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O transporte de PCEs realizado por agentes previstos no art. 144 da Constituição Federal.

Requisitos legais garantidores da legalidade do ato

Agenda 03/08/2015 às 13:53

Tenho visto com frequência policiais apreendendo, executando mandado judicial de Busca e Apreensão, recolhendo e transportando PCEs sem GTs. A imensa maioria dos policias NEM SEQUER sabem do que se trata este documento.

Armas, munições, explosivos e diversos equipamentos e produtos são PCE1s (produtos sujeitos a controle especial), que só podem ser transportados EM QUALQUER PARCELA DO TERRITÓRIO NACIONAL mediante o acompanhamento de Guia de Tráfego, então na quase totalidade das vezes está se sendo cometido crime de porte ilegal, seja do art. 14, ou do art. 16 do Estatuto do Desarmamento, então a condução destes PCEs está se fazendo pela força DAS ARMAS do agente, não pela força da lei. E temos uma Constituição Federal justamente para que isto jamais ocorra.

A Legislação pertinente

No Brasil, por força da redação do Estatuto do Desarmamento, o porte de armas é proibido em todo o território nacional, salvo os casos previstos em lei, e para os listados nos diversos incisos do Art. 6o. Os policiais que estão isentos da proibição ao porte de armas estão listados no Inc. II, que nos remete ao art. 144 da Polícia Federal. Perceba-se que a Força Nacional de Segurança não se encontra na lista. Exatamente. A Força Nacional foi criada por força de Decreto Presidencial, não é uma polícia constitucional, e não tem direito legal de porte de armas previsto em lei. Em outro artigo prometo analisar a fundo o decreto que cria a FNS, existem outras inconstitucionalidades e ilegalidades naquela peça legal.

A lei se refere a estes agentes como NÃO PROIBIDOS a portar sua arma de fogo, mas estes se submetem aos requisitos de suas respectivas corporações. A questão do porte da arma de fogo de propriedade do próprio pessoal não é claramente definida em lei, o art. 35 do Dec. 5.123/04 deixa a questão em aberto para ser regulamentada pela própria corporação (parágrafo primeiro), por este motivo existem divergências quanto às restrições impostas em alguns estados, onde leis locais buscam impedir que o policial porte a sua arma pessoal durante o expediente, ou fora deste. Pessoalmente, acredito que a arma de fogo na mão de um profissional treinado é questão de segurança pública, então não devem ser impostas tais restrições.

Quando o policial está portando uma arma particular de acervo de CAC2, o seu porte é legal NÃO DEVIDO À SUA CONDIÇÃO DE POLICIAL (Inc. II do Art. 6o), mas devido à seu status de CAC (Inc. IX). O Direito é o mesmo, mas as condições são outras, os requisitos legais são outros. Neste caso, não existe sujeição às regras da corporação, mas sim às regras dos arts. 8o, 9o e 24o do Estatuto do Desarmamento, e arts. 30 a 32 do Decreto 5.123/04, cominado com o disposto no R-1053. Em resumo, a arma tem que ser do acervo de ATIRADOR, e estar acompanhada de GT4 válida e correspondente ao local.

Uma curiosidade: Não existe nenhuma vedação ao "Open Carry", ou porte ostensivo por CACs. Então o policial pode portar ostensivamente sua arma do acervo de tiro. Os CACs não o farão, pois por respeito e hábito estes portam suas armas de forma velada (Concealed Carry).

Veja bem, tudo acima diz respeito ao direito de PORTAR arma de fogo, seja a arma acautelada da corporação, seja a arma de propriedade do policial.

Situação totalmente diferente é a de se TRANSPORTAR armas, o que ocorre nos diversos casos de apreensão de PCEs.

As forças policiais são AUXILIARES do Exército Brasileiro no controle de armas e munições, conforme o disposto no art. 22, Inc. I do R-105, exatamente da mesma forma que um Clube de Tiro, uma Federação ou Confederação (Inc. V do mesmo artigo). Da mesma forma como qualquer ente jurídico, as corporações policiais estão obrigadas ao cumprimento da lei, e em se tratando de PCEs, tratam-se de produtos sujeitos ao controle segundo os termos do R-105. E o R-105 determina em seu art. 165 o seguinte:

Art. 165. Os produtos controlados sujeitos à fiscalização do tráfego só poderão trafegar no interior do país depois de obtida a permissão das autoridades de fiscalização do Exército, por intermédio de documento de âmbito nacional, denominado GT, Anexo XXIX.

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Assim, apenas para citar um exemplo, um cidadão que teve sua arma de TIRO, caça ou coleção apreendida judicialmente, só poderá retirá-la mediante a apresentação de GTE. Não existe nenhuma outra forma admitida em lei para o tráfego de PCEs em território nacional.

Quando uma fábrica envia armas ou munições para os seus clientes, MESMO QUANDO O CLIENTE É O PRÓPRIO EXÉRCITO, os produtos só podem sair acompanhados da respectiva GTE. Da mesma forma os atletas transitam com GTEs, e até mesmo as entidades desportivas não podem em hipótese alguma deslocar PCEs sem a GT ou GTE – para esta regra NÃO EXISTEM EXCEÇÕES.

Do tipo penal

Os crimes de porte de arma de fogo se configuram nas seguintes condições:

Oras, a lei fala genericamente em “autorização”. Mas a autorização se materializa de diversas maneiras.

→ Para o cidadão comum, a quem o porte de armas é PROIBIDO, a autorização se configura em um documento de Porte de Arma, art. 10 ou 16 do Estatuto do Desarmamento;

→ Para um CAC, única categoria de civis a quem o porte de armas não é proibido, a autorização (licença, no caso) se configura através da GTE (art. 6o, Inc IX, art. 8o, art.9o e 24 do Estatuto do Desarmamento, Arts. 30 a 32 do Dec. 5.123/04, mais o disposto no R-105);

Quando se trata de cumprimento de uma ordem judicial de Busca e Apreensão, a autorização é judicial. Quando se trata de prisão em flagrante por crime praticado com o PCE, a autorização é intrínseca à própria atividade policial.

O mandamento do art. 301 do Código de Processo Penal é claro, e não dá espaço para interpretações:

Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

Ok. Até aí, então, resolvida a questão da AUTORIZAÇÃO.

A seguir, é necessário que também não se esteja violando a lei OU o regulamento. Como lei, compreende-se a Lei 10.826, de 22 de Dezembro de 2003.

O regulamento da Lei 10.826/2003 é o Dec. 5.123/04, mas o Regulamento de Fiscalização de Produtos Controlados é o Decreto 3.665/2000. O descumprimento de qualquer um dos dois implica na prática dos crimes dos artigos 14 e 16 do Estatuto do Desarmamento.

Então, para se portar (E PARA SE TRANSPORTAR) armas de fogo, é necessária AUTORIZAÇÃO, e não pode estar sendo violado dispositivo legal e regulamentar. Ponto.

Se o agente descumprir Instrução Normativa, Portaria, ordem oficial, etc... mas estiver com autorização (ou licença) e cumprindo a lei e o regulamento, não há a prática de crime.

Dos tipos de GT

A lei prevê alguns tipos específicos de Guia de Tráfego. A mais comum, é denominada meramente de GT, e é expedida pelas fábricas e pessoas jurídicas autorizadas a transportar produtos controlados, geralmente emitida pela própria empresa mediante a aquisição prévia de selos. A mais abundante, é a GTE de CACs, expedida por autoridade militar. Durante a campanha de desarmamento foi muito comum a Polícia Federal emitir GT para que o cidadão transportasse a arma até o local de entrega, isto está dentro das atribuições da Polícia Federal.

A Guia de Trânsito emitida pela Polícia Federal tem em seu previsivo, art. 70 do Dec. 5.123/04, a ordem explícita de que a mesma NÃO AUTORIZA O PORTE DA ARMA (§ 3o), e para pessoas com dificuldade de leitura e interpretação de texto isto gera graves problemas para quem utiliza a GTE como porte de arma (Art. 30). O primeiro caso trata de pessoas a quem é proibido o porte de armas (todos, genericamente), o segundo caso trata de pessoas (CACs) que são autorizados a portar arma de fogo (Art. 8o do Estatuto do Desarmamento.

As polícias descritas no art. 144 da Constituição Federal, na posição de entidades auxiliares do Exército Brasileiro no controle de produtos controlados, não são vedadas a emitir Guia de Trânsito, mas a verdade é que não existindo regulamentação, também não podem adquirir os selos necessários para a emissão do documento.

Para mencionar um exemplo, se uma arma de uma corporação policial necessita de reparos, A FÁBRICA emite uma nota fiscal e a GT correspondente para que uma outra pessoa jurídica COM CR DE TRANSPORTE retire o armamento e o leve até a fábrica. A corporação não emite a GT.

Conclusão

É óbvio que a GT de que se trata o presente artigo é aquela autorizando O AGENTE a transportar o PCE. Se fosse a GT ou GTE do proprietário da arma apreendida, com certeza não haveria a apreensão, e mesmo sendo o caso, esta não autorizaria OUTRA PESSOA a transportar a arma ou o PCE.

Então, os agentes previstos do art. 144 da Constituição Federal tem direito ao porte institucional de sua arma acautelada em serviço, podem excepcionalmente utilizar sua arma pessoal nos termos do art. 35 do Decreto 5.123/04 (armas registradas no SINARM ou SIGMA registrada pela corporação), podem utilizar suas arma de CAC desde que a arma seja do acervo de atirador e estejam cumpridos os requisitos do art. 30 do Decreto 5.123/04, mas em nenhuma hipótese podem TRANSPORTAR PCEs apreendidas em ação policial ou em cumprimento de ordem judicial sem que as mesmas estejam devidamente acompanhadas de GT, sob pena de estarem cometendo os crimes do art. 14 ou 16 do Estatuto do Desarmamento.

1PCE = Produto Controlado pelo Exército, definido no art. 3o, LIV do R-105;

2Colecionador, atirador e caçador, três categorias nas quais os civis se registram no Exército Brasileiro

3R-105 – Decreto presidencial, previsto no art. 23 do Estatuto do Desarmamento, e 49 do Dec. 5.123/04.

4GT, Guia de Trânsito, ou GTE, Guia de Trânsito Eletrônica, documento descrito no art. 3o, LIV do R-105

Sobre o autor
Arnaldo Adasz

Advogado, Perito em Balística Forense e Legislação Brasileira de Armas de Fogo, Primeiro Presidente e co-fundador da Associação Brasileira de Atiradores Civis, membro do Conselho Consultivo de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército Brasileiro.

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