INCENTIVOS FISCAIS AMBIENTAIS NA POLÍTICA TRIBUTÁRIA DO AMAZONAS.
Como já foi ressaltado nos tópicos anteriores, o Estado do Amazonas tem relegado a uma posição secundária a questão ambiental na sua política tributária. A constatação disso está no § 2º do artigo 4º da PIF/AM, o qual dispõe a obrigatoriedade das empresas em apenas contribuir para a substituição de importações nacionais e/ou estrangeiras, e a geração de empregos diretos e indiretos no Estado. Uma análise superficial dessas condições é suficiente para concluir-se que, após a instalação das empresas no PIM, não há nenhum encargo ambiental extraordinário que justifique a fruição dos incentivos aqui concedidos. Primeiro, porque a contratação de mão-de-obra é uma necessidade em qualquer lugar em que se instalem, e a substituição de matérias-primas importadas por insumos locais acaba sendo verdadeiro fator de redução de custos.
O que se pretende com este trabalho é apontar a necessidade de consciência ambiental nas empresas aqui instaladas e naquelas que pretenderem aqui se estabelecer. Para isso será importante a criação de encargos ambientais que sejam compatíveis com os investimentos aqui realizados. Encargos dessa natureza precisam ser considerados obrigatórios, assim como aqueles citados no parágrafo anterior.
A proposta não visa a retirar a competitividade das empresas, o que desestimularia a atividade industrial. Por outro giro, não é aceitável que o PIM permaneça contribuindo apenas reflexamente para a preservação e restauração do meio ambiente. Acrescentar mais obrigações no momento de instalação da empresa representaria um custo adicional inviável, entretanto, após o período de recuperação do capital investido, é razoável que as empresas integrem o programa ambiental do Estado. Há aqueles que entendem que já existe essa obrigação no § 1º do artigo 5º da PIF/AM, o qual preceitua o que segue:
“É condição para a SEPLAN apreciar o projeto técnico-econômico, que a empresa interessada tenha protocolado pedido de licença prévia ao órgão responsável pela política estadual da prevenção e controle da poluição, melhoria e recuperação do meio ambiente e da proteção aos recursos naturais, tendo em vista a observância dos aspectos relativos à conservação ambiental, ficando, em caso de aprovação do projeto pelo CODAM, a emissão do Decreto Concessivo vinculado à emissão da respectiva autorização”.
Mas a realidade demonstra que essas ações são muito pontuais, restringindo-se ao ambiente interno da empresa. Em 23/10/2012 foi apresentada em conjunto pela SUFRAMA e o IPAAM (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) a nova Lei do Licenciamento Ambiental do Estado do Amazonas, Lei Estadual nº 3.785, de 24/07/12. Por esta lei, as empresas do PIM com certificação ambiental ISO 14.000 passaram a ter suas licenças ambientais renovadas automaticamente, e as entidades que tenham atividades voltadas para reciclagem de resíduos ficaram isentas do pagamento da taxa de licenciamento ambiental estadual.
O foco principal da modificação legislativa foi a questão da competência, simplificação e informatização dos procedimentos no licenciamento ambiental das indústrias do PIM. O setor industrial é responsável por 67% do total de licenças emitidas pelo Ipaam de janeiro a setembro, repetindo a performance de anos anteriores, sempre nesta faixa de 60 a 70% de demandas.
Uma das principais novidades do licenciamento ambiental das empresas é a adoção da Licença Ambiental Única (LAU), prevista nos artigos 4º e 15 desta lei. A LAU consiste em juntar os três tipos de licença – Prévia (LP), Instalação (LI) e Operacional (LO) – em uma única licença. Essa modalidade só é válida para as atividades de pequeno impacto ambiental, classificadas no normativo, com vistas a proporcionar desburocratização e redução de gastos ao empreendedor e redução de custos ao gestor público, bem como maior produtividade e celeridade na análise e emissão das licenças ambientais.
Uma série de atividades estão dispensadas de licenciamento ambiental, o que pode beneficiar as indústrias diretamente ou indiretamente por meio de seus prestadores de serviços. Obras ou reformas de empreendimentos já licenciados com a finalidade de melhoria da aparência, aumento da capacidade de armazenamento de matérias primas e produtos, por exemplo, não precisam mais de licença ambiental, embora devam consultar o órgão ambiental para receberem o documento de inexigibilidade de licenciamento.Tratadas as inovações em matéria de licenciamento ambiental, percebe-se que o novel dispositivo tem caráter puramente instrumental, sobrepujando a questão de fundo, ou seja, não contemplou políticas ambientais de promoção da integração das empresas com a política de preservação e recuperação do meio ambiente de forma ampla.
Após todas as digressões acima, é chegado o momento de se avaliar a situação ambiental do Estado do Amazonas e de sua capital, Manaus. Serão apresentados dados fáticos recentes que justificam a preocupação e necessidade de ação do Governo e da sociedade.
A QUESTÃO AMBIENTAL DO AMAZONAS E DA CIDADE DE MANAUS
O Governo Federal anunciou redução de 18% das taxas de desmatamento na Amazônia Legal entre agosto de 2013 e julho deste ano. A Amazônia Legal é uma área que engloba nove Estados brasileiros pertencentes à Bacia Amazônica. Esse fato foi anunciado pela Ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, que comemorou o fato de o índice ser o segundo menor desde 1988, quando se iniciaram os levantamentos com dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal (PRODES). Entretanto não há motivos para festejar conforme as palavras de Paulo Adário, estrategista sênior de florestas do Greenpeace, nesta mesma matéria veiculada pela BBC, Conforme notícia de Mariana Della Barba e Rafael Barifouse da BBC Brasil em São Paulo na data de 26/11/2014:
“É uma boa notícia, especialmente diante dos dados de 2013, quando houve um aumento de 29% em relação a 2012. Mas não comemoramos desmatamento. É preciso ter em mente que foram desmatados 4.848 km² (mais de três vezes o tamanho da cidade de São Paulo), são milhões de árvores”.
Os municípios amazonenses que apresentam maior degradação florestal são Lábrea, Boca do Acre e Apuí, nesta ordem, em função da atividade pecuária. A cidade de Manaus aparece na oitava posição de desmatamento, devido ao crescimento desordenado da população, conforme dados do PRODES em “Desflorestamento nos Municípios da Amazônia Legal para o ano de 2013”.
Em relação à cidade de Manaus já se falou dos efeitos negativos que ocorreram em virtude do movimento migratório provocado pela ZFM. Além do que foi exposto, verifica-se que o impacto ambiente também se faz presente. A cidade tem regiões secas que concentram ilhas de calor, em que a temperatura hoje é bastante superior a de áreas vizinhas, conforme revelaestudo realizado pelos pesquisadores Francis Wagner Silva Correia e Rodrigo Augusto Ferreira de Souza, ambos doutores em Meteorologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e professores do curso de Meteorologia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
As variações chegam a 3ºC. O fato de a cidade ter crescido significativamente nas últimas décadas, sem planejamento urbano adequado, em um processo fortemente marcado pelo desmatamento urbano, está diretamente relacionado a estas mudanças. Todas as críticas que aqui são feitas não podem deixar de se acompanhar de sugestões construtivas, sob pena de se esvaziar a discussão. Não basta apontar o erro, é preciso haver uma abordagem integral do sistema visando a sua melhoria. Com esse pensamento serão apresentadas algumas possibilidades para a demanda ambiental do PIM exemplificativamente.
PROPOSTAS AMBIENTAIS PARA INSTALAÇÃO DE EMPRESAS NO PIM
Antes de iniciar este tópico, dois fatores não podem ser relegados a um plano de importância secundária. Primeiro que as indústrias instaladas no PIM não podem perder em competitividade, caso contrário, estarão condenadas à falência. Segundo, que a questão ambiental não pode mais ficar adstrita aos muros das fábricas, pois, como já foi tratado neste trabalho, o meio ambiente é amplo e ultrapassa fronteiras geográficas e políticas. É sabido que a fase pré-operacional de qualquer empreendimento implica elevados custos de instalação, cujo retorno dependerá muito do tipo empresarial e do produto no mercado.
Então haverá empresas que em curto espaço de tempo recuperarão o capital investido e começarão a gerar lucros; outras demandarão médio ou longo prazo para resposta. Quem pode aferir isso com precisão são os técnicos e economistas que elaboram os projetos de viabilidade econômica e técnica, pré-requisito para a concessão de incentivos. O que se pretende é vincular as empresas com a política ambiental do Estado do Amazonas após o período pré-operacional e de recuperação do capital aqui investido. As empresas precisam assumir um maior compromisso com a preservação e recuperação ambiental tanto no âmbito da ZFM, quanto em termos estaduais.
Após as breves palavras acima, conclui-se que as empresas instaladas no PIM devem também compartilhar a responsabilidade pelos efeitos negativos provocados pela industrialização na cidade e no Estado. Não é razoável a externalização dos prejuízos e internalização dos lucros, pensamento que se revela egoísta e dessintonizado com a nova ordem ambiental.
Neste momento é oportuna a conceituação da tributação com efeitos extrafiscais, haja vista que será o cerne da apresentação pretendida. A extrafiscalidade é o efeito esperado pela tributação na indução de comportamentos sociais. Diferentemente da fiscalidade que busca primeiramente a arrecadação de recursos para a Administração Pública, a extrafiscalidade é técnica administrativa que visa a estimular condutas politicamente corretas, ou desestimular ações consideradas nocivas pelos gestores públicos, mas sempre com nítida finalidade pública.
Como medida de desestímulo cita-se o inciso I do § 4º do artigo 153 da CF/1988 que dispõe sobre a progressividade do Imposto Territorial Rural (ITR) para desestimular a manutenção de propriedades improdutivas. Por outro giro, a Lei Federal nº 9.393/1996, instituidora do ITR, traz em seu bojo medidas de estímulo ao comportamento de preservação ambiental quando exclui da área tributável do imóvel (base de cálculo do imposto) as áreas de: a) preservação permanente e de reserva legal, b) de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declaradas mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, c) sob regime de servidão ambiental, e d) cobertas por florestas nativas, primárias ou secundárias em estágio médio ou avançado de regeneração.
Os exemplos acima demonstram que a política tributária tem o condão de induzir comportamentos ou desestimulá-los em proveito da sociedade. Essa concepção torna plena a possibilidade de a extrafiscalidade induzir comportamentos ambientalmente corretos ou desestimular a agressão ao meio ambiente. Não se trata de novidade no mundo jurídico, pois outros autores já abordaram a problemática. Cita-se Pozzetti (2012, p. 281), por quem:
“a tributação é um instrumento privilegiado de incitação à preservação ambiental, prevenção, recuperação, combate à poluição, meio eficaz para a arrecadação de recursos destinados ao custeio, incentivam comportamentos preservadores do meio ambiente e combate aos poluidores”.
Existem empresas de todos os tamanhos instaladas no PIM, de sorte que cada qual poderia assumir responsabilidades conforme a sua capacidade financeira. Essa referência nos remete ao Princípio da Igualdade Material, que pode ser perfeitamente ajustado ao Direito Ambiental. O que se pretende atingir é a saída do campo filosófico e alcançar o nível da concretização das pretensões.
Por exemplo, a Honda, empresa de grande porte instalada no PIM integrante do Grupo Honda Motor Company com matriz no Japão, aponta no seu endereço eletrônico na rede mundial de computadores em “Política Ambiental” entre outros itens o fato de reconhecerem os impactos ambientais causados pelas atividades de Galvanoplastia, Fundição, Usinagem e Pinturas, e assim adotam controles operacionais para cada aspecto ambiental significativo de suas atividades, produtos e serviços, monitorando-os e gerenciando-os adequadamente.
O reconhecimento do impacto ambiental pela Honda é importante, mas é preciso ir além com ações contundentes em matéria ambiental. Pode-se até falar em regionalização da proteção ambiental com incremento do crédito estímulo do ICMS. Isso não seria novidade, haja vista que esse mecanismo já existe na própria PIF/AM. Basta a leitura da Seção VI da Lei de Incentivos Estaduais para se perceber que o conceito de adicionais de crédito estímulo já se encontra bastante desenvolvido e está ligado visceralmente à produção de mão-de-obra no Estado.
Como é da política de incentivos fiscais a concessão desse benefício, tendo como contrapartida a geração de postos de trabalho, então é possível a adaptação desse conceito de regionalização em atividades ambientais. Principalmente para as empresas que não conseguem transferir tecnologia para o PIM, mas que investiriam em outras atividades que lhes propiciassem um maior nível de crédito estímulo.
E quais atividades seriam essas? Onde se concentrariam? Como já indicado nesse artigo, o PIM não trouxe apenas benefícios; também convivemos com efeitos indesejados provocados pela concentração de fábricas em Manaus. Um deles é a escassez de atividades econômicas no interior do Estado, o que provoca o despovoamento de várias cidades. Pensando nisso, as empresas que pretendam maiores níveis de crédito estímulo deveriam ser incentivadas a desenvolver projetos rurais adaptados à Região Amazônica e que visem ao abastecimento do mercado regional, mormente a capital Manaus, sem degradar o ecossistema. É uma forma de promover a circulação de riquezas dentro do Estado para equilibrar a balança comercial do Amazonas.
Outra iniciativa louvável é o estímulo às atividades de ensino e pesquisa no campo da preservação e recuperação do meio ambiente. Muito recentemente foi divulgado pela mídia nacional que a preservação da Floresta Amazônica tem ligação direta com a estiagem prolongada nos Estados da Região Sudeste do Brasil, segundo a revista Veja em “Ciência”, acervo digital de 31/10/2014:
“Uma nova pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) relaciona a seca que atinge o Sudeste, especialmente São Paulo, com o desmatamento da Amazônia. Realizada pelo biogeoquímico Antônio Nobre, a revisão de literatura sobre o assunto mostra que a redução da quantidade de árvores no local afeta os "rios aéreos" de vapor, responsáveis pelo transporte da água que cai com as chuvas nas regiões brasileiras mais distantes. De acordo com o relatório, intitulado O Futuro Climático da Amazônia, esta é “a razão de a porção meridional da América do Sul, a leste dos Andes, não ser desértica, como nas áreas de mesma latitude a oeste e em outros continentes”.
A criação de postos de trabalho nas instituições de ensino e pesquisa também pode ser alvo da política de regionalização de créditos do ICMS. Atividades de reflorestamento e florestamento de áreas degradadas e sem cobertura natural, descontaminação de mananciais hídricos, ocupação de áreas de fronteiras agropecuárias que devastam o meio ambiente, como forma de impedir do avanço da agroindústria, arborização das cidades etc. São tantas as medidas de caráter ambiental que não se pode mais conviver com a antiga proposta de atração de investimentos baseado apenas em exploração econômica sustentável da floresta. Não dá para fechar os olhos diante de tão grande potencial que está na ZFM.