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A testemunha

Agenda 20/02/2016 às 08:22

O artigo traz o caso do depoimento do ex-presidente em processo penal, com esclarecimentos sobre o papel da testemunha na instrução do feito.

Noticia-se que, arrolado como testemunha de defesa do pecuarista José Carlos Bumlai, o ex-presidente Lula vai depor pela primeira vez perante o juiz Sergio Moro em 14 de março.

O depoimento do ex-presidente será por videoconferência.

Preso desde outubro, em Curitiba, Bumlai afirmou em depoimentos à Polícia Federal que Lula não teve envolvimento em negócios relativos à Petrobras. Ele confirmou que é amigo pessoal do ex-presidente, mas que nunca se beneficiou dessa relação no âmbito comercial.

Bumlai também admitiu ter fraudado um empréstimo de R$ 12 milhões, contraído em 2004, que teve o PT como destinatário final, mas isentou Lula da negociação.

Os investigadores da Lava Jato acreditam que, em troca do empréstimo, a Schahin obteve um contrato de cerca de R$ 1,5 bilhão para operar o navio-sonda Vitória 10.000. A revelação foi feita por um dos donos do grupo, Salim Schahin, em acordo de delação premiada com a força-tarefa da Lava Jato.

Tanto o partido quanto e Bumlai negam vínculo entre o contrato e o empréstimo junto ao banco Schahin.

Lula não prestará depoimento como informante, mas como testemunha.

Assim, se mentir, poderá ser preso e processado.

Heleno Cláudio Fragoso (Lições de direito penal, Rio de Janeiro, Forense, volume II,  5ª edição, pág.  513)  disse que testemunha é a pessoa física chamada a depor em processo perante a autoridade, com o fim de fornecer prova de fatos relativos ao objeto do mesmo.

A testemunha somente depõe sobre fatos, vedando a lei que ela manifeste suas opiniões ou apreciações pessoais sobre os mesmos. Sua função será de narrar ou transmitir ao julgador os fatos pretéritos que percebeu.

Como bem salientou Moacyr Amaral Santos (Primeiras linhas de direito processual civil,  São Paulo, Saraiva, 2º volume, 17ª edição, pág. 452), as declarações da testemunha devem ser feitas com a consciência de dizer a verdade, versando sobre fatos cujo conhecimento adquiriu pelos seus próprios sentidos. A testemunha deve ser uma pessoa física que tem a obrigação de dizer a verdade.

São elementos característicos da testemunha:

a)      É uma pessoa física;

b)      É uma pessoa estranha ao feito;

c)       É uma pessoa que deve saber do fato litigioso;

d)      É uma pessoa que deve ser chamada a depor em juízo;

e)      É uma pessoa que deve ser capaz de depor.

A teor do artigo 339 do Código de Processo Civil se tem que ‘ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o conhecimento da verdade”, competindo ao terceiro, em relação a qualquer pleito, informar ao juiz os fatos e as circunstâncias de que tenha conhecimento, como se lê do artigo 341, I, do mesmo diploma legal.

Considerando as causas determinantes da credibilidade da testemunha, e, nos termos do artigo 405, § 3º, do Código de Processo Civil, são arroladas pessoas suspeitas, dentre as quais o condenado por crime de falso testemunho, havendo transitado em julgado a sentença.

Poderão os impedidos de depor e os suspeitos, quando seus testemunhos forem estritamente necessários, ser ouvidos pelo juiz, mas, em razão de suas condições, não prestarão o compromisso de dizer a verdade, de que fala o artigo 415 do Código de Processo Civil.

A testemunha está obrigada a comparecer a juízo, devendo ser, de forma regular, cientificada de que foi arrolada para determinado processo e que, por isso, deverá depor em certo juízo, em dia e hora designados pela autoridade judicial. Para nascer a obrigação de comparecer, que tem a natureza de compulsória, condição é que a testemunha seja regularmente intimada, dando-se-lhe ciência do lugar, dia e hora em que deverá comparecer. Para tanto, deverão, na forma do artigo 412 do Código de Processo Civil, ser intimadas. Entretanto, a parte que as houver arrolado poderá dispensar a intimação das mesmas, afirmando que comparecerão espontaneamente, como se lê do artigo 412, § 1º, do Código de Processo Civil.

O desatendimento à convocação judicial sujeita a testemunha a duas sanções: uma com o fim de constrangê-la a comparecer e outra pecuniária, consistente na sua responsabilização pelo aumento das despesas do processo a que der causa o seu não comparecimento (artigo 412, parte final, do Código de Processo Civil). Para tanto, a testemunha deve ser regularmente intimada para que possam ser aplicadas tais sanções.

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A testemunha tem a obrigação de depor, devendo narrar o que souber sobre os fatos da causa, isto é, depor a verdade do que souber e lhe for perguntado, pois a testemunha não pode recusar-se a depor.

No entanto, poderão e mesmo deverão recusar-se a depor, quando a obrigação de testemunhas colidir com deveres mais fortes e que em razão do interesse público sejam protegidos, ou quando do depoimento resultarem graves danos a parentes próximos, como se lê do artigo 414, § 2º, do Código de Processo Civil.

O essencial é que a testemunha, em seu depoimento, diga a verdade, pois, se infringir esse dever jurídico, estará praticando o delito de falso testemunho, que é capitulado no artigo 342 do Código de Processo Penal. No início da inquirição, a testemunha prestará o compromisso de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado (artigo 415 do Código de Processo Civil), cumprindo ao juiz, no ato, advertir a testemunha, que incorre em sanção penal quem faz afirmação falsa, cala  ou oculta a verdade (Código de Processo Civil, artigo 415, parágrafo único).

Deverá a testemunha ser tratada com dignidade. Se for ameaçada ou violentada, a lei penal configura o crime de coação no curso do processo (Código Penal, artigo 344), devendo as partes lhe tratar com urbanidade, não se fazendo perguntas ou considerações impertinentes, capciosas ou vexatórias (Código de Processo Civil, artigo 416, § 1º), podendo fazer consulta a notas e apontamentos que reavivem sua memória com relação aos fatos de que é inquirida.

Advertiu, aliás, Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal, volume IX, pág. 478):

“É arriscado forçar uma testemunha a insistente apelo à sua clarividente memória. Assediada, procura ela, quase sempre, suprir artificialmente lacunas, reavivar tintas apagadas, e vai-se operando, assim, a deturpação do testemunho”.

Mesmo a simpatia ou a antipatia com relação ao réu poderão inspirar-se em sua condição pessoal, ou categoria social, como bem disse Paulo José da Costa Jr (Comentários ao código penal, volume III, 1989, pág. 551)

É conhecida a lição de Lombroso (La psicologia dei testimini, nel processi penale, in Sc. pos, 1903) de que não raro o testemunho se encontra entremeado de erros e lacunas.

Mas, deve o juiz levar em conta que é muito comum o receio da testemunha diante da autoridade policial ou judiciária, como o temor, a publicidade e, ainda, o envolvimento em consequências que possam advir, como disse Eduardo Couture (Las reglas de la sana critica en la apreciación de la prueba testimonial, em conferência proferida na Faculdade de Direito de Buenos Aires, em 27 de julho de 1940).

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A testemunha. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4616, 20 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46497. Acesso em: 24 nov. 2024.

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