pedro Lenza (2010, p. 569):          

As garantias atribuídas ao Judiciário assumem importantíssimo papel no cenário da tripartição de Poderes, assegurando a independência do Judiciário, que poderá decidir livremente, sem se abalar com qualquer tipo de pressão que venha dos outros Poderes.

A vitaliciedade, para os magistrados, será adquirida no primeiro grau de jurisdição após o cumprimento do estágio probatório, que terá um prazo de dois anos. A forma de aquisição da vitaliciedade pelos membros do Ministério Público segue o mesmo raciocínio dos membros do Poder Judiciário, assim, após dois anos de efetivo exercício das atividades funcionais e a aprovação em estágio probatório, o membro do Ministério Público adquirirá a garantia constitucional da vitaliciedade.

A pena de cassação de aposentadoria extingue o vínculo do servidor com a Administração, tendo em vista que é equivalente a pena de demissão, gerando a perda do cargo. Os servidores comuns tem a cassação da aposentadoria determinada através de um procedimento administrativo. No entanto, por força da vitaliciedade, os magistrados, membros do Ministério Público e os Ministros dos Tribunais de Contas só perderam o seu cargo por sentença judicial transitada em julgado.

Os magistrados, que gozam do benefício da vitaliciedade, por não poderão perder o cargo de forma administrativa, em caso de cometimento de falta grave, serão aposentados compulsoriamente, conforme dispõe o art. 56 da Lei Complementar nº 35/79.                                          

Art. 56 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, do magistrado:

I - manifestadamente negligente no cumprimento dos deveres do cargo;

Il - de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções;

III - de escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou cujo proceder funcional seja incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário.                                                  

Além do mais, a sanção disciplinar de cassação de aposentadoria não se encontra prevista dentre as penalidades elencadas na Lei Orgânica da Magistratura, pois diferente dos titulares de cargos de provimento efetivo, a prática de infrações de natureza grave não gera a demissão dos detentores de cargos vitalícios. Diante destas infrações será aplicada a pena disciplinar de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.

Entretanto, quando for determinado a perda do cargo, através de sentença transitada em julgado, poderão os titulares de cargos vitalícios serem penalizados com a sanção de cassação de aposentadoria.

Foi exatamente o que aconteceu recentemente com o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, que após ter sofrido condenação criminal transitada em julgado, pelo crime de lavagem de dinheiro, teve decretado a perda do cargo. Com o trânsito em julgado da sentença que determinou a perda do cargo do magistrado, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região cassou a aposentadoria do ex-juiz mediante realização de procedimento administrativo de caráter sigiloso.  

Para que seja aplicada a penalidade de cassação de aposentadoria, no entanto, é necessário que tal medida seja determinada por decisão judicial transitada em julgado, antes disso, os magistrados, Membros do Ministério Público e os Ministros dos tribunais de Contas continuarão percebendo o benefício previdenciário.               

4.4 OS EFEITOS DA PENA DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA

Segundo o entendimento de José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 688), a pena de cassação tem duas consequências: a cessação do recebimento do benefício previdenciário, pois torna inválido o ato de concessão da aposentadoria e a aplicação de pena semelhante à de demissão. Dessa forma, o servidor não receberá nenhuma contrapartida das contribuições que recolheu, pois não receberá o benefício.

A Constituição Federal, pelo contrário, prevê no § 9º, do art. 201 o instituto da contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública ou na atividade privada, seja na área urbana ou rural. Assim, ao trabalhador será concedido o benefício da aposentadoria mediante a soma do tempo de contribuição dos regimes previdenciários. O servidor que tenha exercido atividade no setor privado e no serviço público, sem que tenha cumprido todos os requisitos para se aposentar por apenas um regime, poderá realizar a compensação financeira entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes de previdência dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Tamires Paulino Cesar. A inconstitucionalidade da pena de cassação de aposentadoria dos servidores públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4745, 28 jun. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35130. Acesso em: 27 dez. 2024.

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