Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Responsabilidade civil do Estado em face da inefetividade do direito à educação

Exibindo página 4 de 5
Agenda 07/01/2016 às 13:08

6 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO EM FACE DA INEFETIVIDADE DO DIREITO À EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

A Constituição federal de 1988 elenca uma série de ferramentas jurídicas de modo a instrumentalizar a tutela jurisdicional do direito fundamental à educação. Nesse sentido, assevera Martins (2009) tratar-se da “Constituição Brasileira da Educação”, pois traz um arcabouço jurídico com o fim de instrumentalizar a tutela jurisdicional na proteção deste direito fundamental. Segundo o supracitado autor, esse arcabouço jurídico ultrapassaria o Capítulo III do Título VIII – Da Ordem Social.

Com a atual Constituição e das leis que regulamentam a materialização do direito à educação surgem meios jurídicos necessários para instrumentalizar sua efetivação. Com isso, o judiciário adota um papel relevante no implemento de tais garantias constitucionais através do que Cury e Ferreira (2010, p. 55) denominam de Judicialização da Educação.

Esse fenômeno instrumentaliza discussões judiciais como à garantia de acesso ao ensino público, merenda escolar, transporte escolar, vaga em creches e pré-escola, transferência compulsória, cancelamentos de matrículas etc., ou seja, uma série de questões que gravitam em torno da temática qualidade na educação e que instrumentalizam o acesso efetivo da garantia fundamental pelos indivíduos, haja vista a característica de prestador do Estado contemporâneo.

6.1 JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

O sistema normativo brasileiro elenca uma série de objetivos que constituem deveres de prestação do Estado para com os indivíduos. Dente estes objetivos podemos destacar o Art. 205 da CF/88, ao aduzir que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Também destacamos o Art. 53 da Lei 8.069/90, Lei que dispões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, ao asseverar que:

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - direito de ser respeitado por seus educadores;

III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores;

IV - direito de organização e participação em entidades estudantis;

V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.

Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.

Na mesma esteira garantidora segue o Art. 2º da Lei 9.934/1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a asseverar que “a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”

Nesse sentido, a par das garantias de prestação do direito fundamental à educação de qualidade, torna-se imperioso analisar as consequências jurídicas advindas da ineficiência do Estado em contemplar tais objetivos.

Caminhando no sentido da responsabilização do ente público pela inefetividade na efetivação da mencionada garantia constitucional, a doutrina visualiza no Art. 206, VII, da Constituição Federal o princípio da “garantia do padrão de qualidade”.

Já o Art. 211 do texto constitucional indica os responsáveis pela educação de qualidade, ao aduzir que:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.

§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;

 § 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. 

§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio. 

§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório. 

§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular. 

Desse modo percebe-se um regime de colaboração entre os entes públicos, com a previsão expressa da União como garantidora de equalização de oportunidades educacionais e do padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira.

Ocorrendo a inobservância do retro mencionado padrão mínimo de qualidade deve surgir o dever do Estado em atuar, e em caso de omissão ou atuação insuficiente deve surgir o direito à responsabilização civil.

Entretanto, como já aludido no capítulo atinente aos métodos de aferição da qualidade na educação, essa análise perpassa pela busca de indicadores. Em que pese previsão expressa de dispositivos legais trazendo a exigência de garantia  padrões mínimos de qualidade no ensino, discute-se sobre a necessidade de um parâmetro de referência para possibilitar a atuação judicial.

6.2 CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

6.2.1 Políticas Públicas

Política pública para  Höfling (2001, p. 31)  é “o Estado implementando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade”. Nesse sentido, a implementação e manutenção das políticas públicas só são possíveis através de um processo decisório que transpassa por diferentes órgãos estatais e agentes da sociedade civil.

Para Mello (2008, p. 808) políticas públicas são “um conjunto de atos unificados por um fio condutor que os une ao objetivo comum de empreender ou prosseguir um dado projeto governamental para o País”. Segundo o autor, é plenamente possível controlar juridicamente políticas públicas, pois se um ato é possível de controle o conjunto também o será.

Dessa forma, assevera o mencionado autor, dissertando acerca do controle jurisdicional das políticas públicas, in litteris;

Assim como agredir um princípio é mais grave que transgredir uma norma, empreender uma política – que é plexo de atos – que seja em si mesma injurídica é mais grave que praticar um simples ato contraposto ao Direito. Logo, se é possível atacar o menos grave, certamente será possível atacar o mais grave. (MELLO, 2008, p. 808)

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

São legitimados, portanto, para manifestar-se contra as políticas públicas ineficientes o Ministério Público, os habilitados para a propositura da ação civil pública, bem como qualquer cidadão que demonstre o gravame pessoalmente infringido pela política pública.

 Assim, segundo Mello (2008, p. 808) “o que legitima o cidadão não é a particularidade do gravame, mas o fato de subtrair um bem jurídico de que pessoalmente desfrutaria se a ordem jurídica fosse obedecida”.

6.2.2 Intervenção do Poder Judiciário nas Políticas Públicas

A realização de direitos através da intervenção do Poder Judiciário é tema bastante controverso na doutrina. Boa parte da doutrina tende a defender a não intervenção do Poder Judiciário, no que concerne à definição das políticas públicas e a escolha das prioridades orçamentárias.

Puga essa vertente que essas questões estão no campo da discricionariedade do administrador, “tanto no momento de elaboração das leis orçamentárias, cuja iniciativa é privativa do Poder Executivo, quanto no momento da execução do orçamento” (MÂNICA, 2010, p. 4).

Ademais, argumenta-se ainda acerca da ausência de previsão legal de pretensão individual do particular contra os poderes públicos em matéria de implementação de políticas públicas, bem como da ilegitimidade dos magistrados, posto que não são eleitos. Desse modo, a atuação dos juízes nessas questões ensejariam uma invasão política das atribuições de outro poder assegurados constitucionalmente (FREIRE JUNIOR, 2005).

Já a vertente doutrinária que autoriza intervenção judicial irrestrita nas políticas públicas sustenta que inexiste diferença ontológica entre ato da Administração que tenha por escopo implementar determinada política pública e os demais atos administrativos, pois todos estão vinculados aos mesmos princípios administrativos.

A negação de efetivação dos direitos fundamentais, a partir da ineficiência da realização das políticas públicas, comprometeria, desse modo, a realização do Estado Democrático de Direito, que depende inequivocamente do acesso dos cidadãos aos direitos relacionados ao conteúdo do mínimo existencial. Sobre o tema ressalta Ana Paula de Barcellos (2008, P. 140):

Se a Constituição contém normas nas quais estabeleceu fins públicos prioritários, e se tais disposições são normas jurídicas, dotadas de superioridade hierárquica e de centralidade no sistema, não haveria sentido em concluir que a atividade de definição das políticas públicas – que irá, ou não, realizar esses fins – deve estar totalmente infensa ao controle jurídico.

Em que pese a divergência doutrinária, deve-se observar que a Constituição estabelece, entre os objetivos fundamentais da República, a construção de uma sociedade justa e solidária, garantindo o desenvolvimento, erradicando a pobreza e reduzindo as desigualdades sociais (art. 3º). Portanto, a realização desses direitos relacionados ao mínimo existencial deve ser concretizada a partir da atuação do Poder Judiciário, sob pena de o texto constitucional perder a sua força normativa.

6.2.3 Reserva do possível e controle Judicial das Políticas Públicas educacionais

Ao tratar de políticas públicas na busca por efetivações de garantias fundamentais é inevitável não adentrar na temática da reserva do possível. É pacífico na doutrina moderna que os direitos advindos da superação do Estado Liberal dependem de uma prestação positiva do Estado. Por depender de uma prestação positiva necessitam da disponibilidade de recursos financeiros do Estado na sua implementação.

Dessa feita, as políticas sociais básicas, como a política educacional, exerce uma necessária subordinação frente à todas as demais políticas públicas, impondo ao Estado a sua concretização de forma efetiva, ensejando, portanto, uma atuação garantidora estatal. É nesse sentido que assevera Baratta (2001, p.49):

As políticas sociais básicas têm uma função primária e geral e que, com respeito a estas, todas as outras políticas devem ser subsidiárias e residuais; em segundo lugar, que a concepção dinâmica do princípio da igualdade impõe aos Estados membros da Convenção e à comunidade internacional, respectivamente, o respeito de um padrão mínimo de normas do Estado social e de uma regulação do desenvolvimento econômico que respeite os critérios do desenvolvimento humano e não seja contrário a eles.

Portanto, em face dessa eficácia subordinante das políticas públicas básicas, essenciais à manutenção do mínimo existencial dos indivíduos, a limitação orçamentária dos Estados não pode servir de óbice da efetivação dos direitos sociais. 

Essa constatação foi fruto de embate que surgiu originalmente na jurisprudência Alemã, sendo conhecida como o embrião da teoria da reserva do possível. Sobre o tema Ingo Wolfgang Sarlet (2007, p. 189) assevera que:

A prestação reclamada deve corresponder àquilo que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade. Com efeito, mesmo em dispondo o Estado dos recursos e tendo o poder de disposição, não se pode falar em obrigação de prestar algo que não se mantenha nos limites do razoável. Assim, poder-se-ia sustentar que não haveria como impor ao Estado a prestação de assistência social a alguém que efetivamente não faça jus ao benefício, por dispor, ele próprio, de recursos suficientes para seu sustento. O que, contudo, corresponde ao razoável também depende – de acordo com a decisão referida e boa parte da doutrina alemã – da ponderação por parte do legislador.

Fica evidenciado que o tema requer um equacionamento adequado e sistemático à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade de forma que a reserva do possível não sirva apenas para a como um obstáculo para a efetivação dos direitos sociais, mas também como uma ferramenta para a sua concretização. Nesse sentido ressalta Dirley da Cunha Júnior:

Os problemas de “caixa” não podem ser guindados a obstáculos à efetivação dos direitos fundamentais sociais, pois imaginar que a realização desses direitos depende de “caixas cheios” do Estado significaria reduzir a sua eficácia a zero, o que representaria uma violenta frustração da vontade constituinte e uma desmedida contradição do modelo do Estado do Bem-Estar Social. (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 713):

Percebe-se, desse modo, que a intervenção do Poder Judiciário no controle das políticas públicas torna-se essencial para a efetivação dos direitos fundamentais. Analisando a temática sob o prisma do Estado Democrático de Direito atual, e interpretando o sistema de garantias constitucionais à luz dos princípios fundamentais é imperioso admitir que o órgão jurisdicional determine a redistribuição dos recursos públicos existentes, investidos em áreas como a educação, possibilitando a aplicação de políticas voltadas para a garantia do mínimo existencial.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF nº 45, reconheceu a possibilidade de controle jurisdicional de políticas públicas, com fim de efetivar os direitos sociais, conforme decisão monocrática do Ministro Celso de Mello:

É certo que não se inclui, ordinariamente, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário - e nas desta Suprema Corte, em especial - a atribuição de formular e de implementar políticas públicas (JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE,  "Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976", p. 207, item n. 05, 1987, Almedina, Coimbra), pois, nesse domínio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo. Tal incumbência, no entanto, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. (BRASIL, 2004)

Continuando, quanto à reserva do possível, observa o Ilustre Ministro que “comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto constitucional”. Entretanto, não deixou de ressaltar os limites para a invocação de tal instituto jurídico pelo Estado, in litteris:

Não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese - mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa - criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de  frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.(Brasil, 2004)

Tendo por base as permissões aventadas pela supra citada decisão da corte maior de de boa parte da doutrina, é imperioso concluir que o Estado não pode se eximir da obrigação constitucional de promoção de uma educação de qualidade para seus cidadãos.

Seguindo essa linha de raciocínio, comprovado má gestão, por exemplo, com os recursos do FUNDEB, o judiciário pode, depois de acionado, determinar a correta aplicação dos recursos na manutenção e desenvolvimento da educação básica pública, observando-se os respectivos âmbitos de atuação prioritária dos Estados e Municípios, conforme estabelecido nos §§ 2º e 3º do art. 211 da Constituição Federal.

Dessa forma, a atuação do Poder Judiciário no controle das politicas públicas educacionais deve ser voltado para a consecução dos objetivos das instituições educacionais de todos os níveis de acordo com os preceitos legais voltados ao desenvolvimento da qualidade no ensino, atuando em setores como os relacionados com despesas de aquisição, manutenção e funcionamento das instalações e equipamentos necessários ao ensino, uso e manutenção de bens e serviços, remuneração e aperfeiçoamento dos profissionais da educação, aquisição de material didático, transporte escolar, entre outros.

6.3 DA NECESSÁRIA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DO ESTADO EM FACE DO DANO GERADO PELA PRECARIEDADE DA EDUCAÇÃO.

Em que pese a constatação de que o direito à educação de qualidade é um direito fundamental que requer uma atuação positiva e eficiente do Poder Público, sua discussão jurisprudencial, até o momento, limita-se a questões pontuais, tais como o direito à creche e pré-escola, Ações Civis Públicas movidas por Ministérios Públicos Estaduais em face de municípios, matrículas em estabelecimentos públicos etc.

Entretanto, no âmbito dos Tribunais Superiores ainda não se encontra uma discussão efetiva quanto a inefetividade da qualidade da educação, talvez por conta da complexidade do tema, como assevera Cabral (2008, p.150):

“não há nenhuma decisão emitida pelos Tribunais Superiores Brasileiros sobre ações pleiteando a qualidade do ensino ou a responsabilização do Poder Executivo pela falta de qualidade, em nenhum nível de ensino.” 

Em que pese a ausência dessa discussão no âmbito do judiciário seus efeitos nefastos são evidentes na população brasileira. Constatando indicadores como os fornecidos IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, verificamos que os resultados e metas apresentadas pelo sitio da internet[7], referentes aos anos iniciais e finais do ensino fundamental, bem como do ensino médio, encontram resultados alarmantes, ficando em diversos casos abaixo da meta estabelecida pelo próprio governo federal.

Verifica-se dos citados resultados uma diferença expressiva de rendimentos nos pontos atingidos em relação ao ensino privado. Nesse sentido. constata-se que em 2011 nos anos finais do ensino fundamental a escola pública Estadual obteve 3.9 (Três ponto nove) pontos, a Municipal, por sua vez, obteve 3.8 (Três ponto oito) pontos, já a escola privada obteve 6.0 (Seis) pontos, ou seja, um resultado expressivamente maior do que o do ensino público. Já em relação ao ensino médio o contexto de desnível continua, com a escola Estadual perfazendo pífios 3.4 pontos, contra 5.7 pontos da escola privada. Ou seja, tais dados demonstram um verdadeiro abismo entre a qualidade de ensino privado e público e indicam uma patente inobservância do princípio da eficiência no que tange a prestação da educação no âmbito da Administração Pública.

Ainda no contexto da qualidade da educação no país, podemos vislumbrar que o Brasil ocupa o 53º (Quinquagésimo terceiro) lugar em educação, entre 65 (Sessenta e cinco) países avaliados no PISA-Programa Internacional de Avaliação de Alunos[8].

O analfabetismo funcional de pessoas entre 15 anos ou mais foi registrado em 13,6% (Treze virgula seis por cento) no ano de 2009 (IBOPE - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística)[9]; Ademais, ao avaliar as 5 (Cinco) metas estabelecidas pelo programa Todos pela Educação[10] percebemos que ainda há muito o que fazer para se alcançar o nível de ensino que garanta a plena eficácia do direito fundamental à educação de qualidade.

Ao analisar tais indicadores é imperioso reconhecer que se faz necessário a responsabilização objetiva do Estado em decorrência da inobservância dos seus deveres constitucionais em garantir aos cidadãos uma educação que corresponda ao mínimo existencial. Esse posicionamento pode ser vislumbrado como uma possível solução para a problemática na busca pela efetiva concretização da garantia constitucional.

 Desse modo, a aplicação do art. 37, § 6º da Constituição da República torna-se um importante instrumento para concretização dos direitos fundamentais essenciais para a realização da dignidade da pessoa humana, inclusive frente às omissões estatais. Ademais, a inobservância do princípio da proporcionalidade torna a ação ou omissão estatal antijurídica, indicando uma falha no dever de fornecer a educação pública com qualidade e eficiência, ensejando, portanto, o dever de indenizar à coletividade em sede de Ação Civil Pública ou ao indivíduo especificamente lesado em Ação individual.

Portanto, essa máxima da obrigatoriedade na condução da efetiva implementação das garantias constitucionalmente asseguradas à população exerce uma força subordinante contra o próprio Estado através do reconhecimento de um direito público subjetivo perfeitamente exercitável e passível de responsabilização frente à inobservância e consequentes prejuízos. É nessa direção que assevera Paulo Afonso Garrido de Paula (1995, p. 94), in litteris:

Se o dever do Estado conduz à definição de políticas sociais básicas, o direito de todos leva à existência de direito público subjetivo, exercitável, portanto, contra o Poder Público. Assim, reconhece-se que o interesse tutelado pelo direito social tem força subordinante, isto é, subordina o Estado ao atendimento das necessidades humanas protegidas pela lei.

Nesse sentido, é possível concluir que diante de um dano juridicamente relevante em virtude de omissões ou ações estatais, que inviabilizem a concretização do mínimo existencial dos cidadãos no que tange a garantia de um padrão mínimo de qualidade do ensino ensejam a possibilidade de responsabilização civil do Estado, principalmente através da condenações em obrigações de fazer, como por exemplo, na obrigação de contratação de docentes, de materiais pedagógicos, equipamentos etc.

Nesse diapasão, conclui-se que é imperiosa a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva e do princípio da proporcionalidade, inclusive nos casos de omissões estatais no âmbito educacional como meio mais eficiente para impedir que o Estado continue inerte em relação aos seus deveres constitucionais de garantir uma educação de qualidade, e com isso efetivamente concretizar a educação de qualidade, uma das garantias constitucionais mais caras ao futuro da nação.

Sobre o autor
Wendel N. Piton Barreto

Pós-graduado em Direito de Estado. Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PITON BARRETO, Wendel N.. Responsabilidade civil do Estado em face da inefetividade do direito à educação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4572, 7 jan. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45644. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!