Quis custodiet ipsos custodes? Já preocupante aos olhos de Juvenal, a questão que hoje chamamos de ‘accountability’ permeia todo e qualquer regime de caráter democrático, entendendo-se aqui por democracia um sistema de governo adotado numa comunidade jurídica que possua uma constituição que, através de seus dispositivos como Lei Maior na sociedade, tenha em conta o povo como titular do poder político. Em outras palavras, refiro-me aqui a todos os governos aonde o cidadão pode não apenas eleger um representante, mas também clamar por um bom governo ao longo de seu mandato e findar este último se assim for a vontade da maioria, ou seja, iniciar um processo de impeachment.
Cabe ressaltar ainda neste primeiro momento que, independentemente do prisma jurídico sobre um eventual processo de impeachment, o povo, na condição de titular do poder, não apenas pode, mas também deve fiscalizar e acompanhar o mandato dos governantes. Levando em consideração a titularidade do poder político, a saber, do povo na sociedade brasileira, conforme prevê nossa Constituição de 1988, a vontade da sociedade deve sobressair em relação à ótica jurídica quando se trata de escolher quem irá representar o poder.
Não pretendo aqui rejeitar interpretações de cunho jurídico, lastreadas e embasadas em nosso ordenamento, e sim demonstrar que no caso de um processo de impeachment, o povo, em sua condição de titular do poder político, é hábil e capaz para decidir se deve ou não ser levado a cabo o mandato de um ou outro governante. Atribuo tais capacidades aos cidadãos pelo simples fato de termos em conta num regime democrático a pressuposição de que todos estão devidamente aptos para eleger seus representantes. Se o supracitado é válido, o inverso também o é, ou seja, aquele que possui a capacidade para eleger uma determinada pessoa para representá-lo, é capaz também de, quando suspeita ou comprovada má gestão administrativa, tirá-lo da condição de representante. Ainda digo aqui que a vontade do povo independe de qualquer suspeita de improbidade, mas geralmente quando ocorrem tais suspeitas é que a vontade popular se exalta.
Dito isso, a questão cabível aqui é: como o povo deve agir para fazer valer a sua vontade, já que esta é a que vale em se tratando de política. A resposta aqui poderia ir e vir para diversos dispositivos legais, mas creio desnecessárias as referências e considerarei como primordial o que dispõe, conforme alusão anteriormente feita, o Parágrafo Único do Artigo 1º de nossa Constituição. Ora, se o povo age através de seus representantes, e estes são os responsáveis pela abertura de um processo de impeachment, faz-se necessária a comunicação entre representantes e representados, para que aqueles saibam a vontade destes nos mais diversos momentos de sua candidatura.
Consideremos duas possibilidades. Com o advento da internet, podemos muito bem exigir a abertura do processo de impeachment através de um abaixo-assinado online aonde conste o nome do cidadão e o seu número no Cadastro de Pessoas Físicas no Ministério da Fazenda. Com isto, a comunicação é facilitada e célere, adiantando a saída do indesejado aos olhos dos representados. A coleta de assinatura ‘in loco’ também é uma alternativa, mas considerando a possibilidade anteriormente exposta não vejo um porquê de coletar inúmeras assinaturas ao redor de todo o país.
Num segundo momento, a alternativa é a ida do povo às ruas. Através das manifestações populares, os representantes, dotados do mais natural bom-senso, entenderão que deve ser aberto um processo para a retirada do chefe do executivo. Falo das manifestações porque a eficácia destes movimentos mostrou-se válida não apenas no Brasil, mas também em outros países e em tempos mais remotos.
Conforme o exposto, cabe agora ao povo brasileiro tomar as rédeas da situação e exigir, seja por meio de manifestações populares ou por meio de um abaixo-assinado, aquilo que prevalece como a vontade da maioria votante.
Por fim, destaco aqui mais uma vez o fato de que o povo, na sua condição de titular do poder político na sociedade brasileira, tem não apenas o poder, mas também o dever de fazer valer a sua vontade e fazer com que os representantes ajam de forma ilibada independente de qualquer dispositivo jurídico. É a vontade do povo brasileiro. É a vontade do Brasil.